Tag: Quadrinhos de Samurai

  • Resenha | Satsuma Gishiden: Crônicas dos Leais Guerreiros de Satsuma – Volume 1

    Resenha | Satsuma Gishiden: Crônicas dos Leais Guerreiros de Satsuma – Volume 1

    A editora Pipoca e Nanquim trouxe acertadamente para o Brasil o mangá de Hiroshi Hirata baseado no gênero samurai, O Preço da Desonra, onde um personagem cobra promissórias de dívidas de vida nos diversos clãs ao longo do território japonês. Em 2020 começou a se publicar a serie mais longeva e famosa do autor, um Gekigá (mangá adulto) publicado entre 1978 e 82, denominada Satsuma Gishiden: Crônicas dos Leais Guerreiros de Satsuma, dividida em três volumes, sendo o primeiro, o alvo desta análise.

    As histórias são mostradas em tom de crônica, pequenas e de tom mais épico e otimista que a publicação anterior do autor, até pelos protagonistas serem bravos guerreiros, e não um cobrador de dívidas que visa a  desconstrução temática romantizada dos samurais, embora as histórias tratem logo de início a nefasta prática do Hiemontori, onde dois clãs antes de entrar em combate, “brincam” com uma presa soltando um bandido entre os exércitos, com lanças e armas entre eles.

    O quadrinho é super violento, mostra muitas vísceras e cortes em períodos longos sem fala, tendo alguns com quase 30 paginas sem qualquer diálogo. Os detalhes de armaduras, cavalos, fortificações são ainda maiores que nos mangás anteriores do autor, uma chance única de mostrar a criatividade e inventividade dele, ao mostrar narrativas mais clássicas do subgênero.

    Foca bem na humilhação dos samurais camponeses, fortificando a ideia de que Hirata não gosta de falar de samurais meramente reiterando a condição de guerreiros honrados. Aqui se vê gente pobre, que tem que lançar mão de trabalhos que pagam mal, além de mostrar as humilhações ligadas até a furtos e roubos para conseguir alimento. A desonra para os guerreiros ronins em serem chamados de mentirosos ou ladrões mesmo quando pegos em flagrante é apenas uma das humilhações mostradas ao longo das mais de 400 páginas nesse volume. Outra denúncia desconstrutora de reputações é dos embates em guerreiros de classes diferentes, onde a corda sempre arrebenta no mais fraco.

    As histórias sobre burocracia são mais enfadonhas, mas ajudam o espírito de tirar o romantismo do shogunato e dos samurais. Esse é o mesmíssimo caráter que Hirata já havia mostrado em O Preço da Desonra. Esses momentos servem de respiro entre as cenas de batalha, que quando ocorrem, simplesmente deixam o leitor embasbacado pela grafia e violência, que mesmo sem cores, ainda soam muito sanguinolentas

    O trabalho gráfico desta publicação é bastante bonito, possui um glossário no final, que explica o contexto histórico, como era o império, o governo e a economia de feudos. Apesar de não ter personagens tão memoráveis como foi com o cobrador Hanshiro no outro mangá, as histórias tem momentos muito épicos e vergonhosos, mostrando faces pouco exploradas da história do país milenar que é o Japão, com gente excluída em foco, e que resultam em leituras muito fluídas e prazerosas.

  • Resenha | O Preço da Desonra

    Resenha | O Preço da Desonra

    O Preço da Desonra é o primeiro mangá publicado no Brasil do autor Hiroshi Hirata. Conhecido no Japão por apresentar histórias de samurai elogiadíssimas, entre elas, Satsuma Gishiden, a história deste é  adulta, denominada como Gekigá e foi lançada entre 1971 e 73. Suas histórias são curtas, narradas a partir das experiências de Kubidai Hanshiro, que vem a ser um tomador de promissórias, que vai atrás da dívida entre os dojos e clãs de samurais.

    A primeira história já começa em meio a ação, com um samurai tentando comprar o direito à sua vida com uma promissória, regra essa estabelecida em algumas vertentes dos combates japoneses, embora essa prática seja atrelada a guerreiros covardes e não comprometidos com a tradição e principalmente, com a honradez. A desonra do título mora na dívida que o clã não quer assumir, e logo, aparece o cobrador das promissórias.

