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  • Resenha | Deadpool Clássico – Volume Um

    Resenha | Deadpool Clássico – Volume Um

    Deadpool - Classico - Volume 1

    Após uma parca apresentação no número 98 da revista Novos Mutantes, ainda como vilão e escrito por seus criadores Rob Liefeld e Fabian Nicieza, o Volume Um da revista de Deadpool Clássico, lançado pela Panini Comics, originalmente publica as quatro edições iniciais da personagem, com o arco Perseguição Circular , escrito por seu autor Nicieza e desenhado por Joe Madureira, além de sua primeira aparição. Nesta versão, o caçador de recompensas já é bem mais piadista do que no episódio em que Tolliver o contratou para assassinar Nathan Summers (o mutante Cable, do futuro) nesta primeira aparição, pondo em prática a característica diferencial do personagem.

    O mote da aventura é a recompensa posta sob a cabeça do mercenário, causada por seus trabalhos antigos para Tolliver, maldição que persiste em cruzar seu caminho após a morte do antigo bandido, que parece ter citado o nome do protagonista da história em uma espécie de testamento.

    O cunho da história é extremamente jocoso, repleto de piadas bobas e de cenas massa veio; com as mesmas ombreiras, dentes cerrados e bolsos infinitos comuns a uma época em que o estilo Image era o norte para a indústria. Existe toda uma conspiração dentro do argumento, ainda que seja bastante fraca e forçada, envolvendo outro caçador chamado Slayback e pessoas do passado de Wade Wilson em apuros mortais. Visando aumentar a popularidade do personagem em sua história solo, Deadpool encara, logo de início, os vilões Fanático e Black Tom (este último recém retornado do limbo de vilões secundários). Ambos têm os X-Men como inimigos, além de protagonizarem um bromance na narrativa.

    Madureira consegue desafiar os bons moldes de desenho a um modo muito semelhante ao de Liefeld, enquadrando a anatomia de Cain Marko de um modo impraticável em um mundo real. O texto também não ajuda, com uma intensa entrada e saída de personagens genéricos, que serve unicamente para fortificar a ideia de que Slayback é um sujeito mal e cruel, sem mostrar qualquer ação realmente violenta até a última revista do encadernado.

    Falta muito para Perseguição Circular ser uma história minimamente interessante, já que nem mesmo a violência exacerbada se destaca como elemento diferencial. O romance presente na publicação não engrena, tampouco as piadas funcionam muito além do tempo presente em 1993. É natural notar a popularidade de Deadpool por sua época de lançamento, mas com um início tão pífio, é curioso analisar o crescimento de toda a lenda em volta do personagem, ao ponto de ser um medalhão da editora a partir dessa pequena história descompromissada, boba e bastante fútil.

    Deadpool Perseguição Circular 3

    Após um ano de lançamento desta história, o mercenário tagarela Deadpool retornaria a uma revista mensal em regime de mini-série. Em Pecados do Passado tem início a partir do resgate de Fanático ao seu amigo Tom Cassidy. Logo após o prelúdio, Wade Wilson é mostrado em um bar, coberto por fachas no rosto, tirando-as para mostrar as chagas de seu tratamento, grafadas pelo ótimo traço de Ian Churchill. O tom da história inicia-se mais sombrio que o habitual, certamente graças a Mark Waid e seus repertório mais gabaritado que os comuns escritores do personagem.

    Nesse começo, o texto consegue equilibrar bem a melancolia causada pela deformação do personagem, com o tom humorístico, justificando este ao exibi-lo como válvula de escape para a frustração de ter perdido suas qualidades estéticas. As participações de Banshee e Siryn são tratadas de uma maneira bem diferente das inserções de coadjuvantes em Perseguição Circular, o que garante um bocado mais de sentido na história.

    A segunda edição desta aventura tem lápis dividido entre Churchill e Lee Weeks. A mudança da arte traz a revista um tom levemente mais sóbrio, flertando até com o noir, especialmente nos quadros em que Deadpool não aparece. Waid consegue garantir ao personagem um interesse maior do que o simples consumo por conteúdo infanto juvenil, equilibrando a faceta rancorosa de Wilson com seu lado jocoso.

