Tag: Hailee Steinfeld

  • Review | Gavião Arqueiro

    Review | Gavião Arqueiro

    A série do Gavião Arqueiro, personagem criado por Stan Lee e Don Heck, lida com muitos assuntos: as repercussões de Vingadores: Ultimato, a morte da Viúva Negra, a culpa de Clint Barton em sua fase como Ronin e o treinamento de sua pupila. Por mais que o seriado de Jonathan Igla não seja tão audacioso em seu roteiro, acaba se perdendo em meio a todos esses objetivos.

    De positivo, há o bom ingresso da personagem Kate Bishop, interpretada por Hailee Steinfeld, que faz um bom dueto com Jeremy Renner. Sua personagem tem um passado ligado ao heroísmo do personagem-título, e remonta aos Vingadores de Joss Wheddon, e sua motivação é bem desenvolvida — ainda que apressada —, mas os aspectos de qualidade param por aí.

    Antes da pandemia, quando estavam em produção Wandavision, Falcão e o Soldado Invernal e Loki, havia a promessa por parte de Kevin Feige de que as produções anteriores, comandadas por Jeph Loeb seriam esquecidas, contando aí a subestimada Agentes da SHIELD, como também Demolidor, Jessica Jones, Inumanos, etc. Ainda não se sabe se esse trato foi descumprido, ainda mais após o advento de Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa e tudo que o filme trouxe em participações e outras consequências, mas o desenrolar da série abre uma possibilidade mínima de que, ao menos em parte, as outras produções podem alguma influência.

    O drama da série é urbano, mostrando a violência das grandes cidades. Como já se deu em outras séries de heróis urbanos envolvendo a parceria Marvel e Netlix. Além disso, o seriado brinca com os clichês de Nova York, arrumando espaço até para um número musical da Broadway, em um dos momentos mais inspirados em termos de humor na série.

    Outro bom ponto é o drama de Clint, visto no desenrolar das desavenças do procedimento do Ronin, mas a busca frenética prometida na gênese é interrompida para dar vazão a uma enrolação e plots de vingança um pouco redundantes, além de não gerar interesse no espectador.

    Mesmo tendo só seis episódios há muita enrolação, e nem mesmo participações de personagens como o  Espadachim (Tony Dalton) e Yelena Belova (Florence Pugh) salvam a trama. Há um problema claro de ritmo. Metade da temporada é absolutamente parada, não se desenvolve quase nada, no máximo se apresentam easter eggs de personagens cuja aparição deveria ser bem guardada. É muito pouco.

    Gavião Arqueiro não tem uma segunda temporada garantida, embora seus diretores tenham mostrado entusiasmo para um possível retorno. Fora a interação, ao estilo Máquina Mortífera, entre os protagonistas, não há com o que se empolgar. Fica a expectativa de que a série consiga trazer o roteiro de uma segunda temporada que faça jus a construção visual apresentada nessa temporada inicial, visto que o texto está abaixo da mediocridade típica das séries de heróis de quadrinhos recente, tanto em versões da Marvel quanto de suas concorrentes.

     

  • Crítica | Bumblebee

    Crítica | Bumblebee

    Bumblebee tem surpreendido em suas primeiras exibições com elogios da crítica e público que afirmam se tratar de um filme divertido, com bom ritmo e despretensioso, ao contrário de toda a franquia Transformers, de Michael Bay. Além disso, o longa ainda resgata a simplicidade dos primeiros desenhos, baseados nos brinquedos da Hasbro, que faziam a alegria da criançada nos anos oitenta. O filme de Travis Knight consegue estabelecer uma conexão com seu espectador que não se via desde o primeiro filme da franquia, e em muitos pontos ele o supera.