    O traço de Hirata é absurdo, em momentos de calmaria é super bem detalhado, nas batalhas, o nanquim transborda fluidez. É um trabalho único visualmente , os quadros valorizam demais os cenários, e as paisagens limpas tornam os combates em eventos ainda mais épicos, seja no conflito entre clãs ou no combate em que Hanshiro em alguns pontos é obrigado a fazer.

    As lutas com cavalos, os saqueadores, o abuso as mulheres, tudo é retratado de forma visceral, onde a beleza da violência se mistura a uma reflexão sobre atitudes profanas. Hirata desconstrói a imagem de super honrado ligada aos samurais, mostra homens mesquinhos, ingratos, onde até a covardia é um pecado subalterno perto dos tanto outros equívocos desses que deveriam ser defensores da honra burguesa.

    Os conflitos dentro dos clãs e as discussões sobre o monetário revelam dois aspectos, sendo o mais importante, a total desglamourização da figura dos guerreiros japoneses, e isso seria agravado até na série Satsuma Gishiden. O outro aspecto é o quanto aos samurais, que eram vistos como as pessoas mais honradas e corretas do Japão feudal eram tão humanas, cheias de falhas, sendo egoístas e até deploráveis, seja ao negar o compromisso pré-estabelecido com as promissórias, ou no suplicar por sua vida, sem pensar em todo o código de honra feito no juramento à espada que é feito. O Preço da Desonra é visceral, violentíssimo e tem em Hanshiro um protagonista perfeito para a condução de seu drama, tornando esse trabalho inglório em uma história rica, mesmo que o foco seja em momentos de descrédito e mácula.

    Compre: O Preço da Desonra.

  • Resenha | O Girassol e o Samurai

    Resenha | O Girassol e o Samurai

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    Desde a imigração japonesa em nosso país, no início do século 20, a conexão entre Brasil e Japão se mantém ativa, gerando bons frutos culturais. O mercado brasileiro de quadrinhos se mantém aquecido e receptivo aos diversos mangás lançados por diversas editoras e, simultaneamente, a cultura japonesa, e tal ligação com o oriente, transforma-se em material para que quadrinistas brasileiros desenvolvam suas tramas baseadas nesta rica cultura.

    Lançado pelo designer e ilustrador Eder Modanez de maneira independente, O Girassol e o Samurai apresenta uma breve história, situando o leitor sobre uma lenda folclórica em época que o sol havia sido roubado do céu e um guerreiro parte em uma jornada para resgatá-lo a procura de demonstrar seu valor perante o clã. A edição retoma um estilo popular na década de noventa, em uma era pré-internet: o formato do zine, produzido de maneira simples e artesanal. Um formato definitivo para que autores apresentassem seu projeto sem gastos excessivos na produção.

    A simplicidade da edição, composta em preto e branco, tradicional ao mangá japonês, se alinha com sua narrativa. Nesta primeira história, o autor optou por desenvolver a motivação de seu personagem central. Uma narrativa breve baseada em uma lenda, carregada de metáfora sobre a força do samurai.  Uma história folclórica que evidentemente sintetiza a base da composição de seu personagem, fundamentando argumento central de uma trama que será explorada posteriormente e deve funcionar como força-motriz para a motivação e caráter de seu samurai.

    De acordo com o próprio autor, a lenda foi inspiração para uma história que será desenvolvida posteriormente e terá o bairro da Liberdade, em São Paulo, típico e conhecido bairro oriental da capital, como cenário. Sendo esta história a introdução ao universo desenvolvido, bem como a ação inicial da personagem, uma história antes da história definitiva.

    Modanez mantém o blog Gigante Guerreiro sobre seu trabalho com maiores informações para aqueles que se interessarem na leitura. Também é possível adquirir a edição diretamente com o autor.

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  • Resenha | Vagabond

    Resenha | Vagabond

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    Quando falamos em história do Japão, mesmo aqueles que conhecem muito pouco têm alguns nomes que vem a cabeça como: Oda Nobunaga, Hideyoshi Toyotomi, Ieyasu Tokugawa, e claro, Miyamoto Musashi. Agora imagine uma história em quadrinhos contando a vida de um desses nomes. É isso que Vagabond é.

    Vagabond, de Takehiko Inoue, conta a história de Miyamoto Musashi, baseado na biografia existente. Takehiko é extremamente conhecido por seu trabalho em Slam Dunk, com alguns prêmios para este titulo e com Vagabond também não é diferente, atualmente possui 3 prêmios.

