Tag: Charlton Heston

  • Crítica | Os Dez Mandamentos (1956)

    Crítica | Os Dez Mandamentos (1956)

    O cinema de Cecil B. DeMille é composto basicamente de filmes do gênero conhecido antigamente como épico, onde personagens fortes e heroicos tinham suas jornadas contadas. Sua versão de 1956 para Os Dez Mandamentos é uma refilmagem do seu filme homônimo e certamente é o mais conhecido e elogiado de sua carreira, e essa alcunha não se deu à toa, já que a adaptação do conto bíblico a respeito de Moisés é grandiosa, não só pela potência da história do libertador dos judeus, mas também pelo fato de ser Charlton Heston a vivê-lo – no auge de seu popularidade – além do orçamento vultuoso acompanhado de uma construção visual absurdamente grandiosa e bem feita.

    O roteiro é adaptado dos livros Prince of Egypt, de Dorothy Clarke Wilson, Pillar of Fire, de Rev. J. H. Ingraham e On Eagle’s Wing, de Rev. A. E. Southon. A parte política do Egito, como o nome dos faraós vem da fusão desses três livros, além dos coadjuvantes que não tem destaque nos livros iniciais do Antigo Testamento.

    Da parte dramática, se ouve uma narração incômoda e expositiva, fruto do que era comum ao cinemão dos  anos cinquenta, seu conteúdo aborda o domínio dos homens sobre a Terra após a historia de Adão, onde se resume o Gênesis, para logo depois mostrar a civilização egípcia como a mais evoluída, e com o barbarismo como norte, decidindo acreditar na lenda do escolhido que libertaria os hebreus.

    A produção era soberba, os cenários enormes e suntuosos, com muitos figurantes diferentes e coloridos entre si e um cuidado ao mostrar outros povos lidando com o faraó e seus subordinados, mas mesmo assim se notam alguns elementos que não casam com um filme tão grande, como o exemplo da cena que mostra a chegada do pequeno Moisés às margens do Rio Nilo, com meninas de pele branca e belas feições, que claramente não nasceriam no ambiente árido do Egito. São modelos fotográficas, e perceber isso é quase tão flagrante quanto o artifício utilizado no filme produzida pela Penthouse, Calígula, e fica lado a lado com outro clássico contemporâneo, Cleopatra, de Joseph L. Mankiewicz no sentido de trocar fidelidade histórica pela beleza estética condizente com a época.

    O roteiro é bastante básico e estabelece desde o primeiro momento a rivalidade de Ramsés II (Yul Brinner) com o Moisés de Heston, seja por conta do trono ou pela promessa de desposar Nefertite (Anne Baxter). O triângulo amoroso é mostrado de forma expositiva, assim como a predestinação do bravo Josué (John Derek), como parceiro, mesmo antes dele se identificar como descendente dos escravos. Fato é que desde o início, Moisés age como o “bom opressor”, sendo bem mais tolerante com a dor dos escravos do que os próximos de si. Ele defende Josué quando ele diz que quer ser livre, mas não hesita em mandar milhares de escravos levantarem monumentos a Seth, mesmo que a maioria deles possa simplesmente morrer.

    Da parte técnica, a qualidade varia bastante em efeitos especiais. Para a época era de fato deslumbrante, na remasterização, as cenas com chroma key funcionam melhor quando acontecem à noite, com os cenários vulcânicos. Já pela manhã, no deserto os cenários casados com as pessoas ficam bastante artificiais, mas nada que tire o espectador da atenção à trama. A dramaturgia se desenrola lentamente, como era comum ao cinema nessa época.

    DeMille tem escolhas sábias ao abordar o encontro do futuro profeta com Jeová. A descrição bíblica dá conta de que as feições de Moisés mudaram, e o penteado e a barba de Heston aparecem com tons mais grisalhos para referenciar essa mudança. O trabalho de restauração faz com que as cores fiquem ainda mais vivas, fato que favorece demais o trabalho do cineasta e sua equipe, além de também tornar a música de Elmer Bernstein algo ainda mais grandioso. Evidente que nem todos os efeitos especiais mantém-se com o apuro visual nos tempos atuais, mas ainda assim a abertura do mar e as cenas que seguem a partir daí ainda causam espanto.

