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  • Crítica | Everything or Nothing: The Untold Story of 007

    Crítica | Everything or Nothing: The Untold Story of 007

    Everything or Nothing 1

    Documentário organizado por Stevan Riley, inicia-se com a atuação de Daniel Craig, já remetendo às primeiras linhas de Ian Fleming como novelista do romântico personagem que o tornaria famoso. Everything or Nothing investiga um pouco da intimidade do escritor, para remontar o ideal que o faria escrever sobre o agente secreto britânico. O autor sairia do front da Segunda Guerra traumatizado, indo enfim para a Jamaica para habitar sua casa de praia (chamada Goldeneye) fonte local dos contos e novelas sobre o espião, fantasiando sobre elementos comuns ao local em seus escritos, incluindo as barracudas e tubarões que habitavam os mares.

    Da dor das perdas de seus amigos, viria a inspiração para aventuras que mesclavam o escapismo inocente e o medo do desconhecido presente na figura do soviético. Cassino Royale lançado e tachado como um livro que chocaria a população conservadora, especialmente pelo apetite do protagonista por mulheres e pela fácil entrega das mesmas. Esse e outros problemas fariam com que alguns produtores associados a Albert L. Broccoli achassem que James Bond não era um personagem talhado para o cinema, e sim para a televisão, isso depois da encenação de Cassino Royale de 1954. Tal fator coibiu o escritor de produzir novas aventuras, quase cerceando na raiz a origem das histórias que ficariam famosas no cinema.

    Fundamental para que ocorresse a realização das adaptações foi Harry Saltzman, um sujeito cujo repertório envolvia o trabalho no circo, normalmente entretendo seu público através do colorido e espalhafatoso. Após conseguir os direitos dos livros de Fleming, organizou enfim a parceria com Broccoli e o consenso de ambos sobre a polêmica da persona de Connery como espião, já que ele era um desconhecido. Outros fatores colaboraram para tal identidade ser construída, como a personalidade de Terence Young, primeiro diretor da cinessérie.

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    Broccoli, Connery, Fleming e Saltzman

    A participação ativa de Maurice Binder foi fundamental para a abertura estilizada que se tornaria marca registrada do personagem, misturando elementos violentos com a sensualidade feminina dos textos canônicos de Fleming.

    O documentário não teme em optar por um lado ao discutir a questão de Kevin McClory e Ian Fleming, primeiro ao diminuir a influência do primeiro nas ideias por trás de Thunderball, prosseguindo em atrelar à briga judicial o principal fator para o falecimento do criador de 007.

    A gravidade está no reducionismo, já que o filme passa rápido demais por questões polêmicas, detalhando pouco a tomada de direitos de McClory, bem como a briga entre o cada vez mais famoso Connery e o produtor Saltzman, que resultaria na mudança de postura após Só Se Vive Duas Vezes. Apesar desses problemas, destaca-se a parte em que Lazemby confessa seus problemas de comportamento fora dos sets, além dos fatores que o fariam perder seu posto e a consequente fama e carreira que teria a partir daquilo, inclusive trazendo detalhes sobre sua postura de afronta, soando até bastante humilde ao falar sobre seu visual na premiere do filme, de barba e cabelos longos, diferente do estereótipo de seu personagem.

    Everything or Nothing 4

    O filme funciona perfeitamente como tributo/homenagem, reunindo depoimentos de membros das produções e de tantos outros famosos aficionados, como Mike Myers, que declara seu amor pelo personagem através da paródia de Austin Powers. No entanto, o tempo curto da produção não permite um grande aproveitamento dos detalhes que envolvem uma franquia que já teve um jubileu, atingindo o raso em alguns pontos, especialmente em reafirmar a demonização de McCLory, anda tangenciando os direitos de Thunderball, que resultaria no filme Nunca Mais Outra Vez. No entanto, a briga entre Saltzman e Broccoli é somente citada ao passant, curiosamente gastando-se mais tempo até nas desavenças de Connery com os dois produtores, que o ajudaram a aceitar o papel no filme apócrifo.

    Everything or Nothing soa como uma visão demasiada parcial, como um comercial publicitário, encomendado pelos atuais mandantes da franquia, que exibem a versão que lhes é conveniente. De positivo há a tentativa de justificar alguns dos equívocos dos filmes de Dalton como Bond, mas, ainda assim, sem se assumir.

    Bond Girls Naomi Harris & Bérénice Marlohe on the red carpet at the Orange British Academy Film Awards 2012.

