Crítica | Mulher-Maravilha 1984
Mulher-Maravilha 1984 se tornou uma das esperanças da Warner Bros. e DC Comics para retomar o sucesso do universo cinematográfico dos super-heróis da casa, após a recepção morna da Liga da Justiça. Além disso, era também aguardado que, após o fechamento forçado dos cinemas devido a pandemia, o filme, cuja estreia foi programada para dezembro, traria um retorno aceitável de bilheteria, mesmo que sua exibição fosse simultânea com o streaming da HBO Max.
Novamente conduzido por Patty Jenkins, o início do filme marca um retorno a ilha das amazonas, Themyscera, resgatando boa parte do que deu certo em Mulher-Maravilha em 2017, com o caráter épico do filme solo da heroína. Essa sequencia em particular dura onze minutos, e logo a linha do tempo vai para o presente, os super coloridos anos oitenta do século XX. O segundo filme protagonizado por Gal Gadot faz lembrar seu par da editora concorrente, Capitã Marvel, que brincava com clichês de 1990, mas com diferenças cabais entre as narrativas e a necessidade de se apelar para outra época.
O elenco é estrelado com destaque especial para Pedro Pascal fazendo o canastrão Maxwell Lord. Nos quadrinhos, surgiu como um ganancioso empresário da Liga da Justiça da fase J.M. Demattheis e Keith Giffen, mas que sempre que vai para outras mídia é retratado como um vilão puro e simples. Os problemas do filme começam justamente na hora de desenvolver as relações entre personagens. O exemplo disso é visto entre a doutora e especialista em geologia Barbara Minerva (Kristen Wiig) e a princesa amazona, uma relação cujo roteiro guarda semelhanças com Batman Eternamente, entre Edward Nygma e Bruce Wayne, mas sem ser tão caricatural. Fora isso, as intimidades dos personagens não parecem realistas, e sim um pastiche do que seriam os relacionamento entre pessoas reais. Ao menos a dinâmica e química entre Gadot e Chris Pine segue bem e firme, as piadas que funcionam são exatamente as que invertem os papeis da pessoa em um mundo novo, que antes contemplava Diana e agora, acometem Steve Trevor.
Porém, o retorno do par romântico da heroína, ajuda a deflagrar um dos defeitos do filme: a conveniência do roteiro de Geoff Johns, David Callaham e Jenkins. O que incomoda é o apelo a suspensão de descrença. Em alguns pontos é bem comum os exageros nas historias em quadrinhos, mas aqui há também excessos e muita convenviências narrativa. Em especial ao artifício do objeto mágico de desejo, que muda suas regras a todo momento. Além disso, os personagens são quase todos muito genéricos, e as cenas de ação são artificiais e muito mal pensadas. As que ocorrem no deserto variam entre momentos com uma iluminação nada realista, unido a resgate de crianças que são feitas por bonecos tão fajutos quanto os vistos em Sniper Americano.
Outra questão complicada é a participação da Mulher Leopardo. Sua versão é bem diferente dos gibis, e isso não necessariamente é um fator negativo. O problema mesmo é ela ser cercada de clichês, igual a tantos outros opositores de filmes de herói, movido por algo maligno e ancestral, representando o esteriótipo de uma pessoa boa mas que é corrompida.
Já o drama de Lord, no final, por mais bizarro que seja, ainda guarda boas surpresas, ao refletir sobre o apego ao poder absoluto, mostra como um homem comum pode se corromper. Os momentos finais guardam momentos grotescos e soluções que não fazem sentido, envolvendo os dois opositores, cujos fins são vergonhosos, assim como a utilização da tão esperada armadura da heroína em O Reino do Amanhã aqui sub aproveitada.
Apesar de Deborah e Zack Snyder assinarem como produtores executivos, claramente se ignora completamente as falas sobre Diana estar escondida desde a Primeira Guerra Mundial, como é aludido em Batman VS Superman e Liga da Justiça (a saber se no vindouro Snydercut da Liga, haverá alguma explicação a respeito). Na verdade, James Wan já havia ignorado fatos sobre o rei atlante em seu Aquaman, mas aqui não há qualquer pudor da heroína em se expor, mesmo que fiquem dúvidas na imprensa sobre suas intenções e origens.
Os aspectos visuais também são estranhos. Sai a fotografia super escura para uma clara e esquisita, em um trabalho assinado por Mathew Jansen, bem diferente do que havia feito em Poder Sem Limites, Game Of Thornes e The Mandalorian e até mesmo no primeiro filme. Ao menos a música de Hans Zimmer não interfere tanto na trama como em outros de seus trabalhos.
Jenkins apresenta um filme desequilibrado, que faz lembrar os momentos mais atrozes de Mulher Gato, A Ascensão Skywalker ou A Torre Negra. Os poucos momentos que são inspirados ficam isolados, como ilhas no meio do oceano, soterradas por uma tempestade marinha capaz devastar tudo, incluindo as boas qualidades. Nem o sacrifício de heroísmo de Diana faz sentido, e a mensagem presente no diálogo entre ela e Lord é tão barata e piegas que faz temer pelos próximos trabalhos dos envolvidos. Naturalmente, já há uma parte três confirmada pelo estúdio.