Tag: Gary Ross

  • Crítica | Oito Mulheres e Um Segredo

    Crítica | Oito Mulheres e Um Segredo

    Nos anos sessenta, Frank Sinatra ao lado de seus amigos, Dean Martin e Sammy Davis Junior, fizeram Onze Homens e Um Segredo, décadas mais tarde Steven Soderbergh revisitou a trama em uma série de três filmes e um elenco estelar. Oito Mulheres e Um Segredo segue na mesma esteira, se valendo do subgênero dos filmes de assalto, mas sem ter associado a si a moda que envolvia a versão do longa que tinha George Clooney, Brad Pitt e Matt Damon como seus chamarizes, esticando ainda mais a fórmula em um produto que tem gosto de bolo solado.

    A história começa com Debbie Ocean, a irmã de Danny (Clooney), vivida por Sandra Bullock. Essa relação é necessária, pois o nome original da franquia é Ocean’s Eleven (no caso desse, Ocean’s Eight), por mais bizarro que isso seja, já que em três longos filmes jamais se falou a respeito da irmão de Danny e de todas as suas habilidades. Após sair da prisão, ela planeja uma vingança contra o sujeito que a incriminou, e para isso, ela reata a relação que tinha com a bela Lou, vivida pela (também) oscarizada Cate Blanchett, que ao que tudo indica, é um antigo amor da protagonista.

    Os problemas e clichês do roteiro de Gary Ross (também diretor dessa versão) e Olivia Milch começam exatamente no dueto de Deb e Lou. As duas não são flagradas aos beijos ardentes, e não protagonizam cenas que possam servir de pretexto para que os espectadores machistas possam enxergar ali potencial para o onanismo, mas a total falta de química e de cenas que façam elas parecerem realmente próximas sentimentalmente torna Oito Mulheres e um Segredo um produto moralista, que não tem coragem sequer de assumir que suas protagonistas sejam bissexuais ou lésbicas.

    O restante do grupo de assalto é formado por Amita (Mindy Kaling), especialista em jóias; a contrabandista “aposentada” Tammy (Sarah Paulson); a ladra de mãos leves Constance (a rapper Awkwafina); a hacker Nine Ball (Rihanna); e a estilista decadente Rose Weil (Helena Bonham Carter). O plano envolve fazer com que a atriz e bela socialiate Daphne Kluger (Anne Hathaway) utilize um conjunto de jóias reais, guardado sobre segurança máxima por uma seguradora. O texto é tão óbvio que se percebe já no início que as personagens se juntariam, mesmo as que não estão no plano inicial, e essa obviedade é irritante principalmente porque esse filme não possui o mesmo carisma da trilogia de Soderbergh, e o trato entre as mulheres ocorre inclusive após uma demonstração de extrema carência de Daphne, que basicamente repete frases machistas que remetem a falsa afirmação de que amizade entre mulheres é pautada na falsidade.

    Ainda no quesito falácia, há uma cena constrangedora, que envolve a fuga das assaltantes, cada uma com uma roupa elegante, com sua parte dos espólios furtados. A cena é basicamente um pretexto para cada uma das intérpretes aparecer com vestido de gala e algum diamante, não faz sentido na continuidade do filme quanto na ideia pueril de “empoderar” as mulheres, já que o conceito desse poder é associado a posse de objetos que visam atrair os olhares masculinos.

    Oito Mulheres e Um Segredo parece ter sido feito sob demanda para um certo público, no entanto, sua abordagem é tão rasa quanto os argumentos liberais que precedem estes pedidos de representatividade a qualquer custo, pois não acrescenta nada ao gênero ou mesmo a série de filmes, além de ter em Ross uma direção muito mais frouxa que a de Soderbergh e deixar claro a falta de sintonia e camaradagem entre o elenco, muito diferente do que ocorreu no filme de Sinatra ou na série de Clooney.

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  • Crítica | Um Estado de Liberdade

    Crítica | Um Estado de Liberdade

    Se tem um assunto além da segunda guerra mundial que os EUA adoram fazer filmes sobre é a sua Guerra Civil. Durando de 1860 a 1865 entre os confederados e a união, a também chamada Guerra de Secessão forjou violentamente o caráter industrial do Norte do novo país, assim como manteve suas tradições racistas e agrárias no sul. Este conflito mexeu tanto com o imaginário do americano que museus, roupas, armas, cartas de soldados e encenações de batalhas são um enorme filão de comércio, mas sempre mantendo a dicotomia Norte x Sul. Neste sentido, Um Estado de Liberdade joga uma nova luz sobre o evento.

    O filme conta a história de Newton Knight (Matthew McConaughey), um pequeno proprietário de terras do interior do Mississipi que ao perceber a inutilidade de uma guerra que não era sua, deserta (como muitos soldados confederados) e volta para casa. Ao se dar conta das injustiças que os confederados cometem contra uma família de amigos, tenta protege-los, mas isso expõe seu status de desertor e ele precisa fugir. Ao ser ajudado, se une a também escravos fugidos e ali passam a tramar uma insurreição contra os confederados dentro de seu próprio território.

    Devido aos desmandos do comando sulista, os desertores só engrossam as fileiras dos revoltosos, causando problemas reais aos grandes proprietários de terras e escravos da região, devido ao caráter abolicionista e igualitário da insurreição. Porém, quando Knight não recebe apoio nem da união, a revolta enfraquece, e o consequente fim da guerra e os acordos de paz entre as elites locais trazem uma paz para os ricos de outrora, mas uma perseguição intensa aos antigos escravos libertos, formando as primeiras células da KKK na região, tratados no excelente terceiro ato do filme.