    Não há qualquer remorso por parte dos produtores em colocarem Pierce Brosnan em temas que tornam os resquícios da Guerra Fria como algo imbecil e parodial, tampouco há um assumir de culpa por abordar esses temas mais espinhosos. A convalescência de Cubby Broccoli seria responsável pela reaproximação dele com Sean, fator que talvez explique a boa abordagem que fazem do ator, o qual, ainda assim, não se permitiu sair de sua aposentadoria para participar das gravações do documentário.

    Mesmo os comentários corretos em relação ao boicote preconceituoso a Daniel Craig soam oportunistas, como uma tentativa de trazer um virtuosismo para os atuais produtores, Barbara Broccoli e Michael G. Wilson, os mesmos que são incapazes de fazer uma autoanálise minimamente crítica em relação aos erros do passado. Para o fã do personagem 007, existem poucas informações inéditas, mas para um cinéfilo neófito Everything or Nothing funciona como bom artigo de curiosidade, mesmo considerando a quantidade absurda de fatos suprimidos.

  • Crítica | Supermensch: The Legend of Shep Gordon

    Crítica | Supermensch: The Legend of Shep Gordon

    Supermensch 1

    A investigação sobre o  sucesso de Shep Gordon é bastante aventuresca, em Supermensch. A persona do empresário, um dos mestres da indústria norte-americana de entretenimento, tem um cartel de clientes (e amigos) dos mais influentes do showbusiness, como Alice Cooper, Michael Douglas e Mike Myers, o qual assina a direção do documentário. Logo de início, são feitos grandes elogios a sua figura, da parte de artistas que têm presença constante, pessoal e profissionalmente, em sua vida.

    Myers escolhe imagens relacionadas às falas de Gordon e filmes populares para preencher as lacunas, quando não há imagens ou fotografias próprias, fazendo com que o biografado seja retratado de forma ainda mais interessante, referindo-se a diversas áreas do imaginário popular. O modo errático como Shep se tornou empresário é revelado sem qualquer receio, e faz relembrar os primeiros e malfadados espetáculos de Alice Cooper, que na verdade eram pretexto para o protagonista vender seu estoque de drogas. Seguindo seus instintos, o futuro empresário trabalhava de forma que o diferenciasse dos managers comuns, apresentando uma interação com o público bastante diversa.

    A quantidade de aventuras bizarras em que o agente e Cooper se enfiavam, e dos mais variados tipos e gostos, era vasta. A rotina bizarra de um rockstar era também vivida por ele, sendo o entrevistado o catalisador da maioria dos fatos tresloucados lidos ante a câmera, desde a morte de uma galinha em pleno palco, até transgressões comerciais nos discos de vinil vendidos nos anos 1970 e 1980, sendo fonte de inspiração para alguns dos casos mostrados no filme Quase Famosos, de Cameron Crowe.

    A persona de Shep é demasiado dionisíaca, peculiar e divertida. Toda a abordagem criativa idealizada por Myers torna a fita um objeto caro e terno, com um ritmo que bastante se diferencia de seus primos do gênero. Uma obra divertida, colorida e cujo entretenimento se equipara ao montante de informações dadas em pouco tempo de tela. O formato consegue adequar-se ao roteiro, além de emular perfeitamente a trajetória trôpega moralmente e cheia de destruição de tabus e auges comerciais da carreira de Gordon. O filme também se faz perfeitamente como o retrato de uma época, onde a autodestruição com entorpecentes e boemia não era tão mal vista.

    Shep era conhecido por realizar festas extravagantes, gerando crossovers interessantes entre celebridades, com amizades improváveis iniciando-se através de seu estilo de vida. Sua relação com causas nobres caracterizava-se por muitas realizações, desde a idealização de eventos beneficentes, que ajudavam os infectados pelo vírus HIV, até causas pessoais que envolviam famílias próximas de sua casa na praia, financiando estudos de uma família inteira e atuando como pai e patrono.

    A figura de nice guy, relacionada ao comportamento e modus operandi de Shep Gordon, é flagrada de modo quase poético, tal é a paixão de todos os que falam do personagem central: uma pessoa dionisíaca, mas essencialmente terna, amada por todos que o cercam. Supermensch é um retrato agridoce de uma biografia nada chapa branca, que consegue exalar a mesma simpatia de sua figura de análise, sem soar forçada ou panfletária.