Review | Love – 1ª Temporada
Produção realizada partir de uma ideia antiga de Judd Apatow, que já tem uma vasta experiência em capitanear comédias cinematográficas sem necessariamente dirigi-las, Love é um retorno às origens para o autor, um resgate ao formato deixado anos atrás, a exemplo das comédias dramáticas Freaks and Geeks e Undeclared. O foco desta vez é o sentimento universal, aprofundado em vivências bastante distintas nas personagens de Mickey (Gillian Jacobs) e Gus (Paul Rust), que se encontram em hemisférios completamente diferentes no campo amoroso, inclusive com pares completamente diferentes do que consideram ideais.
O chamado à aventura acontece quando ambos conseguem sair do relacionamento fracassado em que estão, com variações de tempo cada vez mais extensas entre um ponto e outro, o que dá à rotina de ambos o caráter de resumo da melancolia e da angústia proveniente da vida adulta, entre uma decepção sentimental e outra, capaz de atordoar até o bom senso: a moça mergulha em um estado sentimental depressivo e o nerd em uma recusa de sexo grátis.
O encontro entre as partes ocorre graças ao acaso e aos problemas de socialização da moça. Mickey lembra bastante seu personagem em Community, Britta, em especial por sua personalidade explosiva. A diferença básica é que nesta encarnação ela não tem um fracasso profissional como base de seu drama diário, apesar de ter sua vida igualmente bagunçada. Somando estes defeitos a sua beleza, produz-se um charme grande na personagem, além de uma empatia sui generis.
A parte jocosa do programa não é escrachada, ao contrário, é sutil e de situações, como em Tá Rindo do Que?, se valendo de questões pontuais de roteiro ao parodiar o cotidiano de um modo sensível, apesar do humor. O foco do seriado não é o comentário metalinguístico ligado à comicidade, e sim ao ambiente normalmente cor-de-rosa das comédias românticas, apresentando uma versão bem menos colorida das situações em contraponto com uma fotografia repleta de tons vívidos e claros, artigo que garante muita dubiedade ao texto final. As influências para o roteiro de Apatow passam por Nora Ephron, ainda que o tom seja muito mais agressivo do que os filmes conduzidas pela escritora.
A profissão na produção audiovisual de Gus faz uma abordagem metalinguística, bem como a profissão de Mickey em um programa romântico de rádio. Cada um em sua trajetória é absolutamente trôpego na condução de sua psiquê sentimental, tentando em vão transmitir suas defluências tóxicas e isolando seu possível par da realidade que os cerca: primeiro através de associações fálicas, depois pela fuga literal da responsabilidade de se cortejar um ao outro. Love trata basicamente de personagens reais, exagerados em suas ações, mas de carências plenamente cabíveis e verossímeis dentro da suspensão de descrença mínima pedida.
A direção dos dez episódios é realizada por condutores com experiência anteriores na televisão, sempre executada por artistas mais conhecidos por seus papéis como atores do que em outras faixas de produção. Dean Holland, John Slattery, Maggie Carey, Joe Swanberg, Michael Showalter e Steve Buscemi dão continuidade a roteiros que premiam o elenco, inclusive apelando para comentários parodiais, utilizando a personagem Susan Cheryl (Tracie Thoms) e seu ofício de diretora para tocar nos detalhes comuns à produção áudio visual.
As fases de ascensão e decadência de um namoro são mostradas de modo explícito e acelerado, como se a junção emocional e sexual dos protagonistas fosse um resumo, um pastiche de como funciona a montanha russa emocional de uma carreira amorosa, resultando também no colapso da vida pessoal de ambos, alertando sobre a crise existencial do homem como um aspecto comum na vida de quem tem dificuldades em se relacionar com outrem, além de aludir ao comum erro de associar a felicidade à sorte amorosa.
A trama se mostra confusa na maior parte dos episódios, basicamente por estabelecer um paralelo com a mentalidade de um dos personagens principais, fazendo valer todos os conflitos ocorridos nas pouco mais de cinco horas de duração da temporada. A série, através dos absurdos do jogo romântico e de personagens humanos, falhos e neuróticos, não cai na armadilha de associar o sentimento de carência somente ao estereótipo do nerd, mostrando que os problemas de comportamento ocorrem muito além de semblantes que se enquadram ou não nos padrões de beleza, sendo universais e quase inevitáveis na maioria dos casos.