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  • Crítica | O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio

    Crítica | O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio

    O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio começa simples, com uma gravação de sua heroína, a Sarah Connor de Linda Hamilton, que estava ausente desde o 2º filme, ainda no manicômio falando a respeito do dia do Juízo Final, em 1997. A gravação a fazia parecer paranoica, mas ela era autoritária, forte, bem resolvida  e durona, e a escolha por começar  esse sexto episódio da franquia no cinema, que relembra outras cenas clássicas, inclusive fazendo uma rima visual que, apesar de ser um recurso clichê, aqui combina demais, com as comparações das diferentes praias, uma no caos futurista e outra na calmaria pré tragédia pessoal.

    Uma das maiores preocupações por parte dos fãs, era se Tim Miller conseguiria repetir os bons momentos de O Exterminador do Futuro e O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final no quesito ação, e ao menos nesse sentido, não há do que reclamar. Os 20 minutos iniciais são de uma ação frenética absurda, e mesmo os efeitos especiais soam naturais, bem melhor do que o rejuvenescimento de O Exterminador do Futuro: Genesis, que visto hoje, faz Arnold Schwarzenegger parecer realmente um boneco mal feito.

    A introdução dos novos personagens é um pouco apressada,mas o ritmo acelerado faz com que o estranhamento seja facilmente driblado. Tanto Grace (Mackenzie Davis) quanto Dani Ramos (Natalia Reyes) são personagens que parecem um pouco apagadas, mas até  para manter o mistério em torno delas, faz sentido isso ocorrer. A luta que Grace tem com o Exterminador REV-9 de Gabriel Luna é sensacional, em especial a sequencia na estrada, pós saída da fábrica, uma pena que boa parte desses momentos já tivessem sido antecipados no material de divulgação.

    Hamilton, no presente do filme, acrescenta demais a trama, seja no espírito de guerrilheira que  ela veste, como no aspecto de heroína de ação que prosseguiu evoluindo, tal qual foi em T2. Aliás, o núcleo de protagonistas ser todo formado por mulheres é um aspecto muito bem vindo, e ela que faz lembrar os momentos mais legais de mulheres badass do cinema recente, quase como uma Charlize Theron mais madura, uma evolução da Imperator Furiosa de Mad Max: Estrada da Fúria e da espiã de Atômica.

    O roteiro de David S. Goyer, Justin Rhodes e Billy Ray não é primoroso. A historia se perde um pouco ao não causar muito impacto com aspectos novos da franquia, e com essa outra versão do destino da humanidade. Talvez a quantidade grande de roteiristas e de argumentistas ( foram cinco, incluindo o produtor James Cameron) tenha ajudado a diluir essa importância que deveria ter sido dada. Além disso, há uma reciclagem tanto da trama de T2, quanto de muitos aspectos das continuações que foram “descanonizadas”. De O Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas, há  o conceito de uma mulher viajando no tempo e sendo badass, de O Exterminador do Futuro: A Salvação, o conceito de um humano aprimorado e de T: Genesys, a questão do envelhecimento do tecido orgânico do T-800 de Arnold.

    Apesar de se valer demais de flashbacks – o que é ruim – ao menos é possível observar como essa versão do futuro é suja, lembrando inclusive Aliens: O Resgate em boa parte dos aspectos, mostrando que Miller é muito reverencial ao legado de Cameron. No entanto, a repetição de ciclos, com mulheres sempre se sacrificando pela sobrevivência da humanidade, não é tão bem traduzida para a parte da nova geração. Ao menos, o sub plot do T-800 é bem legal, e faz sentido mesmo com a suspensão de descrença. Se as máquinas são capazes de se revoltar e exterminar os homens, não há porquê elas não evoluírem ao ponto de criar uma espécie de ética própria, ainda mais se essa máquina não tiver nenhuma ordem ou comando. A mensagem sobre propósitos e a necessidade de tê-los é um pouco piegas, mas não chega a ser ofensivo, até porque Schwarzenegger está engraçadíssimo, à vontade como há muito não se via.

    Exterminador do Futuro: Destino sombrio acerta demais nos aspectos ligados a action movies, tem sequencias de luta muito boas, um bom vilão, que não deixa tanto a desejar para o T 1000 de Robert Patrick, e que tem em Linda Hamilton sua âncora, com uma atuação muito tocante e inspirada da veterana atriz, com um desempenho tão bom que quase faz esquecer que Reyes e Davis não estão tão bem.