    Os Dez Mandamentos é grandioso, mesmo em seus momentos finais, quando o profeta recebe a palavra de Deus, com o povo se corrompendo em torno da idolatria. O único senão mora no fato de que Moisés é um personagem sem defeitos ou nuances, é o belo e perfeito herói incapaz de errar, e ainda que a Bíblia o trate como um homem honrado, ele não é infalível e o próprio Antigo Testamento demonstra isso. No mais, o tom épico dos momentos derradeiros justifica a pressa com alguns dos plots, incluindo a pouca participação dos irmãos do protagonista. Heston concentra em si toda a complexidade do filme, e entrega uma performance apoteótica, mesmo que tenha poucos tons em si.

  • Crítica | Planeta dos Macacos (2001)

    Crítica | Planeta dos Macacos (2001)

    A versão de Tim Burton para o clássico Planeta dos Macacos de Franklin J. Shaffner começa com uma música imponente, de Danny Elfman, e com uma abertura lindíssima, com vasos e objetos de artes cuja temática tem a ver com os símios que em breve aparecerão. O primeiro personagem vivo a ser mostrado é exatamente um chimpanzé de tamanho comum, que está dentro de um simulador. Pericles é cuidado por Leo Davidson, o cientista que Mark Wahlberg vive e faz as vezes de Charlton Heston que alias, faz uma ponta neste. Esse começo parece promissor, ao menos até mostrar Leo, e mesmo assim, a historia desandaria mais ainda depois.

    O ano da historia 2029 e o roteiro começa mostrando a estação Oberon onde Davidson trabalha, e é enviado ao vazio do espaço onde é pego em um vortex que o joga para outro lugar no espaço e aparentemente no tempo, e ele pousa em um planeta que vive em uma espécie de Era Medieval, mas habitado por macacos, que tem toda uma sociedade, dividida em castas, e que se munem de armaduras super estilizadas, com um roteiro de Mark Rosenthal, Lawrence Konner e William Broyles Jr. mais fiel ao menos em ambientação ao livro de Pierre Boulle do que o que Michael Wilson e Rod Serling fizeram em 68.

    O grande problema do filme é a caricatura em que ele se insere. Há um exagero e uma mão muito pesada de Burton. As atuações são ou genéricas ou histriônicas, como a de Tim Roth fazendo o vilão Thalos, um chimpanzé inteligente e agressivo, que tenta impor sempre sua vontade através da força. Há momentos risíveis e referencias escabrosas, reunidas juntas, como uma cena em que um casal está se preparando para transar e a fêmea – na verdade, Nova, interpretada por Lisa Marie até então esposa de Burton –  dança para seu marido, em uma dança de acasalamento terrível, ou jovens macacos que imitam roqueiros punks, de jaqueta, fato que mistura linhas temporais ou referências visuis distintas demais para conviverem juntas. Alem do que, os humanos (que falam, contrariando a ideia de que seriam muito inferiores aos macacos) ao fugirem conseguem entrar em algumas casas, como se as mesmas não tivessem qualquer proteção, trancas ou algo que os valha. Mesmo em épocas bíblicas há relatos de utilização de algum método de segurança para proteger a moradia do povo de saques ou furtos.

    Os atores tiveram um trabalho árduo de preparação, para emular de maneira completamente bípede alguns dos movimentos animalescos típicos, mas até esses falham, pois em alguns momentos são utilizados e em outros tantos, não. Além disso, há uma grande banalização dos momentos do clássico, com as frases que foram icônicas, em especial as ditas pelo personagem de Heston, tem seu sentido invertido, e não por algum motivo válido, pois parecem apenas piadas de mal gosto.

    As lutas entre o exercito símio e os humanos tentam ser emocionantes, mas tem coreografias estranhas, e a sequencia como um todo é bagunçada, e tem um evento meio Deus Ex Machina ali, que debocha dos mitos  que o filme tentou estabelecer e banaliza o todo, mostrando Semos – na verdade, Pericles – como um macaquinho adestrado que é soberano diante dos outros inteligente e capazes de dividir uma sociedade inteira. É tudo muito conveniente, e a tentativa de falar sobre religião esbarra em uma abordagem rasa e meio simplista.

