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  • Crítica | Cabras da Peste

    Crítica | Cabras da Peste

    Cabras da Peste é uma comédia policial brasileira que brinca com os estereótipos das antigas produções de ação que passavam nas sessões na tv aberta, as mesmas que colocavam policiais de estilos completamente diferente juntos, valendo-se de choques culturais ou raciais para gerar atrito em meio a uma missão de difícil solução. O filme conta a historia de dois policiais franzinos, um nordestino e outro do sudeste que por forças do destino são obrigados a trabalhar juntos.

    Há dois cenários iniciais que o diretor Vitor Brandt (Copa de Elite e Historietas Assombradas: O Filme) apresenta: o primeiro é a cidade do interior nordestino Guaramobim, que tem em Edmilson Filho um policial voluntarioso e trapalhão chamado Bruceuillis Nonato, e outro local é na cidade, mostrando Trindade, um pacato burocrata, interpretado por Matheus Nachtergaele, obrigado a agir em campo contra sua vontade. Ambos são fracassados em suas missões e acabam unidos pelo desalento de não terem êxito como policiais sérios.

    O humor do filme se assemelha ao visto nos filmes de Halder Gomes, como Cine Holliúdy e Shaolin do Sertão. Gomes dirigiria o filme a princípio, mas ao longo do projeto se decidiu que ele assinaria a produção executiva. Ainda assim não é difícil perceber as marcas de seu cinema, seja no fato de não ter receio em usar sotaques e dialetos próprios de sua localidade, ou no escracho do humor físico, que por mais que seja primário não trata o espectador como bobo.

    O fator mais engraçado do filme é o excesso de informações desencontradas. As falas dos personagens são quase sempre incompletas, de modo que a percepção é sempre deturpada. O roteiro faz questão de deixar as situações ambíguas para provocar um humor de erros que, apesar de bem simples, é bem feito e combina bem com a abordagem proposta. Os diálogos lembram o nível de explicação das telenovelas populares, e esse fator resulta em uma boa mistura com os clichês de filmes e seriados policiais dos Estados Unidos.

    Cabras da Peste é charmoso, engraçado, tem um elenco que funciona de maneira entrosada, com uma química exemplar entre Nachtergaele e Filho. Brandt um filme que conversa bem com a comédia tipicamente brasileira, com temperos e referências aos filmes humorístico de Ivan Reitman e John Landis. Seus personagens são erráticos, engraçados e muito humanos. O longa é engraçado, direto, brinca bem com os defeitos e incongruências dos filmes de ação antigos, e o faz com um charme e tempero próprio do cinema de Halder Gomes.

  • Crítica | O Shaolin do Sertão

    Crítica | O Shaolin do Sertão

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    Halder Gomes volta a direção em 2016 cheio de expectativa com O Shaolin do Sertão após o sucesso do surpreendente e bom Cine Holliúdy de 2012.

    Durante os anos 80 em Quixadá, interior do Ceará, um fã dos filmes chineses de artes marciais vai atrás de treinamento após desafiar um lutador de vale tudo que está fazendo um tour em várias cidades pelo sertão.

    O roteiro de Halder Gomes baseia o seu enredo na estrutura simples dos filmes que ele pretende referenciar: o cinema chinês de luta marcial dos anos 60 e 70. O nome do protagonista não é por acaso, Aluísio Li é referência direta para o maior astro do gênero: Bruce Lee e seus filmes tão reverenciados pelo mundo todo.

    O grande diferencial do roteiro é manter a regionalidade do sertão cearense sabendo utilizar a paisagem e os personagens típicos, mantendo a caricatura para os fins da comédia. Outro trunfo é fazer com que a história se torne universal atingindo os temas comuns. ALuisio Li no fundo deseja duas coisas que todo mundo quer em alguma parte da vida: conquistar a garota que ele gosta ao mesmo tempo em que ganha independência da mãe.

    Um ponto interessante são os flashbacks da história que auxiliam a narrativa, ao invés de serem usadas como muletas. Elas inclusive vem acompanhadas de efeitos visuais que as deixam ainda melhores.

    A atuação é o ponto mais forte do filme. Edmilson Filho que interpreta Aluísio é de novo o grande nome do elenco, ofuscando quase todos que contracenam com ele. Igor Jansen como Piolho e Frank Menezes como Rossivaldo também se saem bem. Destaque ainda para Falcão como o treinador Chinês e Fafy Siqueira como a mãe Dona Zefa.

