Tag: Emilia Silveira

  • Crítica | Silêncio no Estúdio

    Crítica | Silêncio no Estúdio

    Silêncio no Estúdio é um documentário que discorre sobre a trajetória da jornalista, poeta e romancista Edna Savaget. O filme é capitaneado pela cineasta Emilia Silveira, responsável pelos excelentes Galeria F e Callado. Mais uma vez seu cinema desbrava uma figura pioneira, que entre os anos 1950 a 1990 produzia programas de televisão que davam voz a um estudo de crítica literária e cultura muito pungente, com alma e identidade muito próprias.

    Silveira costuma fazer filmes muito íntimos, mergulhando na rotina e identidade de seus biografados, e com Edna não é diferente. O estudo vai desde o complexo que ela tinha por se considerar feia, até sua facilidade em se comunicar com o espectador. Segundo o filme, Edna sabia transmitir suas ideias, muitas vezes sabendo demonstrar sua intelectualidade, mas de um modo simples e não academicista. A franqueza com que ela tratava o público era enorme, e ajudava a enriquecer esse personagem.

    A história contada também passa pelos dramas pequenos e usuais, e também pelos que a atormentava terrivelmente, desde o fato de perdoar as traições do marido em virtude do medo de se desquitar até mesmo a depressão que por vezes lhe atacava. Toda a trajetória dela como comunicóloga é amplamente discutida em riquezas de detalhes por meio de depoimentos de familiares e amigos.

    A alma de Edna é muito bem explorada e exemplificada, mesmo para quem não apreciou seu trabalho e método ainda em vida, e essa talvez seja a maior das marcas do cinema de Silveira, que consegue fazer em filmes curtos e econômicos um panorama bastante emocionado, sem nunca deixar a informação e análise crítica de lado. Silêncio no Estúdio consegue reverenciar sua figura de estudo sem soar chapa branca, fato que é raro dentro desse filão.

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  • Crítica | Callado

    Crítica | Callado

    Após algumas falas destacadas do escritor Antônio Callado, o documentário se encaminha para uma cena de A Chinesa, clássico de Jean-Luc Godard, em preto e branco. Callado, de Emilia Silveira, é acima de tudo político, como eram também Setenta e Galeria F, filmes anteriores que se debruçavam sobre os anos de governo militar. O perfil do jornalista é traçado também por sua militância política.

    A verborragia e a força das palavras do biografado são muito bem capturadas nas entrevistas que Emília escolheu para figurarem em seu filme. O pensamento politico e ideológico de Antonio é bastante presente em seu cotidiano, assim como sua luta contra a censura. Callado disse que já sentiu vontade de entrar para o Partidão, o PCB (Partido Comunista Brasileiro), principalmente por sua admiração por Luis Carlos Prestes, mesmo que o próprio jamais tenha se assumido como comunista.

    As entrevistas com Davi Arrigucci, Carlos Heitor Cony, Eduardo Jardim, Fuad Atala, Lalo Leal e outros tantos amigos, familiares e colegas da Academia de Letras servem para inflar ainda mais a sensação de que o personagem era um sujeito imortal para a literatura. O roteiro utilizou muito das fontes de entrevistas dadas à parte desses investigados pela lente de Emilia, tornando a obra final um material colaborativo muito forte, de certa forma evocando as ideias e ideais do cronista analisado.

    O filme convida o espectador a ser íntimo do personagem-título. A escolha por apresentar as frases do escritor junto a suas fotos antigas é um recurso inteligente, já que encurta a distância do personagem com aqueles que não conhecem sua obra. A memória do literário é muito bem fotografada neste longa de Emilia Silveira, que mais uma vez entrega um longa reverencial bastante terno, trazendo a tona bons momentos de reflexão sobre a vida e obra do homem que foi Antônio Callado.

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  • Crítica | Galeria F

    Crítica | Galeria F

    História pessoal, contada por meio de um documentário que se insere no cotidiano de seu biografado, Galeria F é o novo filme de Emília Silveira, a mesma diretora do excelente Setenta, sendo este também um novo longa sobre a resistência contra o Regime Militar. Theodomiro Romeiro dos Santos começou a se envolver com a luta política quando tinha 14 anos e foi capturado aos dezoito anos, passando boa parte de sua juventude em cárcere e tendo declarada sua sentença de morte.