    O começo do longa mostra a guerra em Cibertron, com os Autobots servindo como resistência aos Decepticons, os mesmos vilões de sempre, que nessa versão canibalizam o planeta, de certa forma. Não há um mergulho nessa trama, e isso é ótimo, pois pode investir emoção em outros momentos. É estabelecido que B-127 (dublado por Dylan O’Brien), um robô de aspecto semelhante a uma abelha iria até a Terra e permaneceria incógnito até os outros heróis se juntarem a ele. Ao chegar ao planeta, ele se depara com alguns militares humanos, entre ele o Agente Burns (John Cena, que estás surpreendentemente bem no filme), além de enfrentar um decepticon que o perseguiu. Nessa luta, é respondido um detalhe importante da biografia do personagem.

    Nesse epílogo já se nota uma bela diferença em relação a impessoalidade dos outros filmes, há perdas humanas, se vê quem morre, e esse é um belo acerto do roteiro de Christina Hodson. Mas esse quadro evolui quando é introduzida a personagem Charlie Watson (Hailee Steinfeld), uma adolescente impopular, e que tem ainda de lidar com a perda de seu pai.

    A menina possui um interesse em mecânica automotiva, já que é algo que a aproxima da memória de seu velho pai. Com o tempo, ela decide comprar um fusca encostado no ferro velho, sem saber que se tratava de B-127. A forma como os dois personagens começam a interagir é muito terna e bem construída, o robô que ganharia dela a alcunha de Bumblebee está traumatizado, não consegue falar e nem entrar em modo de combate, e ela trata o alienígena como um novo amigo, jogando no nessa relação uma carga emocional de compensação pela perda que teve. Toda essa dramaticidade é muito bem explorada, não há grandes exageros melodramáticos, ao contrário, tudo é bem construído, mesmo os típicos percalços soam bem escritos e executados.

    O fator que mais pesa a favor do spin off/prequel em comparação aos outros capítulos da franquia é a questão das personalidades, o filme bem como os personagens são carregados de sentimentos, e possuem alma ao contrário do restante da cine saga. Steinfeld consegue trazer um carisma aos personagens humanos que não se via em Shia Labeouf, por exemplo, muito menos em Mark Wahlberg apesar de ambos serem atores com bons momentos no cinema. A menina que já havia surpreendido em Quase 18 prossegue fazendo um bom papel aqui, e seus problemas sérios de aceitação conversam com os de Bumblebee e fazem sentido exatamente por se tratar de dois personagens flagelados e à margem. Além disso, o fato de durar menos de duas horas e ter um bom ritmo favorece demais ao longa na comparação com os longas de Bay, se isso não fosse o bastante, o fato dele pouco se levar a sério colabora ainda mais para o filme – o modo com alguns humanos são desintegrados, como gosma transparente é engraçado e tira o peso do acontecimento.

    Os personagens humanos periféricos tem cada um seu momento de desenvolvimento e vestir a máscara do protagonismo, mas nada exagerado. O design dos autobots é mais quadrado, remetendo a um fator nostálgico e funcional, pois o design ultra futurista tornava os Transformers em guerreiros super poderosos meio genéricos e artificiais demais e a graça do anime e cartoon era que eles parecessem brinquedos – afinal, é uma cinessérie da Hasbro.

    Apesar de claramente haver um declínio na historia quando deixa de lado os homens e mulheres de Brighton Falls para focar no núcleo militar, o final consegue acertar essas duas questões em uma amálgama com cenas de ação bem divertidas e uma luta emocionante, além de também mostrar didaticamente o quão boba era a mentalidade paranoica da Guerra Fria, e o quanto os Estados Unidos podia agir de maneira irracional diante da possibilidade de ter vantagens em um conflito. Bumblebee é carismático, divertido e certeiro, simples em sua fórmula e emocional quando necessário.

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  • Crítica | Mesmo Se Nada Der Certo

    Crítica | Mesmo Se Nada Der Certo

    Poster Mesmo se Nada Der Certo

    O produtor musical Dan Mulling (Mark Ruffalo) era tão ocupado que precisa utilizar qualquer tempo livre que tem para ouvir os aspirantes a cantor que aparecem para ele. Mesmo quando preso no trânsito, ele passa um bom tempo escutando os pretensiosos artistas. Retirado de uma sucessão de clichê de comédia romântica, o estereótipo tem seu ápice no homem confuso, sem identidade, que ainda não achou o amor verdadeiro, e até sua vida familiar é bagunçada. O protagonista chega ao fundo do poço ao se deparar com a demissão da produtora musical que fundou.