    O agravo da condição de saúde de Cassidy une de maneira íntima o seu destino ao do anti-herói, utilizando o fator de cura implantado pelo Arma X como elemento de perseguição a si. A solução encontrada, de costurar a mão decepada de Deadpool a Tom soa risível aos olhos dos leitores atuais, e era cabível dentro da estética de absurdos presentes nesta década. A fuga do escopo massaveístico é bastante rápida, e não compreende uma mudança de caráter real.

    O desfecho deste volume é bastante infantil, principalmente comparado ao início um pouco sombrio. A ação é repleta de uma poluição visual desnecessária, que deixa o leitor confuso diante de tantas onomatopeias e acontecimentos periféricos. Mesmo a demonstração de seu rosto deformado para Siryn soa um pouco bobo, mesmo ao denotar o trauma do protagonista. Wilson termina o arco aceitando sua condição estética, ainda que tenha em seu íntimo a tentativa de descobrir alguma reversão para sua condição. As últimas páginas tratam de elocubrar um gancho para possíveis continuações, mas nada que faça retornar o encadernado aos bons momentos que tinha lá em seus momentos iniciais. A leitura de Deadpool Clássico Volume Um ao menos garante um retorno a uma fase bem específica do exploitation de ultra violência típica dos anos noventa, tendo em ambas histórias uma demonstração bastante fiel de uma época, em especial nos defeitos apresentados.

  • Crítica | Deadpool

    Crítica | Deadpool

    Desde que foi anunciado, em 2014, o filme solo do controverso e falastrão Deadpool, os fãs de quadrinhos ficaram com sentimentos divididos. Se por um lado Ryan Reynolds já tinha interpretado o papel de forma ridícula no desastroso X-Men Origens: Wolverine, por outro os spots, imagens e depois trailers trouxeram um certo alívio ao mostrar que as origens do personagem seriam respeitadas. Mais do que isso: o filme parecia ser bom.

    Deadpool é um personagem criado nos anos 90 por Rob Liefeld (citado no filme) e Fabian Niciesa. Apesar de ter surgido como paródia do vilão da DC Exterminador, Wade Wilson logo ganhou uma personalidade própria, com um humor ácido e extremamente irônico, incapaz de levar qualquer situação a sério. Esse fato, e também o de ser mentalmente instável, o fez participar dos mais variados grupos de heróis dos quadrinhos da Marvel, mas também incapaz de permanecer lá. Esse fato torna sua trajetória nas HQ’s um tanto quanto errática.

    Nas telonas, o filme dirigido pelo novado Tim Miller mantém todas as características do personagem, o que irá agradar à maior parte dos fãs de filmes baseados em super-heróis, que começaram nos últimos anos a dar sinais de desgaste. Com baixo orçamento em comparação aos filmes do mesmo tipo, Deadpool se foca quase exclusivamente no protagonista, e Reynolds felizmente consegue carregá-lo inteiramente de forma competente. Ciente de suas limitações, sente-se bem à vontade no papel do personagem que satiriza tudo e todos à sua volta, os quais servem como escada para seu incessante repertório de piadas.

    Wade Wilson no filme é algo próximo de um “mercenário do bem”, que aceita pequenos serviços de pessoas comuns (geralmente não muito dentro da lei) em troca de pagamento. Em uma das noites em que passa no bar (que também funciona como o balcão de agendamentos de seus serviços) conhece Vanessa (Morena Baccarin), e a partir dali a vida de ambos muda para sempre. Porém, ele descobre que tem câncer terminal e tem pouco tempo de vida. Desiludido, recebe uma proposta de um misterioso homem prometendo curar seu câncer e lhe dar habilidades especiais. Wilson deixa Vanessa com pesar e se submete ao processo, que se mostra totalmente diferente do que havia imaginado, com sessões de tortura cujo objetivo era ativar um gene mutante nas cobaias e transformá-las em super soldados, tudo conduzido Por Ajax (Ed Skrein) e Angel (Gina Carano). Tal processo deforma Wilson fisicamente. Ao conseguir fugir, promete vingança e dedica sua vida a encontrar Ajax e fazê-lo reverter o processo que o deixou assim.