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  • Crítica | Tully

    Crítica | Tully

    Diablo Cody é a escritora que surgiu em 2007 com Juno, uma comédia que enganou muita gente (e outras, nem tanto) e de cara descolou um Oscar, respeito da indústria de conteúdo e comparações precipitadas com o talento de Woody Allen (?!). Cody é uma farsa, e o mesmo talvez possa ser dito de Jason Reitman nessa altura do campeonato. O roteirista adora analisar o cotidiano da classe média americana, os prós e contras de gente normal, sem nunca sair da sua zona de conforto ou conseguir extrair algo verdadeiramente interessante fora do banal que Reitman e Cody tanto gostam de se alojar, fingindo que o investigam assim (“Você é chata, sua casa é chata, mas isso é incrível pra caramba!”, confessa a certa altura uma personagem, aqui.)

    O problema é que tanto cineasta, quanto roteirista, não conseguem jogar brilho no mundo real que se debruçam sem pedir licença para contar histórias desde a comédia indie que deu tão certo nas suas carreiras, há mais de dez anos. Tully parece uma releitura contemporânea de algum roteiro ou sinopse perdida dum filme de John Cassavetes que o mesmo esnobou, e Reitman resgatou, assumindo a peleja de contar com personagens iguais você, e eu, para emblemar seu projeto de Cinema tão centrado na completa e nua informalidade das relações pessoais americanas – e que acabam sendo, em partes, ocidentais por excelência.

    Na trama, Marlo (Charlize Theron) é o que a personagem de Ellen Page virou quando adulta. De meia-idade, a mulher e seu marido, tão apático quanto os próprios filmes de Reitman, já são pais de dois moleques teimosos e esperam o terceiro com o cansaço de quem sabe os desafios que irá enfrentar – de novo, até que num jantar entre amigos, onde nada de especial pode acontecer, surge a ideia de uma babá para ajudar com a futura tarefa. Tem-se o bebê, e a exaustão que um terceiro filho causa a matriarca (sem apoio do pai bobão e ausente, sendo esse seu quarto filho na verdade) é grande demais para Marlo suportar sem a ajuda de Tully.

    Eis a moça novinha, o ingrediente que faltava a normalidade sufocante a uma quase desperate housewife, e que encara tudo como se fosse um playground caseiro, personificando o frescor que a mãe estressada tanto carecia numa rotina já bagunçada o suficiente. Nisso, ao invés de promover um choque entre gerações ou doces lições de companheirismo que ninguém aguenta mais, a empatia que surge pouco a pouco entre a veterana e a novata diverte e faz pensar numa revitalização bacana de Thelma e Louise, bem ritmada e com bom senso de sensibilidade que a trama com certeza precisava para decolar, e mesmo assim não decola.

    Reitman trabalha seus bons personagens de forma quase documental, perseguindo-os com a câmera e apostando tudo em nos fazer ouvi-los em excesso para melhor assimilá-los, mesmo sendo personas completamente acessíveis a qualquer um de nós. Típico. Mesmo assim, Tully desdobra-se num filme agradável, em indiscutível, com conflitos reais sobre o preço da passagem do tempo no universo feminino (a cena da corrida na floresta), usando e abusando de uma Theron morna e em piloto automático. A atriz, contudo, está longe de ser uma farsa.

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  • Crítica | Always Shine

    Crítica | Always Shine

    É direito do nascimento de uma mulher ser atraente e encantadora. De certo modo, é seu dever. Ele é o vaso de flores da mesa da vida. – John Robert Powers, ator americano e dono de uma grande agência de modelos.

    Essa crítica se inicia com a mesma frase que abre Always Shine, dirigido por Sophia Takal (Green) e escrito por Lawrence Michael Levine (Wild Canaries), porque se faz necessário. Não é só um resumo de tudo que o filme trata e desconstrói em seus 80 minutos, mas a manifestação sucinta da construção social catalisadora para os conflitos que se discorrerão, já que Always Shine acompanha duas amigas, Anna (Mackenzie Davis) e Beth (Caitlin FitzGerald), mulheres de personalidades distintas em um meio dominado por homens, que vão para uma casa isolada passar o fim de semana.

