Um Corpo que Cai e Intriga Internacional, David Carbonara e sua mina de ouro tocam pela última vez e fazem aqueles 30 segundos abrirem o último episódio de Mad Men.
Como começar melhor o fim do que lembrar o espectador que já estamos nessa estrada há quase 10 anos? Basta, após os créditos, encararmos um deserto e, à la Mad Max, o barulho ensurdecedor de um carro dirigido por Don Draper, de capacete e óculos. O próprio personagem nos recorda da conversa com sua filha dizendo que tudo passou rápido demais. Depois de encerrar 2014 com a cena mais inesperada e, provavelmente, uma das mais belas na história das produções pra TV, o último episódio de Mad Men se concentra exclusivamente em não parecer o fim de nada, e apenas mais um episódio muito bem executado como todos os outros.
Matthew Weiner volta para continuar cavando o buraco que abriu dirigindo e roteirizando. Temos pequenas jóias de diálogos entre amigos que parecem não se ver ou se encontram na mesma frequência de tempos anteriores em algumas passagens do episódio. Aquelas três pessoas, que começaram como coadjuvantes do grande diretor de arte da Madison Avenue, agora possuem algo próprio, apesar de não tão grande, e fizeram tanta presença nessa história quanto ele. São bons amigos agora, estão longe uns dos outros e vão continuar assim daqui em diante.
Ken e Joan nos relembram novamente sobre o dinheiro. Ele sempre estará ali. Foi o dinheiro que traçou o caminho de todos, retornando eventualmente como prioridade. O Dinheiro pra Joan é o respeito de poder trabalhar com o que quer, de estabelecer seu nome e não precisar estar na sombra de ninguém, um preço que aceita sem hesitar. Para Peter foi finalmente a chance de reconquistar Trudye, largar toda a estrada que consequentemente resultou no seu divórcio, mas que, ainda assim, deixa boas memórias pra trás.
O trabalho é o corpo dessas pessoas; não o fazem pelo dinheiro, mas pelo hábito. Não interessa se algo não se encaixa ou se tudo não se encaixa mais: simplesmente é necessário fazer. Um processo quase mecânico, assim como precisar de dinheiro. Peggy reflete muito bem essa faceta do trabalho durante a série, e curiosamente é Joan e ela que se mostram mais viciadas no que fazem antes de qualquer outro.
Mas antes de olhar para trás, Sally e Betty nos lembram de que tudo que está acontecendo agora vai continuar acontecendo também daqui pra frente. Faz parte do grande abismo que essas pessoas viveram no decorrer de cada temporada (não podendo faltar um ultimo “What?”). Ninguém, de fato, nunca está ou esteve bem por muito tempo, mas ainda assim há espaço aberto para vermos Peter e Trudy como um casal prometido e feliz a caminho de seu jatinho particular. Certamente, se ele irá seguir pelo caminho de Don como pessoa, como já havia feito algumas vezes, é incerto, mas foi um final feliz.
E o Don? Não é a primeira vez que vai embora aleatoriamente para qualquer lugar. Repetir o mesmo processo há mais de 20 anos não deve ser simples, muito menos mecânico. Mais uma vez com outra mulher e outro problema que irá corroê-lo por dentro da mesma forma como qualquer outro problema. Don é a pessoa que mais tenta juntar pequenos pedaços de um todo desfeito há muito tempo. Poderíamos esperar qualquer coisa menos um retiro espiritual como opção para acabar com sua decadência contínua.
De todos, ele é o único que precisou encarar tudo o que representa e faz esse exercício todos os dias naquele lugar com sua própria imagem refletida na vida de outra pessoa. Precisou ver o abismo de outros e se prender ao próprio abismo sem beber ou fugir (de novo). Encarar que é um péssimo pai e que nunca irá fazer parte importante de uma família que ele já teve ao seu lado, a qual hoje não existe mais. É triste pensar que sua última conversa com Peggy foi uma carta de confissão, quase como um suicídio. A sensação de que algo ruim estava por vir é cortada de maneira sobrenatural pela declaração de amor de Stan por Peggy. Sem nenhum tipo de preparação, com a própria Elizabeth Moss cortando o clima da declaração, mostrando que aquilo está completamente perdido no meio de tudo. e daí lembramos: é o ultimo episódio.