    Há momentos grotescos no filme, incluindo ai  o confuso final, que faz referencia mais ao livro de Boulle e tenta (em vão) soar mais poderosa que a do clássico sessentista. Toda a questão sobre o desfecho e a estátua de Thade no lugar de Abraham Lincoln é terrível, seja a crença de que ele conseguiu reativar a Oberon mesmo jamais tendo contato com esse tipo de tecnologia, ativando a rota para a Terra repovoando o planeta com símios ou levando em conta que a nave de Leo errou a rota e voltou ao mesmo planeta em que se passa o filme inteiro, qualquer uma dessas teorias ou outras possuem furos e não constituem um final poderoso como o filme quis soar, o que é uma pena, pois esse Planeta dos Macacos de Tim Burton tinha um claro potencial. A declaração de Burton sobre essa sequencia foi presunçosa – O final parece não ter lógica, mas tem. O objetivo é fazer você usar ambos os lados do cérebro ao mesmo tempo – e destaca o quanto o realizador estava fora da realidade ao analisar seus próprios méritos.

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  • Crítica | Ben-Hur (1959)

    Crítica | Ben-Hur (1959)

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    Épico de extensa duração – 212 minutos – Ben Hur de William Wyler começa com uma abertura de seis minutos a fim de que seus espectadores se acomodassem antes do início do espetáculo, fator que já demonstra a ambiciosa intenção do longa em ser um evento para muito além do cinema convencional. Somente após doze minutos decorridos é declarado que este é um conto bíblico, originalmente escrito por Lew Wallace (autor do livro). A história é focada na intensa amizade/fraternidade do hebreu Judah Ben Hur (Charlton Heston) e Messala (Stephen Boyd), um típico tribuno romano. Ambos tinham um apreço incomensurável pelo outro apesar das óbvias diferenças entre seus povos, mas essa relação não sobrevive para sempre ao abismo ideológico travado entre o escravocrata e o servo, com o destino tratando de pôr os parceiros em lugares distintos.

    Wyler não foi o primeiro a adaptar a história de Wallace, já havia ocorrido um curta metragem homônimo em 1907 e um longa em 1923. O primeiro arco de desventuras ocorre para o personagem título ao perceber que seu velho amigo lançará mão sobre os habitantes da Judéia, que liderados por Ben-Hur, pretendem finalmente atingir sua liberdade. O intuito de Messala é o de massacrar os pretensos independentes e convoca seu companheiro de infância para chacinar as chances de libertação de seu antigo povo, obviamente tendo seu requisito negado. A partir dali as posições de ambos seria bem distintas e o paradisíaco envolvimento emocional de ambos é freado.

    Judah e Messala parecem muito mais que meros amigos neste inicio. A própria condução de cenas e troca de gracejos fazem lembrar um amor reprimido, que seria absolutamente comum em tempos de poderia romano, ainda que fosse completamente transgressor para os conservadores anos cinquenta do século XX, ainda mais em uma época de recém queda do macarthismo. A mensagem homo erótica nem pretende ser tão velada, ainda mais se observada atualmente e de certa forma torna todo o drama de rejeição de valores e de nacionalidade ainda mais lógica e intensa, uma vez que faz com que o poderoso oficial romano se sinta traído por seu confrade, irmão e possível amante não consumado.

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    A condução que Wyler emprega é bastante semelhante ao que Cecil B. De Mille e David Lean faziam em seus filmes produtos, em especial Os Dez Mandamentos, lançado anteriormente também com Heston estrelando, e Lawrence da Arábia. Em comum, os três produtos tem cenários suntuosos e muito bem construídos, grandes impérios e um herói que sozinho enfrenta um tirano governo, em nome dos excluídos, exemplo que serviria de inspiração para inúmeros ícones tipicamente masculinos nos anos oitenta, como o John Rambo de Sylvester Stallone, Braddock de Chuck Norris e até os exploitations de Bruce Lee e demais astros orientais

    A longa jornada de Judah envolve sua transformação em um escravo, fato que o ajuda a entender melhor o ponto de vista de seu povo, agora sem os privilégios de ser amigo dos poderosos, sem a dourada chancela sobre sua cabeça que o fazia ser mais que um mero mortal. Ao perceber infortúnios da fome, sede e da dor da chibata presente em instantes longos a bordo de um navio, o destino do homem novamente é voltado aos poderosos, tendo enfim a oportunidade de servir a Quintus Arrius (Jack Hawkins, em inspirada interpretação), um homem que é justo consigo, apesar da maldição que acompanha o herói.