    A cidade de Nova York constitui o cenário perfeito para o alvorecer de uma estrela, e é em meio a um bar pé-sujo no subsolo que Dan se depara com algo subvalorizado pelo público presente, mas que lhe acende a criatividade e um bocado do prazer. Para (não) surpresa do público, a figura que encanta o desolado homem é a bela Gretta (Keira Knightley), uma cantora resignada, que somente faz composições, apesar de ter uma bela voz. O motivo do asco pela fama é justificado pela atribulada intimidade dela como cônjuge e compositora anônima de Dave Kohl (Adam Levine). O namorado faz um sucesso enorme, mas esconde a real autoria de suas canções, muito pela timidez de Gretta, mas também por uma canalhice, que se provaria maior pelo motivo que o faz romper a relação.

    Juntos, os pares desordenados começam a planejar uma nova empreitada musical, com músicos que aparecem repentinamente para colaborar de graça com a produção da fita demo, todos inspiradíssimos, como se algo cósmico estivesse prestes a ocorrer. A harmonia com que o clipe é conduzido é de fazer inveja a qualquer musicista profissional. Até os percalços das locações externas onde a fita é gravada colaboram para a perfeita feitoria da canção, convenientemente.

    O “casal” torna-se tão perfeito em suas ações que Gretta consegue conquistar a afeição da filha dele, Violet (Hailee Steinfeld), sendo uma conselheira amorosa, dando um banho de loja na garota e descobrindo um talento musical que fugia aos olhos do pai. O estado de perfeição só é quebrado após ambos comentarem como suas relações acabaram, entrando em um novo nível de intimidade, onde máscaras de hipocrisia não poderiam mais prevalecer. A conversa a partir daí evolui para uma amizade de apoio mútuo, com potencial para se tornar algo mais.

    O par se conheceu no pior momento de suas vidas, onde a aflição imperava. Seria uma comédia repleta de bordões e banalidade, não fosse a mola central da engrenagem. O modo como a musicidade é percorrido pelo roteiro faz todas as repetições terem um sentido maior do que o normal, com significado e profundidade acima das baboseiras pré-fabricadas e de cunho publicitário. A condução delicada de John Carney faz tudo isso soar naturalmente.

    Mesmo as cenas irreais ganham uma aura de fantasia graças ao místico da música. As paragens, que normalmente seriam barulhentas ao extremo, prostram a melodia presente na alma de Gretta, funcionando de modo despretensioso, como uma comédia chapa branca, mas sincera em cada acorde. Nenhuma interferência externa, fora os personagens centrais, os músicos e seu entorno, consegue subsistir ante a magia musical da banda quando está em forma.

    Mesmo Se Nada Der Certo é um filme sobre essência, que apesar de apegar a fórmulas tem em sua mensagem a fuga da formatação, tanto das músicas quanto do cotidiano. O ineditismo está intrinsecamente ligado à obsessão de Gretta e Dan, e é por isso que as vidas de ambos eram tão miseráveis antes. Soterrados pelo tédio, eram incapazes de usufruir dos momentos simples e felizes de suas vidas. Mesmo diante de uma saída fácil, em que poderia reunir os dois com um romântico par, Carney prefere mostrar a evolução de pensamento, tanto de Gretta quanto de Dan, com frieza de espírito suficiente para decidirem suas vidas de modo calmo e correto, costurando um desfecho plausível com toda a duração do drama e de modo extremamente positivo.

  • Crítica | Amores Inversos

    Crítica | Amores Inversos

    O começo de Amores Inversos é agridoce, exibindo o cotidiano incomum de Johanna Parry (Kristen Wiig), cujo comportamento é bastante curioso, uma vez que ela parece ter algum tipo de anomalia mental, que a faz ter dificuldades em expressar sentimentos e até de se alimentar como um adulto “normal”. Logo, sua paciente, uma idosa, que mesmo ela não sabe a idade, falece, deixando a mulher sem um ofício, coisa que não ocorria há 15 anos, quando ela assumiu os cuidados da anciã.

