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  • Os festivais que nunca tivemos

    Os festivais que nunca tivemos

    presentacio

    A literatura não acontece só quando os olhos de alguém percorrem as páginas de um livro. Ela vai além das abarrotadas prateleiras e dos silenciosos gabinetes de leitura. A literatura também se materializa em ocasiões agitadas, onde as pessoas se encontram, se confraternizam e compartilham paixões iguais e interesses diferentes. Esses espaços privilegiados são as feiras e festivais que reúnem escritores, editores, capistas, tradutores, ilustradores, distribuidores, vendedores, mídia especializada e públicos. Alguns desses eventos assumem a condição celebrativa e adotam o nome de “festa”, como é o caso da Flip, que se firmou como um dos mais importantes momentos do ano literário no país.

    A questão é que esses festivais são peças necessárias para a engenharia de uma cena cultural. Diversas razões apontam pra isso. As feiras literárias permitem que leitores tenham contato com escritores, e que editoras exibam seus autores e catálogos, buscando fidelizar públicos. Esses eventos costumam despertar a atenção de outros públicos e ajudam a formar novas gerações de leitores. Além disso, geram mídia espontânea para o setor, alavancam vendas e ainda atraem realizadores de outras mídias, como a TV e o cinema, interessados em adaptações e produtos derivados. Ganham o mercado editorial, os criadores e os leitores. Se por um lado quem lê pode trocar ideias com grupos de interesses comuns, assistir a palestras e conhecer grandes autores, por outro as editoras têm a chance de conhecer seus públicos, divulgar coleções e pesquisar diretamente a opinião dos leitores sobre seus produtos. Quer dizer: eventos literários movimentam a economia, valorizam a escrita e a leitura, e expandem a presença da literatura na vida das pessoas.

    Para os fãs de romances policiais e de suspense, há várias feiras todos os anos. É uma pena que não no Brasil. Com exceção de participações isoladas de autores em festivais mais amplos, não se criou ainda um evento totalmente dedicado à literatura policial do porte dos que existem na França, Inglaterra e Estados Unidos, por exemplo. De olho nessa receptividade, os mercados locais não pensam duas vezes em investir para fomentar produção e vendas.

    Sangue na Europa

    Na Inglaterra, um dos mais interessantes festivais é o Harrogate Crime Festival, que acontece em julho e dura quatro dias. Com jogos investigativos, premiações e palestras, já reuniu nomes como Ian Rankin e Tess Gerrintsen. O público elege o melhor romance do ano, e o vencedor recebe 3 mil libras como incentivo. Uma curiosidade: é justamente em Harrogate que fica o Old Swan Hotel, lugar usado por Agatha Christie para desaparecer misteriosamente por 11 dias em 1926!

    Ainda na terra da rainha, em Bristol, acontece sempre no mês de maio a CrimeFest. Considerado um dos 50 melhores festivais literários do mundo pelo jornal The Guardian, teve a primeira edição em 2008, com jantares, mais de 40 mesas de discussão com autores e editores, workshops e apresentações variadas.

    Não poderia faltar um evento em homenagem à Rainha do Crime. O International Agatha Christie Festival acontece em setembro em Torquay, onde a escritora nasceu em 1890. A celebração dura em torno de uma semana, reunindo fãs de todo o mundo desde 2004. Um dos pontos mais visitados pelos participantes é Greenway, a famosa casa de verão onde Agatha escreveu muitos de seus sucessos.

    Na Escócia, há o Bloody Scotland (Escócia Sangrenta), que movimenta o mês de setembro na cidade medieval de Stirling. Durante uma semana, tradutores, leitores e escritores reúnem-se para discutir a diversidade do gênero e o festival apresenta os melhores romances policiais publicados no país de Arthur Conan Doyle.

    Os festivais criminais atravessam o Canal da Mancha e invadem a parte continental da Europa. Entre março e abril, Lyon, na França, sedia o Quai du Polar Crime Festival, um dos mais prestigiados do gênero. Por lá, já passaram Patricia Cornwell, Henning Mankell, P. D. James, Harlan Coben e Gillian Flynn, entre outros. Na última edição, mais de 65 mil aficcionados visitaram a cidade.

    Se os nórdicos são a nova moda criminal, não poderiam faltar nessa lista. A Islândia promove o Icelandnoir, e a Noruega, o Krimfestivalen. Na Suécia há o Crime Writing Festival, que acontece em agosto na ilha de Gotlândia. O slogan é “para quem ama suspense em livros e filmes”, e o evento apresenta trilhas investigativas, exibição de filmes, peças de teatro e cinquenta autores participando, com nomes da casa como Lars Kepler e Anne Holt.

    A Espanha também merece destaque, pois tem um mercado muito ativo no que se refere à literatura policial. Há dez anos, Barcelona promove entre janeiro e fevereiro a BCNegra, reunindo 60 autores em mais de 20 atividades. Charme adicional é o prêmio de melhor romance – Pepe Carvalho Award – homenagem ao detetive criado por Manuel Vasquez Montalban.