Com o tempo quase esgotado, vemos Roger e Marie finalmente juntos (quem sabe até o fim dessa vez), e passamos por todos os outros personagens novamente, cada um mais distante do outro e certamente com os mesmos problemas de sempre. Don finalmente aparece, em seu estado mais zen já antes visto. O som de tudo cessa e a meditação ilustra ordem e controle de todo aquele abismo que ele se encontrava, porém um sorriso aparece. Ele finalmente conseguiu se dividir da sua pior parte? Ele voltou a trabalhar e aquela propaganda da Coca-Cola é de sua autoria? Não saberia dizer, mas é certo que algo ali mudou, pelo menos em parte.
Se pudesse chutar, diria que o episódio 7 encerraria o programa de forma que não pudéssemos pensar em nada disso. Mas, ao mesmo tempo, seria uma lágrima no final das contas, e não um sorriso curioso que encerraria uma das maiores produções na história da TV. Sentirei falta de pensar no que ele poderia ter sido.
Atenção: este review contém spoilers de toda a série. Siga por sua conta e risco.
Mad Men entrou para o seleto grupo de séries que mudaram a televisão americana atual, ao lado de Breaking Bad, The Sopranos, Deadwood, The Wire e Six Feet Under. A série criada por Matthew Weiner relata a rotina dos homens e mulheres que modernizaram a publicidade a partir dos anos 60.
Entre os turbulentos anos de 1960 a 1970, acompanhamos as principais figuras da agência de publicidade nova-iorquina Sterling Cooper, centralizadas na figura de seu misterioso diretor de criação, Don Drapper.
Por se tratar de uma série que acompanha a rotina dos mesmos personagens em um ambiente que pouco altera com o tempo, as mudanças em Mad Men poderiam ser ainda menos perceptíveis de uma temporada para a outra se não fossem as contextualizações históricas. Os grandes eventos da época foram agentes importantes para as mudanças que a publicidade sofreu. Não obstante, os anos 60 são reconhecidos nos Estados Unidos como a grande fase em que houve a quebra do padrão em toda a cultura, além das manifestações políticas contra a guerra do Vietnã, a ascensão da mulher no mercado de trabalho e os conflitos raciais através da luta dos direitos civis.
Os personagens principais da série na primeira Sterling Cooper
No entanto, os três atos da série podem ser identificados entre antes e depois do divórcio de Don, e após o seu afastamento da agência.
A primeira temporada consolida os personagens principais da agência, os “homens loucos” que modernizaram a publicidade. Eles são compostos pelos chefes de atendimento que lidam diretamente com os clientes e o núcleo de criação que dá ideias para o seu diretor fazer as apresentações, e assim conquistá-los e mantê-los. No entanto, é através da rotina de Don Drapper que vemos quase tudo o que acontece na agência, além dos seus inúmeros casos extraconjugais. Aos poucos, também vemos como Don vai se mostrando um personagem com passado misterioso que ele tenta a todo o custo esconder; sua única fraqueza aparente. Don na verdade se chama Dick Whitman, filho de uma prostituta, sem família, que na guerra da Coreia acaba assumindo a identidade do seu superior para fugir do conflito.
É aqui também que vemos o outro lado da Sterling Cooper através da contratação da nova secretária de Don, Peggy Olson e do trabalho de quem a contratou, a secretária geral Joan Harris. O manjado artifício nos permite conhecer o funcionamento da Sterling Cooper através de um novo personagem, além de mostrar o lado das mulheres da empresa, o que permite problematizar o sexismo no trabalho. Não à toa, as duas personagens crescem de importância já no final da primeira temporada, com Peggy se tornando redatora e Joan resolvendo problemas cada vez maiores. O terceiro núcleo se fixa na residência de Don, através da sua esposa Betty, dona de casa que cuida dos seus dois filhos.
