Tag: Mark Duplass

  • Crítica | Tully

    Crítica | Tully

    Diablo Cody é a escritora que surgiu em 2007 com Juno, uma comédia que enganou muita gente (e outras, nem tanto) e de cara descolou um Oscar, respeito da indústria de conteúdo e comparações precipitadas com o talento de Woody Allen (?!). Cody é uma farsa, e o mesmo talvez possa ser dito de Jason Reitman nessa altura do campeonato. O roteirista adora analisar o cotidiano da classe média americana, os prós e contras de gente normal, sem nunca sair da sua zona de conforto ou conseguir extrair algo verdadeiramente interessante fora do banal que Reitman e Cody tanto gostam de se alojar, fingindo que o investigam assim (“Você é chata, sua casa é chata, mas isso é incrível pra caramba!”, confessa a certa altura uma personagem, aqui.)

    O problema é que tanto cineasta, quanto roteirista, não conseguem jogar brilho no mundo real que se debruçam sem pedir licença para contar histórias desde a comédia indie que deu tão certo nas suas carreiras, há mais de dez anos. Tully parece uma releitura contemporânea de algum roteiro ou sinopse perdida dum filme de John Cassavetes que o mesmo esnobou, e Reitman resgatou, assumindo a peleja de contar com personagens iguais você, e eu, para emblemar seu projeto de Cinema tão centrado na completa e nua informalidade das relações pessoais americanas – e que acabam sendo, em partes, ocidentais por excelência.

    Na trama, Marlo (Charlize Theron) é o que a personagem de Ellen Page virou quando adulta. De meia-idade, a mulher e seu marido, tão apático quanto os próprios filmes de Reitman, já são pais de dois moleques teimosos e esperam o terceiro com o cansaço de quem sabe os desafios que irá enfrentar – de novo, até que num jantar entre amigos, onde nada de especial pode acontecer, surge a ideia de uma babá para ajudar com a futura tarefa. Tem-se o bebê, e a exaustão que um terceiro filho causa a matriarca (sem apoio do pai bobão e ausente, sendo esse seu quarto filho na verdade) é grande demais para Marlo suportar sem a ajuda de Tully.

    Eis a moça novinha, o ingrediente que faltava a normalidade sufocante a uma quase desperate housewife, e que encara tudo como se fosse um playground caseiro, personificando o frescor que a mãe estressada tanto carecia numa rotina já bagunçada o suficiente. Nisso, ao invés de promover um choque entre gerações ou doces lições de companheirismo que ninguém aguenta mais, a empatia que surge pouco a pouco entre a veterana e a novata diverte e faz pensar numa revitalização bacana de Thelma e Louise, bem ritmada e com bom senso de sensibilidade que a trama com certeza precisava para decolar, e mesmo assim não decola.

    Reitman trabalha seus bons personagens de forma quase documental, perseguindo-os com a câmera e apostando tudo em nos fazer ouvi-los em excesso para melhor assimilá-los, mesmo sendo personas completamente acessíveis a qualquer um de nós. Típico. Mesmo assim, Tully desdobra-se num filme agradável, em indiscutível, com conflitos reais sobre o preço da passagem do tempo no universo feminino (a cena da corrida na floresta), usando e abusando de uma Theron morna e em piloto automático. A atriz, contudo, está longe de ser uma farsa.

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  • Crítica | Jeff e as Armações do Destino

    Crítica | Jeff e as Armações do Destino

    jeff e as armações do destino 1Jeff é um rapaz que depende de cuidados especiais, apesar da avançada idade de seu intérprete Jason Segel. Suas primeiras cenas remetem a um planejamento bastante torpe, registrado em um gravador improvisado dentro de seu banheiro. Apesar das semelhanças com uma fita de comédia, especialmente pelos escapismo a que se submete seu protagonista, fazendo uso contínuo de drogas para fugir de sua rotina depressiva, o roteiro dos irmãos Jay e Mark Duplass contempla um drama que se vale da leveza para tocar em questões difíceis sobre evolução e recusa à liberdade de pensamento.

    A câmera dos Duplass trata de muitos closes, em tomadas quase invasivas, já que transpassa a barreira da intimidade das personagens, tratando-as como familiares, como se fossem também um membro do clã. O outro personagem especialmente retratado é Pat (Ed Helms), irmão um pouco mais responsável de Jeff, mas também atrapalhado em suas relações, principalmente com sua esposa Linda (Judy Greer), mostrando que a inabilidade nas relações humanas é uma característica recorrente na hereditariedade destes.

