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  • Crítica | Carrie, a Estranha (1976)

    Crítica | Carrie, a Estranha (1976)

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    No clássico de Brian de Palma, o terror de Stephen King se inicia a partir da sexualidade efervescente típica da adolescência. A cena do banho que Sissy Spacek sofre mostram as curvas do corpo feminino movendo-se para uma direção de absoluta naturalidade, expondo-se a um evento comum como a menstruação, mas demonizado por sua personagem e pelo entorno familiar da mesma. Carrie A Estranha é um filme sobre violência, emocional e psicológica, movida contra uma garota que tem um comportamento inofensivo e vitimável, e que esconde em si um poder destrutivo escondido no recôndito de sua alma perturbada.

    A personificação de Carrie revela uma menina aterrorizada, oprimida por sua matriarca,  Margaret White (Piper Laurie), e maltratada pelas outras crianças, com alcunhas maldosas, apelando para a esquisitice de seus modos. Não demora a ser demonstrada a criação rígida que a menina recebe, através de uma religião extrema e recalcante de sua mãe, o que determina o motivo de seu backrground já se iniciar tão negativo.

    É curioso como em inúmeras cenas em que Carrie é enquadrada sozinha há uma aura avermelhada envolvendo a personagem, emulando a malignidade que lhe é conferida pelos olhares alheios. As cenas dela com sua mãe ocorrem quase sempre no escuro, nas trevas do desconhecimento e alienação, causando na adolescente um temor terrível, o receio de se relacionar com qualquer ser humano, já que toda e qualquer ação é encarada como pecaminosa e imunda, por sua mãe.

    A opressão que Carrie sofre encontra até paralelos atuais, já que grande parte dos fanáticos religiosos ainda buscam o completo isolamento ideológico e comportamental, especialmente quando seus dogmas e ideais são muito questionáveis. A razão dos poderes paranormais de Carrie ocorrerem não são explicitados em tela, até para manter o clima de mistério. Todas as manifestações destas “habilidades” são mostrados em momentos de extrema tensão da moça, pontuados pela música grave de Pino Donaggio, que aumenta e muito o suspense, medo e claro sensação de humilhação pelo qual passa a protagonista.

    A crueldade e intolerância típica do homem se manifesta de maneira ainda mais agressiva no período da puberdade, onde os padrões de politicamente correta ainda não se estabeleceram por completo. O tratamento hostil que a personagem recebe é retribuído ao modo que lhe cabe, impingindo os mesmos medos e horrores que couberam a antiga vítima. Carrie A Estranha só tem cenas de terror próximo do final, onde os que causaram mal a protagonista, sofrem a ira de uma inocente inviolada, que só buscava para si a aprovação de quem a rejeitava gratuitamente.

    O destino de Chris Hargensen (Nancy Allen) e seu namorado Billy (John Travolta) é ainda mais sombrio e particularmente violento, sofrendo o ataque direto da menina que não queria nada, além de ser considerada normal. Cada golpe psíquico que Carrie desfere, envolve um acorde agudo na música,mostrando que mesmo ao atacar seus “adversários”, há uma dor intrínseca terrível, causada pela repressão de sentimentos proveniente de sua mãe que do alto de sua hipocrisia, impede a si e aos outros de dar vazão aos prazeres mais básicos da humanidade. O epílogo mostra o quão temor do trauma após um choque, dessa vez enfocando em um dos agressores primários, invertendo a ordem de predação, além de aventar um final em nada otimista tão triste e trágico quanto a existência de Carrie em si.

  • Crítica | A Fuga

    Crítica | A Fuga

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    Após o assalto a um cassino, trio de ladrões dirige-se à fronteira EUA-Canadá, quando um acidente na estrada acaba causando a morte de um deles. Escapando ilesos, os irmãos Addison (Eric Bana) e Liza (Olivia Wilde) separam-se com o intuito de dificultar a perseguição policial, tomando rumos diferentes no meio da neve para chegar à fronteira. Enquanto isso, Jay (Charlie Hunnam), um ex-boxeador recém saído da prisão, viaja para passar o Dia de Ação de Graças na casa dos pais – o xerife aposentado Chet Mills (Kris Kristofferson) e sua esposa June (Sissy Spacek).

    A sequência inicial é suficientemente impactante para chamar a atenção do espectador e fazê-lo querer saber o desfecho da estória dos dois irmãos. A tranquilidade quase excessiva dentro do carro – de certo modo um reflexo da quietude da paisagem branca ao redor – é subitamente interrompida pelo acidente. É uma pena que a força dessa cena não se mantenha no restante do filme que avança numa sucessão de eventos bastante previsíveis, com coincidências que por vezes soam forçadas.

    É um thriller de perseguição. Ponto. Dito isto, pode-se afirmar que o filme é satisfatório enquanto thriller de perseguição. Não se deve esperar algo similar a Argo, em que a perseguição é pano de fundo para o estudo dos personagens – todos muito bons. Neste, ao contrário, a tentativa de mesclar ação e dramas pessoais apenas enfraquece a trama. O roteiro, aliás, se mostra bem indeciso, sem saber se explora os dramas pessoais, o isolamento causado pela nevasca, as pequenas tramas paralelas ou se se atém à fuga dos ladrões. Ao tentar focar nos conflitos interpessoais de alguns personagens – Jay e seu pai, Liza e Addison, Hanna e seu pai – ou ao tentar acrescentar um pouco de complexidade psicológica aos personagens – Addison na cabana, por exemplo – a trama perde ritmo e interesse.

    Percebe-se a boa intenção do roteirista, mas isso não é o bastante. A sucessão de clichês e estereótipos, principalmente na construção dos núcleos de personagens, poderia ter sido evitada. Citando apenas os mais óbvios: clichê machista – uma policial feminina, a única da delegacia, que é sempre preterida por ser mulher; clichê racial – um caçador com feições indígenas vestindo um casaco de peles com uma águia pintada nas costas.

    Mesmo a presença de bons atores – Spacek, Kristofferson e Kate Mara (que demonstra todo seu potencial na série House of Cards) – não ajuda na construção dos personagens, já que estes são unidimensionais. A performance do elenco é correta, mas nada além disso. Eric Bana quase convence como o ladrão meio anjo meio demônio. Olivia Wilde não tem como ir além do perfil apático de Liza. Hunnam talvez pudesse tornar seu personagem mais carismático, se ele fosse mais que apenas o link entre os ladrões e seu destino.

    Apesar do excesso de closes e de “establishment shots”, a fotografia não deixa a desejar. Principalmente nas externas em que é beneficiada pela paisagem. Ajudaria bastante se a montagem fosse um pouco mais ágil. Afinal, é uma perseguição a fugitivos, não um filme contemplativo. A sequência de perseguição com snowmobiles, mesmo com a obviedade de alguns cortes, é um bom exemplo do ritmo que deveria ser seguido no restante do filme.

    A sequência inicial e o final (quase) inesperado – depois que os personagens lavam a roupa suja durante o jantar de Ação de Graças – compensam o “miolo” meio morno da narrativa. Em suma, é um filme mediano. Longe de ser um blockbuster, mesmo com o roteiro convencional e pouco criativo, personagens estereotipados e pouco complexos, consegue cumprir a função de entreter e passar o tempo.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.