Na segunda temporada temos o evento histórico da crise de mísseis de Cuba. Apesar de ser somente nos episódios finais, o evento histórico dialoga com os principais acontecimentos: Duck Phillips, apresentado na temporada anterior, trouxe instabilidade a todos os personagens principais da agência, e não à toa ele se torna o responsável pela compra da Sterling Cooper pela Putnam, Powell & Lowe, uma agência inglesa.
Don tem um novo caso, agora com a esposa de um comediante que destrata seus clientes, algo que se torna um resumo da sua vida no momento, já que não consegue respeitar seu casamento depois do acordo que fizera com a própria esposa e ainda termina por engravidá-la. Aliado a isso, em uma viagem com Pete, Don acaba sumindo, e assim conhecemos Anna Drapper, esposa do verdadeiro Don, o que faz com que comece o colapso do seu casamento.
Peggy Olson, interpretada por Elisabeth Moss, liderando a sua equipe
Na terceira temporada vemos uma mudança na Sterling Cooper, agora controlada pelos ingleses sob o comando de Lane Pryce. A mudança de rotina com a fusão afeta menos a publicidade em si e mais a forma de trabalho do núcleo principal da agência. Como não possuem mais o controle, Don Drapper e a sua equipe agora têm que seguir ordens de Londres das quais discordam, sendo o caso mais emblemático do Jai Alai: aceitar o investimento de um cliente em algo que eles sabem que está fadado ao fracasso. Somado a outras complicações com clientes, o desgaste com Londres vai crescendo até que os publicitários tomam uma decisão: sair da empresa que venderam antes de uma nova aquisição e fundar a sua própria agência levando os clientes que conseguirem.
Enquanto isso, a relação de Don com a sua esposa se desgasta, apesar do nascimento do novo filho. A crise se agrava ainda mais com a morte do pai de Beth, o que a faz buscar em Harry Francis um amante e no fim da temporada terminar se divorciando de Don, decisão que encerra o primeiro grande ato da série.
Uma das cenas mais brilhantes da série: o carrossel
A quarta temporada traz uma mudança no protagonista e inicia o segundo ato de Mad Men. Agora solteiro, Don está vivendo solitário em seu apartamento experimentando a vida de Dick Whitman que ele tinha deixado para trás. Entre prostitutas e curtos relacionamentos que não dão certo, ele passa a beber ainda mais.
A sua instabilidade acaba sendo a síntese de todos os personagens da nova agência Sterling Cooper Draper Pryce. É nesta temporada que vemos todos os personagens enfrentando ou começando a ter problemas pessoais mais sérios, além da nova agência se tornar instável financeiramente por causa dos novos e incertos clientes. Para piorar a situação, a SCDP perde Lucky Strike, o seu principal cliente, e em uma tentativa desesperada de salvar o negócio, Don comete um erro grave, o que acaba sendo o início do seu declínio na empresa. Assim como o divórcio foi um trauma para o protagonista, a perda da Lucky Strike o foi para a agência. E ambos agora seguem se recuperando.
Na quinta temporada, Don está casado com sua ex-secretária Megan, e o equilíbrio volta um pouco para a sua vida ao se afastar dos casos extraconjugais e, por consequência, ao funcionamento da própria SCDP. Somente no último episódio, ele dá indícios de que voltará a ter uma possível amante. Lane Pryce comete suicídio no final por um erro que ele mesmo cometeu, e a empresa acaba expandindo.
O assassinato e a morte das enfermeiras em Chicago também marca esta quinta temporada em se tratando dos direito civis dos negros e das mulheres. A barbárie causada em 1966 permite a discussão sobre o racismo e o sexismo no mercado de trabalho. Assim, no final da temporada, Peggy recebe proposta da agência rival e decide ir, e Joan Harris se torna cada vez mais indispensável dentro da SCDP.
Na sexta temporada, a SCDP, que havia voltado a crescer, acaba se fundindo com a agência do antigo rival de Don, Ted Chaough, a Cutler Gleason Chaough. Por causa dessa união, a nova agência acaba tendo maiores problemas, como lidar com os dois diretores de criação no mesmo lugar. O assassinato de Martin Luther King serve como contexto histórico para discutir o racismo na sociedade americana e a luta pelos direitos civis dos negros através de Dawn Chambers, a secretária de Don. A principal figura negra dentro da agência acaba representando todo o preconceito sofrido.