    Os loucos fatos que envolvem a rotina dos fraternos fazem eles se encontrar, pondo para fora toda a insegurança de Pat e a falta de tato de Jeff, que mal sabe o que fazer diante de questões básicas da vida adulta, acreditando em toda sorte de agir torpe consigo. Desconfiado, o primogênito envia o caçula para vasculhar a sua cunhada para flagrar uma possível traição. O deslocamento mútuo faz assustar o espectador, tornando ambas figuras dignas de risos.

    jeff e as armações do destino 3Nos poucos minutos exibindo os infortúnios de Jeff, há uma exacerbo de sua condição, mostrando que a falta de compreensão é o seu norte, o ponto em comum junto ao seu irmão e sua mãe Sharon (Susan Sarandon), seus únicos familiares próximos. Não ser compreendido sequer pelos seus devasta sua moral, reduzindo-o a uma miséria comum a todos os personagens, com a pequena diferença de que isso é mais explícito nele em comparação aos outros nada discretos personagens.

    No entanto, as situações mais constrangedoras ocorrem com a personagem de Ed Helms, que mesmo diante da óbvia ruína em que se encontra seu matrimônio, segue intransigente e insensível, não conseguindo ler sequer os reclames mais óbvios de sua companheira. A irresolução amorosa também acomete os serviços comuns de Sharon, fazendo os dois parecerem párias diante do ideal sentimental, tão inadequados quanto o personagem-título.

    O cuidado em conduzir uma história repleta de ternura é notado em cada detalhe minimalista  da cenografia e figurinos, valorizando a melancolia mesmo nas cores que deveriam ser vivas. Os tons em vermelhos têm intensidade baixa, sombrios como a sensação de impotência, remetendo à pequenez do ser humano diante da grandiosidade da vida e do destino, avatares universais da opressão emocional que invariavelmente incorre ao ser humano, mas que não o impede de agir com honradez e heroísmo.

    Somente após a completude da jornada do trio de personagens principais é que são liberadas as cores frescas que ecoam bo agridoce da narrativa, superando a tristeza absoluta para apresentar uma nova face de superação, comum à vida dos que tendem a evoluir. Não há necessidade de que tudo dê certo para que o desfecho seja o mais próximo de felicidade, já que Jeff consegue comprimir um sorriso, mesmo diante dos dissabores e do azedume de sua jornada, sensível em cada manifestação que o destino entrega a si.

  • Crítica | Renascida do Inferno

    Crítica | Renascida do Inferno

    Renascida do Inferno - Poster

    Raras são as produções de terror que não somente fazem uso dos clichês naturais de um repertório como são capazes de potencializar seu fracasso em uma mistura de argumentos diferentes entre si mal vendidos pelo material de divulgação.

    Em Renascida do Inferno, o roteiro de Luke Dawson (Imagens do Além) e Jeremy Slater (Quarteto Fantástico – 2015) parece unir dois argumentos distintos em uma mesma narrativa. A divulgação promocional vendeu a produção como um terror de possessão, a qual uma entidade, após a morte acidental da pesquisadora Zoe  (Olivia Wilde, atriz de maior calibre da produção) e uma fórmula experimental que a traz de volta a vida, de alguma maneira, modifica sua personalidade. Na realidade, porém, a história justifica as transformações do soro por uma reconstrução cerebral que ampliaria a percepção do paciente e, com isso, lhe daria poderes sobrenaturais como telecinésia e outras capacidades limitadas ao humano comum.

    O Lázaro do título original, refere-se ao personagem bíblico ressuscitado por Jesus Cristo. Além da personagem central católica e de um pesadelo recorrente com um incêndio devido a um trauma da infância, não há nenhuma outra inferência que permitira o inferno no título brasileiro, se não a demonstração de como a produção foi vendida equivocadamente para distribuição mundial.

    O cruzamento de signos sem significado tentam explorar vertentes distintas do terror sem nenhuma eficiência. Não há nenhuma possessão na trama, mas muitas cenas são compostas a semelhança de outras possessões vistas no cinema: olhos que se tornam enegrecidos, modulações de voz, contorções comporais. Efeitos que não produzem sentido direto com o que a própria narrativa postulou anteriormente. Como se ao unificar dois conceitos dispares o elemento amedrontador seria exponencialmente ampliado. Porém, falha em dobro.

    Mais assustador que a história em si é observarmos como um argumento mal delineado conseguiu se tornar um lançamento cinematográfico. Mesmo que o terror seja a manipulação direta de uma emoção primitiva, a execução destes sustos devem ser apoiadas em uma trama, mesmo que mínima. Não só a qualidade das produções contemporâneas dá margem para reflexão sobre o mercado atual como a qualidade de seus roteiristas, afinal, como Slater foi convocado para colaborar no roteiro do novo Quarteto Fantástico se parece desconhecer propriedade básicas e fundamentais para o desenvolvido de uma história? Nem mesmo a duração de 1h23 faz esta experiência mais agradável.