    Shinmen Takezo é um rapaz de uma pequena vila chamada Miyamoto que vai a guerra em busca de um nome para si, junto dele está seu amigo Hon’iden Matahachi que tem o mesmo objetivo. Sobrevivem por pouco da guerra e são ajudados por duas mulheres que roubaram as armas dos mortos na guerra, quando bandidos atacam a casa das mulheres Takezo enfrenta os bandidos enquanto Matahachi foge com uma delas. E assim começa a aventura solitária de Takezo, que logo mais tarde será rebatizado como Miyamoto Musashi.

    Ao contrário do que muitos pensam mangá não tem sempre o traço do Astro Boy de olho grande, Vagabond é um excelente exemplo disso. O traço é bem diferente do que normalmente você vê por ai e a riqueza de detalhes é incrível, embora não seja um dos meus traços preferidos. Uma das coisas que o autor consegue fazer de forma excelente é pelo olhar do personagem passar o que ele está pensando e suas sensações, é possível ver pelo olhar de Musashi sua evolução durante todo o mangá.

    Quanto à história, como disse, ela é baseada na biografia do Musashi e isso já bastante coisa, e o autor consegue traduzir o livro para quadrinhos de forma fantástica. Para quem gosta de mangá sabe que a forma narrativa é diferente das comics, quadros, imagens é tudo usado para a narrativa e para ambientar melhor a noção do leitor, e Takehiko faz de uma maneira extasiante em determinadas partes e calma em outras, fazendo a história correr extremamente bem. Para quem não conhece Miyamoto Musashi é um dos samurais mais conhecidos da história do Japão (se não O mais), grande estrategista e lutador, ele criou doutrinas tanto de comportamento quanto de luta e as escreveu em seu livro “O Livro dos 5 Anéis”, além disso, um dos grandes pontos de sua fama é o fato de ele ter ficado famoso em sua época por lutar usando duas espadas, uma em cada mão.

    Um dos pontos fracos de Vagabond é seus personagens, enquanto a história é focada em Musashi e Matahachi e te mostra a vivência dos dois e suas evoluções, ele simplesmente ignora qualquer outros personagens. Personagens secundários não são emotivos e você não consegue pegar profundidade neles, eles simplesmente ali estão pois o centro do mundo é Musashi. Falta um trabalho melhor nos personagens secundários, alguns que aparecem bastante dentro da história ficam um tanto quanto chatos pelo fato de você não conseguir pegar a motivação deles. A história não possui antagonista certo, a cada batalha é um oponente, após ele ser vencido que venha o próximo, não há um grande inimigo, embora este não faça falta.

    Vagabond é um mangá que conta a história de um personagem real da história japonesa, possui um excelente traço, uma narrativa empolgante e, embora os personagens secundários deixem a desejar, os personagens principais são carismáticos. Vale a pena para quem se interessa por história japonesa, vale a pena para quem gosta de história de samurais e vale a pena para quem gosta de boas lutas de espada.

    Compre: Vagabond.

    Texto de autoria de André Kirano.

  • Resenha | Blade: A Lâmina do Imortal

    Resenha | Blade: A Lâmina do Imortal

    blade - a lamina do imortal

    “Um dojô de estilo de luta espadachim e uma família encarregada de ensinar neste local. Pai, mãe e filha, juntos com todos os discípulos que ali residem e treinam diariamente, vivem uma vida pacata durante a “era de paz” do Japão. Então tudo muda, quando um jovem que está juntando outros espadachins sem nome e sem “estilo” por ai aparece reclamando uma vingança e mata os discípulos, o pai e sua esposa, deixando apenas a filha viva. Dois anos depois, após jurar vingança sobre o túmulo de seus pais a garota vai em busca de seu juramento. É recomendada que contrate certo homem como “guarda-costas”, e junto dele vai atrás dos que mataram sua família.”

    No geral, este é o plot, a história, que está por trás de Blade of the Immortal, ou Blade, A lâmina do imortal, nome que o mangá recebeu ao vir para o Brasil, de Hiroaki Samura. Parece simples, mas não é. Rin Asano, a filha que jurou a vingança sob o túmulo dos pais, quer matar Kagehisa Anotsu. Anotsu é denominado um gênio da espada, e mesmo sendo muito novo juntou sob seu comando um bando de espadachins e formou a escola “Itto-Ryu”. Pregando que as artes com espada nada mais eram que danças e não combate, ele quer reviver o espírito guerreiro do povo e acabar com os estilos que povoam o Japão.

