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  • Resenha | A História do PCB: Partido Comunista Brasileiro em Quadrinhos – Parte 1

    Resenha | A História do PCB: Partido Comunista Brasileiro em Quadrinhos – Parte 1

    O Partidão foi durante muito tempo a maior referência partidária na esquerda, e o quadrinho A História do PCB: Partido Comunista Brasileiro em Quadrinhos – Parte 1 tenta resgatar um pouco dessa história e tradição, em uma reunião de artistas e roteiristas que remontam as origens do PCB e que conversam com a atualidade do partido hoje.

    Na introdução em texto, há um resumo da mentalidade comunista do partido, que luta pela transformação radical da sociedade atual visando a substituição do sistema capitalista pelo socialismo, na perspectiva da construção da sociedade comunista, para muito além da paranoia bolsonarista e ultradireitista. Segundo as palavras do editorial é papel do partido contribuir para a elevação da consciência de classe dos trabalhadores e tentar falar em uma linguagem de arte popular, em atenção aos 90 anos do PCB, à época do lançamento deste, em 2012.

    A historia começa com Minervino limpando um veículo, que é confundido por um menino, como um bonde. O rapaz começa a conversar com Minervino, que fala sobre seu passado, sobre  a organização dos trabalhadores têxteis, entre anos 1910 e 1920. A conversa é meramente um pretexto para se falar a respeito das movimentações do partido comunista, criado no ano de 1922, e no diálogo, passa rapidamente pela chegada de Luis Carlos Prestes e Olga Benário Prestes, além da ANL (Aliança Nacional Libertadora) e antes da tomada de poder da ditadura Varguista. A historia se baseia no conto que Minervino faz ao curioso menino pergunta e a qualidade da historia depende muita da arte, que varia de autor de acordo com pequenos agrupamentos de paginas.

    Os  desenhos e textos de Rosali Colares, Alex D’Ates e Luciano Irrthum. Daniel Oliveira e Márcio Rodrigues varia de qualidade, algumas vezes soando bem amador o modo de contar a historia, mas ao final a arte melhora muito, onde as sombras e cores escuras predominaram. Ha informações bem legais, como o detalhamento de Stalingrado e a presença maciça de comunistas na companhia brasileira Senta a Pua, entre eles, Dinaro Reis, o Tenente Vermelho. O PCB cresceu no pós guerra, teve 200 mil associados e elegeu 14 deputados, com direito a Carlos Marighella, Gregorio Bezerra e Jorge Amado, e Prestes senador. A perseguição ao partido, que foi posto na ilegalidade novamente é bem explorada e a historia termina após as autoridades reacionárias tomarem a força o poder presidencial de Jango.

    É uma pena que esse volume seja tão curto, em especial pelo ritmo que ganha ao final, com uma arte a abordagem que lembra vagamente a obra de Robert Crumb, embora não tenha a acidez do estilo do quadrinista americano. Ainda assim, mesmo sendo uma obra curta ha muito o que apreciar em A Historia do PCB, uma publicação que conversa simples e direta sobre um dos movimentos progressistas mais importantes do país e que segue vivo por pessoas que agem na direção da resistência.

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  • Crítica | Sobral: O Homem Que Não Tinha Preço

    Crítica | Sobral: O Homem Que Não Tinha Preço

    O homem q não tinha preço

    A origem latina da palavra “resistência” vem de resistire, que faz lembrar o conceito de “ficar firme, aguentar”, relacionando a manter posição. Em tempos de ditadura militar, em plena efervescência cultural e política mundial, o Brasil vivia aquém, sem liberdade para o povo, sem vazão ao  poder popular. Apesar de mentes envelhecidas nadarem normalmente a favor desta correnteza de mazelas, havia alguém que fazia a contramão desses ideais, destacando a militância no ambiente jurídico.

    Sobral Pinto era um senhor de alta idade que teimava em legislar em favor dos direitos humanos, em um período no qual o conceito era completamente ignorado e tratado como assunto subestimado, uma vez que o regime impunha sua vontade para quem quer que tentasse resistir a ele.