Com o novo casamento consolidado, Don voltou a ter amantes, e sua arrogância está ainda maior, o que só reforçará a sua queda dentro da própria empresa, iniciada com a sua decadência na quarta temporada. A sexta temporada termina o segundo ato de Mad Men com o afastamento de Don da agência.
Assim como Breaking Bad, que termina o ato principal na penúltima temporada, a sétima e última temporada soa como um grande epílogo. Don Drapper, desvinculado da agência e mais solitário do que nunca, agora tem que se virar para voltar a ser uma pessoa relevante tanto no mundo publicitário quanto na vida pessoal e familiar. Ele começa passando seu tempo entre Nova York e Los Angeles, onde agora vive a sua esposa Megan, o que faz com que a sua vida fique ainda mais perdida. A luta para ser readmitido de volta a Sterling Cooper passa por entraves entre os sócios, e Don tem que voltar a provar o seu valor. Aqui vemos uma faceta já mostrada na série, mas através de Peggy: como um iniciante em publicidade virou o principal e mais desejado diretor de criação. É também aqui que vemos a chegada do homem à Lua, em 1969, e isso dialoga com a chegada de uma nova tecnologia na agência: a computação. A inovação representa um novo momento para todos, pois Peggy agora chegou onde jamais esteve ao se apresentar para um cliente grande, e, com a morte de Bert Cooper, tudo muda.
Joan Harris, vivida por Christina Hendricks
A segunda parte da última temporada inicia pela quinta vez com a mudança de nome da agência após ser vendida/passar por fusão/absorvida pela McCann-Ericksson. Don inicia um romance com uma garçonete misteriosa que desaparece, e isso dá o tom de toda a temporada final da série: a magia por trás de Mad Men chegou ao fim. Todos os personagens principais se desvinculam de alguma forma do trabalho que estavam acostumados. Matthew Weiner, o criador da série, dá indícios o tempo todo nesta temporada que ela está terminando: a morte de Cooper, o segundo divórcio de Don, a venda do seu apartamento, o câncer de Betty, a segunda demissão de Joan e de Ken Cosgrove, e o devaneio que leva Don a se aposentar do trabalho.
Don Drapper, interpretado por Jon Hamm
A jornada final do protagonista é a desconstrução de Don Drapper para voltar a ser Dick Whitman. Ao dirigir sem rumo pelo país e acabar em um hotel de beira de estrada onde o dono é um veterano da Segunda Guerra Mundial, voltamos ao soldado que admite que causou a morte do seu superior e ficou com seu nome. Neste mesmo lugar, vemos um vigarista que rouba dinheiro e consegue bebida alcoólica, duas coisas que Dick fez ao se passar por Don metade da vida inteira: ganhar dinheiro sendo aquilo que não é, ou, em suma, a essência da publicidade. Don é levado pela sobrinha de Anna Drapper, esposa do Don original, a um retiro espiritual para a sua final desconstrução do personagem. É emblemática a cena onde ele abraça um senhor que compartilha o sonho de ser aquilo que todo mundo é: uma pessoa irrelevante para a própria família. Finalmente ele deixa de ser Don Drapper de vez ao abandonar seus filhos e volta a ser Dick Whitman, um desconhecido para a sociedade.
A estrutura de Mad Men é toda baseada em The Sopranos, inclusive não é segredo nenhum que Matthew Weiner, enquanto roteirista da série, via como mentor David Chase, criador de Sopranos. Ambas tratam a rotina de um grupo de homens poderosos liderados por um chefe, o “Don”, protagonista. Os cabos e soldados da máfia são os chefes de atendimentos das agências, que respondem a ele para aprovar ou não as peças publicitárias ou ajudar com alguma coisa, e resolvem problemas dos seus clientes, sendo que nenhum deles respeita a própria esposa e tem amantes. Apesar de aparentar ser um homem forte, Don Drapper sofre do mesmo mal de Tony Soprano: a ansiedade de ter o tempo todo que representar um papel que ele não é. Enquanto Don Drapper na verdade é Dick Whitman, Tony Soprano não é o chefão da máfia, mas uma pessoa frágil.
