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  • Crítica | Lion: Uma Jornada Para Casa

    Crítica | Lion: Uma Jornada Para Casa

    Como todos os anos, há sempre as famosas biopics: os filmes biográficos indicados a categoria de melhor filme. São filmes baseados em personagens e empreitadas reais, seja de alguma personalidade conhecida ou não, mas que carregue potencial melodramático, “inspirador”. Esse ano, temos cerca de 3 filmes que seguem esses moldes. E não, ser um filme biográfico não torna qualquer obra definitivamente ruim, mas em época de premiações é o suficiente para levantar algumas sobrancelhas céticas, que confirmam seus pessimismos com filmes como Lion: Uma Jornada Para Casa.

    Lion é um filme de Garth Davis, roteirizado por Luke Davies a partir do livro de Saroo Brierley, que trata de sua própria história de vida. Saroo (Sunny Pawar, na infância, e Dev Patel, quando adulto) se perde de sua família com 5 anos ao adormecer em um trem desconhecido da Índia. A narrativa trata de sua trajetória e foca em seus pontos cruciais e definidores, seja enquanto foge de raptores ou se acostuma a sua realidade na Austrália, até quando adulto e se vê tomado pela necessidade e vontade de voltar para sua terra natal, sua antiga família.

    O filme se divide em dois momentos: a etapa da infância, que lida com a realidade precária de muitas crianças abandonadas da Índia, como fazem para sobreviver e quais os perigos que tomam forma em adultos mal-intencionados, ou que não se importam. Sunny Pawar age como o esperado de uma criança em sua situação, mas exatamente por sua idade e pouca experiência não é nele que se deposita a maior demanda dramática, mas nos adultos a sua volta; foco especial para os Brierley, sua mãe (Nicole Kidman) e pai (David Wenham) adotivos australianos.

    A fase adulta, entretanto, já aborda uma crise de identidade familiar e nacional que o roteiro é incapaz de desenvolver propriamente. É especialmente nessa segunda metade que o telespectador é subestimado, desde os constantes flashbacks até a fotografia excessivamente explanatória. Patel se apresenta aqui limitado pelos diálogos mecânicos e sentimentos que ele deve sentir por conveniência, assim como outros personagens não desenvolvidos além de justificativas narrativas, como Lucy (Rooney Mara). E não importa o quanto o elenco tenha de potencial e experiência, não há salvação para problemas narrativos, pois ao tratar da história como uma sequência de fatos seguros da automática percepção de importância do público, afinal, são momentos “grandes”, “emocionantes”, o filme se mostra genérico, sem impacto.

    Seja na vida ou no cinema, a importância que damos a algo não se mede por questões factuais, e sim pelo quanto que foi construído até ali. O pior que pode acontecer a filmes biográficos é caírem no abismo de abordagens pragmáticas sem personalidade, com momentos coreografados para choro (com trilha sonora de violinos e piano a postos) e conclusões artificiais de desenrolar desleixado. Todos os aspectos cinematográficos em filmes do tipo se baseiam em um desalmado funcional. Falham em perceber que não é por uma história ser importante ou extraordinária que o filme se eleva. É preciso a alma que ele tão prepotentemente assume ter, é preciso rugir.

    Texto de autoria de Leonardo Amaral.

  • Crítica | O Homem que Viu o Infinito

    Crítica | O Homem que Viu o Infinito

    Baseado no livro The Man Who Knew Infinity: A Life of the Genius Ramanujan (ainda sem tradução no Brasil), de Robert Kanigel, com roteiro e direção de Matt Brown, o filme conta parte da história de Srinivasa Ramanujan (Dev Patel), um gênio matemático autodidata indiano. Um pouco antes de estourar a Primeira Guerra Mundial, em 1913, ele sai da pequena cidade de Madras e viaja para a Inglaterra para encontrar seu futuro mentor – o excêntrico G.H. Hardy (Jeremy Irons), professor de Matemática Pura no Trinity College, em Cambridge. Lá, além de ter de se adequar a regras com que não está habituado, ainda tem de enfrentar a xenofobia e o desprezo da maioria dos estudiosos de Cambridge, colegas de Hardy.