    No mesmo país, há a Semana Negra em Gijon. A edição deste ano teve 120 autores, 20 deles vindos América Latina. Foram 100 atividades culturais gratuitas para o público durante nove dias de festival. É no evento que são concedidos o Dashiel Hammett Prize!

    No resto do mundo

    Os alemães têm o seu Krimifestival e os nova-iorquinos, o ThrillerFest. Argentinos realizaram a quarta edição de sua Buenos Aires Negra (a BAN!), e os uruguaios dedicaram uma semana de seu mês de agosto para a Semana Negra de Montevidéo. Foram painéis literários, simpósios, dezenas de atividades e entrada gratuita para o público. Jornalistas, criminologistas, especialistas forenses, policiais, e – claro! – autores do gênero trocaram ideias e experiências sobre violência, corrupção e criminalidade na literatura.

    No Chile, desde 2011 acontece o Festival Iberoamericano de Novela Policial “Santiago Negro”. Com autores da Argentina, Chile, México, Venezuela e Espanha, um dos objetivos é incentivar o intercâmbio cultural entre os participantes, qualificando a produção e difundindo novas expressões do gênero.

    Como se não bastasse a Feria Internacional del Libro de Santiago (Filsa), marcada para outubro e novembro, vai homenagear a literatura nórdica com ou devido destaque para Sissel-Jo Gazan (Dinamarca), Kjartan Fløgstad (Noruega), Tove Alsterdal e Johan Theorin (ambos da Suécia).

    Esses são apenas alguns dos festivais mais reverenciados do noir no mundo. Com uma produção de qualidade cada vez mais crescente, um mercado leitor gigantesco e editoras que nada devem às estrangeiras, por que não temos um festival do tipo no Brasil? Falta coragem ou ousadia? O que impede que uma cena cultural dessas aconteça pra valer? Quando chegará a nossa vez? Com a palavra, editores, livreiros, escritores e agitadores culturais…

    Chris Lauxx

     Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério  Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • FLIP 2013: considerações finais ou de como sai de Paraty

    FLIP 2013: considerações finais ou de como sai de Paraty

    bandeira flip

    A Flip acabou. E demorei 12 horas para chegar em casa com uma conexão em São Paulo que quase temi não pegar por um congestionamento na Dutra, ocasionado por um caminhão de Skol tombado na pista.

    A cobertura do evento se finaliza, não antes de pontuar pequenos acontecimentos que ficaram de fora, tamanha a quantidade de informações.

    Paralelos

    Há muitos eventos paralelos ao evento principal. O risco de perder alguma boa palestra é alta mas inevitável. Assim como não se deve se espantar caso descubra mais um evento paralelo na cidade que você não tinha ideia que acontecia.


    Muita gente bonita

    Há uma quantidade incontavel de pessoas, dos mais variáveis tipos. Tanto que, mesmo que saiba que há muitos escritores conhecidos transitando no local, a chance de encontrá-los é quase nula. Isso quando não olhamos diversas pessoas com o pensamento acho que ele é um famoso e eu não sei quem é e nem vou perguntar porque isso é babaca.


    FLIP/inha/ona/off

    Não vi a Flipinha. Não vi a OffFLIP. Pude ver duas palestras da FLIPZona para perceber que os paralelos também são bons e se destacam também pela informalidde. Vi duas mesas: Grafite, quadrinhos e afins, com Eloar Guazzeli – engraçadíssimo, talentoso e maluco – e Meton Joffilly, grafiteiro normal perto do Guazelli. E Teatro, Música e Literatura, com Paulo Scott – que participou também do evento principal – e falou sobre todas suas conexões literárias com tais vertentes e, tão conectado com os dias de hoje, não parou um momento de tão agitado.


    Crachá

    Entre a equipe de apoio, parceiros, imprensa e etc, o que mais se vê em qualquer lugar é gente usando crachá. É sempre divertido ver alguém com eles e tentar ler as letras míudas do nome e veículo. Sim, eu fiz isso. Sim, tentaram ler muitas vezes o meu.


    Cidade Histórica

    Tem que ter muito amor no coração para não se irritar com as pedras históricas do Centro de Paraty. Se precisar correr de um local para outro, mesmo que saiba que a distância é curta, comece a chorar. Vá devagar ou tropece.


    Livraria

    A Livraria da Travessa foi a responsável pela Livraria da FLIP. Só não entendi por que em um evento de literatura não se fez uma única promoção de livros. No próximo ano, coloque a Submarino lá para comprarmos 5 livros por R$50, por favor, Miguel Conde.

     

    FLIP x Mercado Editorial

    Os organizadores da FLIP são mais inteligentes que o mercado editoral brasileiro. Não que precise muito, talvez. Mas muitos dos autores vindos ao evento não tinham nem sequer um livro traduzido no país. O livro de Lydia Davis foi lançado em 2007 e somente agora, menos de um mês antes da FLIP, foi lançado no país. E este é apenas um exemplo.

    Mesmo não conhecendo nada sobre os bastidores, imagino que aconteça um lobby para saber qual editora pode contribuir para trazer alguns autores e se estão favoráveis a lançá-los no país. Somente isso pode explicar.

