Tag: John Slattery

  • Review | Love – 1ª Temporada

    Review | Love – 1ª Temporada

    Love 3

    Produção realizada partir de uma ideia antiga de Judd Apatow, que já tem uma vasta experiência em capitanear comédias cinematográficas sem necessariamente dirigi-las, Love é um retorno às origens para o autor, um resgate ao formato deixado anos atrás, a exemplo das comédias dramáticas Freaks and Geeks e Undeclared. O foco desta vez é o sentimento universal, aprofundado em vivências bastante distintas nas personagens de Mickey (Gillian Jacobs) e Gus (Paul Rust), que se encontram em hemisférios completamente diferentes no campo amoroso,  inclusive com pares completamente diferentes do que consideram ideais.

    O chamado à aventura acontece quando ambos conseguem sair do relacionamento fracassado em que estão, com variações de tempo cada vez mais extensas entre um ponto e outro, o que dá à rotina de ambos o caráter de resumo da melancolia e da angústia proveniente da vida adulta, entre uma decepção sentimental e outra, capaz de atordoar até o bom senso: a moça mergulha em um estado sentimental depressivo e o nerd em uma recusa de sexo grátis.

    O encontro entre as partes ocorre graças ao acaso e aos problemas de socialização da moça. Mickey lembra bastante seu personagem em CommunityBritta, em especial por sua personalidade explosiva. A diferença básica é que nesta encarnação ela não tem um fracasso profissional como base de seu drama diário, apesar de ter sua vida igualmente bagunçada. Somando estes defeitos a sua beleza, produz-se um charme grande na personagem, além de uma empatia sui generis.

    A parte jocosa do programa não é escrachada, ao contrário, é sutil e de situações, como em Tá Rindo do Que?, se valendo de questões pontuais de roteiro ao parodiar o cotidiano de um modo sensível, apesar do humor. O foco do seriado não é o comentário metalinguístico ligado à comicidade, e sim ao ambiente normalmente cor-de-rosa das comédias românticas, apresentando uma versão bem menos colorida das situações em contraponto com uma fotografia repleta de tons vívidos e claros, artigo que garante muita dubiedade ao texto final. As influências para o roteiro de Apatow passam por Nora Ephron, ainda que o tom seja muito mais agressivo do que os filmes conduzidas pela escritora.

    Love 5

    A profissão na produção audiovisual de Gus faz uma abordagem metalinguística, bem como a profissão de Mickey em um programa romântico de rádio. Cada um em sua trajetória é absolutamente trôpego na condução de sua psiquê sentimental, tentando em vão transmitir suas defluências tóxicas e isolando seu possível par da realidade que os cerca: primeiro através de associações fálicas, depois pela fuga literal da responsabilidade de se cortejar um ao outro. Love trata basicamente de personagens reais, exagerados em suas ações, mas de carências plenamente cabíveis e verossímeis dentro da suspensão de descrença mínima pedida.

    A direção dos dez episódios é realizada por condutores com experiência anteriores na televisão, sempre executada por artistas mais conhecidos por seus papéis como atores do que em outras faixas de produção. Dean Holland, John Slattery, Maggie Carey, Joe Swanberg, Michael Showalter e Steve Buscemi dão continuidade a roteiros que premiam o elenco, inclusive apelando para comentários parodiais, utilizando a personagem Susan Cheryl (Tracie Thoms) e seu ofício de diretora para tocar nos detalhes comuns à produção áudio visual.

    As fases de ascensão e decadência de um namoro são mostradas de modo explícito e acelerado, como se a junção emocional e sexual dos protagonistas fosse um resumo, um pastiche de como funciona a montanha russa emocional de uma carreira amorosa, resultando também no colapso da vida pessoal de ambos, alertando sobre a crise existencial do homem como um aspecto comum na vida de quem tem dificuldades em se relacionar com outrem, além de aludir ao comum erro de associar a felicidade à sorte amorosa.

    A trama se mostra confusa na maior parte dos episódios, basicamente por estabelecer um paralelo com a mentalidade de um dos personagens principais, fazendo valer todos os conflitos ocorridos nas pouco mais de cinco horas de duração da temporada. A série, através dos absurdos do jogo romântico e de personagens humanos, falhos e neuróticos, não cai na armadilha de associar o sentimento de carência somente ao estereótipo do nerd, mostrando que os problemas de comportamento ocorrem muito além de semblantes que se enquadram ou não nos padrões de beleza, sendo universais e quase inevitáveis na maioria dos casos.

  • Crítica | Spotlight: Segredos Revelados

    Crítica | Spotlight: Segredos Revelados

    Spotlight 2

    A preocupação de Tom McCarthy em emular Alan J. Pakula em Todos Os Homens do Presidente é tamanho que todo o visual da redação do Boston Globe faz lembrar os clássicos momentos em que os repórteres setentistas desvelaram o Watergate. Nada à toa, mas os esforços de Spotlight Segredos Revelados são bem maiores do que uma simples cópia, apesar da clara aproximação dramática entre a fita de 1976 e esta.