O momento em que Dick Whitman vira Don Drapper
Por se tratar do cotidiano de uma agência de publicidade que lida basicamente com os mesmos clientes, fica mais difícil pontuar as diferenças entre uma temporada e outra. Para tal, são usados os grandes eventos dos anos 60, que acabam servindo para discutir parte dos problemas da Sterling Cooper. Acaba que o microcosmo da agência serve como uma versão resumida da própria América.
Se Breaking Bad prima pela direção e The Wire pelo roteiro realista, um dos grandes diferenciais de Mad Men é a discussão política, social e cultural da sociedade americana através da publicidade. Não à toa a série se passa nos anos 60: os produtos que sempre foram feitos para os públicos certos agora enfrentam mudanças intensas nunca antes sentidas na sociedade.
A desconstrução do mito norte-americano, que começa na falência do american way of life centrado na família de Don, passando pela força de um capitalismo baseado na exclusão ao deixar mulheres e negros em posição inferior, enfrenta a hostilidade da guerra do Vietnã e da crise de mísseis de Cuba. Além disso, é brigado a se adaptar à contracultura e ao movimento hippie, mas termina com uma esperança quando o homem chega à Lua e vence a corrida espacial. Como se adaptar a essas mudanças? Os EUA continuam sendo o modelo ético e moral para a sua própria população? E que população é essa? Será que o mundo também está mudando? Como nós vamos nos vender agora? E que novo mundo é esse?
A outra discussão da série é a filosofia e a moral da publicidade. Como transformar o inútil em um desejo? Como vender algo para alguém que não precisa daquilo? É ético tentar moldar o caráter de alguém? O todo poderoso chefe de criação Don Drapper na verdade é alguém que se passa por outra pessoa o tempo todo, alguém que negou a sua própria história e personalidade, e construiu outra para chegar ao poder de persuasão sob os demais como diretor de arte. E o que é a publicidade senão a vitória da persuasão sobre a personalidade?
Bert Cooper e Roger Sterling, dois dos melhores personagens da série
Por fim, algumas curiosidades da série. É comum nas salas de roteiristas o criador da série, ou showrunner, reescrever os episódios de algum dos roteiristas, porém mantendo o crédito original. Matthew Weiner mudou isso e ele se deu crédito em quase todos os episódios da série como co-autor. Para quem quiser se aprofundar: a lista de alguns livros que os personagens leram durante a série; o figurino que os atores usam de acordo com os seus personagens; um guia pela direção de arte da série; e a história do publicitário Draper Daniels, principal referência para a criação do protagonista.
Além da direção de atores, direção geral e direção de arte, a atuação da série é outro ponto forte de Mad Men. Jon Hamm dá vida a Don Draper; a ótima Elisabeth Moss é Peggy Olson; Vincent Kertheiser como Pete Cambell; Christina Hendricks é Joan Harris; a limitada January Jones vive Betty Drapper e depois Betty Francis; Rich Sommer é Harry Crane; Aaron Stanton vive Ken Cosgrove; a boa atriz Jessica Paré dá vida a Megan, ex-secretária e segunda esposa de Don; Jay R. Ferguson vive Stan Rizzo, o melhor amigo da Peggy; o limitado Michael Gladis é Paul Kinsey; Bryan Batt como Salvatore Romano; por último o sempre ótimo Jared Harris é Lane Price; e sem esquecer do bom ator John Slattery como Roger Sterling e Robert Morse como Bert Cooper.
Mad Men é o tipo de série que vale a pena simplesmente por tudo o que a história representa. Ela não somente foge do padrão das séries na TV fechada, mas também consegue contar uma boa história usando um ótimo fundo histórico.
Atenção: este review contém spoilers de toda a série. Siga por sua conta e risco.
Figurando entre as cinco séries consideradas revolucionárias, ao lado de The Sopranos, The Wire, Breaking Bad e Mad Men, a série criada por Alan Ball conseguiu atingir um alto nível de roteiro e direção, colocando Six Feet Under em um patamar acima das séries comuns.