    Ben-Hur parece um homem predestinado ao sucesso, apesar de sua casta ser considerada inferior. Sobre si está a mesma benção que esteve sobre os baluartes bíblicos de José, que apesar de escravo no Egito foi um homem importante entre os poderosos, e claro Moisés, que foi criado no berço da civilização egípcia dominante. Mesmo quando em posição de competidor de bigas, sua colocação recebe privilégios, com carros mais potentes e o direito de usar seus próprios cavalos. Seus méritos são bons mas suas condições também o são, fato que o deixa num patamar bem diferente dos demais membros do seu povo, fator que faz fortalecer a ideia que já existe no inconsciente do público dos Estados Unidos, de que aos vitoriosos cabem benefícios exclusivos e mais ajuda do que os outros, sendo estes mais iguais do que o próximo.

    O trabalho técnico em Ben-Hur é muito esmerado também nos efeitos visuais. As cenas com fundo verde soam mais naturais nesta que é uma produção do final dos anos cinquenta do que na maioria dos filmes de James Bond e nos suspenses hitchcockianos como Ladrão de Casaca e Intriga Internacional. O altíssimo orçamento da produção é muito bem empregado, não somente na reconstrução do período imperial romano, mas também nas excelentes sequências de corridas em bigas e na competente batalha marinha.

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    O resgate da humildade e da serenidade vem após mais uma decepção do personagem titulo, rendendo sua crença ao pretenso Messias. A preocupação de Wyler em não mostrar o rosto da figura divina soa mais reverente do que a esmagadora maioria dos filmes baseados na mitologia judaico cristão.

    A trilha de Miklós Rózsa é algo único e serviu de inspiração para quase todos os filmes épicos dali para frente e o mesmo ocorreu com o trabalho da figurinista Elizabeth Haffenden, que teve de comandar centenas de profissionais na construção das roupas das centenas de figurantes em tela.

    O filme da MGM tem muitas semelhantes com o vindouro Spartacus, de Stanley Kubrick, ainda que seu final tenha um caráter bem diferente, muito mais otimista, em relação aos combalidos judeus que serviam aos imperativos romanos, tendo na figura mitológica do Cristo uma esperança de mudança. Mesmo esse apelo não soa demasiado melodramático ou tolamente gratuito, sendo Ben-Hur um bom exemplo de como uma história sobre uma figura religiosa pode ser bem enquadrada sem necessariamente ser focado nela. Até a pecha de filme épico é discutida, uma vez que o ato final faz menção a outro protagonismo, fazendo dele um produto abrangente e universal, fazendo jus aos múltiplos prêmios que concorreu e ganhou.

  • Crítica | Terremoto

    Crítica | Terremoto

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    O começo do filme, com uma tomada aérea que compreende a cidade de Los Angeles em todo seu esplendor, já denota o que seria Terremoto, filme de Mark Robinson com roteiro de Mario Puzo (junto a George Fox), lançado pouco tempo depois do sucesso retumbante de O Poderoso Chefão. A música de John Williams ajuda a aumentar o espectro de classicismo do filme, que não demora a registrar imagens com seu herói tradicional Stuart Graff, vivido por um Charlton Heston já decadente física e profissionalmente.

    Aos poucos, é mostrado que Stuart vive uma grave crise conjugal, já não suportando mais os disparates de sua cônjuge, Remy (Ava Gardner), uma mulher possessiva, dissimulada e extremamente ciumenta. O homem então passa a visitar a viúva da ex-colega de trabalho, a bela Denise Marshall (Geneviève Bujold), ainda que a intenção dúbia não seja correspondida pela senhora ainda em luto.

    É bastante curioso a demora em que o roteiro tem para se inserir na questão tragédia natural, apresentando uma porção significativa de personagens cujas feições e comportamentos são bastante datados, exibindo como era o visual e ações típicas dos anos setenta, especialmente no que tange a sexualidade feminina e vestuário peculiar de mulheres caucasianas e negras, reproduzindo o pitoresco padrão de beleza em tela. A aura de filme b permeia toda a fita, que aparenta em cada detalhe da direção de arte um aspecto mambembe, ainda que não seja risível.

    A tragédia começa a ocorrer pelos idos dos cinquenta minutos de exibição, sobrando cenas cômicas, com os prédios e câmeras balançando, graças a precariedade não só de recursos, mas de possibilidades de efeitos visuais que fizessem jus a um arrombo da natureza de proporções dantescas. As maquetes sendo destruídas e miniaturas de carros e casas caindo só não são mais toscas e mal feitas do que as subidas que o solo se permite dar, levantando terra para todos os lados.