    Se por um lado a história de Knight é interessantíssima sob o ponto de vista da história local e de como uma pequena parcela da população local se organizou por conta própria, o filme trata o próprio protagonista de uma forma tão heroica que soa como uma das grandes biografias do passado, contrastando com a proposta de trazer novos tons a uma narrativa tão batida. O passado de Knight, que poderia explicar porque ele não era racista como seus iguais (a ponto de ter o primeiro casamento inter-racial registrado) no estado mais racista dos EUA, é completamente ignorado, e ele acaba encarnando o papel do “homem branco bom”, que assola os filmes passados na época.

    Na mão de um roteirista e diretor um pouco mais competentes, toda a excelente produção e reprodução fiel das batalhas do século XIX, de uma guerra antiga, teriam uma importância muito maior, assim como o trabalho de atuação, muito competente, por parte de todo o elenco. Comparando com Tempo de Glória, todas essas diferenças de tratamento ficam abundantemente claras, no entanto, com essas escolhas dramáticas rasas, lembra mais O Patriota. Com seus 139 minutos de duração, tempo para desenvolver isso não foi uma questão, e sim direcionamento, ou talvez talento.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | Jogos Vorazes

    Crítica | Jogos Vorazes

    “Quem não tem criatividade para criar tem que ter coragem para copiar”. Muitas obras seguem à risca esse pensamento e podemos notar isso muito bem nos últimos anos, já que a maioria dos grandes sucessos na literatura e no cinema não passam de re-contextualizações de temas e histórias clássicas. Jogos Vorazes, adaptação de uma série de livros de mesmo nome, está aí como mais novo representante desse fenômeno e o faz muito mal.

    Em um mundo pós-apocalíptico, o governo da Capital realiza anualmente um doentio reality show em que 24 jovens devem se enfrentar até sobrar apenas um vivo. A história se foca em Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence), uma garota do Distrito 12, que se voluntaria a participar do programa substituindo sua irmã mais nova, que havia sido escolhida no sorteio.

    Battle Royale (2000), filme do diretor Kinji Fukasaku baseado na obra homônima de Koushun Takami, não sai da minha cabeça em nenhum momento do filme. Muitos podem achar tendenciosa essa análise, mas todos os elementos principais daquela história estão presentes no filme de Gary Ross: governo obrigando jovens a matarem uns aos outros simplesmente para reafirmarem sua soberania frente à população, basicamente. Porém o problema não é a re-utilização da ideia, mas a falha em sua execução.

    Imagino que em um cenário em que cidadãos ordinários são colocados para matarem uns aos outros em um reality show (considerando que eles não tem escolha se querem ou não fazer aquilo), o que mais deveria ser explorado seriam os conflitos internos e os pensamentos obscuros que circunscreveriam os “participantes”. Aquelas pessoas não são homicidas. Apenas foram obrigadas a estarem ali. Em Jogos Vorazes essas dúvidas e hesitações não existem e, por isso, podemos ver jovens entre 12  e 18 anos matando umas as outras como se tivessem sido criadas para isso. O fato de ser uma ficção científica não exime dessa responsabilidade, já que notamos que a população no geral está descontente com esses jogos. Vale dizer inclusive que o filme sequer poderia ser considerado uma “ficção científica”, pois as aparentes tecnologias futuras não fazem diferença alguma na trama (no máximo aparece uma nave voando, que também não faz nada).

    Os personagens são vazios e não evoluem conforme os fatos vão se desenvolvendo. A protagonista interpretada por Lawrence – a qual é uma atriz muito boa, porém seu papel no filme não valoriza sua atuação – sequer consegue convencer de que as mudanças abruptas que estão ocorrendo em sua vida a estão realmente afetando. Os personagens são completamente desprovidos de sentimentos e tirando por dois momentos de “emoção forçada”, o filme não convence. Inclusive temos uma tentativa de um romance,  contracenado com o ator Josh Hutcherson (que interpreta Peeta Mellark), o qual simplesmente se demonstra ambíguo, fazendo com que não conseguimos saber até que ponto existe sinceridade na personalidade de ambos personagens. As atuações de Lenny Kravitz (sim, pra mim foi uma surpresa vê-lo no filme também), Stanley Tucci e Elizabeth Banks apenas se resumem aos seus visuais “futurísticos” que se aproximam do bizarro, muito provavelmente inspirados pela cantora Lady Gaga.

    Outro fato que incomoda muito é a ausência de violência em um filme cujo pressuposto inicial são “pessoas se matando em um reality show”. O diretor Gary Ross optou por escolher todas as opções erradas, inclusive na hora das cenas de ação, as quais ao invés de serem minimamente interessantes acabam se tornando confusas e sem nexo, pois a única coisa que vemos são borrões de movimentos causados por uma câmera bagunçada, que não tem coragem de mostrar a violência que o filme, em tese, se propõe.

    Tal como Crepúsculo se aproveitou das lendas dos vampiros e lobisomens para fazer uma contextualização mais “atual”e voltada para um público mais jovem, Jogos Vorazes faz a mesma coisa com Battle Royale (entre outras referencias) e perpetua um filme ruim, que não se sustenta e não cumpre sua proposta.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.

    Você também pode conferir a minha análise do filme, com um ar um pouco mais descontraído (e ainda sob fase de melhorias), em formato de vlog no primeiro episódio de FASTBURGER. Confiram logo abaixo:

    – Texto de autoria de Pedro Lobato.