Tag: Joe Pantoliano

  • Crítica | Fuga à Meia-Noite

    Crítica | Fuga à Meia-Noite

    Fuga à Meia-Noite conta a historia de Jack Walsh, caçador de recompensas e ex-policial interpretado por Robert De Niro cuja única busca real é por dinheiro, de preferencia, o que vem de maneira fácil. O filme dirigido por Martin Brest e escrito por George Gallo não perde tempo, mostra ele em ação contra um bandido procurado, acompanhado de uma trilha de jazz de Danny Elfman que lembra um remete a música de Eric Clapton em Máquina Mortífera. O filme tem um humor próprio, é divertido e engraçado, especialmente pelo carisma de seus protagonistas.

    Eddie, o contratante dos serviços de Jack interpretado por Joe Pantoliano propõe a ele um trabalho que parecia ser simples, mas resulta em algo drástico: a escolta a um contador de Nova York até Los Angeles. Jonathan Mardukas (Charles Grodin) tem problemas com bandidos e com o FBI, fato que faz os dois lados da lei irem atrás de De Niro. Jack é engraçado, tem mãos leves, semblante fechado e não aparenta ser tão trapaceiro quanto de fato é.

    O filme é cheio de reviravoltas em seu roteiro, o contratante ao se sentir ludibriado tenta pegar seu alvo com outro mercenário, Jack aplica diversos golpes enquanto faz a transição de seu prisioneiro, o contador tenta subornar o encarregado de leva-lo e ate manipula a doação de gorjetas quando ele se serve em um restaurante. O filme é todo baseado em jogos de influências e é bastante inteligente dentro dessa proposta, seus personagens são reais, densos, mesmo quando aparecem rapidamente.

    Walsh é um sujeito com uma vida normal, tem problemas mundanos, dificuldade de lidar com aspectos pessoais de sua rotina, e mesmo a historia sendo breve, há algum nível de aprofundamento dessas causas, ainda que por meio de eventos inesperados e entrópicos. Essas e outras circunstâncias aumentam o caráter de comédia de erros que o filme apresenta, toda sorte de infortúnio ocorre com o policial aposentado, de modo que uma simples missão de transporte vira uma epopeia que brinca com o poder paralelo.

    De Niro e Grodin tem química, tem uma sinergia típica de amigos que se conhecem há muito tempo. Acompanhar a intimidade dos dois é gratificante, pois é quase uma síndrome de estocolmo só que invertida, já que Jack, o “sequestrador” passa a confiar em Jonathan mesmo que ele esteja em uma posição inferior, a despeito até da experiência e esperteza do agente.

    Os momentos finais são carregados de suspense, bastante tensos. A obra de Brest mistura elementos de filmes thriller, comédia de humor negro e claro, filmes de máfia. Fuga à Meia-Noite tem um De Niro bastante à vontade, apresentando facetas que são familiares em sua carreira ainda que com com temperos diferentes. Toda a jornada de Jack e Jonathan é digna de uma odisseia de Ulisses, voltada claro para o cinismo típico dos filmes de tiras dos anos oitenta, é um clássico esquecido de sua época.

  • Crítica | Bad Boys: Para Sempre

    Crítica | Bad Boys: Para Sempre

    Por outras duas vezes, Michael Bay se juntou a Will Smith e Martin Lawrence para fazer os episódios cinematográficos da franquia Bad Boys, conseguindo muito sucesso em um e um enorme equívoco no outro. Demorou mais de uma década para que houvesse um terceiro tomo, dessa vez sem Bay. Em Bad Boys Para Sempre, os personagens estão mais velhos, mais falhos e sentimentais e não demora a demonstrar esses sentimentos e sensações.

    No início do filme há uma perseguição de carros, protagonizada obviamente por Mike e Marcus, pelas estradas de Miami, atrás dos malfeitores, e essa tradicional entrada apoteótica é seguida de um momento sentimental, com o nascimento do neto de Burnett, mostrando que para todos os efeitos, a direção de Adil El Arbi e Bilall Fallah emula o estilo do diretor antigo, mas há uma abordagem mais aprofundada do lado mais emocional.

    O problema do longa reside no roteiro mesmo, que se vale de vilões latinos, genéricos ao extremo e que supostamente teria ligação com os bad boys. Ao menos não se dá grande importância para eles, exceto quando tentam execuções e claro, no final. O modo como o texto lida com as dificuldades dos personagens em aceitar o peso da idade e experiência suaviza essas questões.