    Além do fato de, é claro, a maioria desses autores são literatos com maíscula. E literatura boa raramente vende. Mais fácil publicar best seller do que sanar com alta demanda grandes bons escritores que ficam sem lançamento aqui. Não digo que os populares não tenham espaço. Mas é uma pena que ainda exista essa polaridade.


    TOP o que?

    O G1 fez um TOP 10 da FLIP e, provavelmente, eles não assistiram ao que eu assisti. Elegeram a palestra improvisada de Tobias Wollf com Juan Pablo Villalobos uma das melhores da festa, dando destaque para Villalobos como carismático. Não que o mexicano não seja, apenas era claro que os autores estavam fora de sintonia e, para mim, isso não faz da mesa uma das melhores.


    Agora sim, acabou!

    Este colunista agradece a leitura dos textos e pede desculpas por eventuais deslizes. Foi uma oportuna união de espaços a ida à Paraty e a cobertura do evento. Em um mundo ideal, a cobertura seria feita diariamente, mas o dia é curto para ir ao evento, almoçar e jantar, caminhar pela cidade, dormir e escrever a cobertura das mesas. Mas, se querem poucas palavras, a FLIP e todos seus paralelos são excelentes e vale a pena.

  • FLIP 2013: a forma livre da literatura

    FLIP 2013: a forma livre da literatura

    dyer-e-sullivan

    Sábado foi o dia mais movimentado em Paraty. No dia seguinte, o público começa a diminuir e, talvez não por acaso, a décima nona mesa do evento, às 17h, A arte do ensaio, foi deixada para o último dia com a consciência de que parte do público não se importaria de perdê-la. Um erro por parte do público.

    Diferente da denominação comum da palavra ensaio tida no país, a expressão não significa no exterior o estilo de texto acadêmico presente em nossas universidades que é, normalmente, erudito demais quando não engessado ou empolado ao extremo.

    Com mediação de Paulo Roberto Pires, editora da principal revista ensaística do país, a Serrote, do Instituto Moreira Sales, dois dos grandes ensaístas contemporâneos, o britânico Geoff Dyer e o americano John Jeremiah Sullivan conversaram a respeito de uma das formas mais livres da literatura.

    A mesa foi a última conversa do evento. Já que o próximo encontro, programado para o início da noite, reúne diversos autores lendo trechos de seus livros de cabeceira. Até esta conferência, uma importante constatação, até então ignorada por mim em eventos acadêmicos, veio à tona: a importância do mediador.

    Paulo Roberto Pires foi exemplar. Soube transitar entre os temas abordados e as perguntas do público como quem produz uma fala única e bem composta. Pontuava considerações nos momentos certos e levantava boas questões que fazia os ensaístas dialogarem entre si.

    Escolheu ir além do tradicional, optando por primeiro conversar um pouco com os autores para depois, com público integrado a cada um deles, ouvir a leitura de cada um. Como estilo considerado livre pela maneira com que mescla erudição, opiniões pessoais e um estilo narrativo próximo da ficção, os escritores foram estabelecendo pontos de referência para que público compreendesse sua importância.

    Sem ter um formato próprio, o ensaio permite que o escritor deforme o estilo a favor de seu tema. Escolhendo uma voz adequada para abordar cada assunto que vem à tona sem a intenção formal. Por isso a indefinição do gênero e, não por acaso, a maneira com que escolhi abordar as crônicas do evento, sempre escolhendo a abordagem no estilo que parecia mais adequado com cada debate, tentando ao máximo produzir um bom texto referente.

    Dentre as mesas às quais assisti, elegi esta uma das melhores pela fruição com que autores e mediador conversavam, dialogando sobre o tema de maneira natural. Uma sensação que também reflete no público, menor que os dos dias anteriores mas não menos interessado.

    Coincidentemente, os dois ensaios lidos pelos autores tinham como tema a música. Dyer apresentou texto de seu livro sobre jazz, Todo Aquele Jazz, e Sullivan leu um pungente texto sobre Michael Jackson, de Pulphead – O Outro Lado da América, ambos da Companhia das Letras.

    Ao abordar o ensaio e fazer dele a última mesa dialogada do evento, a FLIP finaliza sua décima primeira edição privilegiando um dos grande temas deste ano, o prazer do texto e da leitura. E, naqueles aplausos no final da conferência, a festa literária anunciava seu final. Faltando apenas a reunião épica de autores que leriam seus trechos preferidos e, sem dúvida, falariam de si mesmos, sempre egocêntricos que são.

  • FLIP 2013 | Eduardo Coutinho e seu jogo de cena

    FLIP 2013 | Eduardo Coutinho e seu jogo de cena

    Abre-Coutinho

    Eduardo Coutinho é o grande documentarista brasileiro. Responsável por filmes como Peões, Edifício Master, Santo Forte e Jogo de Cena, Coutinho se tornou um nome central no cinema mundial ao investigar em seus filmes o olhar do diretor no documentário. Seu cinema é complexo, os últimos filmes repletos de teorização que alguém menos talentoso teria colocado em livro, mas Coutinho reflete sobre seu próprio cinema enquanto o realiza, criando uma obra única.