    Tudo isso é explicado ao espectador através de flashbacks que vêm e vão no início do filme enquanto Deadpool tenta capturar Ajax após uma implacável perseguição, que termina com a participação de outros X-Men, Colossus (Greg LaSalle / Stefan Kapicic) e Negasonic Teenage Warhead (Brianna Hildebrand), que buscam capturá-lo e tentar conscientizá-lo de que suas ações são irresponsáveis. Colossus inclusive garante uma ótima participação como o grandalhão forte, ingênuo e de bom coração em contraste com o escrachado Deadpool. Em alguns momentos sua ingenuidade chega até a lembrar Drex, de Guardiões da Galáxia. Sua luta com a personagem de Gina Carano também é um ponto alto do filme, inclusive mais interessante que o próprio combate entre Deadpool e Ajax, que, por não ser um vilão com muita profundidade, não deixa o espectador investido emocionalmente em seu destino. A grandiosidade um pouco desnecessária dessa batalha final também não ajuda, a não ser em criar um espetáculo visual que destoa da simplicidade do filme. Afinal, destruir tanta coisa assim é coisa dos Vingadores.

    Deadpool se encaixa bem nos tempos atuais, onde a seriedade sombria dos heróis da DC/Warner se contrasta com a linguagem divertida e engraçadinha dos heróis da Marvel. Neste contexto, ele chega justamente para tirar sarro de todos esses filmes e seus clichês, por isso funciona muito bem. As piadas com as escolhas do ator no passado, tanto de sua interpretação anterior do mesmo personagem quanto com o seu Lanterna Verde em 2011, são explícitas e tiram risadas do espectador antenado na cultura pop. As referências também passam pelos filmes do X-Men, de ambas as linhas do tempo, e de vários outros heróis, filmes e personagens icônicos da atualidade. Tantas referências acabam deixando o filme com um certo gosto enjoativo da preguiçosa série The Big Bang Theory, cujo roteiro inexistente é compensado justamente pela devoção dos fãs às referências ao que eles já conhecem. A sorte é que Deadpool ao menos tem uma história a ser contada e não se deixa levar por essa fácil saída.

    Mas é justamente em seu ponto forte reside um pequeno porém. O humor do protagonista funciona, mas é cômodo e em momento algum arrisca. As piadas sempre possuem o mesmo pano de fundo sem desafiar o espectador. Isso não é um problema em si, mas um filme que quer se destacar pela violência em si, poderia se arriscar mais neste quesito, tendo no roteiro um pouco mais de coragem. Alguém também poderia criticar avanços temporais, onde Wilson aprende sozinho a fazer uniformes e a conduzir investigações minuciosas sobre figuras grandes do submundo do crime, aparentemente do dia pra noite, mas por se tratar de uma adaptação totalmente fiel aos quadrinhos, e por ao mesmo tempo homenagear e satirizar esta mídia, essas sequências acabam integrando justamente o imaginário coletivo de tantos filmes de origem que já vimos com os mesmos clichês.

    Ao quebrar toda hora a “quarta parede” e conversar com o espectador da mesma forma que fazia nos quadrinhos (e ao mesmo tempo em que diz que faz isso), Deadpool subverte não só os padrões estéticos da onda recente dos filmes de herói da Marvel e DC, como também padrões narrativos. Ele nos lembra a todo instante que super-heróis são bregas, ultrapassados e infantis. E tudo bem ser assim.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Resenha | Cable: Sangue e Metal