    Após isso, Johanna consegue outro serviço, tornando-se doméstica de uma família em frangalhos, formada pelos remanescentes à morte da sua amada matriarca. Sobraram o avô Mr. McCauley (Nick Nolte), um senhor a que Parry sempre responde, e que é assustadoramente gentil com ela, a menina Sabitha (Hailee Steinfeld) e o viúvo e “doente” Ken (Guy Pearce) que tem um passado trôpego e relações conturbadíssimas com o sogro e com a própria filha.

    O comportamento pouco convencional de Johanna faz todos a verem com maus olhos, geralmente de modo excludente, inclusive por Sabitha e por sua amiga Edith (Sami Gayle), que resolvem brincar com os sentimentos da cuidadora, forjando um flerte por meio de cartas, usando o nomadismo de Ken e a comunicação escrita para praticar os seus atos maléficos.

    Johanna é subserviente em quase todas as relações em que se embrenha, mesmo as românticas, causadas pela ilusão pensada pelas cabeças maléficas juvenis. Seus primeiros atos são os de conserto e de reabilitação do lugar onde está alocada, para só então agir. No entanto, sua condição não a exime de sentir-se rejeitada ou usada.

    Edith é encarada como má até mesmo por seus amigos, por impingir medo em uma pessoa incapaz de revidar os impropérios que vem a sofrer. Sua atitude covarde é também um mecanismo de defesa, uma vez que seu complexo de inferioridade é latente, motivado por sua condição financeira não ser abastada, o que no high school seria uma afronta das mais graves, condição o suficiente para ser excluída, ainda que isso não se prove num primeiro momento. O ato parece mais uma dissimulação, onde a adolescente usa a coitadice como muleta para praticar seus atos mesquinhos.

    Aos poucos a reunião entre Ken e a protagonista ganha contornos reais, como se a afeição fosse mais fácil entre dois páreas que buscam saciar a aflição de suas almas, cada um ao seu modo e estilo. O casal acabou íntimo por vias tortas, uma vez que pelos emails e cartas ela soube dos podres dele. O retorno dos reprimidos ao seio familiar é complicado para Sabitha e constrangedor em inúmeras instâncias, mas que, chegando ao seu desfecho, torna-se para a moça algo muito próximo do que seria uma vida doméstica normativa, muito aproximado graças ao empreendimento comercial de seu pai.

    Logo, o quadro evolui, mas não sem pisar em ovos e em desagrados. Saber de todas as facetas de seu par, mesmo as aparentemente desagradáveis, fazem-na ter subsídios o suficiente para cobrar dele uma atitude mais enérgica na sua reabilitação e no abandono do seu vício. Para analisar melhor a obra de Liza Johnson é preciso refletir, como quando se dá um passo atrás no momento em que se contempla algumas pinturas, para contemplar a real evolução da trajetória mostrada no ecrã cinematográfico, cujo limite da completude de espírito é analisada e mostrada sob um viés atípico.

  • Crítica | 3 Dias Para Matar

    Crítica | 3 Dias Para Matar

    3 Dias Para Matar

    Sem qualquer introdução ou preambulo, o filme começa anunciando designações de assassinato a Wolfgang Braun (Richard Sammel), um fugitivo alemão que já dá mostras do porquê de estarem em seu encalço, uma vez que ele tentar apagar logo no início o senhor Ethan Renner (Kevin Costner), um agente veterano, mas que ainda apronta peripécias mil, apesar de aparentar uma saúde debilitada. Seus inimigos se aproximam dele, e praticam atos dos mais cruéis com os seus aliados. Não há muita preocupação em disfarçar a ação desenfreada, como às vezes acontecia nos filmes de super espião, na verdade a toada de 3 Dias Para Matar é muito semelhante a Guerra é Guerra, filme anterior de MCG, onde a predominância era no exagero caricato, já que este era um pastiche assumido.