    Anna e Beth são atrizes em diferentes momentos de suas carreiras; Beth participa de filmes B de terror e comerciais de cerveja, enquanto Anna ainda luta para encontrar algum agente. E ainda que a carreira da primeira não pareça ser um grande sucesso, é motivo de inveja para Anna, que tem bem menos que isso, o que faz com que se sinta inferior. Porém não só na questão profissional são distintas, e não somente assim Anna se sente diminuída. Por exemplo, uma das primeiras cenas do filme é a do teste de elenco de Beth, onde ela interpreta uma mulher sendo abusada, implorando, afirmando que faria qualquer coisa que o abusador quisesse. Ela faz isso em uma sala cheia de homens, que logo deixam claro a forma como o filme terá nudez extensiva e ela deverá se preparar para isso. As poucas vezes que levanta a voz, logo é interrompida. Anna, por outro lado, não se enquadra no papel, seja no da personagem rasa de filmes de terror, ou naquele que lhe esperam socialmente. Anna se impõe, mas não conquista o que almeja, logo se sente injustiçada. É a partir dessa dicotomia que o filme trata a posição da mulher na sociedade e a maneira que lhes é incentivada a competição entre si, especialmente no mundo do cinema.

    Você se sente como uma puta?

    O filme se desenvolve nessa constante zona metalinguística sobre atuação e performance. E se não fosse a competência de Sophia, talvez fosse um filme que se apoiasse e se satisfizesse indulgentemente nessa característica autoconsciente. A direção de Takal mistura elementos de thriller clássico e traços experimentais. Não se permite um único momento que não seja uma construção e intensificação para o próximo; seja pela montagem visual e sonora que prega pelo desconforto do espectador enquanto ainda o mantém intrigado, com toques de David Lynch, ou a própria interação entre as atrizes. As atuações de Mackenzie e Caitlin transitam nas sutilezas da apreensão e da amizade que se definha com o passar do tempo, tal como a sanidade. Essa interação apresenta seu ápice no momento que as personagens leem o texto do próximo filme de Beth.

    O único aspecto do filme que deve ser tratado com cautela é sua parte final, isso porque com certeza causará decepção em muitos do público, ainda que, por mais estranho que seja, não se faz de forma forçada após tudo que foi desenvolvido ao longo do filme. É uma demonstração da coragem e confiança da diretora.

    Eu nunca vi alguém me olhar com tanto nojo

    Always Shine é um thriller psicológico de extrema potência social e experimentação cinematográfica. Corajoso, mas não prepotente. Suas personagens são a principal força do filme, que se veem impulsionadas pela direção segura de Takal e texto denso de Levine, que exibem suas competências ao fundamentar o terror e o suspense na natureza e desejo de Anna e Beth; suas percepções sobre elas mesmas e sobre a outra. Isoladas e cercadas pelos pinheiros e pela neblina, não há como fugir daquilo que brilha e deseja brilhar nelas mesmas.

    Texto de autoria de Leonardo Amaral.

  • Crítica | Será Que?

    Crítica | Será Que?

    Saudosismo é um sentimento que deveria remeter a bons momentos, normalmente vividos por duas ou mais pessoas, mas também pode compreender a imaginação do que seria uma vida ideal, ou uma postura que deveria ter sido tomada há muito. É baseada na segunda hipótese em que está a trama de Será Que?, a nova comédia romântica fofinha/indie/hipster de Michael Dowse, que apresenta um casal de jovens, Wallace e Chantry, que se conhecem de modo curioso e que produzem uma amizade platônica a partir dali, claro, com uma evidente tensão sexual, mas que prossegue sem ser concluída.

    O carisma dos personagens é garantido de modo quase automático, graças aos seus interpretes –  Daniel Radcliffe e Zoe Kazan – reunindo até alguns ecos de alguns de seus personagens anteriores. A falta de ação de Wallace lembra muito a persona eternamente adolescente de Harry Potter, ainda que de sua boca saiam mais palavrões e sacadas mais maduras que a do bruxinho, mas a falta de traquejo com seres do sexo feminino prossegue, tanto que o personagem permite que seu próprio potencial caia indiscriminadamente na mítica friendzone.