    O tom dramático ainda soa bobo, mas é mais acertado neste. As tentativas de parecer grave e nos conflitos entre Burnett e Lowrey fazem sentido, além das simples piadas. Eles são falhos, agora mais do que nunca, já que seus dias são mais lentos e mais difíceis de lidar graças ao peso dos anos de ação, e mesmo personagens secundários, como o chefe deles Conrad Howard (Joe Pantoliano) tem mais função aqui do que em Bad Boys II, por exemplo.

    Uma das boas mensagens do filme moram na sabedoria por trás da hora de saber parar, de como a natureza do trabalho do policial pode ser perigosa e de como e quando se deve perceber que o ciclo é finito e que é preciso deixar de lado questões de vaidade, de revanche e quando é o momento de desapego. Para a  dupla de amigos, é um misto de cada uma dessas sensações.

    Os momentos finais são carregados de pieguice, especialmente na questão de legado envolvendo Mike Lowrey. Esse assunto já havia sido levantado no recente Projeto Gemini de Ang Lee, e por mais que Bad Boys: Para Sempre não seja tão equivocado quanto o outro, há problemas sérios, de orçamento e condução do desfecho  no quesito ação, mas assim esse terceiro filme tem mais acertos que o anterior, consegue introduzir bem um novo núcleo de policiais especializados em tecnologia e ação de campo além de desenvolver bem o clima de aventura, fazendo valer o espírito dos personagens pela última vez.

  • Crítica | Bad Boys II

    Crítica | Bad Boys II

    De começo bastante apelativo, Bad Boys II retorna oito anos depois e se inicia com uma sequencia criminal muito elaborada, mostrando traficantes de drogas em Miami com um conjunto de ações submarinas, agindo sobre a maré e com apoio tático de todos os lados. O novo vilão, Johnny Tapia (Jordi Mollà) se assemelha aos vilões genéricos do  programa Miami Vice, mas é ainda mais canastrão e caricato, trata as mulheres mal como bom personagem maniqueísta dos bons exemplares da filmografia de Michael Bay.

    Os Bad Boys jamais foi um filme que tentava reinventar o gênero de ação/aventura, eles se valiam de clichês dos gêneros, unidos a marcas de filmes policiais, munidos de muito humor, e de certa forma, o roteiro de Ron Shelton e Jerry Stahl contempla isso também, mas toda a estética envolvida é evoluída, a linguagem cinematográfica condiz muito com o que se fazia em matéria de ação brucutu e introduz os heróis Marcus Burnett(Martin Lawrence) e Mike Lowry (Will Smith) invadindo uma ação de supremacistas brancos, que pegam emprestados até as indumentárias da Ku Klux Klan.

    Em menos de dez minutos se abrange temática racial, problemas com as drogas e cenas de ação genéricas, com direito a disparo de balas em câmera lenta com conseqüências cômicas. Fora isso, ainda há viagens de ácido mostradas de maneira literal, em boates com muito neon,contemplando as imagens com movimentos de câmera que vem dos pés até a cabeça dos personagens, em uma clara demonstração do cineasta de que ele sabe filmar dessa maneira.

    No meio de toda a bagunça da imbatível dupla há o acréscimo de Syd (Gabrielle Union), irmão de Marcus e que tem um caso secreto com Mike, e também um pedido de transferência de Burnett. Sai a simplicidade do texto anterior para um arremedo de script que junta dezenas de plots e não desenvolve minimamente nenhum, na falta de uma historia coesa ou pretensiosa, Bad Boys II apela para toda sorte de dilema, de situações genéricas e de violência super gratuita. Há semelhanças bizarras com Matrix Reloaded e Mais Velozes e Mais Furiosos, lançados no mesmo 2003, além  de referenciar outras fitas de ação recentes para a época, sendo que nenhuma era boa, e nenhuma é superada por esta.

    A câmera viaja demais pelos cenários, de um modo que quase causa náuseas no espectador. As situações são extremamente genéricas, mesmo que o trabalho da direção de arte tenha cuidado em mostrar detalhes incríveis. Há toda uma sequencia de tiroteio depois dos anti heróis passarem em uma loja de artigos religiosos. A troca de tiros é confusa na maioria das vezes, denegrindo ou dando pouca importância inclusive para a quantidade de entidades religiosas aludidas visualmente, entre santos católicos, orixás e entidades de credos afro-brasileiros.