    O plot se inicia com a aposentadoria anunciada de Walter Robby Robinson (Michael Keaton), e segue a partir dos seus últimos esforços enquanto chefe de um pequeno grupo de jornalistas, tendo como base uma acusação de corrupção envolvendo uma das instituições mais tradicionais no país, tocando em pecados graves e tradicionalmente associados ao catolicismo romano moderno. A manutenção do tabu é exatamente o inverso do ideário dos homens e mulheres que formam a equipe de Robby, e um extensivo trabalho conjunto se inicia já nos primeiros minutos de fita.

    O grupo de jornalistas, não necessariamente subordinados ou diretamente ligados a Robinson, formado por Ben Bradlee Jr. (John Slattery), Marty Baron (Liev Schreiber), Michael Rezendes (Mark Ruffalo), Matt Carroll (Brian d’Arcy James) e Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams) é muito bem desenvolvido, com momentos únicos de brilho para cada personagem e intérprete. É no desenrolar dos depoimentos das vítimas que mora a maior emoção do roteiro baseado em fatos de McCarthy e John Singer (Quinto Poder), já que nas declarações dos antigos infantes abusados mora não só o trauma pelo temível abuso, bem como a morte de sua fé em uma crença maior, tirada de seu imaginário sem qualquer possibilidade de escolha ou refuto.

    Há um cuidado em registrar nuances e diferenciações básicas no comportamento dos entrevistados, mostrando como tais violências podem afetar homens e mulheres adultos, marcados tão fortemente em uma fase em que o ethos e a sexualidade não foram desenvolvidos. Desde sujeitos absolutamente inseguros e retraídos, até homens broncos, passivos, ativos, agressivos e mais dóceis, todos são marcados na alma. Os detalhes incluem até jogos de falsidade em níveis de aceitação e falácias por parte dos abusadores que visavam aproveitar-se da carência de meninos, incluindo os comumente excluídos por identificarem cedo a homossexualidade latente, e que viam nos sacerdotes o primeiro sinal positivo para sua orientação sexual, claro, pautados no engano mesquinho.

    A gravidade da situação faz unir dois comunicólogos de perfis diferentes, uma vez que Rezendes procura Mitchell Garabedian (Stanley Tucci) para ajudar a popularizar a causa através dos meios de comunicação por rádio. O impressionante dentro do proceder dos atores, em especial de Schreiber e Tucci, é a discrição e silêncio que produzem, gerando gama de emoções de modo comedido e nada histriônico. A contenção da indignação é algo comum também às personagens de McAdams e Ruffalo especialmente, já que a distância para o estourar da repulsa com a ética da apuração dos fatos é um aspecto em que a passionalidade deve, ao menos em tese, não fazer parte do conjunto de fatores que compõem a denúncia.

    Spotlight 3

    Alguns dos investigados demonstram uma atitude estranha, por vezes assumindo a responsabilidade por seus atos, mas sem conseguir expressar culpa, já que a rede de agressão é antiga, passando de geração a geração e  causando um impacto de normalização assustador, aspecto tão amedrontador quanto a letargia paralisação anestésica apresentada por alguns ex-padres, que em sua senilidade não conseguiam enxergar a extensão de suas graves transgressões, que atingiam tanto a Deus quanto aos homens criados à imagem e semelhança do primeiro.

    Há um mérito enorme na direção econômica de McCarthy, já que o realizador sabe dosar um roteiro que se desembrulha de modo gradativo e pontual, além de equilibrar como poucos um elenco tão multi talentoso e de perfis tão diferenciados. Conduzir um Michael Keaton pós Birdman e em um papel completamente diferente, mas igualmente exigente, não deve ter sido uma tarefa das mas fáceis, e o ator só brilha graças a toda a base que a fita lhe dedica, bem como Ruffalo só consegue exercer seu repórter inquieto graças à urgência de um assunto bem conduzido.

    A duração do filme faz o texto e abordagem amadurecerem ainda mais, fazendo um eco narrativo com as atitudes de seu protagonista, que nos primeiros dois terços permite aos seus subalternos fascinarem o público, com a procura e as descobertas dos sujos segredos sagrados. O arremate é inteiro de Walter, que se torna cada vez mais agressivo em sua abordagem, servindo como o canto de um cisne, a despedida silenciosa de toda uma carreira bem combatida. A composição da comparação metalinguística é tão cabível que se torna um crime achar que tais fatores casam por coincidência e não planejamento, já que Robinson e Keaton se misturam em uma intimidade muito maior do que a simplicidade de personagem e intérprete.

    A condução é elegante e correta, faz deslanchar uma história repleta de terríveis acontecimentos trazidos à luz em um momento de crise externa no país. Spotlight mostra parafilias terríveis de pessoas ditas normais, e que são comumente protegidas por um verniz social terrível. A cena final na redação da Boston Globe encerra o ciclo de trabalho e negligência de modo redentório, emocional e denunciativo, sob equilíbrio distante demais do comum a obras laureadas.