    A pesquisa de Paula Fiuza – diretora e roteirista, interessada pessoalmente pelos assuntos legais dos tempos em que a esquerda somente habitava os porões do regime – leva o espectador ao ano de 1999, quando ocorreu o resgate das fitas com os julgamentos dos presos políticos, os quais o jurista Sobral, que destacava sua tremida e passional voz, ainda teimava em defender; tudo através de um material adquirido por um jovem advogado que visava preencher o espaço de sua tese de conclusão de curso na faculdade. As defesas serviam de inspiração para alguns bons defensores de direitos, além de fornecer a garantia da lei, tão ignorada no absolutismo de farda.

    A intimidade do já idoso protestante realiza-se através dos depoimentos de seus convivas e descendentes, dos que foram bravamente defendidos por ele. A obra também reúne boas imagens da época, com falas do próprio advogado. A briga para fazer da liberdade a bandeira universal teve um episódio especial na união do biografado com Luis Carlos Prestes, mostrando que mesmo o marxista e militante extremo não tem necessidade de conflitos extremos com o comportamento católico praticante do causídico, exemplificando o quanto tem em comum em relação ao discurso socialista e do moderno modo de Jesus tratar os excluídos dos evangelhos.

    O subtítulo do filme reflete a verdade atrás de sua personalidade e trabalho. Não ter preço não era uma expressão, especialmente por poucas vezes cobrar de seus clientes, a maioria formada por gente humilde, de poucas posses. Sobral era um homem do povo, refutava que o chamassem de Vossa Excelência. Por suas virtudes no Direito terem a ver com sua extrema humanidade, contraditas no passional modo de enxergar o futebol e as fases ruins de seu time de coração, o América da Tijuca. A sabedoria do jurista não o salvaguardava do fanatismo do futebol ou do bom humor e sacanice em relação a belas mulheres, inclusive Sônia Braga. Os fatos narrados em relação ao tema, prendem-no à realidade, distanciando-se da ideia de um androide em prol da justiça.

    A influência da religião fez Sobral se autopunir quando cometeu o pecado da infidelidade conjugal: a renúncia ao próprio ofício de procurador e a diversões sãs, como partilhar dos estádios de futebol em dias de jogos e sessões de cinema. A marca do erro se fixou em sua alma, revelando o lado conservador do advogado, que só teve sossego sobre o caso quando conseguiu o perdão de sua esposa.

    Segundo as falas dos depoentes, Sobral apoiou o movimento “revolucionário” dos militares, por medo igual do possível regime vermelho. A partir do momento em que a constituição passou a ser transgredida, o jurista mudaria de lado. A fala é dada em gritos, com a voz claramente alterada em razão da passionalidade, possivelmente pela indignação consigo próprio ao ter caído no engodo dos que viria a combater. Nem mesmo sua verve e inteligência foram capazes de identificar a tomada de poder ilegítima: mesmo apoiando o golpe em 1964, houve o ato de lançar uma carta de repúdio a Castelo Branco por assumir a presidência mesmo sendo o chefe do exército, o que era também inconstitucional.

    A falta de concessões às convicções que tinha e que defendia fazia dele uma personalidade sui generis, algo descoberto em sua integridade anos depois dos seus feitos junto ao romantismo, ao extraordinário trabalho que fazia para o povo de modo geral. Os créditos finais passam-se em uma homenagem no terreiro de samba, ao lado de seu amigo João Nogueira, que canta os feitos de seu amigo e mentor, popularizando uma figura de integridade ímpar, que a câmera de Paula Fiuza busca honrar. Às vezes não dando tanta vazão ao conservadorismo conhecido do advogado, a obra ressalta o viés de luta de seus convivas e o altruísmo que fala mais alto que qualquer pragmatismo pseudo-revolucionário, mostrando um Sobral como o jurista do qual o povo precisava.