Ao longo de cinco temporadas, acompanhamos as vidas de Ruth, Claire, David e Nate Fisher, donos da funerária Fisher & Sons (depois Fisher & Diaz). Entre os seus desentendimentos, familiares e amorosos, e a luta contra a compra de uma multinacional, vemos como uma rotina cercada de morte pode significar tanto.
As cinco temporadas conseguem ser divididas por temas sempre gerados pela morte. Por se tratar da rotina dos mesmos personagens, o diferencial é pautado pelas situações das mais absurdas que ocorrem com os protagonistas.
O elenco principal da série: Freedy Rodriguez como Rico, Rachel Griffith como Brenda, Lauren Ambrose como Claire Fisher, Peter Krause como Nate Fisher, Frances Convoy como Ruth Fisher, Michael C. Hall como David Fisher e Matthew Patrick como Keith
O seriado começa com a morte do patriarca Nathaniel Fisher. A partir daí, todos os personagens acabam se livrando de diversas amarras sociais: Ruth se liberta sexualmente, assumindo o caso que tinha com o seu cabeleireiro; Claire passa a ser uma pessoa menos rebelde; David se revela gay e assume seu namoro com Keith; e Nate deixa a cidade onde morava e volta para a casa. O tema é claro na primeira temporada: a libertação.
É através da rotina da funerária que sabemos como o negócio funciona. Por conta disso, os Fishers passam a ser assediados pela Kroehner, gigante do ramo. O dilema de vender ou não o negócio da família permeia esta primeira temporada, ainda mais utilizando a estrutura do filho renegado, Nate, que não quis assumir o empreendimento familiar.
Toda a série tem personagens que se destacam dos demais de alguma forma, seja pela condução do roteiro, seja pela atuação. Em Deadwood, é Al Swarengen e em The Wire, é Omar Little. No caso de Six Feet Under é Brenda Chenowith, a namorada e segunda esposa de Nate. Ser criada por pais psicanalistas e que a usaram como tema de um livro, além de ter um irmão psicopata, transformou-a na melhor personagem da série.
Uma das muitas cenas da série em que os protagonistas conversam com os mortos do começo dos episódios
A segunda temporada tem como tema a decisão. Ruth começa a ficar na dúvida do que fazer da vida e se fica ou não com Nikolai; Nate e David são assediados novamente pela Kroehner; David ainda tem incertezas sobre se assumir gay publicamente; e Claire não sabe o que fazer quando se formar na escola; e Brenda passa a trair Nate com várias pessoas assim que fica noiva. Porém, as maiores indecisões da temporada recaem sobre Nate: a partir de uma ida a sua antiga cidade, Seattle, ele revê uma antiga amiga. Meses depois, ela o procura com barriga grande, e ele reflete se vai assumir a filha ou não. Outra grande indecisão de Nate ocorre ao descobrir que sofre uma espécie de AVC, que resolve operar mesmo correndo o risco de ficar em coma.
É aqui também que vemos que Rico, o ajudante embalsamador de Nathaniel, se torna sócio da empresa, fazendo com que a funerária passe a se chamar Fisher & Diaz. Ao mesmo tempo, ocorre um processo, esquecido pela série, que iria levá-los à falência. A Kroehner também não é mais mencionada daqui em diante.
Na terceira temporada, temos a própria vida como tema. Nate cria a sua filha, Maya, e aceita se casar com a mãe dela; David começa a ter desejos de adoção, junto a Keith, após tomar conta da sua sobrinha; Claire entra na faculdade de arte e deseja iniciar um relacionamento adulto; e Ruth acaba se envolvendo com Arthur, o novo empregado da funerária. Brenda se mantém fora da maior parte dessa temporada, voltando, no final, após a morte do seu pai, enquanto Ruth acaba se casando com George.
É também aqui que temos um dos momentos mais tensos da série em relação à morte. Lisa, a esposa de Nate, desaparece nos episódios finais, o que faz com que Nate se altere de uma forma nunca vista. E a forma como o roteiro e a direção trata o tema faz com que os episódios finais tenham uma carga muito pesada.