    Ao se aproximar de seu desfecho, a fita opta por explorar espaços de escombros, subterrâneos, onde as filmagens seriam mais fáceis de executar, e claro, de construir suspense. O grave erro é que a maioria dos personagens não geram empatia no público, já que não tem nem muito tempo de tela, e nem uma boa construção de caráter e personalidade. O excessivo tempo de duração ajuda a fomentar a atenção nos graves defeitos de produção, não restando quase nenhuma sensação que não seja de reprimenda a feitoria deste Terremoto, que não consegue se sustentar nem através da persona carismática de seu astro e nem através das miniaturas em chamas.

  • Crítica | A Última Esperança da Terra

    Crítica | A Última Esperança da Terra

    the omega man

    A temática do fim do mundo foi explorada em inúmeras oportunidades. Dentre estas, a que talvez seja a mais notória em questão de influência, especialmente no meio do público que consome ficção científica e seus derivados, seja o romance de Richard Matheson, Eu sou a Lenda, que teria influído até no imaginário de infestação zumbi reinventado por George A. Romero em seu A Noite dos Mortos-Vivos. Até por seu repertório como roteirista, era natural que o texto de Matheson fosse explorado pelo cinema, também por seu potencial midiático. Uma destas versões seria protagonizada pelo herói de ação da época (1971), Sir Charlton Heston, em A Última Esperança da Terra.

    Logo no início o espectador é apresentado à temática da história, uma aparente tranquilidade com uma dose de violência pouco elevada. Até pelas já citadas influências que Eu Sou a Lenda deixaria na cultura pop, passou a ser comum associar a espécie que teve seu apogeu na trama como zumbis. No entanto, o diretor Boris Sagal deixa ainda mais evidente nesta versão – especialmente quando comparada com a mais recente interpretação – que os mortos-andantes são, na verdade, vampiros. Mesmo assim é curioso como o mundo arquitetado pela direção de arte guarda muitas semelhanças com o filão de filmes com mortos-vivos. Os ambientes áridos, cidades abandonadas, figurinos de personagens maltrapilhos, qualquer ponto que remeta ao pós-apocalipse acaba lembrando o que Romero havia feito em 1968, mas de modo evoluído, mais amplo, em um espaço urbano, cuja iconografia visual seguiria o influxo até em Despertar dos MortosThe Walking Dead, e até um pouco de Mad Max.

    O protagonista do filme, o sobrevivente Robert Neville é canastra ao máximo, cheio de frases feitas e piadinhas infames, contém em si todos os clichês cinematográficos que se tornaram moda entre os action heroes. Este A Última Esperança da Terra exala um forte cheiro de filme B, em determinados pontos da trama é quase uma comédia. Figurinos destoantes e cafonas, maquiagens toscas, personagens estereotipados, crianças que falam como adultos, tudo isso torna o filme bastante datado, o que exige de quem vê uma porção considerável de paciência.

    Heston faz Neville, aparentemente o único sobrevivente de uma praga que transformou a humanidade em seres albinos, que tem vulnerabilidade a luz. A “doença” ocorreu devido a uma guerra bacteriológica, protagonizada pelas duas potencias mundiais da época: EUA e URSS. As pessoas portadoras desta doença tornam-se uma comunidade, e recusam qualquer tentativa de “cura”, perseguem Neville como se ele fosse o monstro – até porque ele tirou a vida de muitos membros desta “Família”.

    A Nova Raça tenta realizar uma super correção, refutando tudo que é moderno: a ciência, tecnologia, armamentos, para viver em condições semi medievais – essa é a intenção do roteiro, ainda que falhe em muitos aspectos. O curioso é que o papel de Charlton Heston é semelhante a outro de seus mais famosos personagens. Dave, de Planeta dos Macacos, assim como Neville está diante de outra classe dominante, sozinho contra uma sociedade inteira. Na visão da “Família”, o morto é Neville, assim como Dave era o involuído para os símios.

    O grande pecado da fita é que em quase momento nenhum se teme pelo futuro dos personagens, ainda que os seus tristes destinos sejam iminentes. Os sobreviventes vivem num mundo pós-apocalíptico, mas o seu status quo parece não ter mudado praticamente nada. O pânico que deveria estar instaurado é nulo, inexiste e o desfecho é anticlimático, já que o fim do herói é pouco significativo. A cena acaba sendo mal executada, talvez se o orçamento fosse um pouco maior, poderia ter havido um maior esmero em concluir a película.