    O modo como os dois “pombinhos incompreendidos” agem corre inteiro pelo modus operandi dos superestimados e inconscientemente pretensiosos membros de nicho, que usam armações de óculos gigantescas e camisas xadrez, amando objetos artísticos não populares, louvando um modo de vida alternativo unicamente por ser alternativo, praticamente nem discutindo a qualidade do que consomem. E depois de 500 Dias Com Ela, uma comédia romântica para homens, e de tantas outras voltadas a outros nichos, essa agora tenta alcançar os fãs vazios de Pedro Almodôvar e quiche, emulando os diálogos hiper-verborrágicos de Woody Allen para dar volume a obra, mas sem banalizá-la por completo, apesar do vício linguístico claro.

    A aproximação dos dois é lenta por causa do compromisso de Chantry, apesar que desde antes do filme começar, já ficar evidente que o guião tratará de juntar os dois jovens. Todas as interações dos adolescentes envolvem muita química e uma inevitável vontade de que as peles se toquem e que todo o circo de sensualidade e inter-curso sexual finalmente ocorra, sempre esbarrando na condição de namoro a distância e de um comprometimento que nunca consegue se concluir em si. A carência une e atrai os dois, como mosquitos em direção a uma luminária mata-insetos.

    A situação vai se complicando com a intimidade chegando sem a possibilidade de coito. Os amigos começam a ser confidentes, adentrando numa intrínseca narrativa de segredo com alta confiança, e cada vez à distância do tão esperado enlace entre os dois. O paralelo visto entre o medo de se entrelaçar com o par – lê-se casamento – e o modo pomposo de se vestir em um casório, dito por Nicole (Mackenzie Davis) serve como alegoria a um dos maiores temores da vida adulta, inclusive cooptando as inseguranças de Wallace em finalmente se lançar em direção ao sentimento que tem por sua musa, e, claro, a evasão dos namoros sempre que as coisas começam a dar errado.

    As agruras pelas quais Wallace passa para reencontrar sua alma gêmea envolve uma série de fatos bastante nonsense, com provas de amor que cortam o globo terrestre e envolvem pensamentos e atitudes inconsequentes, que não são encaradas com a expectativa que ele tinha. A vida adulta mais uma vez exibe sua face cruel, frustrando seus desejos de finalmente ser um com sua amada.

    Será Que? Possui uma necessidade menor de paciência por parte do público masculino, que não fica completamente estafado com o resultado final, mesmo com todas as fórmulas e estratagemas repetidos de filmes como Ruby Sparks. O modo singelo como tudo é tratado neste microuniverso exala sensibilidade, medo e receio de que a modernidade e a rotina matem a possibilidade de romance, ainda que no desfecho haja um momento açucarado, como o gênero mesmo pede, até por motivos comerciais. A sensação após o ao apagar inicial das luzes é semelhante a da letra de Provas de Amor, dos Titãs, que em seus versos, afirma que  “Existem provas de amor… Não existe o amor“, remetendo ao sentimento de Chantry, que sempre tenta ir até o final de seus relacionamentos, mas acaba optando por seguir sua vida com o outro protagonista da fita, na demonstração de evolução mais palpável de ambos personagens.

  • Crítica | Paixão Inocente

    Crítica | Paixão Inocente

    Breathe-In-Poster

    O filme de Drake Doremus começa como um terno retrato de família  literalmente. Paixão Inocente põe Keith Reynolds (Guy Pearce) interagindo com sua esposa Megan (Amy Ryan) e sua filha Lauren (Mackenzie Davis), enquanto esperam o registro de mais um momento do “lindo” álbum de família. Mas algo parece abalar o ânimo do patriarca, ainda que ele tente não explicitar o seu descontentando aos outros membros do clã. Seu olhar é longínquo, voltado para o nada. Keith preocupa-se com o avanço de sua carreira como músico de orquestra, já que um teste se aproxima e ele teme não poder usufruir de maior concentração graças à chegada de Sopphie (Felicity Jones), uma aluna estrangeira de intercâmbio que será alocada em sua casa.