    O diretor é conhecidamente rabugento e arredio a entrevistas, mas a Flip acertou ao coloca-lo para conversar com Eduardo Escorel, amigo de longa data e montador de Cabra Marcado Para Morrer (além de Terra em Transe, São Bernardo e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro). Cabra é um dos filmes lendários do cinema brasileiro (nossa história tem alguns, filmes perdidos ou não terminados e que ainda assim influenciam profundamente a produção nacional): deveria ser uma ficção sobre movimentos de resistência camponesa na década de 60, mas teve suas filmagens interrompidas pelo governo militar; em 1984, Coutinho retornou aos lugarejos da Paraíba onde havia começado a filmar e fez um documentário sobre o filme que não foi.

    Mas Coutinho não é um mal-humorado, é, isso sim, um rabugento divertido. Durante 1:15 o cineasta foi escrachado e engraçado, contou sobre seu processo criativo, soltou pérolas de sabedoria ranzinza e pareceu se tornar um de seus personagens: um misto ambíguo de honestidade e atuação. Coutinho falou sobre isso, a diferença entre ter uma boa história e contar uma boa história e a todo momento chamou seus entrevistados de personagens e reforçou “é isso que eles são”. Eduardo Coutinho conta narrativas cuja matéria prima é a ficção.

    Foram exibidos dois trechos de filmes seus: a entrevista final de Peões, filme sobre os metalúrgicos da região do ABC Paulista, e um momento de Cabra Marcado Para Morrer. Depois de ambos, Coutinho contou sobre a filmagem dos longas e refletiu sobre suas próprias escolhas com clareza impressionante, talvez ele seja a pessoa mais consciente do processo cinematográfico que eu já ouvi falar (e já vi palestras de ícones como Abbas Kiarostami e Wim Wenders).

    Aos 80 anos, o diretor esbanjou energia, consciência, citações a Walter Benjamin e Marcel Mauss, Coutinho é um erudito e um teórico, mas tem a maravilhosa capacidade de condensar sua teoria em concretude. Na mesa do autógrafo, elogiei efusivamente Jogo de Cena e ele me respondeu com um entusiasmo genuíno e um sorriso afetuoso, assinou meu livro e escreveu “sem jogo de cena”, mas avisou “você sabe que isso não existe”.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • FLIP 2013: Barthes e Nabokov tem razão

    FLIP 2013: Barthes e Nabokov tem razão

    flip - o prazer do texto

    Lila Azam Zanganeh foi uma das escritoras que mais se destacou na FLIP. Principalmente, pelo exagero midiático em torno de sua beleza, elegendo-a a musa do evento (que exploro neste outro texto), quando, ao lado do escritor Francisco Bosco, compôs uma das melhores mesas do evento, na sexta, intitulada O Prazer do Texto.

    A mesa com mediação de Cassiano Elek Machado, destacava a força da literatura como objeto transformador, valendo-se de dois autores que, não por acaso, são objetos de estudos dos convidados: Roland Barthes e Vladimir Nabokov.

    Bosco abriu a conferência apresentando o conceito de Barthes sobre a leitura em seu excelente livro O Prazer do Texto. Fez um rápido diagrama imaginário com as mãos para configurar em síntese a teoria do francês sobre diferentes tipo de literatura divididos entre textos de prazer e texto de gozo. Para Barthes, a definição bifurca as narrativas entre aquelas que produzem prazer no leitor e as que produzem incômodo de alguma maneira, desautomatizando a leitura e fazendo-a mais densa.

    A apresentação da tese abre espaço para que Lila Azam Zanganeh apresente outra maneira de se compreender a literatura, vista pelos olhos do russo Vladimir Nabokov que acreditava na necessidade de produzir um encantamento no leitor. Uma espécie de êxtase que promoveria no leitor o misto de desconforto com certa paixão.

    Inevitavelmente menciona a obra mais conhecida de Nabokov, o romance Lolita. E demonstra sua compreensão pela obra do russo ao definir, em poucas frases, a grande importância do romance. Diz Lila que o enredo trata-se de uma história do amor  ocidental em uma época em que os poucos tabus presentes são a pedofilia e o incesto. Dessa maneira, o autor criaria uma história universal e transgressora.

    A história de Lila e Nakobov transita além do encantamento. O russo trocou sua língua mãe pelo inglês e a utiliza para escrever parte de sua obra literária sendo Lolita um desses romances em língua inglesa. Lila tem descendência iraniana, nasceu na França e parece reconhecer-se no autor por também ser patriada por duas línguas.

    Aprofundando-se em sua obra, escreveu O Encantador – Nabokov e a felicidade, realizando uma análise biográfica e narrativa sobre o autor e produzindo ecos e jogos do espelho entre a ficção e a realidade, como seu objeto de estudo faria em sua literatura. Compôs uma falsa entrevista com Nabokov tão profundamente ligada a narrativa do autor que Dmitri Nabokov, filho e herdeiro de seu espólio, espantou-se ao lê-la, tão fiel era a fala e o pensamento do pai.

