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  • Crítica | Chatô: O Rei do Brasil

    Crítica | Chatô: O Rei do Brasil

    Chatô O Rei do Brasil 1

    Após uma longa espera, aproximadamente vinte anos depois do início da produção, Chatô: O Rei do Brasil chega as salas de cinema brasileiros com uma distribuição curta, fruto do óbvio descrédito que o seu diretor Guilherme Fontes tem após polêmicas que envolvem uso de verba pública, processos criminais e muitos outros espectros polêmicos. O corte de 102 minutos contém uma abordagem singular com um conjunto de influências que vai muito além do comum aos blockbusters brasileiros.

    A obra de Fernando Morais é muito completa, tanto na pesquisa histórica, quanto na construção fantasiosa da figura de Francisco Assis Chautebriand. E a vontade de Fontes – que primariamente sequer seria o diretor – em retratar o comunicólogo passa por óbvias comparações com Cidadão Kane de Orson Welles graças a temática, passando também por uma aura utópica que faz lembrar as viagens mentais de David Cronenberg e o hermetismo visto nos filmes de Jim Jamursch. Na primeira cena, Marco Ricca já aventa uma das origens de Chatô, reunindo elementos típicos do teatro em um dialeto metalinguístico.

    Chateubriand era um homem de excessos e, para representar tais extravagâncias, a fotografia de José Roberto Eliezer, a direção de arte e o roteiro andam lado a lado, em um trabalho primoroso que ajuda a construir o cenário político e midiático o qual o biografado vivia. Além da questão do deslumbre visual, os personagens são bem retratados, em especial Paulo Betti, com um jocoso Vargas (com muito mais alma que Tony Ramos, no filme recente Getúlio), Andrea Beltrão como o interesse amoroso de quase todos os homens, a Senhora Vivi, e até Gabriel de Braga Nunes, como o antigo pupilo e mais tarde rival Rosemberg, em uma performance que faz perguntar o que aconteceu com sua promissora carreira.

    No entanto, apesar das ótimas apresentações de coadjuvantes, que ainda contavam com Leandra Leal adolescente e com o esplendor de Leticia Sabatella, os holofotes estão todos sobre Marco Ricca que consegue como poucos representar o glamour, grosseria e carisma de sua personagem, que infelizmente será pouco visto, graças ao ínfimo número de salas em que será exibido – em torno de quarenta – somando Rio e São Paulo. Tal agouro e o trabalho de guerrilha de Fontes em fazer o filme circular é certamente atrelado ao salário de seus pecados enquanto administrador de verba e como cineasta.

    Muito se fala a respeito desta polêmica, e o conjunto de boatos faz as informações se desencontrarem. A reunião de Fontes com Francis Ford Coppola gerou uma comparação curiosa e bastante irônica, pois, em Apocalypse Now ocorreu também um problema como este com estouro de orçamento e produção demorada – sem verba pública, afinal, a máquina de Hollywood funciona com outros combustíveis. O processo no filme de guerra também se arrastou por anos e o resultado final é uma obra prima, comparável as melhores obras do cineasta. Curioso como um pecado de Copolla tem um peso e o de um inexperiente (e brasileiro) tem para parcela do público e crítica, analistas que se permitem ser tão criteriosos e exigentes, mas que apresentam dois pesos nestes diagnósticos.

    A metalinguagem utilizada no programa de tribunal, aberto ao público é inteligentíssima, conseguindo atingir toda a megalomania e egocentrismo presentes no ideário de Chateubriand, exibindo de modo burlesco, curioso e colorido, ao mesmo tempo em que discute hipocrisia, jogo de poder e influência econômica e social. A harmonia entre o formato e o conteúdo de contestação é impressionante, com um poder pouco visto mesmo dentro do melhor dos cenários dos filmes nacionais.

    Chatô: O Rei do Brasil é fruto de seu meio e filho de sua própria história. A grandeza narrativa e dramatúrgica vista no filme que Fontes orquestrou só fazem sentido graças a atualidade e aos temas políticos discutidos nos anos 2010, em especial no que tange o monopólio midiático. Os paralelos com a manipulação da imprensa são atuais, mostrando que a demora em se definir enquanto filme fez amadurecer o texto do primeiro tratamento do roteiro, claramente modificado em essência, desde sua concepção até o resultado final exibido na tela grande. A política e a origem de Chatô são respeitadas, o que faz valer ainda mais o esforço em tornar real este belo quadro sobre um dos mais notáveis brasileiros que já existiu.

  • Crítica | A Floresta Que Se Move

    Crítica | A Floresta Que Se Move

    A Floresta Que Se Move 1

    Adaptação bastante livre da obra shakesperiana MacBeth, o novo filme de Vinícius Coimbra realiza um roteiro que mistura poesia e uma esquematização bastante normativa, obviamente sem sucesso em apelar para ambos os aspectos. O texto tenta dar alguma sobriedade aos personagens, quase todos pessimamente executados, mesmo pelos atores mais gabaritados, a exemplo de Nelson Xavier e Angelo Antônio.

    A trama se passa nos anos atuais, na escalada pela presidência de um banco. Elias, vivido por Gabriel Braga Nunes, acaba de ser promovido a vice-presidência de seu ofício. Sua timidez e fraqueza de pensamento dão vazão a nefasta influência de sua esposa, Clara, com Ana Paula Arósio retornando após um longo período sem “exercer” sua imagem.

    A dramaturgia do filme é nula; as falas forçadas são semelhantes às piores telenovelas, com substância equivalente as microtramas do seriado Sandy e Júnior. A quantidade de absurdos mostrados no combalido texto é uma ótima alegoria aos problemas da feitoria do longa. A trama de assassinato, típica da peça teatral, é conduzida do modo mais atrapalhado e repleto de incongruências possíveis, factoide que se faz perguntar se o script sofreu qualquer tratamento antes de começar a ser rodado nas locações estrangeiras.

    Mesmo os momentos onde a luxúria e o sexo devem prevalecer, não há qualquer apelo à sensualidade, mesmo com as belas feições de Arósio e Braga Nunes. Nada em absoluto funciona, aproximando disso apenas os momentos de investigação policial, digno de nota por ser ruim, e não péssimo, como todos os outros momentos do filme.

    As motivações de Elias são completamente erradas, não pela ganância, mas sim pela automática mudança de postura em relação a cometer crimes. Não há a mínima construção desse declínio espiritual, moral e de caráter, ao contrário, tudo é conduzido do modo mais fraco e risível possível. As cenas de encontros de fantasmas são dignas de gargalhadas, além de reunir em si uma porção enorme de erros de continuidade e de concepção, inclusive em relação às causas da morte.

    A Floresta Que Se Move tenciona uma proposta de difícil execução, e que não consegue se valer sequer da experiência de seu diretor, que já havia realizado o interessante – e de proposta completamente diferenciada – A Hora e a Vez de Augusto Matraga, além de ter realizado episódios na mini-série JK, que nem em seus piores momentos (e não foram poucos, no seriado) conseguiam exprimir tanto vazio quanto nesta obra que se baseia em um texto tão laureado, exibindo uma origem para a loucura bastante porca e tratando seu público como seres imbecilizados.