    É tudo muito confuso e forçado, um exemplo de quão mal pensado é o esquema visto no script é o modo como Marcus se veste. Ele era inseguro no outro filme, mas nesse, é também carente e insuportável, vive utilizando regatas e roupas de esporte, como se precisasse dos torcedores do Miami Heat para transpirar carisma, ele já causava simpatia no espectador, não precisava de nenhuma apelação.

    As minorias GLBT são mostradas de modo muito caricato, forçado e artificial. Quase tudo que funcionava no outro filme é mal replicado aqui, o Capitão Howard de Joe Pantoliano é uma sombra do que era, e o uso de Michael Shannon, como o bandido pé rapado Floyd Poteet não chega nem perto do que era o papel de Michael Imperioli, e claramente ambos fazem a mesma coisa, com algumas diferenças de pano de fundo. Nem a relação familiar dos Burnett segue semelhante. Nem mesmo a pieguice, que antes era charmosa, funciona, aqui é pura gratuidade mesmo.

    A meia hora final é  ainda mais constrangedora, onde se faz piada com necrofilia mais de uma vez, e em uma sequencia tão grande que faz perguntar quando ela acabaria. Os dois protagonistas não conseguem salvar o longa de soar um pastiche do que foi o primeiro, o que é lamentável, dado que havia grandes expectativas sobre os rumos dessa continuação, que já  demonstrava que o cinema de Bay estava desgastado e refém de suas próprias formulas.

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  • Crítica | Amnésia

    Crítica | Amnésia

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    Em 2000, Cristopher Nolan, então um diretor estreante, movimentou os festivais, surpreendeu a crítica e foi indicado a dois Oscars com um filme contado ao contrário.

    O primeiro plano de Amnésia nos mostra uma polaroid que desaparece gradualmente e a primeira cena estabelece toda a estrutura do filme: essa é uma história contada de trás para frente, em que o diretor nos apresenta as consequências antes das causas.

    O protagonista de “Amnésia” é Leonard, um homem incapaz de armazenar novas memórias após ser agredido pelo mesmo homem que estuprou e matou sua mulher. Em busca de vingança ele desenvolveu um sistema de notas, fotos e tatuagens para se lembrar do que é importante e do último propósito que ainda o mantém funcionando.

    Em determinado momento Leonard diz que sua condição é como estar sempre acordando, sempre naqueles poucos minutos em que o mundo ainda não entrou em foco e você não sabe exatamente quem é ou onde está. E a estrutura do filme simula exatamente essa sensação: cada vez que um novo fragmento começa o espectador não tem ideia de como chegou ali.

    No entanto, mesmo ao contrário, a informação se acumula e conforme o filme avança nós passamos a interpretar a origem dos atos de Leonard sob a ótica de suas consequências. Nolan domina muito bem esse efeito ao inserir reviravoltas e tornar duvidosas as origens de atos que até então julgávamos certos. Ao final do filme o lugar do espectador é de novo muito parecido com o de Leonard: ele viu a conclusão de uma história, mas não pode confiar plenamente nela.

    Dessa forma “Amnésia” usa as possibilidades do cinema para reforçar e construir a historia que conta, e Nolan se prova desde o início um diretor particularmente consciente de seu ofício. No fundo, o filme fala sobre as diversas possibilidades de uma narrativa e, principalmente, da forma como alguém constrói sua identidade a partir das histórias que conta a si mesmo.

    Nolan voltará nesses temas em seus filmes posteriores. Ainda que ele nunca revisite a mesma ousadia de forma, seu cinema se constrói em reflexões sobre identidade, manipulação e as histórias que escolhemos contar para nós mesmos.

    “Amnésia” é ao mesmo tempo um filme não-convencional e um noir, um dos gêneros mais clássicos do cinema, sua estrutura aparentemente difícil é dosada com cenas intermediárias que a tornam mais fácil de absorver. É um excelente filme de estreia e marca Nolan como um grande herdeiro de Hitchcock, tanto nas escolhas narrativas e formais, como na capacidade de andar na linha entre o autoral e o comercial.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.