    Evidenciando o prazer do texto, pressuposto por Barthes, estudado por Bosco, refletido em Nabokov com certa obsessão por Lila, a reverência à literatura atingiu seu máximo. Dialogando duas vertentes que se encontraram com perfeição. Em grande parte porque os excelentes convidados tinham domínio pleno dos assuntos abordados.

    Logo após a conferência, na Tenda dos Autógrafos promovida pelo evento, conversei brevemente com Bosco. Como graduado em letras que me tornarei, tentei, sem criar um discurso elogioso, afirmar que ele, aos trinta e seis anos, é um daqueles estudiosos que nos servem como exemplo pelo carisma e domínio do assunto. E, como quem quer saber sobre o futuro, perguntei se o caminho das Letras tem frutos.

    Lila, falando um português de invejar muitos nativos, atenciosa e simpática mas desconfortável com o calor de Paraty, fazia pose para as fotografias com os leitores e autografava seu livro. Diante da afeição que também nutro por Nabokov, não hesitei e lhe perguntei se ela tinha consciência que, daqui há uns trinta anos, outro apaixonado pelo autor, leitor de seu livro, escreveria uma nova tese traçando os paralelos entre a vida de ambos e o jogo de espelhos que ela refletiu a partir das máscaras de Nabokov.

    A franco-iraniana me olha nos olhos, sorri e responde: mas eu ainda sou tão pequena, como quem ainda deseja acreditar que está no caminho certo. E  penso não, Lila, sem dúvida não. E lhe digo, como quem já confunde autor com criatura, mas eu lhe prevejo um futuro brilhante. E assim nos despedimos.

    lila  O Prazer do Texto

    francisco bosco - flip

  • FLIP 2013: velhinhos que mandam bem

    FLIP 2013: velhinhos que mandam bem

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    Lydia Davis e John Banville são escritores maduros. Nasceram na década de 40 e desde cedo debruçaram-se sobre a produção literária ou ao seu estudo, proporcionando hoje um vigor narrativo e uma percepção precisa ao dialogarem sobre a composição da escrita. No sábado, dividiram uma mesa na Tenda dos Autores,  sobre Os Limites da Prosa.

    A aguda observação de si permitem que façam um diálogo sem cair nas respostas fáceis da literatura. São elegantemente vagos ao mencionar as motivações da própria escrita, mas certeiros ao demonstrar sua proposta literária e a comprensão da escrita em suas vidas.

    Embora neguem qualquer limite da prosa, defendem que é necessário que autores tenham um desafio constante para manter a escrita em evolução. Sem medo da opressão do papel em branco. Nunca temendo o processo de talhar a escrita, trabalhando-a arduamente.

    Banville e Davis contrastam-se e enriqueceram a discussão, principalmente, pela vontade de estabelecer um diálogo ativo, sem permanecerem apenas em suas cadeiras aguardando perguntas da mediação feita por Samuel Titan Jr.

    A pedido dos autores, a mediação foi realizada em inglês, fato que fez Titan Jr. constatar que, pela primeira vez, falava uma língua estrangeira para um público brasileiro, efeito que não causou nenhum problema a quem assistia a mesa e deixou os autores ainda mais confortáveis.

    O encontro poderia parecer improvável pela diferença tanto de escrita como de personalidade de ambos. Escritor desde a adolescência, o irlandês se destaca por seus romances, além de uma personalidade irônica. Já Davis compõe contos tão curtos que desafiam a definição do gênero e esconde a erudição em uma personalidade aparentemente pacata e prosódia lenta. A união improvável alimentada por um mesmo interesse resultou em uma excelente mesa de autores que compreendem sua própria arte e sentem prazer ao mencioná-la.

    No país, dois livros dos autores acabam de ser lançados. Vencedor do National Book Award Fiction em 2007 – o que revela um atraso imenso de edição – Tipos de Perturbação, de Lydia Davis, foi lançado pela Companhia das Letras. Pela Editora Globo, John Banville lança Luz Antiga, cujo trecho inicial – estupendo – foi lido pelo autor, e pela Rocco lança O Cisne de Prata, escrito com o pseudônimo de Benjamin Black. Pseudônimo que, de acordo com o autor, foi criado para atender ao mercado e pagar as contas mas que, ainda assim, se diverte ao escrevê-lo.

  • FLIP 2013: Companhia das Letras disponibiliza transcrição da primeira mesa do evento

    FLIP 2013: Companhia das Letras disponibiliza transcrição da primeira mesa do evento

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    A Companhia das Letras disponibilizou em seu Blog da Companhia a transição da Mesa O1, Dia-Dia De Baixo D´Agua, realizada no primeiro dia da FLIP, 05 de junho, as 10 horas.

    Com mediação de Noemi Jaffe, a mesa reuniu Alice Sant´ana, Bruna Beber e Ana Martins Marques em uma conversa sobre poesia.  A transcrição pode ser lida no blog da editora e apresentação da mesa conferida abaixo.