Na quarta temporada, temos como tema o castigo. Nate enterra a esposa da forma como ela queria, e não como a família dela gostaria, e acaba descobrindo que talvez o próprio cunhado tenha matado Lisa; Claire se sente perdida e desiste da faculdade de arte; Brenda começa a se dar bem com o vizinho, até que Nate chega; Keith é demitido do emprego de guarda-costas após transar com a cantora; Arthur se demite; Rico se divorcia após ser infiel; e David sofre um sequestro que o deixa traumatizado.
É aqui também que temos uma guinada na vida de Brenda, que deseja ser psicanalista, finalmente seguindo a profissão dos pais. Nesta temporada, aparecem dois novos personagens, George, novo marido de Ruth apresentado na temporada passada, e sua filha Maggie, cuja função é ajudar o pai, que começa a apresentar sinais de demência.
As melhores mortes dos começos dos episódios
Na quinta e última temporada, o tema é o perdão, fechando o ciclo. Nate e Brenda finalmente se casam após os preparativos da temporada passada, e logo depois Brenda perde o bebê; David e Keith conseguem adotar dois meninos, depois de muitas tentativas, e acabam tendo dificuldades em criá-los; Claire desiste da faculdade de arte e começa a trabalhar em um emprego que odeia; Ruth se divorcia de George; Brenda engravida novamente; Rico volta para a esposa, mas sem ser como antes; Nate trai Brenda com Maggie, e Nate morre após um novo AVC.
Nos dois últimos episódios, os personagens acabam seguindo a cartilha padrão, e o que poderia ser um bom final se transformou no dramalhão apelativo nível novela das oito do Maneco. Nível este que já havia se instaurado na série desde meados da terceira temporada. O término da série foi fraco, piegas, e a última cena, desnecessária.
A estrutura dramática da série ainda se aproxima da tradicional, no entanto cada episódio começa com uma morte aleatória, algo que vai significar trabalho para a funerária. A partir daí, as circunstâncias que levaram a esse falecimento passam a dialogar com o tema de cada episódio. Literalmente os Fishers conversam com os mortos enquanto os preparam para o velório, dando, inclusive, mais tridimensionalidade aos protagonistas. Nathaniel sempre volta para conversar com sua viúva, Ruth, e seus três filhos, ao longo de toda a série.
Ao incorporar a morte como tema principal e trabalhá-la a partir de vários outros assuntos, a série mostra que a sua principal característica é a diversidade. A morte tem a função de sustentar aquela família, que por si oferece algum conforto para os parentes dos mortos. Dessa forma, a morte gerou vida, uniu, separou, perdoou, criou indecisões e, por fim, libertou, seja quem estivesse em vida ou em uma morte dolorosa. E essa diversidade também é mostrada através das minorias, a exemplo de latinos, negros, gays e mulheres como os protagonistas da série.
Uma das melhores cenas da série, com Nate chapado de ecstasy
A atuação é um dos pontos altos de Six Feet Under. Rachel Griffiths interpreta a melhor personagem da série, Brenda Chenowtiz; Frances Convoy dá vida à matriarca Ruth Fisher; Peter Krause é Nate Fisher; Michael C. Hall faz de David Fisher o melhor papel de sua carreira (colocando Dexter no bolso); Lauren Ambrose é Claire Fisher; Richard Jenkins faz as ótimas aparições momentâneas de Nathaniel Fisher; Matthew Patrick é Keith, o namorado e depois marido de David; Freddy Rodriguez dá voz a Frederico ‘Rico’ Diaz e Justina Machado, à sua esposa, Vanessa; Jeremy Sisto interpreta Billy, o irmão psicopata de Brenda; Tina Holmes como Maggie; Lili Taylor como Lisa, a mãe da filha do Nate. E ainda há espaço para a menção de três excelentes atores que emprestaram o seu talento para a série de Alan Ball: James Cromwell como George Sibley, o segundo marido de Ruth; Kathy Bates como a amiga de Ruth, Bettina; e Patricia Clarkson como Sarah, a irmã de Ruth.
Six Feet Under merece ser vista não só pelo tema diferencial de uma família que ganha a vida como agente funerária, mas também por atingir um nível de roteiro como poucas séries o fizeram, principalmente nos primeiros episódios. Quem quiser mais detalhes pode se aventurar pelo Wiki da série.