    Até em virtude do pouco investimento e da decadência de Heston como astro do cinema, o filme de Boris Sagal torna-se essencial, uma vez que em suas devidas proporções, foi um divisor de águas dentro do seu universo temático, além, é claro, de ter em seu subtexto uma mensagem relevante e atual.

  • Crítica | O Planeta dos Macacos

    Crítica | O Planeta dos Macacos

    planeta dos macacos 1968

    Falar do clássico O Planeta dos Macacos não é uma tarefa fácil, afinal o filme já está consolidado como um dos grandes clássicos do cinema há anos. Serei breve e objetivo nessa resenha, e espero que consiga convencer quem ainda não assistiu essa obra, que confira o quanto antes este clássico do cinema cult e de ficção-científica.

    Baseado no livro de Pierre Boulle, o filme conta a história de quatro astronautas que viajam para o espaço, rumo a uma estrela na constelação de Orion, e caem em um sono profundo de dois mil anos. Ao acordarem, no então ano de 3978, descobrem que aterrissaram em um planeta desconhecido, e partem em busca de algum sinal de vida naquele local. Após uma longa jornada pelo deserto, os astronautas encontram um povo bárbaro e tentam estabelecer contato, o que é dificultado pois eles não conseguem articular palavras e apenas emitem grunhidos e gritos animalescos. Enquanto tentam os primeiros contatos, algo surge e aterroriza esses raça de humanos bárbaros, fazendo todos partirem em uma corrida frenética. Quando se dão conta, os astronautas se veem perseguidos por macacos vestidos com trajes humanos, montados em seus cavalos e disparando seus fuzis contra aquele povo, para transformá-los em escravos, animais de estimação e cobaias de laboratório.

    Nos dias atuais a cena pode não causar o mesmo impacto que causou em 1968, e até mesmo poder soar um pouco bizarro e tosco, mas no ano do lançamento causou um frisson inacreditável, sendo responsável por uma das maiores bilheterias do cinema na epóca. E pudera, com um roteiro desses não poderia ser diferente, tendo o já astro, Charlton Heston no papel principal do astronauta que após um sono artificial, aterrissa em um planeta desconhecido, parecido com a Terra, se depara com uma realidade chocante onde homens agem como macacos e os macacos são seres dotados de inteligência e usam estes como experimentos e escravos.

    O Diretor norte-americano Franklin J. Schaffner, um dos responsáveis pelo sucesso que o filme tem até hoje, mostrou um excelente trabalho de câmera, com grandes tomadas e conseguindo extrair boas atuações, inclusive dos atores que utilizavam a maquiagem para viver seus personagens símios, o que acabava dificultando em suas interpretações. Schaffner fez o que Tim Burton não conseguiu, expor a inversão de papéis entre homem e macaco de uma maneira excepcional, e sobretudo ser crível com essa história. O roteiro do filme é grande responsável por isso, ao mostrar essa realidade aterradora entre dominador e dominado, porém, sem um trabalho competente de direção teria sido esquecido à muito tempo.

    E por falar dos aspectos técnicos, o que dizer da maquiagem dos macacos? Simplesmente perfeita e por incrível que pareça, ainda hoje consegue convencer quem a vê, além de ser mais expressiva que muitas animações feitas nos últimos anos. O responsável técnico John Chambers recebeu um Oscar honorário anos depois pela Academia, muito merecidamente, mas um bocado atrasado, pois na premiação de 1969 foi totalmente ignorado por ela. O filme havia sido indicado apenas para o Oscar roteiro original e figurino.

    O estilo narrativo é um pouco lento em comparação aos filmes hollwoodianos atuais, isso se dá ao estilo típico do cinema até o início dos 70. O que torna uma ótima oportunidade para quem não conhece o estilo cinematográfico da epóca e não quer começar com filmes mais “pesados”, O Planeta dos Macacos é uma ótima pedida, pois pode ser considerado um dos blockbuster’s da epóca.

    Schaffner conseguiu mesclar aventura, suspense e ficção-científica como poucos. Charlton Heston emplaca mais um grande papel depois do clássico Ben-Hur. Enfim, um filme que merece ser visto e revisto por todos nós, não só por ser um grande clássico do gênero sci-fi, mas também por todo seu contexto histórico e político da época de seu lançamento.

    Ouça: Planeta dos Macacos.