    Ao se tornar matéria de poesia nas obras dessas três jovens poetas, o cotidiano assume inflexões várias – cômico, melancólico, sublime. A sucessão dos dias, observada naquilo que tem de mais trivial, pode se estender num clima arrastado de tarde de domingo ou sugerir uma possibilidade inesperada de revelação, como indica o título do livro de Alice Sant’Anna, Rabo de baleia. O mergulho na vida íntima, aqui, se constrói por meio dessa tensão entre o campo delimitado pelas paredes da vida privada e um desejo reiterado de expansão.

  • FLIP 2013: o norueguês pede desculpas

    FLIP 2013: o norueguês pede desculpas

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    (a respeito da Mesa 8  intitulada Ficção e Confissão, realizada dia 05, as 17h15)

    Karl Ove Knausgård e Tobias Wolff dividiriam uma mesa sobre Ficção e Confissão que não aconteceu. Com o cancelamento do norueguês, Juan Pablo Villalobos foi o substituto para que se mantivesse uma discussão literária.

    A FLIP tentou. Mas selecionar autores para uma conversa é delicado. É necessário certa aproximação entre os mesmos, seja por uma proposta literária em comum, o estilo narrativo ou qualquer outro ponto de partida que desperte o diálogo.

    Wolff e Knausgård aproximam-se por um estilo narrativo memorialista, apoiado nas experiência da própria vida como material ficcional. Injetando na leitura uma sensação dúbia entre experiência vivida e experiência narrada que transforma uma realidade parcial, descrita a partir da memória. Há uma conexão evidente entre os autores.

    Semelhança que se perdeu com Juan Pablo Vilalobos que também se baseia em vivência para compor sua narrativa, mas não as faz como uma confissão explícita. E sim parte de um elemento observado – não necessariamente vivido – para a escrita (no caso de seu romance Festa no Covil, a violência do narcotráfico em seu país natal, México, é ponto de arranque da história).

    Deveriam ter pensado em modificar o tema para adequar ambos escritores. Tentando manter-se na programação original, a mesa perdeu a força. Em parte, porque a mediação de Ángel Gurría-Quintana me pareceu frouxa. Se tentasse aproximar melhor os dois autores, conseguiria promover um diálogo entre ambos. Mas preocupou-se em apenas apresenta-los e deixar com que cada um falasse sobre si. O resultado foi uma palestra dupla, próxima a uma entrevista de talk show, do que uma discussão literária.

    Alternando entre os escritores, Gurría-Quintana explorava as especificidades de cada autor com perguntas distintas que afastaram ainda mais os escritores, deixando Wollf – aguardado desde edições passadas do evento – em segundo plano. Como se faltasse um par com que pudesse dialogar sobre seu estilo de prosa.

    Não que não houvesse bons momentos de cada um isoladamente. Wolff emparelhou sua vida na literatura, louvando a mentira e a construção da narrativa a partir da memória, demonstrando consciência em sua proposta como autor. Vilallobos revelou preocupação em expor as mazelas de seu país de origem, afirmou ser também devoto da mentira como forma de narrativa, e da dificuldade em encontrar a voz adequada para composição de um romance. Mas não havia entre as falas uma conexão visível. A mentira como forma de narrativa foi o ponto mais em comum, mas logo se dissipava em outras questões.

    Talvez fosse caso de deixar de lado uma discussão entre escritores e partir para uma conversa franca com o autor presente. Se Wollf dialogasse sozinho com o mediador, a mesa ganharia mais força mesmo com a perda do debate.

    Karl Ove Knausgård e Tobias Wollf foram a melhor palestra que não foi. Ainda nas livrarias da cidade, o romance do norueguês continua na estante de autores presentes na FLIP. Imaginei por diversas vezes leitores imaginários folheando o romance e encontrando dentro deles um bilhete com os dizeres, desculpe por não participar do evento. Uma bobagem que me fez rir.

  • FLIP 2013: Mulher não faz literatura

    FLIP 2013: Mulher não faz literatura

    Lila Azam Zanganeh

    De pais iranianos, nascida em Paris, formada na École Normale Supérieure aos vinte anos, professora de Harvard aos vinte e quatro. Fala cinco línguas, uma delas, a brasileira. Mas nada foi suficiente. Lila Azam Zanganeh tornou-se a musa da FLIP pela beleza franco-iraniana.

    Fossem Lydia Davis e Maria Bethania mais novas, talvez houvesse concorrência. Quem sabe enquete na televisão para escolher a mulher que mais se adequasse a um padrão de beleza que lhe conferiria este importante título.

    Enquanto, ao meu lado, um grupo de garotas comenta sobre Francisco Bosco, parceiro de Lila no debate: bonitinho, dizem. Mas nenhuma nota de imprensa até agora conferiu ao ensaísta o título de mais belo homem do evento.

    E na literatura, exposta quase à margem da página, vive a mulher. Em séculos passados, escritoras utilizavam-se de pseudônimos masculinos para publicarem seus livros. Inconcebível uma mulher capaz de produzir narrativas. Dizem até mesmo que Vladimir Nabokov não simpatizava com suas tradutoras.

