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  • Crítica | Elvis & Nixon

    Crítica | Elvis & Nixon

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    A história por vezes nos traz, além dos grandes acontecimentos, pequenos eventos que se não serviram para mudar muita coisa, ao menos nos deixarão pistas para compreender melhor uma época e um sentimento. É mais ou menos neste contexto da micro história que o novo filme da diretora Liza Johnson, Elvis & Nixon trabalha. Com um tom claramente humorístico e uma narrativa simples, a história é leve e atraente, tamanho os absurdos envolvidos: Um presidente com a mentalidade em outra época resistindo ao encontro do maior ícone da música daquele tempo, mas que também mostrava dificuldades em entender os novos tempos.

    Em meio a revolução sexual, Woodstock, hippies, os Beatles de cabelos compridos, os Panteras Negras se organizando e Muhammad Ali recusando ir a guerra, Elvis era o símbolo do artista do bem, dos bons costumes e pró-EUA. Ao menos em sua cabeça. Seu plano era se reunir com Richard Nixon e obter uma credencial oficial de uma agencia governamental anti-drogas e ir disfarçado atrás de outros artistas, pois as drogas estariam corrompendo os jovens do país, e por isso eles estavam se revoltando.

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    Essa análise simplista é muito utilizada até hoje por muita gente, mas ganha um caráter cômico ao ser incorporada por Elvis Presley tamanha a sua inocência ao achar que, desta forma, iria contribuir para diminuir o uso de drogas no país (porém sua ex-esposa Priscilla Presley afirmou depois em uma biografia que o objetivo de Elvis com essa credencial era poder andar livremente com suas próprias drogas e armas de fogo).

    Michael Shannon entrega uma ótima performance como Elvis, com seus trejeitos absurdos e voz introspectiva, lutando para ser ao mesmo tempo o astro que todos queriam ser e se manter a criança inocente do interior do Tennessee. Seus companheiros Jerry (Alex Pettyfer) e Sonny (Johnny Knoxville) o ajudam na relação conturbada com o mundo exterior. Jerry aliás é uma figura interessante, pois ao mesmo tempo que gosta de Elvis, não quer mais ser escravo de seus caprichos, lutando ao mesmo tempo para manter Elvis e sua noiva felizes. Kevin Spacey como Nixon também está muito bem, mas Spacey na pele de um presidente soa mais como uma piada interna, referenciando-se ao seu icônico papel em House of Cards. Colin Hanks e Evan Peters como os assessores Krogh e Chapin (que mais tarde seriam implicados criminalmente no caso Watergate) também se mostram figuras interessantes, ao tentar associar a presidência a um ícone do rock. O que na época era extremamente ousado hoje viraria quase regra nas campanhas políticas.

    Porém, o maior mérito de Elvis & Nixon é justamente trabalhar na linha tênue do real e do absurdo que duas das maiores imagens da época se reunindo para tratar de quase nada. Duas figuras em seu auge de popularidade e poder, que alguns anos mais tarde iriam se ver em meio a um escândalo e morte acidental por drogas, como não é incomum dentre moralistas do tipo. Uma história que foi negada por muito tempo pela casa grande, hoje se tornou cult, tendo seu registro fotográfico como sendo o mais requisitado no Arquivo Nacional, virando broche, imã de geladeira, camiseta e tudo mais. É justamente ao tentar entender esse fenômeno de forma honesta que o filme acerta, afinal, os anos 1970 eram uma época louca que tudo estava mudando e muitos lutavam para tudo permanecer o mesmo. Ambos falharam em seu projeto, mas onde cada um falhou cabe somente a cada um de nós dizer.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | Amores Inversos

    Crítica | Amores Inversos

    O começo de Amores Inversos é agridoce, exibindo o cotidiano incomum de Johanna Parry (Kristen Wiig), cujo comportamento é bastante curioso, uma vez que ela parece ter algum tipo de anomalia mental, que a faz ter dificuldades em expressar sentimentos e até de se alimentar como um adulto “normal”. Logo, sua paciente, uma idosa, que mesmo ela não sabe a idade, falece, deixando a mulher sem um ofício, coisa que não ocorria há 15 anos, quando ela assumiu os cuidados da anciã.

    Após isso, Johanna consegue outro serviço, tornando-se doméstica de uma família em frangalhos, formada pelos remanescentes à morte da sua amada matriarca. Sobraram o avô Mr. McCauley (Nick Nolte), um senhor a que Parry sempre responde, e que é assustadoramente gentil com ela, a menina Sabitha (Hailee Steinfeld) e o viúvo e “doente” Ken (Guy Pearce) que tem um passado trôpego e relações conturbadíssimas com o sogro e com a própria filha.

    O comportamento pouco convencional de Johanna faz todos a verem com maus olhos, geralmente de modo excludente, inclusive por Sabitha e por sua amiga Edith (Sami Gayle), que resolvem brincar com os sentimentos da cuidadora, forjando um flerte por meio de cartas, usando o nomadismo de Ken e a comunicação escrita para praticar os seus atos maléficos.

    Johanna é subserviente em quase todas as relações em que se embrenha, mesmo as românticas, causadas pela ilusão pensada pelas cabeças maléficas juvenis. Seus primeiros atos são os de conserto e de reabilitação do lugar onde está alocada, para só então agir. No entanto, sua condição não a exime de sentir-se rejeitada ou usada.

    Edith é encarada como má até mesmo por seus amigos, por impingir medo em uma pessoa incapaz de revidar os impropérios que vem a sofrer. Sua atitude covarde é também um mecanismo de defesa, uma vez que seu complexo de inferioridade é latente, motivado por sua condição financeira não ser abastada, o que no high school seria uma afronta das mais graves, condição o suficiente para ser excluída, ainda que isso não se prove num primeiro momento. O ato parece mais uma dissimulação, onde a adolescente usa a coitadice como muleta para praticar seus atos mesquinhos.

    Aos poucos a reunião entre Ken e a protagonista ganha contornos reais, como se a afeição fosse mais fácil entre dois páreas que buscam saciar a aflição de suas almas, cada um ao seu modo e estilo. O casal acabou íntimo por vias tortas, uma vez que pelos emails e cartas ela soube dos podres dele. O retorno dos reprimidos ao seio familiar é complicado para Sabitha e constrangedor em inúmeras instâncias, mas que, chegando ao seu desfecho, torna-se para a moça algo muito próximo do que seria uma vida doméstica normativa, muito aproximado graças ao empreendimento comercial de seu pai.

    Logo, o quadro evolui, mas não sem pisar em ovos e em desagrados. Saber de todas as facetas de seu par, mesmo as aparentemente desagradáveis, fazem-na ter subsídios o suficiente para cobrar dele uma atitude mais enérgica na sua reabilitação e no abandono do seu vício. Para analisar melhor a obra de Liza Johnson é preciso refletir, como quando se dá um passo atrás no momento em que se contempla algumas pinturas, para contemplar a real evolução da trajetória mostrada no ecrã cinematográfico, cujo limite da completude de espírito é analisada e mostrada sob um viés atípico.