    Para completar sua vingança Rin é recomendada a contratar um guarda-costas: Manji. Este é também conhecido como “Hyakunin-Guiri”, o matador de 100 pessoas. Um Ronin que desobedeceu a ordem de seu senhor e por causa disso foi perseguido, durante a perseguição foi matando um atrás de outro, assim recebeu a alcunha de matador de 100 pessoas. Durante esta matança sua irmã ficou louca com algo que ocorreu e ele passou a cuidar dela. O especial é que enquanto cuidava de sua irmã uma monja apareceu e colocou em seu corpo os “kessenchus”, vermes simbióticos que reconstroem seu corpo assim que ele é ferido, fazendo com que ele se tornasse imortal. Após sua irmã ser morta por bandidos que queriam ser conhecidos como “os que mataram o Hyakunin-Guiri” ele jurou que iria matar 1000 bandidos e assim os Kessenchus iriam sair de seu corpo e ele morreria. Por esse juramento ele começou a ajudar a Rin e junto dela enfrentar os membros da Itto-Ryu um após o outro.

    Após falar tanto da história do mangá é hora de falar sobre ele como um todo. Blade é estritamente um mangá da era samurai do Japão, era que após a unificação todas as terras estavam sob ordem do Xogum e dividida entre daimyos, e como tudo que relata essa época é repleto de batalhas com espadas e tudo o que tem direito. Porém ao contrário de muitos outras histórias que mostram batalhas de espada, Blade demonstra as batalhas como elas realmente eram, em pouco tempo de combate pelo menos um membro dos lutadores já está voando, ISSO é uma batalha de espada, não é ficar batendo espada durante uma hora e só depois dar o golpe final. Pelo personagem principal ser imortal, você o vê sendo realmente cortado em varias lutas.

    Outro grande ponto do mangá é que o antagonista principal não é, necessariamente, o vilão da historia, ele TEM um lado humano e que é extremamente bem trabalhado, tornando Anotsu um personagem carismático e que você torce por ele também em muitos pontos da historia. Manji, protagonista e “herói” têm seu comportamento no melhor dos padrões do “anti-heroísmo”, é briguento, fala muito palavrão, não foge a briga e vive discutindo com a Rin. Rin, personagem que você fala que é boba, porém ela também te conquista com sua inocência e dúvida em certos momentos. Parando para analisar, poucos são os personagens que participam da trama que não tem um fundo muito bem trabalhado. Cada um tem seu motivo para estar na historia, tem sua força de vontade para viver e suas dúvidas a serem respondidas. Samura consegue mostrar a essência de alguns personagens de maneira tão forte que algumas vezes você torce pro antagonista ao menos fugir ou, em certos momentos, pra vencer. Aliás, um dos meus personagens preferidos faz parte da Itto-Ryu que é o Taito Magatsu, também antagonista a dupla de personagens principais do Mangá.

    A história do mangá esta sendo distribuída em arcos. Quatro já terminaram, entramos no quinto arco de historias, e este está sendo dito que será o último. Cada arco apresentou novos detalhes a trama e fechou alguns, porém não todos, mudou objetivo de alguns personagens, enfim, cada arco representa uma evolução para os personagens e fechados em história entre si.

    Mas o que realmente impera em Blade é o desenho e estilo de Samura. Que evolui com a série, porém mesmo no inicio é de extrema beleza. Os kanjis de sons entram em perfeita sintonia com a cena, não são apenas recurso dos quadrinhos, eles fazem PARTE da cena. É admirador o traço do desenho, principalmente em algumas cenas, um tanto quanto sangrentas, mas ainda assim, de uma beleza indescritível.

    Em resumo, uma história de espadachins japoneses, lutas sangrentas, um enredo vibrante e envolvente, um traço estupendo, personagens carismáticos e que tem “alma”, trama rica porém sem pontas soltas e também tem mulher segurando espada, e sendo uma das melhores espadachins do mangá. Recomendo fortemente para quem curte o estilo, não vão se arrepender.

    Compre: Blade – A Lâmina do Imortal.

    Texto de autoria de André Kirano.