    Recordo-me de Cecília Meireles em seu poema Motivo, afirmando: sou poeta, contra a regra normativa de gênero que transforma poeta, no feminino, em poetiza. Esse sufixo que parece menor, rebaixado, precário diante do poeta, grande realizador.

    Perdoem-me o linguajar, mas Cecília tinha culhões. Em um pequeno verso, composto por duas palavras, equipara-se a todos os poetas, rindo deste disparate arbitrário que parece inferiorizar as poetas, indignas de estarem no mesmo panteão que eles.

    Mas a poesia de Cecília, nem a carreira bem-sucedida de Lila e sua precisão ao escrever sobre Vladimir Nabokov tem importância. Vale o sorriso amplo que revela dentes bem cuidados. Olhos observadores e o rosto simétrico destacado pela maquiagem bem realizada. Fatores suficientes para produzir belas fotografias.

    E torna-se fatal: musa. Sem tirar, nem por: musa. Deixam-se de lado a carreira, os estudos acadêmicos, a leitura atenta à obra de Nabokov, a composição dos ensaios críticos. Porque Lila Azam Zanganeh é uma mulher bonita.

    Nas páginas de seu livro O Encantador: Nabokov e a Felicidade vejo a escritora escorrer pelos cantos. Banida do reconhecimento. Exilada do panteão contemporâneo da crítica literária. Esperando desesperadamente perder a beleza para que se concentrem no cerne da questão: seu exímio trabalho premiado ao biografar Vladimir Nabokov. Enquanto isso, ela acena, sorri com os aplausos, sendo o bibelô de nossa imprensa.

    E a beleza de Francisco Bosco? Não importa. Ele é um escritor e temos de nos concentrar naquilo que ele produz.

    Enquanto isso, musa.

  • FLIP 2013: T. J. Clark e um Picasso

    FLIP 2013: T. J. Clark e um Picasso

    819_ngDizem que a FLIP é uma caixinha de surpresas. Nem sempre o evento com a maior probabilidade de ser excelente, com dois grandes escritores, torna-se a melhor mesa literária. Se os envolvidos não conseguem produzir um bom diálogo, mantiver uma química, tudo é fracasso.

    Porém, há palestras que não perdem seu potencial de maneira alguma, como a quarta mesa do evento, Olhando de Novo para Guernica de Picasso, um tema específico escolhido a dedo para dialogar sobre a pintura, pouco explorada na festa literária com possibilidade nula de falhar.

    O crítico e professor de arte Paulo Sérgio Duarte foi o responsável por abrir a conferência apresentando T. J. Clark, um dos mais experientes críticos vivos de arte que, nas palavras de Duarte, ainda ousa produzir seus artigos sem se afastar dos objetos de estudo. Mantendo ativamente a análise ao lado de cada obra, em sua produção crítica.

    Clark reconhece que Guernica, de Picasso, é uma obra grandiosa. Assim, escolhe o espaço dentro da tela para dissertar sobre o modo de composição do pintor até finalizar derradeiramente o grandioso quadro – grande também por suas proporções, além das diversas leituras diferenciadas.

    Transita pelas etapas de produção, revelando esboços e retratos tirados na confecção do quadro e extraindo detalhes de quem, sem dúvida, dedicou-se a observar cada pincelada do quadro como um movimento inteiro novo.

    O diálogo com o público é franco sem nunca duvidar da competência de sua análise. Densa, repleta de pormenores mas que, em uma fala concisa e entusiasmada produz no público a óbvia sensação de que estamos lidando com um grande profissional de arte capaz de transmitir apaixonadamente o que sente por aquilo que estuda.

    Quanto a Guernica, a obra continua completa, talvez ainda mais contemporânea, ainda mais precisa, um dos maiores quadros ilimitados da arte.

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  • FLIP 2013: Sopa de Hatoum

    FLIP 2013: Sopa de Hatoum

     

    milton_hatoum

    Encontrei o escritor Milton Hatoum na casa do Instituto Moreira Salles. Duas leitoras pediam autógrafo em seu novo livro, Um Solitário a Espreita, lançado pela Companhia das Letras. Enquanto observava a cena, o escritor era abordado por diversos colegas de profissão.

    Hatoum parecia cansado após um longo dia de trabalho. Disse que recebeu diversos veículos da mídia e, evidentemente, era interpelado inúmeras vezes pelos leitores admirados que pediam autógrafo ou uma fotografia.

    Um fio de conversa chegava aos meus ouvidos sobre os elogios do público sobre sua conferência de abertura, em homenagem à Graciliano Ramos, na noite de quarta – feira. Compreendi que o homem que dialogava com o escritor era do próprio IMS. Se compreendi bem, mencionaram a ideia de lançar na íntegra o referido discurso de Hatoum em ebook e futuramente em edição impressa. Provavelmente, na revista Serrote.

