Crítica | O Homem nas Trevas 2
Lançado no ano de 2016, o primeiro O Homem nas Trevas foi uma grande surpresa pela sua qualidade e um sucesso. Produzido pelo mestre Sam Raimi e dirigido por Fede Álvarez, o longa contava a história de um grupo de jovens ladrões que invade a casa de um homem cego indefeso em busca de um suposto dinheiro que ele ali guarda. Porém, de indefeso o homem não tinha nada.
A produção teve um custo de cerca de 10 milhões de dólares e arrecadou uma cifra próxima de 160 milhões de dólares. Com um filme de altíssima qualidade que obteve um lucro absurdo, era óbvio que uma sequência não demoraria a ser lançada. Tendo sido filmado todo na segunda metade do ano de 2020, O Homem nas Trevas 2 foi lançado em 2021 com Rodo Sayagues substituindo Fede Álvarez na direção e mais uma vez com roteiro assinado pelos dois. Entretanto, enquanto o primeiro filme se apresenta quase como um slasher onde o antagonista cego surge como uma ameaça imparável, nesse segundo o roteiro o transforma em protagonista e dá uma guinada inexplicável rumo à redenção do personagem, o que provoca enorme estranheza no espectador.
Na trama passada oito anos após os eventos do primeiro filme, o veterano navy seal cego Norman Nordstrom está morando com sua filha de onze anos ainda nos arrasados subúrbios de Detroit. Com convivência social restrita ao máximo, a garota é criada pelo pai para se tornar uma sobrevivente. Entretanto, ao dar um passeio com uma veterana de guerra que trabalha como florista e também é o mais próximo de um amigo que Norman conhece, a garota tem um tenso encontro com um traficante de drogas em um posto de gasolina. Esse encontro acaba tendo péssimas repercussões, com a gangue sendo sequestrada e cabendo a Norman resgatá-la.
O primeiro grande erro do filme é eliminar o elemento claustrofóbico que seu predecessor possuía e tentar inverter a perspectiva. Na primeira película, Norman estava completamente em seu domínio, o que elevava a tensão ao máximo, pois acompanhávamos a luta do grupo de ladrões para sobreviver em um lugar sem nenhuma luz, onde eles não conheciam absolutamente nada, enquanto eram caçados por alguém extremamente inteligente e implacável. Entretanto, nessa segunda película, tal elemento ocorre por alguns minutos, mais precisamente na sequência do sequestro da garota. Infelizmente esse aceno ao original dura pouco e logo depois somos apresentados a Norman tendo que cair no mundo e ir a lugares estranhos para tentar achar a garota. Isso poderia ser bem interessante, porém o que temos é o personagem resolvendo tudo de maneira extremamente tranquila, praticamente sem nenhum desafio. Nos momentos onde Norman precisa enfrentar inimigos, seu comportamento ao super-herói cego Demolidor, ainda que com instintos homicidas.
O outro grande erro do filme é a tentativa de criar uma jornada de redenção para o personagem. No original, fica mais do que claro que Norman é um personagem extremamente vil, ainda que um fato traumático tenha sido um gatilho para seu comportamento. Porém, desde o primeiro momento fica apontado que isso não é justificativa para ele ser como é. Já nesse segundo filme, o diretor/roteirista insere alguns momentos de ternura entre o protagonista e a garota, além da sua jornada para resgatá-la, com o único intuito de despertar simpatia no espectador. Entretanto, essa guinada beira a canalhice, tendo em vista que no primeiro filme é mostrado que o personagem sequestrou, torturou e cometeu violência sexual contra uma mulher. Mesmo com ele reconhecendo para sua filha adotiva que é um monstro, o estrago da tentativa de redenção já está feito.
Como ponto positivo, o diretor Sayagues demonstra ter aprendido bem com seu amigo Fede Álvarez a direção de cenas de suspense e ação. Ainda que fugazes, elas são bem conduzidas e eficientes. As cenas de combate são muito bem coreografadas e extremamente brutais, exigindo muito comprometimento do ator Stephen Lang e da equipe de dublês. Aliás, Lang entrega outra vez uma ótima interpretação, mesmo que dessa vez o roteiro mais comprometa do que ajude.
É compreensível que a equipe criativa por trás de O Homem nas Trevas 2 não quisesse entregar mais do mesmo. Porém, ao se desviar demais do original e tentar estabelecer uma nova dinâmica para um personagem imperdoável, entregaram um filme que apesar de ter cenas eficientes de ação e suspense, desperta incômodo e até mesmo afastamento no espectador.