    Resenha | Cable: Sangue e Metal

    Cable - Sangue e Metal

    Anos 90, o auge da Rob Liefeldização dos quadrinhos. Antes da Image, antes da era da escrotidão reinar, o “Jack Kirby” que a modernidade merece traria à luz um mutante sem poderes, cuja habilidade incluía a capacidade de mastigar (e viver) com pelo menos 68 dentes por arcada, ombreiras gigantes e claro, bolsos ad eternum. Cable, o líder da reformulada equipe X-Force, antes denominada Novos Mutantes, ganhou notoriedade e fama, obviamente merecida graças aos seus préstimos. No ano de 1996, data de publicação da aventura solo do filho de Ciclope, o portentoso criador ainda estava na editora número 3, cabendo a tarefa de trazer à tona Sangue e Metal pelo texto de Fabián Nicieza e lápis de contestado (ainda não estrelado) John Romita Júnior. A estética empregada na aventura não poderia ser mais filha do meio: todo o registro visual era tirado do clichê noventista, o que por si só já justifica 90% dos erros na arte.

    O argentino Fabián Nicieza já trabalhava na Marvel desde o final dos anos 1980, escrevendo para os títulos dos Novos Guerreiros (vindo a trabalhar com o futuro artista de Transmetropolitan, Darick Robertson), Deadpool (a segunda criação mais famosa do “Mestre”) e a ótima As Aventuras de Capitão América, resgatando o ideário do personagem com temática diretamente relacionada ao início da década de 40. JRJR por sua vez já estava mais cascudo, após trabalhos em Amazing Spiderman, no Demolidor (pelo qual ganhou um prêmio Eisner) até atuando ao lado de Frank Miller e claro, já desenhara um arco maravilhosamente ilustrado do Homem de Ferro, mas o seu currículo não foi o suficiente para que ele não fosse obrigado a enquadrar seu lápis a praxe da época. A arte lembra muito a de Justiça Extrema e Youngblood, era Marvel tentando angariar seu público perdido imitando os artistas que perdera para a cooperativa Image.

    O mutante grisalho é, aparentemente, o líder de uma força tarefa que intervém numa questão de imbróglio no Irã, envolvendo mais uma vez a questão intervencionista americana, contendo no texto um discurso bastante pró-capitalismo. A missão na verdade seria a de parar um grupo chamado Frente de Libertação Mutante, de cunho terrorista. O engraçado é que a Frente é formada por personagens muito distintos entre si, alguns levando até estereótipos nacionais, como o sino-adiposo Sumô. O contraste entre eles e o grupo de heróis é notório, especialmente porque fora Dominó, os capangas de Cable parecem versões menos portentosas suas, não há variação nem de design e poderio armamentista, e há pouco quanto a personalidade dos personagens.

    As cores de Brad Vancata pontua alguns dos bons momentos de Romitinha, o uso da colorização digital era uma novidade na época, mas em alguns pontos ela peca horrorosamente, dando a obra um ar genérico, semelhante visualmente a Stormwatch, que Jim Lee iniciara alguns anos antes.

    O grupelho, antes chamado de Comando Selvagem muda de alcunha, para o revolucionário nome de Matilha, e prossegue fazendo justiça com seus enormes trabucos e bombinhas de fumaça. Não há aprofundamento dos personagens, até porque essa não é a ideia da mini-série. Os vilões, Conflyto e Holograma além de não representarem qualquer perigo aos protagonistas, carecem de carisma e substância.

    O segundo número vem com a tag de A Maior Batalha de Cable que evidencia algo estranho, talvez uma arrogância que não condiz com o nível da revista ou a baixa expectativa em relação às histórias do telepata grisalho. A Matilha é como uma equipe da Shield, mas de baixo escalão. O combate final é fraco e anti-climático demais e é condizente com o resto da obra. O grande problema da história é mesmo o cunho de propaganda enganosa, pois a maior batalha de um personagem deveria ter ao menos um bocadinho de ousadia, e a história de Nicieza não o tem, é igual a tudo o que já fora feito para o herdeiro bastardo dos Summers, portanto é extremamente dispensável.