    O caminho percorrido pela câmera é o da fuga que ocorreu com o militante, reconstruindo cada um de seus passos até os lugares onde se hospedou quando estava foragido. Guga, seu filho, acompanha o pai e o ajuda nessa jornada de reconhecimento. O arquivo digital permite a diretora manter sua câmera ligada o tempo inteiro, fazendo finalmente seu objeto de análise sentir-se tranquilo para não mais atuar de frente das lentes.

    Os relatos de Theo as vezes fazem falhar sua memória, sendo essas lacunas preenchidas por seus amigos e companheiros de lutas, que estiveram no presídio Lemos de Britto consigo, além dos partidários do PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário) que servem para testificar suas palavras. O outro lado do filme é focado em Guga, que é quase um co-protagonista. O herdeiro busca entender a psique do pai e a rotina que o fez chegar onde chegou e o testemunho do filho é bastante emotivo e compreensivo, mesmo quando seu pai era rígido com ele na juventude, entendendo que a adolescência de Theodoro lhe foi tirada ao ficar tanto tempo aprisionado.

    Silveira faz um mergulho profundo na vida de Romeiro dos Santos, inclusive mostrando rapidamente a proximidade dele com ACM – Antônio Carlos Magalhães – ex-governador baiano por três mandatos e coronel nordestino. No entanto, a fórmula de seu filme se esgota cedo demais, tornando-se pouco dinâmico e menos inspirado que Setenta, ainda que tenha bons momentos em sua projeção.

  • Crítica | Setenta

    Crítica | Setenta

    Emilia Silveira é a responsável pela curadoria das entrevistas que permeiam o filme Setenta. O início, com a câmera junto ao carro pelas estradas da praiana cidade carioca, tenta remeter à simplicidade da vida cotidiana, ainda que os dias nos anos 1970 não fossem “normais”. A perseguição aos homens era um massacre, próximo de um comportamento padrão daqueles que faziam política e que impediam qualquer outro que não fosse conveniente fazê-lo pensar.

    O roteiro de Sandra Moreyra retrata o modus operandi dos 70 presos políticos que seriam exilados no Chile em troca da vida do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher. Os que estavam encarcerados eram encarados como guerrilheiros, apesar da maioria dos manifestantes sequer saber atirar, isso se estes estivessem armados.

    Alguns dos presos políticos também são mostrados no documentário lançado na época, e filmado no Chile, Brasil: Um Relato de Tortura. A maioria dos quase idosos militantes tem de segurar as lágrimas ao escavar os momentos emocionais pelos quais passou. O compartilhar dos ideais prossegue na vida da maioria deles, mas a dor da lembrança inevitavelmente faz relembrá-la. Famílias eram separadas, humilhações impingidas tanto fisicamente, pela tortura, como também por meio do emocional dos manifestantes e dos seus companheiros. A distância entre os encarcerados e suas famílias é escrutinada no documentário, assim como é detalhado o cerco aos subversivos.

    O nível de pessoalidade é grande não só pelos testemunhos, mas pela movimentação da câmera que mostra os exilados na intimidade de seus lares, no lugar e país onde muitos achavam que não voltariam a pisar. A correria dos que planejavam as ações ofensivas visava contra-atacar todo o desrespeito que sofriam os que se opunham ao regime. Apesar da multiplicidade de ideais dos que estavam ao lado oposto dos poderosos, a truculência com que eram tratados era o ponto em comum.

    O argumento básico da luta dos entrevistados era pela liberdade. O esforço da maioria era realizado para atingir este ideal, dedicando-se cem por cento de suas vidas à briga pela livre expressão de pensamento, por vezes até deixando, pela falta de tempo, de cuidar dos familiares e daqueles que os cercavam, especialmente em tempos em que a clandestinidade era algo comum ao cotidiano dos militantes.

    A baixa bilheteria do filme, quando em cartaz, é um mistério, pois, apesar de tratar de um assunto antigo, tem em seu caráter uma estética moderna, aprofundando o tema que documentários já haviam iniciado, mostrando os ecos de um tempo opressor, elemento que evidencia o quanto o país deixou de evoluir e se deseducou graças a isso. Setenta vale ser visto especialmente pelo resgate de histórias que convenientemente são esquecidas, quando deveriam ser frequentemente marteladas na mente dos brasileiros para que os erros pretéritos não mais nos assombrem.

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