    Ao contrário do que mostram as fotos, o equilíbrio do bem estar familiar é muito complicado e tênue. A sintonia é fina e delicada, prestes a ruir a qualquer momento. O que não fica claro é se isto acontece a todo momento ou apenas em momentos decisivos. A tensão que existiria entre o pai da família e a nova estudante não veio de repente: já havia uma clara insatisfação por parte do homem sem que este externasse o que incomodava o seu ânimo. Do mesmo modo, Sophie parece incomodada em estar ali, longe de sua casa, mas o incômodo da jovem parece ser pessoal em determinados momentos, pois esta refuta a figura de mentor que seu professor (Keith) exerce. O desafio à figura autoritária mostra um espírito arredio cuja contestação é a tônica, o que se torna um atrativo aos olhos do entediado mestre.

    A trilha de piano marca as paixões comuns a Sophie e Keith, assim como ajuda a mostrar, de pouco a pouco, o que faz o marido se sentir tão deslocado da felicidade familiar que deveria imperar, visto que não há muito contato visual do homem com sua esposa, tampouco comunicação verbal. Seu isolamento como artista coincide com o conjugal, o que o faz divagar sobre quais tentações ele deve usufruir. Mesmo quando os dois conversam, a câmera oferece uma maneira de mostrá-los à distância, seja não enquadrando ambos na mesma cena, seja “cortando” a cabeça de Megan. As conversas são sempre em frases conflitantes; eles dificilmente concordam em algo.

    As crescentes frustrações do homem de meia-idade aproximam-no do pensamento da luxúria, fazendo-o temer cair na fascinação da pele macia e alva da ávida e irresoluta aluna. A insegurança da jovem constitui-se de um eficaz afrodisíaco, muito maior do que seria qualquer ação entusiástica sua. A vontade de Keith em tê-la passa pela possibilidade de conserto da garota, ainda que ele não assuma este fato. O marido, ainda fiel, cai no impetuoso sentimento de ciúme ao ver sua vaidade ferida por um espécime mais jovem que ele e, supostamente, mais atraente que ele. Porém, o fascínio que ela exerce sobre o orientador não parece projetar-se de forma recíproca.

    A construção da relação é gradativa e platônica, e demora a ocorrer graças à culpa e ao sentimento de proibição estritamente ligado à indiscreta infidelidade. As mentiras que circulam sobre a menina estrangeira acabam pondo sua integridade  e seu segredo em perigo: um boato infundado a põe na mira de suas colegas sem que ela saiba, e a moça passa a se culpar, achando ser a fonte do desequilíbrio que aflige os Reynolds. Esse suspense é interessante e utiliza-se do método usado por Alfred Hitchcock, no qual o diretor mostra determinada situação ao público enquanto, em tela, os personagens aproximam-se do acontecimento desconhecendo o que realmente ocorre.

    O nome original, Breathe In, traduz bem como são as sensações e os sentimentos entre a dupla de protagonistas. A espiração que ambos trocam próximos um ao outro é muito mais determinante do que a sedução pura e simples, pois a musa no caso associa-se ao estímulo criativo, bem mais que ao desejo carnal, ainda que a tensão entre os dois seja inegável e evidente desde a primeira cena protagonizada por Pearce e Jones.

    Os últimos momentos são conduzidos com uma frieza difícil e muito perene. O que Doremus e Ben Yorke Jones fazem com o roteiro é de um trabalho meticuloso, detalhando as ações de seus personagens de modo elegante e pontual. A reação emocional de cada pessoa é perfeitamente condizente com a de espécimes reais. A visão que a câmera dá a cada uma das mulheres envolvidas na teia de eventos é única, e faz lembrar a emocionante cena do batismo de O Poderoso Chefão, onde todos os plots paralelos se resolvem simultaneamente. Porém, ao contrário do momento original, este é muitíssimo mais dramático para os protagonistas da jornada, uma vez que a tragédia interrompe os seus planos de fuga, assim como a esperança de viverem longe de sua infelicidade costumeira. O status quo é mantido, assim como o vazio existencial de Keith Reynolds. A preocupação com os seus o leva a não quebrar com a hipocrisia que correu toda a sua vida antes da chegada de Sophie, e até o faz se perguntar se outras oportunidades como esta não foram desperdiçadas antes.

    A obra é muito boa em demonstrar o quanto a conformidade com a normatividade e a moralidade pode soterrar os anseios de grandeza e ambição pela vida, até porque esta máxima é deveras presente na rotina do homem.