    Neste momento, também aguardava trocar breves palavras com o escritor, enquanto outro grupo atrás de mim esperava o mesmo. Relembrei-o que há alguns anos, ele esteve em Araraquara, na Unesp, em um evento promovido pelo nosso centro acadêmico. Hatoum disse se lembrar, afirmando ter sido uma boa conversa mas, quem pode saber se de fato ele se lembrou ou se foi apenas cordial com quem lhe demonstrava afeição?

    Ali, cercado de admiradores e profissionais que lhe parabenizavam pelo discurso, com jornalistas aguardando um horário em sua agenda para uma entrevista, vi Hatoum como o próprio solitário a espreita. O escritor que reconhece que, além dos ossos do ofício da escritura, deve também ser uma figura de expressão, sendo quase obrigatório ter uma postura opinativa sobre diversos assuntos e, se for ciente de seu público, não negando o carinho dos leitores.

    A graça da FLIP é a quantidade diversificada de público convivendo em um mesmo local por um mesmo motivo. Espaço que deixa escritores e leitores lado a lado. Sendo fácil observar que eles são como nós. Sem esse papo de superiores, incríveis, inquebráveis, apenas porque são donos de uma narrativa de causar inveja de tão boa.

    Li os dois primeiros romances do escritor e estas duas narrativas foram suficientes para que pedisse uma foto ao seu lado. Fotografamos e lhe afirmei o óbvio sobre seu discurso na noite anterior. Quantas vezes, pensei, ele não deve ter ouvido as mesmas palavras nestas últimas horas?

    Faz parte do ofício de escritor. Mas fiquei refletindo no quanto deve ser exausto, além do trabalho em si, composto nas narrativas, carregar o peso de ser uma figura quase intangível.

  • FLIP 2013: Introdução ou de como fui à Paraty

    flip

    Começou hoje a 11ª Festa Literária Internacional de Paraty, a FLIP, e minha missão nos próximos dias é acompanhá-la diariamente, apresentando as notícias referentes ao evento e cobrindo as mesas literárias que assistirei, tanto do evento principal como das outras diversas programações que acontecem paralelamente em Paraty.

    Leitor assíduo de literatura e estudante de Letras, sempre fui entusiasta do evento e curioso sobre a mítica em torno da cidade histórica de Paraty. Mas sem dinheiro no bolso não se vai longe e sempre permaneci em casa acompanhando o evento com aquela ponta de inveja de quem esteve presente.

    A proposta que nosso editor-chefe, vulgo general / coronel,  fez foi irrecusável. Hotel cinco estrelas em Paraty com tudo pago para cobrir o evento porque, de acordo com ele, faltava literatura dentro do caldo cultural do Vórtex. Então, depois de me enviar um cheque graúdo que, estranhamente, havia fundos, eu iria oficialmente para Paraty com tudo pago.

    Não, peraí, nada disso. Vamos de novo.

    Depois de um longo planejamento – longo – e de um período de economia – regado a copos d´água e cascas de pão – uni o útil ao agradável e propus ao nosso general que, aproveitando que eu estaria em Paraty, cobrisse o evento. Seria um desafio pessoal e complementaria ainda mais o espaço literário do site. E aqui estamos.

    Sendo o evento literário mais conhecido do país, grandes veículos midiáticos se voltam para Paraty produzindo especiais, promoções, perfis, análises e toda uma cobertura diferenciada sobre o evento. Fazendo-os pensar, o que haverá de diferente nesta cobertura? E eu respondo: absolutamente nada.

    Mas achei que não haveria problema em tentar, principalmente porque estamos falando de um assunto que tenho muita paixão e, não por coincidência, também minha futura formação acadêmica. Dessa forma, os leitores acompanharão nos próximos dias breves comentários a respeito de cada palestra que estiver presente, bem como as notícias divulgadas direto da central de informações da FLIP (o evento tem pompa, nada de falar assessoria de imprensa, não!).

    Serão breves comentários diários sobre o que os ditos grandes autores falam sobre seu ofício e como se relacionam com a contemporaneidade. E, nos dias seguintes ao término da Flip um texto narrando a experiência da viagem, porque quem não tem cacife para ir aos Estados Unidos – alô, Pablo – viaja para Paraty mesmo.

    Para quem se interessa por literatura, a programação da FLIP e de todos os seus eventos paralelos deixa qualquer um maluco. Não há chance de conseguir assistir tudo o que se quer devido à tantas conversas potencialmente boas marcadas em simultâneo para os próximos dias.

    Mesmo quem não pode estar em Paraty, há a possibilidade de assistir todas as mesas principais no site da própria FLIP. Um excelente conceito para promover a discussão cultural sem a necessidade de aprisioná-la em um local somente para iniciados.

    Dialogar sobre literatura é sempre arenoso. À parte as indefinições de diversos conceitos teóricos, sempre chega um momento em que o egotismo, a metralhadora verborrágica, fala mais alto do que a conversa informal. Alguns dos elementos que eu pretendo evitar porque, francamente, o ambiente acadêmico literário já é um porre. Não precisamos transformar um evento bacana – que não a toa tem a informalidade na festa do título – em mais um sermão sobre a queda de Roma.

    Vamos, então!