    A trajetória de Renner envolve uma lembrança desagradável, a de ser um pai ausente, sua preocupação maior é conseguir reatar relações com sua filha, incógnita no início da fita. Após o atentado a sua vida, ele resolve se refugiar em um dos seus antigos imóveis, na França, que foi empossado por Jules e sua família de malinenses. Apesar de não gostar da ideia, Ethan se compadece e permite a presença deles na casa, o que mostra que ele tem um belo coração. As escolhas do roteiro entre o sentimentalismo barato e o nada sutil plot de espionagem tornam o filme desequilibrado.

     A situação em que o espião está metido envolve uma ausência de saúde, seu corpo o sabota e ele está a beira da morte, e para corrigir seus pecados passados, ele aceita um serviço sujo. Vivi Delay (Amber Heard) lhe oferece uma droga que prolongaria os seus dias e ele é obrigado a se enfiar numa sequência de assassinatos cuja motivação ele desconhece, e até por isto, ele refuta o motivo deste serviço. A droga altera sensivelmente a percepção do idoso, fazendo-o ter alucinações. O retorno aos afazeres paternos dividem tela com os insights de Amber Heard em trajes sumários – não que isto seja motivo de reclamação, uma vez que a beleza da moça é algo ímpar, mas o guião em determinados pontos parece ter sido feito por esquizofrênicos.

    O cotidiano do protagonista varia entre capturas, torturas de bandidos e serviços de babá, onde Ethan tem de consertar seus erros com Zooey (Hailee Steinfeld), compensando os cinco anos de distanciamento. A variação de temas tem o intuito de deixar o filme leve, mas exagera na dose, pois mesmo as piadas jogadas quase nunca funcionam, sem falar que ter uma execução interrompida por uma ligação não é o melhor modo de agir enquanto trabalha-se disfarçado, mas, a cena serve para ao menos mostrar que as prioridades do herói estão divididas, e que apesar do passado, ele está procurando ser um parente mais atento às necessidades de sua herdeira.

    Ao menos com relação às cenas de ação, MCG demonstra uma evolução clara, as sequências são melhor executadas do que as de Panteras, fazendo até o público temer pela vida dos personagens, ainda que a empatia não seja tão grande. O carisma de Costner de papéis anteriores é o que mais angaria torcida para que o seu drama seja resolvido.

    O desejo do personagem principal é atingido e gradativamente ele reconquista o seu papel de direito dentro da família, ao mesmo tempo que seu envolvimento com os vilões também aumenta, mas como era de se esperar. Tal trama torna-se muito menos interessante que a vida pessoal dele, ainda que as perseguições e assassinatos sejam plasticamente interessantes. A sensação de que tudo é um pretexto bobo para apresentar mais e mais situações genéricas de spy movies não abandona o expectador em nenhum momento. O filme carece de substância e conteúdo, o que não impede que os pólos opostos da vida de Ethan se cruzem, num momento inusitado.

    Não demora para que sua antiga nova parceira Christine (Connie Nielsen) o indague sobre a promessa que fez, de não envolver a sua família nas complicadas tramas derivadas de seu trabalho, mas como era de se esperar, é impraticável para ele continuar na ativa e manter sua família distinta disso. Mesmo que a intenção seja a de discutir a  velha questão de família x trabalho, tal prerrogativa somente arranha a superfície. MCG não consegue conduzir uma trama mais emocional ou que dependa de algo além da pura e simples ação desenfreada. As questões de manipulação e de abuso de drogas, que poderiam ser exploradas não são, somente servem para apresentar uma vazia tentativa de redenção, que ao final, não se mostra concluída.

  • Crítica | Ender’s Game: O Jogo do Exterminador

    Crítica | Ender’s Game: O Jogo do Exterminador

    Ender's Game - O Jogo do Exterminador

    Baseado no romance de mesmo nome, de Orson Scott Card, com roteiro e direção de Gavin Hood, o filme conta a história de Andrew Ender Wiggin (Asa Butterfield), uma criança que, mesmo sendo um “terceiro” (o filho excedente), é inteligente e muito bem-sucedido na escola de combate. Após a Terra ter sido atacada por alienígenas conhecidos como Formics – devido à sua semelhança física com os insetos – é formada uma Armada Internacional, que se encarrega de treinar uma geração de jovens talentos incumbidos de realizar um contra-ataque 100% efetivo. O Coronel Hyrum Graff (Harrison Ford) convoca Ender, acreditando que ele tem potencial para se tornar um líder estrategicamente tão bom quanto o lendário Mazer Rackham (Ben Kingsley), responsável pela primeira vitória sobre os Formics.

