Crítica | Coração de Dragão
O gênero capa e espada se tornou muito popular ao longo dos anos, sendo um tipo de historia muito apreciada pelo público em geral não só nos livros como também nos cinemas. Após avanços em efeitos especiais, os anos noventa trouxeram adaptações de qualidade e outras tantas de gosto duvidoso, explorando uma vertente mais fantasiosa de obras mais realistas como Coração Valente. Em 1996, misturando certo realismo com fantasia, Coração de Dragão de Rob Cohen (Dragão: A História de Bruce Lee, Velozes e Furiosos) chega às telas.
A história apresenta inicialmente dois personagens, o bravo Bowen (Dennis Quaid) e o jovem Einon (interpretado por Lee Oakes quando moço e depois, adulto, por David Thewlis), seu pupilo. A interação é mostrada de forma ingênua mas o pragmatismo da Era Medieval Logo domina a tela. Em um acidente testemunhado por ambos, o príncipe do reino sofre um acidente e a rainha invoca o poder mágico de um dragão para salvar o filho. A única condição imposta pelo dragão é um juramento de bondade e justiça. Porém, o personagem se revela um rei tirano e jovem cavaleiro acredita que foi o poder mágico que modificou o rei.
O filme foi reprisado inúmeras vezes nas Sessão da Tarde e Cinema em Casa e angariou fãs que viam na obra um clássico moderno. O alto grau de fantasia pode sustentar essa afirmação, embora cinematograficamente ele não tenha grande qualidade. O roteiro é básico em seus primeiros momentos e parece se desenvolver, em certa medida, de maneira semelhante a história do rei bíblico Ezequias, alguém que pediu a um ser divino uma vida prolongada e viu a desgraça chegar em seu reino. Os desígnios divinos são substituídos pela corrupção entre homens e dragões.
O destaque da fita é Sean Connery que empresta sua voz e personalidade ao Dragão procurado por Bowen e pela rainha. Após a mudança de personalidade da majestade, o guerreiro que segue o Antigo Código – uma espécie e conduta honrosa antiga, citada mas não desenvolvida durante o longa -e persegue por doze anos o ser draconiano. Em cena, muitos arquétipos típicos de jogos de RPG medieval aparecem como clérigos, bardos e outros personagens da época.
Os os cenários das cidades são bem feitos, embora em alguns momentos seja visível a precariedade de alguns cenários, principalmente as rochas. Há também um enorme pudor para finalmente mostrar a figura de Draco que primeiro aparece se camuflando como um camaleão e somente aparece com maior intensidade após meia hora de exibição.
O grave problema que desequilibra a trama é a artificialidade das personagens. Não há sutileza nenhuma. Em alguns pontos a qualidade dramática lembra uma representação amadora. Para uma narrativa épica que busca falar sobre o fim de uma raça, afinal o dragão do título é o último de sua espécie, o roteiro não está a altura da empreitada. Para piorar, os efeitos da época não encaixam muito bem o dragão e outros personagens com o cenário. Mesmo que a equipe da Industrial Light & Magic tenha participado da confecção da criatura, é visível a precariedade. O personagem foi o primeiro feito inteiramente por computação que interagia com outros personagens humanos em cena. Sendo assim, é natural certa precariedade. Ao menos a construção do humor do dragão é charmosa e carismática, ao contrário das outras personalidades, em especial dos vilões.
Mesmo com as limitações visuais, o que mais incomoda são as obviedades do roteiro com personagens que se julgam espertas mas não são. Diversos ardis em cena não enganam nem mesmo os mais novos. Ao menos, o caçador e o monstro alado parecem estar se divertindo com as grotescas situações em que se colocam. Além disso, há boas participações também de Pete Postlethwaite, Brian Thompson e Dina Meyer, e um de comédia bizarro entre a criatura e o caçador.
As relações dos personagens não tem uma construção bem trabalhada, mentor e pupilo não tiveram grande tempo de tela para desenvolver ali uma relação de paternidade ou mesmo de fraternidade. Desse modo, o duelo entre Eion e Bowen se esvazia de significado. O que realmente importa para o roteiro de Charles Edward Pogue é o compartilhamento de coração entre Draco e o rei malvado.
Ao menos, o conceito do herói caído, deprimido e decepcionado com seus próprios rumos de vida consistem em uma boa mensagem. Há química entre Dennis Quaid e a figura monstruosa de CGI. É uma pena que a historia não acompanhe o arrojo dessa amizade, sequer em seu desfecho, que valoriza o legado de Draco e mostra uma revolta popular contra a monarquia tirana, embora toda essa movimentação não faça sentido.
Coração de Dragão é um filme cujas intenções são ótimas, mas o modo como sua historia se desenvolve é irregular. Resultando em uma obra que mais se destaca pelo imaginário nostálgico do que pela qualidade intrínseca.
https://www.youtube.com/watch?v=Volt1twIb84