Tag: Érico Veríssimo

  • Resenha | Rango 1

    Resenha | Rango 1

    De Edgar Vasques, Rango 1 compila algumas historias do personagem titulo publicadas no jornal Folha da Manhã e diversas outras revistas como Pasquim. Este volume 1, lançado em um tempo longínquo pela L&PM editores possui prefácio de Érico Veríssimo, que adjetiva muito bem as historias do personagem, descrevendo-o como um anti-herói que vive em condições paupérrimas e que se nutre de humor ácido já que comida é algo que falta bastante tanto para si, como para seu filho.

    Cada página possui duas tirinhas. O espírito presente mira a vida de um sujeito sem esperanças, bastante pragmático e muito pobre. Ele tem a companhia do seu já citado filho, além de eventualmente falar com o estrangeiro Chaco e Baba, um sujeito que está sempre bêbado.

    As conversas envolvem problemas universais como a fome, desemprego e pessoas em situação de rua, com um humor ácido e bastante político. A maioria delas é bem espirituosa, toca em feridas, critica principalmente as pessoas mais abastadas e o modo com a burguesia lida com as pessoas em situação de rua e/ou mendicância.

    Rango hoje pode ser considerado como uma obra que trata de questões óbvias, mas em sua época, 1974, não era. Sobram criticas ao capitalismo, concentração de renda, busca por lucro acima de tudo, industrialização e mostra como armas dos pobres a esperança das crianças, o cinismo dos pais e até a bebedeira para ludibriar a fome.

    Em algumas tiras não há como ficar incólume, há uma de cortar o coração, em que o menino diz que raspou o prato, quando está sentado em cima de uma lixeira vazia. Embora a publicação não seja exatamente engraçada, afinal trata de situações bem pesadas, Rango tem muito peso, e aborda uma época do Brasil que se imaginava superada ao menos em grandes cidades, e se torna ainda mais grave por retratar uma realidade que em confins do país ainda se alastra e que também voltou a ser flagrante em metrópoles como Rio de Janeiro, São Paulo e outras grande cidades, piorada a situação ainda mais em épocas de pandemia.

  • Crítica | O Tempo e o Vento

    Crítica | O Tempo e o Vento

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    Esta não é a primeira adaptação da obra do escritor Érico Veríssimo. Em 1967, O Tempo e o Vento foi levado para a televisão em formato de novela, dirigido por Dionísio de Azevedo e dividido em três partes. Novamente, em 1985, a TV Globo criou a bela minissérie dirigida por Paulo José, em que trazia Tarcísio Meira como Capitão Rodrigo e Glória Pires como Ana Terra. Apenas em 2013, a obra de Veríssimo ganhou uma nova adaptação, dessa vez para os cinemas e com direção de Jayme Monjardim.

    O longa dá início com o belo trabalho de fotografia de Affonso Beato, explorando as paisagens dos pampas gaúchos em um pôr-do-sol esmaecido. Mostra-se a chegada do Capitão Rodrigo (Thiago Lacerda) até a casa da família dos Terra Cambará para encontrar-se com a já centenária Bibiana (Fernanda Montenegro), em meio ao cerco de sua casa pela família Amaral, inimiga declarada dos Terra Cambará.

    Adaptar uma obra como O Tempo e o Vento para os cinemas não é tarefa fácil. A série literária de Veríssimo conta a história de gerações de famílias marcadas por romances e guerras no Rio Grande do Sul. Condensar tudo isso em apenas duas horas de exibição, sem parecer superficial, exigiria uma habilidade que Monjardim deixou a desejar.

    A trama envolvendo a família Terra Cambará é narrada por Bibiana Terra, apresentando toda a história de formação de um período do Brasil. Primeiramente, acompanharemos a história de amor de Ana Terra (Cléo Pires) e o índio Pedro Missioneiro (em uma bela interpretação de Martín Rodriguez). Logo após, Bibiana relembra seu romance com o Capitão Rodrigo Cambará. A narrativa de Bibiana relembra aproximadamente 150 anos de história de amores, capazes de resistir às guerras e grandes tragédias.

    Dito isso, fica mais claro entender a proposta de Monjardim. Contudo, isso não torna mais fácil aceitar algumas de suas escolhas. Sua adaptação busca um tom novelesco, até mesmo burocrático, e seu olhar é voltado apenas para o romance entre os protagonistas. Não espere encontrar muito contexto histórico e político, que é apenas pincelado. Utilizada em segundo plano, a conjuntura da época só aparece como justificativa de que não foi esquecida.

    Castelhanos, Farrapos e Guerra do Paraguai são temas apenas mencionados, dando-se pouca explicação ao que estava acontecendo e sobre o que aquelas batalhas se tratavam. Tudo isso acaba com um gosto ruim na boca. Monjardim parece carecer de objetividade narrativa. Se seu desejo era fundamentar sua obra através de uma trama romântica, deveria ter focado nisso desde o início, colocando alicerces ao longo da história de amor entre Rodrigo e Bibiana e deixando o restante em segundo plano. Contudo, ao abrir a lente filmando um épico, a dimensão de sua obra se esvai em uma narrativa superficial.

    Ainda assim, O Tempo e o Vento está longe de ser um filme ruim; o universo recriado por Monjardim tem personalidade própria. O conceito de que tudo que Deus tira para dar novamente é muito bem explorado ao longo da trama, tempo cíclico a que Veríssimo idealizou em sua obra. O personagem de Rodrigo, muito bem interpretado por Lacerda, esbanja carisma e utiliza muito bem os olhares para demonstrar suas emoções, assim como Fernanda Montenegro, como de costume, se entrega ao papel da velha senhora Bibiana. Difícil não se emocionar com a cena inicial em que Lacerda, com suavidade, carrega Montenegro no colo levando-a até a janela.

    O Tempo e o Vento tem escolhas de roteiro que dificilmente passarão batidas, mas ainda assim é um belo material. A obra de Monjardim ganhou uma versão televisiva em formato de minissérie para a TV Globo, mas resta saber se os problemas narrativos do filme não sejam repetidos na versão para a televisão, não interferindo, assim, na qualidade da obra.

    “Uma geração vai, e outra geração vem; porém a terra para sempre permanece. E nasce o sol, e põe-se o sol, e volta ao seu lugar donde nasceu. O vento vai para o sul, e faz seu giro para o norte; continuamente vai girando o vento, e volta fazendo seus circuitos.”