    O livro, apesar de ser leitura (quase) obrigatória entre fãs de ficção científica, perdeu boa parte do seu impacto com o passar do tempo devido aos avanços tecnológicos. O que resta – e não é pouca coisa – é o questionamento filosófico por trás da história: Até que ponto o governo tem direito de “brincar de Esparta”, recrutando crianças para serem treinadas em táticas militares? Até que ponto é válido utilizar esse único ataque sofrido como motivo para um contra-ataque, sem qualquer comprovação de que haverá outro? Até que ponto é ético abusar psicologicamente das crianças a fim de manipulá-las de acordo com os interesses militares? Enfim, há outras tantas perguntas que são feitas e cuja importância no enredo independe das traquitanas tecnológicas.

    Infelizmente, o roteiro conseguiu deixar tudo isso de lado e prendeu-se apenas à superfície da história, atendo-se somente à jornada do herói de um modo que peca pela falta de criatividade. A obra cinematográfica deve ser analisada, a priori, de forma independente e, sob esse ponto de vista, deve se bastar, não necessitando de conhecimento prévio para ser compreendida. No entanto, o espectador passa boa parte do filme com a sensação de que há algo a mais na história que ele deveria saber para a trama ficar mais interessante. E, desconsiderando o fato de ser uma adaptação, da dificuldade de transpôr a narrativa de uma mídia a outra, o roteiro parece ainda mais insosso. Há vários momentos em que se tem a impressão de que a trama vai deslanchar – “hmmm, agora vai ficar legal!”. Alarme falso. O momento passa e o filme continua se arrastando.

    Outro problema é a construção dos personagens, todos unidimensionais e tão “profundos” quanto um pires. Se ao menos o protagonista fosse bem desenvolvido, se suas motivações fossem mais definidas, se as características que levam Graff a escolhê-lo fossem mais evidentes, talvez o público se importasse um pouco mais com seu destino. Ele pode ter um momento de genialidade, tomar uma atitude extremada, sofrer um viés drástico e o máximo de reação que se obtém do espectador é um “Ah, ok.”. Nem se pode culpar Butterfield por sua performance. Ele até consegue transmitir um pouco o dilema do personagem, mas o resultado é aquém da expectativa. O Ender do filme é um moleque antipático o tempo todo e arrogante quando lhe convém.

    Que diferença faz se os cenários são boas representações das descrições de Orson Card? De que adianta se a sala de gravidade zero, utilizada nos treinos dos alunos, é muito fiel ao livro se o restante carece de complexidade? Enfim, para quem assiste sem ter lido o livro, o filme deixa a desejar por ser superficial demais e por deixar vários buracos não preenchidos no roteiro. Para quem assiste aguardando uma boa adaptação, deleita-se com os cenários e os figurinos e nada mais. Vale mais a pena ler o livro. Pois só assim o final do filme adquire algum sentido.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Bravura Indômita (2010)

    Crítica | Bravura Indômita (2010)

    bravura indomita

    A adaptação do romance de Charles Portis feita pelos irmãos Coen talvez seja o trabalho menos autoral da dupla de cineastas, pois não tem os traços característicos mais marcantes de suas produções, como o humor negro e a complicada cadeia de eventos que acomete e dificulta a vida dos protagonistas. Porém, não é menos significativa por isso. Ao optar por uma ótica e narrativa mais diretas, temos contato com o outro lado, também talentoso, dos diretores.