    Interessante observar a interação entre os personagens, uma vez que a visão que cada um deles – mentor e aluno – tem do estudo e da aplicação da Matemática Pura é bem diversa, quase oposta. Ramanujan diz que seu dom e todas os teoremas que escreve são originados de sua fé, aliás em certo momento, quando Hardy o pressiona para que diga de onde lhe vêm as ideias, ele responde que vê as fórmulas enquanto está rezando. E, enquanto Ramanujan acredita que seus teoremas são verdadeiras pura e simplesmente por terem sido inspiração divina, Hardy quer fazê-lo entender que isso não basta e que, para que suas fórmulas sejam publicadas e reconhecidas como verdadeiras é necessário fornecer provas. Essa diferença de abordagem garante boas discussões filosóficas entre eles.

    O roteiro é bem estruturado, simples, sem sofisticação ou arroubos inventivos. A narrativa mescla a estadia de Ramanujan em Cambridge com a vida de sua esposa, que ficou na Índia. Há quem tenha comparado o filme a Uma mente brilhante, dizendo ser uma versão simplificada deste, o que é uma tremenda bobagem, afinal são biografias de duas pessoas diferentes, com personalidades diferentes e problemas diferentes a enfrentar. A fotografia e a direção de arte são eficientes, se complementando para situar bem os personagens no período retratado.

    Ramanujan é um bom exemplo de pessoa famosa entre seus pares, mas praticamente desconhecida da maioria das pessoas. E que continuaria desconhecida não fosse pelo filme. É uma obra que, se não se destaca pela história em si, conquista o espectador pela boa atuação do elendo e pelo brilhantismo do personagem retratado.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Chappie

    Crítica | Chappie

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    A cotação é maior do que o filme realmente merece. As três estrelas são por todas as boas ideias e sacadas que mereciam ter sido melhor exploradas no roteiro. Boas intenções não fazem um bom filme, mas achei que valiam ao menos para incrementar a nota dada à história de um engenheiro – Deon (Dev Patel) – que, depois de ser o responsável pela invenção de droides autônomos, utilizados como força policial, esforça-se para desenvolver uma inteligência artificial que consiga replicar a consciência humana. Frustrado com a executiva da empresa onde trabalha, – Michelle Bradley (Sigourney Weaver) -, mais interessada em vender armas que poetas, resolve agir por conta própria.

    Desde Distrito 9, o público espera que Neill Blomkamp repita a dose do que se tornou sua “especialidade”: misturar ficção científica com crítica social. Elysium parecia promissor, mas deixou bastante a desejar. E este, apesar da boa premissa, também não chega aos pés do maior sucesso do diretor/roteirista.

    A maior falha é o roteiro não saber para que lado vai. A narrativa não se decide entre fazer graça, fazer crítica social ou partir para cenas de ação. Sem contar a infinidade de incongruências tecnológicas que deixam qualquer nerd indignado. Ok, é uma obra de ficção, mas um mínimo de bom senso e verossimilhança ajudam muito a mergulhar o espectador no universo da história. E o roteiro falha ostensivamente nisso. Vale reparar que essa “indecisão” vem desde os trailers. O primeiro dá impressão de que é um filme quase infantil, algo como Wall-E + ET. Enquanto o segundo já parte para a pancadaria, mais parecendo Robocop, dando enfoque ao vilão, Vincent Moore (Hugh Jackman).

