Tag: Christopher Abbott

  • Crítica | Tyrel

    Crítica | Tyrel

    Tyrel é um filme de Sebastian Silva, que mostra o personagem-título vivido por Jason Mitchell indo junto ao amigo para uma viagem nas montanhas de Castkills, em uma festa de aniversário de um desconhecido que tem laços com esse amigo. Por ser desconhecido da maioria das pessoas que lá estão, o protagonista fica completamente deslocado em um primeiro momento e passa a ser incomodado não só por sua timidez, mas também pela indelicadeza das outras pessoas.

    O modo de interação daquele grupo de pessoas é para Tyrel algo estranho, não só pela quantidade absurda de palhaçadas que ali impera, mas também por conta do incômodo deles com a sua presença. O motivo dessa diferenciação não é dita abertamente, mas através dos eufemismos e brincadeiras de cunho preconceituoso, se nota que a questão envolve a cor de sua pele.

    O único ser vivo com que Tyrel consegue estabelecer alguma conexão é com o cachorro da casa, basicamente aludindo a questão de que um animal irracional não liga para questões raciais, tampouco é capaz de transmitir preconceitos por meio de atos jocosos ou de preconceito velado, assim como também não faz questão de estabelecer um verniz social para esconder qualquer falha de caráter.

    O protagonista se sente incomodado e importunado e nem o seu conhecido parece fazer questão de protege-lo dos ataques ou sequer frear as gracinhas preconceituosas, basicamente porque ele não percebe o seu erro e nem dos outros, por não entender como racismo os impropérios ditos na casa onde estão todos. A situação do personagem se agrava tanto que ele decide se refugiar na casa de uma vizinha que ele viu assim que chegou, pois nem conseguir dormir ele consegue, provavelmente não só por conta do barulho que o grupo faz, mas também pela sensação de não pertencimento àquele microcosmo, além da repetição inconveniente de toda sorte de pressão racista e lembranças do passado, onde tinha que lidar com isso sem necessariamente ter maturidade suficiente. Ao contrário do que se falou por quem viu, Tyrel não é uma nova versão de Corra!, até porque o objetivo é claramente outro, não há catarse ou revide, mas apenas a contemplação do quão baixo o ser humano pode mergulhar.

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  • Crítica | Ao Cair da Noite

    Crítica | Ao Cair da Noite

    Se tem algo que a sétima arte é capaz de fazer, é tocar seu espectador. Com a imagem, o som, o texto, uma narrativa tem a capacidade de transcender os limites de alguns dos nossos sentidos, ou seja, ela provoca reações. Para um filme causar reações, sejam externamente físicas como o levantar dos braços em comemoração numa cena triunfante, ou íntimas como o desconforto em uma sequência que lhe incomoda, o filme deve ser ou muito bom ou muito ruim. Ao Cair da Noite (It Comes At Night) é um exemplo ímpar de como a arte do cinema pode tomar conta da sua mente por duas horas e te presentear com algumas sensações, quando os créditos sobem o filme não te deixa, ele fica com você ainda por muitos dias, te fazendo refletir, reagir.

    Trey Edward Shults, diretor e roteirista do longa, tem no currículo o incrível Krisha, filme que nos mostra de cara como Trey sabe construir uma atmosfera imersiva e criar personagens tridimensionais e propensos a identificação. Em Ao Cair da Noite, o diretor nos coloca em um futuro aparentemente não tão distante, em que uma doença desconhecida e contagiosa mantém uma família – composta pelo casal Paul (Joel Edgerton) e Sarah (Carmen Ejogo) e pelo único filho Travis (Kelvin Harrison Jr.) – refugiados dentro de uma casa no meio de uma floresta. A “paz” é contrariada quando a família recebe a visita de novas pessoas.

    Como em A Bruxa (The Witch), que inclusive é da mesma distribuidora, a A24 – o longa teve um marketing que o vendeu como terror e teve/terá reações decepcionadas de parte do grande público, não que o longa não tenha uma veia de horror, mas aqui o suspense paranoico e sem grandes jump scares é que prevalece. Suspense esse que é arquitetado da maneira mais ambígua possível, enquanto a trama possa parecer lenta e sem grandes acontecimentos, é só observar mais a fundo que percebe-se o quão complexo e alarmante é o caminho que a trama segue, deixando com que o silêncio se case com uma trilha musical singular, a fotografia escura e composta por sombras e silhuetas dê às cenas incríveis pontos de vista, e que as personagens pareçam críveis.

    Acompanhamos a trama pelos olhos do adolescente Travis, e como Shults trabalha os impactos de um “pós-apocalipse” na vida de um jovem é genial, mais do que tudo soa sincero e corajoso. Harrison Jr. entrega a atuação mais tridimensional com seu Travis, o personagem tem constantes pesadelos e isso vai tomando dimensões cada vez maiores e é neles que o filme abusa um pouco mais de seu viés do horror e do suspense. É através do garoto também que o longa expõe as relações de suas personagens, desde o cachorro Stanley até o pequeno Andrew (Griffin Robert Faulkner).

    Dando o tempo que sua história precisa, Ao Cair da Noite é como uma fragmento no tempo, nem um pouco preso em obrigações de se explicar tudo, o filme não subestima seu espectador e soa como uma das muitas tristes histórias que o universo do longa abriga. É uma aula de construção de expectativa, ambiente e personagens, além de ser impecável nos responsáveis pelo filme causar tantas sensações: imagem e som. É um casamento perfeito. Shults entrega um daqueles filmes memoráveis, que te faz ficar inquieto na cadeira do cinema, que te faz torcer e criar fortes relações com o que se vê em tela mesmo que seja um sentimento inevitavelmente pessimista levando em conta  tudo que já se viu. É de provocar reações, é de ser como um peso que você carrega nas costas quando sai do cinema. Pesado. O trabalho de Shults é a confirmação de que o terror e suas variáveis está em alto nível e de que seu diretor é uma das promessas dessa nova geração.

    É de sair do cinema e se enxergar como humano, e falho. Ao Cair da Noite é desses.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.