    A história se inicia com a órfã de pai extremamente inteligente, educada e perspicaz Mattie Ross (Hailee Steinfeld) em busca de alguém para trazer Tom Chaney (Josh Brolin), o assassino de seu pai, à justiça. Para isso, tenta contratar o caçador de recompensas Rooster Cogburn (Jeff Bridges), que aceita o serviço a contragosto. Também se junta ao bando o Texas Ranger LaBoeuf (Matt Damon), que há anos procura Chaney por um assassinato de um senador cometido no Texas.

    Bridges compõe um personagem peculiar, pois ao mesmo tempo em que se mostra um bêbado e em decadência, mostra um faro apurado ao ser colocado no encalço de seu alvo. Misturando um sotaque carregado com a fala confusa característica dos alcoólatras, Bridges cativa o espectador ao flertar com um típico anti-herói, que, apesar de antagonizar a protagonista, no final faz de tudo para salvá-la.

    A protagonista Mattie Ross também tem em sua pele a atuação impressionante da novata Hailee Steinfeld, que logo de início convence o espectador através da obstinação de sua personagem – que renegocia os pôneis de seu falecido pai – em um diálogo rico, rápido e extremamente inteligente, que lembra o estilo clássico dos Coen, mas em um tom mais sóbrio, condizente com a proposta do filme. A própria existência de uma adolescente, forte e dona de seu destino, em um contexto como o do Velho Oeste oitocentista, garante uma profundidade maior a Mattie, fartamente explorada tanto pelas situações em que é colocada como pela amplitude dramática de Steinfeld.

    Matt Damon dá a LaBoeuf a arrogância típica do texano, que traz um sentimento maior para com o seu estado do que para com o seu país, causando uma antipatia em Cogburn. Porém, após tantas disputas e certas trapalhadas, como morder a língua ao ser arrastado por um cavalo, LaBoeuf mostra um lado fraternal para Ross, como se estivesse tentando protegê-la tanto de Cogburn quanto do restante do mundo.

    Juntando três personagens tão diferentes com um mesmo objetivo, a dinâmica da narrativa se estabelece exatamente na evolução de suas relações e como todos aprendem mais sobre o outro, si próprios e sobre o mundo, especialmente Mattie, que acaba por enfrentar e depois matar Chaney sozinha, enquanto Cogburn protagoniza uma bela e épica cena de tiroteio contra o grupo de “Lucky” Ned Pepper (Barry Pepper), sendo ajudado depois por LaBoeuf em um tiro certeiro, o que restabelece sua confiança como atirador antes abalada justamente por Cogburn. Interessante também é a composição de Chaney, mostrado como um bandido inferior, submetido às ordens do outro, e que reage impulsivamente e de forma nem sempre inteligente às situações, contrariando a expectativa criada sobre um grande mestre do crime que engana as autoridades há meses.

    Tecnicamente falando, a produção é um primor em todos os aspectos. A fotografia de Roger Deakins traz os mais belos planos do Oeste, nos lembrando a todo instante das razões pelas quais o gênero conquistou tantos espectadores com o passar das décadas. O figurino, o design de produção e a maquiagem passam toda a brutalidade suja do Oeste, responsável por transformar homens em bestas que, depois de algumas décadas, seriam alçados à categoria de heróis e desbravadores do país.

    Bravura Indômita cativa, então, por sua seriedade e sobriedade, com toques de um leve humor, e por seus personagens que agem, reagem e crescem frente aos obstáculos em seus caminhos, criando-se um vínculo próprio entre eles. Vínculo esse que é friamente subvertido na cena final, onde a já crescida Mattie Ross procura Cogburn depois de 25 anos para prestar uma homenagem a ele e o encontra morto. Essa atmosfera áspera e melancólica do Oeste, que se reflete nas relações entre seus habitantes, é transferida para o filme, o que dá a ele uma carga emocional ainda mais intensa, já que poucos cineastas têm a sensibilidade de retratar o sul dos EUA com toda a complexidade social e cultural da região sem cair em clichês e estereótipos.  E essa produção traz exatamente isso: uma nova releitura sobre uma história bem conhecida mas que renova o combalido gênero western através de um revigorante sopro de qualidade.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.