    Inicialmente, parece que o roteiro irá focar na discussão sobre a substituição do contingente humano por um robótico no policiamento e em suas consequências, boas ou ruins. O filme avança mais um pouco, e o foco passa a ser a evolução da inteligência artificial, a possibilidade de construir máquinas (quase) à nossa imagem e semelhança, com capacidade para aprender e sentir. O espectador pensa “Ah, o filme é sobre a ética da IA.”. Ledo engano. Alguns minutos se passam, e o enfoque é o preconceito, a aceitação (ou não) de estranhos ou ‘diferentes’ em um grupo social. Mais adiante, é sobre a capacidade de adaptação e aprendizado de um ser inteligente não-biológico. Nesse meio tempo, o tom da narrativa também muda, mas de forma irregular e pouco consistente. Nenhuma história, nenhuma pessoa é séria ou cômica o tempo inteiro. Porém, neste roteiro o que fica nítida é a indecisão quanto à forma de contar a história de Chappie. Essa variação no tom mostra-se pouco “orgânica” – para usar um termo da moda. E incomoda quem assiste. Pois uma coisa é ir ao cinema achando que é um filme infanto-juvenil sobre um robô engraçadinho e descobrir logo nos primeiros minutos que é algo mais sério e violento. Outra coisa é o filme mudar essa perspectiva a cada cena.

    Falando dos personagens, apesar de algumas falhas na construção – perdão pelo trocadilho – Chappie é de longe o personagem mais bem estruturado, com mais profundidade. Os demais, em sua maioria, são estereotipados e, em alguns casos, pouco críveis. Michelle Bradley, diretora da OCP, digo, Tetravaal, é apenas uma executiva padrão. Ou até menos, pois que executivo não se apegaria à possibilidade de testar uma nova tecnologia que o deixaria à frente da concorrência? Deon Wilson é o engenheiro responsável pela criação do modelo de robôs policiais similares a Chappie. É um nerd típico que passa a noite em claro programando e movido a energéticos. E, convenhamos, por mais nerd que seja, ninguém deixaria sua própria criação, um salto tecnológico em IA, nas mãos de qualquer um. A gangue que “acolhe” Chappie – Ninja, Yolandi (Ninja e Yo-Landi Visser, vocalistas da banda sul africana de rap-rave Die Antwoord, responsável pela trilha sonora) e Yankie (Jose Pablo Cantillo) – está longe de ser ameaçadora, mais parece um grupo de comédia pastelão. Mas mesmo assim, em termos de complexidade e identificação com o público, estão anos-luz à frente de Vincent Moore. Mais clichê impossível. O engenheiro com ideias diametralmente opostas às de Deon, não é apenas um estereótipo, mas uma caricatura. Chega a ser chato, de tão previsível. Sua animosidade em relação a Deon é exagerada demais, teatral demais. Enfim, apesar dos personagens deixarem a desejar, não há o que reclamar do elenco, que faz o que pode com o material que tem em mãos.

    E há, como dito anteriormente, inconsistências, não apenas tecnológicas, que certamente atrapalham a suspensão de descrença necessária para comprar a ideia do filme: Douglas, parceiro no blog Cafeína Literária ajudou a lembrar as mais gritantes:

    1- O departamento, ou empresa, que cuida da segurança da Tetravaal deveria ser inteiramente dispensado. Que (falta de) segurança é aquela? Em que praticamente qualquer um tem acesso ao chip responsável pela programação dos robôs. Em que um funcionário consegue sair das instalações levando não apenas material da empresa mas também armas. E para que servem as câmeras de segurança que filmam essas ações, se aparentemente não há ninguém assistindo a elas?

    2- Como um capacete feito para ler ondas cerebrais – de novo, ce-re-brais – consegue ler o “cérebro” de um robô? Ok, são pulsos eletromagnéticos, mas até mesmo um leigo sabe que os pulsos emitidos por uma máquina, um forno micro ondas por exemplo, são beeeem diferentes da ondas emitidas pelo cérebro humano

    3- Se, como afirma Deon, Chappie tem poder de aprendizado acima da média, conseguindo inclusive descobrir como transferir a consciência de uma pessoa para um pendrive, por que continua falando como criança ou usando as gírias tolas de seus colegas de bando? Poderia, ao menos, sair falando feito He-man.

    É uma premissa muito boa, perdida em um roteiro mal construído. Na torcida para que o próximo Alien seja melhor que isso.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.