    A direção de Halder Gomes continua satisfatória e condiz perfeitamente com todos os clichês e convenções da comédia. O seu diferencial é manter a sua assinatura que é falar o cearês de Cine Holliudy agora de forma mais universal.

    A fotografia de Carina Sanginitto usa bem o vermelho e o amarelo que ressalta o clima árido e seco do sertão, e também provém o exagero que a comédia do filme se pretende. A edição de Helgi Thor é cadenciada e se destaca nas cenas de ação e no treinamento. No restante, é invisível e terminou por deixar o filme em um bom tempo.

    O Shaolin do Sertão deve agradar um vasto público que buscava uma história original em uma mistura nada convencional entre os filmes de arte marcial chineses com a nova comédia cearense.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | Cine Holliúdy

    Crítica | Cine Holliúdy

    CINE-HOLLIUDY

    Na década de 70 a televisão chegava aos lares nordestinos. Casas de famílias abastadas eram cobiçadas pelo fato de possuírem o aparelho que, assim como em escala global, modificou o entretenimento no interior do Ceará. A mudança vinda com a chegada da televisão parecia tão definidora que políticos utilizavam o aparelho em suas campanhas como forma de conquistar o povo. Diante desta novidade, o cinema parecia ameaçado por esta revolução.

    Reverenciando a sétima arte, Cine Holliúdy narra a saga de Francisgleydisson, um brasileiro resiliente, casado, pai de um menino, e que viaja de povoado a povoado Ceará adentro exibindo diversos filmes para um público variado. A história é considerada a primeira a ser falada no dialeto local, o cearês, o que justifica a exibição de legendas no longa-metragem para o público que desconhece o sotaque. Ao utilizar uma linguagem local, a produção demonstra a pluralidade de pronúncias regionais do país, enriquecendo uma trama que se torna universal por meio da paixão ao cinema, dando ao público maior imersão nesta realidade.

    Como um projetista itinerante, o personagem central e sua família carregam consigo parte da representação da sétima arte. São os fornecedores do momento em que a realidade entra em suspensão e a atenção e foco estão centrados num espaço em branco capaz de contar qualquer estilo de história. Dentro de um estado ainda rudimentar em relação à urbana região sudeste, o cinema representa a quebra da rotina, uma fuga que abre outra janela diferente da observada dia a dia. Mesmo sentindo-se uma relíquia em tempos do surgimento televisivo, o personagem prossegue em sua profissão, como uma sina, uma luz que leva ao povo o divertimento e uma pílula de cultura.

    Ao mesmo tempo em que dialoga com muito carinho sobre a experiência cinematográfica, a narrativa demonstra o quão transformadora é esta jornada para o público. Mesmo que momentaneamente, as cidades se modificam após as sessões de exibição de aventuras variadas: chineses que desejam vingança, lutadores melhores que Bruce Lee e, quando calha do velho projetor falhar, surge em cena o próprio Francisglaydisson para acalmar os ânimos e, como um contador de histórias orais, prosseguir a narrativa.

    A cena em que o ator Edmilson Filho relata as futuras cenas do filme que era exibido, não fosse um problema no projetor, é talentosa e demonstra o amor do personagem pelo cinema, ao mesmo tempo em que traz comicidade pelas imitações exageradas. Como se a produção rompesse a barreira entre o público e se transformasse em um diálogo entre amigos cinéfilos que repassam as melhores cenas assistidas. Tentando salvar a noite do fiasco, o próprio projetista se transforma na ação central e sintetiza a força da arte e do cinema como comunicação.

    Ao demonstrar o conflito entre a televisão e o cinema e a força da arte, a produção conseguiu destaque também fora das telas. Mesmo com poucas cópias em exibição, conseguiu uma excelente média de bilheteria, ultrapassando números de blockbusters em relação à quantidade de público x cópias em circuito. A obra comprova o bom momento vivido pelo cinema brasileiro e evidencia – como muitos outros veículos destacaram – que é possível contar histórias sem o uso da nudez de atores, um onipresente background político-militar ou a utilização da estética da pobreza para contá-las. Uma bonita narrativa cinematográfica made in Ceará.