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  • Crítica | Halloween Kills: O Terror Continua

    Crítica | Halloween Kills: O Terror Continua

    Crítica Halloween Kills: O Terror Continua

    Halloween Kills: O Terror Continua segue os eventos imediatamente posteriores ao desfecho do Halloween. O ponto de partida é o exato momento após do confronto entre a família de Laurie Strode de Jamie Lee Curtis contra o assassino poderoso e quase imortal Michael Myers, com todos os resultados dramáticos do que seria a encarniçada briga de uma mulher traumatizada contra o causador desse trauma.

    Esse segundo filme segue com a direção de David Gordon Green, e remonta a momentos clássicos de Halloween: A Noite do Terror, incluindo um prólogo que reconstrói bem a atmosfera da obra de John Carpenter, emulando perfeitamente o clima de terror do clássico, usando e abusando da trilha sonora original, inserindo junto mais camadas do passado do xerife Frank Hawkins (Will Patton), um dos poucos amigos de Laurie na obra anterior.

    Green anunciou desde antes da estreia de Halloween que seu planejamento era fazer três filmes, então esta obra analisada seria o filme do meio de uma trilogia. Era até previsível que isso poderia resultar em problemas no roteiro, e de fato isso ocorreu. A fragilidade maior do roteiro reside na tentativa de criar uma milícia civil entre os habitantes de Haddonfield, fato um pouco forçado e que de certa forma contradiz boa parte dos eventos na versão de 3 anos atrás, pois não houve comoção em volta de Laurie, tampouco solidariedade por parte de outros sobreviventes dos ataques de Myers.

    Se havia um grupo de apoio, que se reuni todo ano no Dia das Bruxas para comemorar a própria sobrevivência, Laurie simplesmente não deveria sentir um pária na cidade, nem deveria ser encarada como a única louca da cidade pequena. O eco de um passado trágico deveria ser um fardo dividido por todos esses que não perecerem, mas esses novos personagens parecem estar aqui apenas para desviar o foco do espectador enquanto Lee Curtis e sua personagem se recuperam dos ferimentos.

    As críticas de que as vítimas que perecem pelas mãos de Myers e de que são personagens genéricos não estão erradas, no entanto, há um certo exagero e até rabugice nesse comentário, afinal se a intenção de diretor é homenagear o subgênero de cinema slasher, é natural que haja uma apelação a esses  clichês, sem falar que as mortes são normalmente bem filmadas, criativas e bastante gráficas.

    Michael é aterrorizante, causa temor e é imprevisível. Sua sede por sangue não inclui somente os adolescentes sexualmente ativos, mas todos que ousarem cruzar seu caminho. Ele não utiliza de um falso moralismo sexista, é apenas a encarnação do Bugman, o Bicho Papão mesmo, uma força da natureza que só busca destruição, um psicopata que evoluiu no cárcere ao ponto de transformar suas cenas de crime em arenas de exibição artística, dignas de observação do espectador e até de uma plateia imaginária. Nem monstros recentes conseguem capturar essa sensação como Michael consegue e só por isso esse resgate de Gordon Green já vale o esforço, fora evidentemente o gore, que se intensifica após uma hora de exibição.

    O filme funciona quando não se leve a sério. Ao tentar tecer algumas críticas ao linchamento público, evento comum em território estadunidense, e a paranoia generalizante que parece tomar conta das mentes do povo, acaba esbarrando  em pieguices. Falta sutileza ao argumento pensado por Green, Scott Teems e Danny McBride, chegando ao cúmulo de pôr em pé de igualdade o desejo ignorante do povo por justiça com as ações de um assassino serial. São eventos nada equivalentes, e se Myers não parece movido por uma moralidade conservadora, o filme em si é refém um pouco dessa condição.

    O final de Halloween Kills: O Terror Continua é carente de força e entusiasmo. Mesmo a morte de personagens importantes não choca, soa bobo, pois fica a sensação dos verdadeiros combates envolvendo O Mal e Laurie ocorrerão no vindouro Halloween Ends. Gordon Green traz boas sequências de violência, mas traz também uma obra com fragilidades consideráveis, mas que nem de longe justifica toda a negatividade das análises em geral.

  • Crítica | De Repente 30

    Crítica | De Repente 30

    Longa de Gary Winick (Noivas em Guerra, Cartas Para Julieta), De Repente 30 foi uma das comédias românticas mais populares de sua época. Sua história conta a trajetória de Jenna Rink, uma menina que aos treze anos não é popular, tem apenas um amigo e o sonho de se juntar as meninas lideradas pela patricinha Tom Tom.

    Um evento mágico e estranho ocorre e Jenna (Christa B. Allen) se transforma em uma nova versão dezessete anos mais velha (Jennifer Garner). Neste ponto, percebe que ao chegar aos trinta anos de idade se tornou editora da revista que mais amava. Além de bem sucedida, guarda uma porção de defeitos terríveis, optando pela popularidade à qualquer custo. Ao se deparar com essa nova vida, fica confusa e mesmo sendo próxima de uma pessoa do passado, Lucy Wyman (Judy Greer), procura seu único grande amigo da adolescência.

    Garner está muito à vontade no papel, mesmo que a premissa aqui seja extremamente não crível, como era com Quero Ser Grande. Acordar um dia, com muito mais idade e com licença poética até para beber (e Jenna bebe muito, possivelmente aludindo a uma predisposição genética sugerida subliminarmente no roteiro) não garante a personagem ou a qualquer possível contra parte dela uma maturidade mínima. A atriz faz muito bem uma mulher de meia idade, bonita, bem resolvida mas que ainda tem gosto e fome por coisas que crianças consomem, seja em questão de alimentos ou de meros sonhos e anseios.

    Ainda assim, nessa versão interrompida de si a personagem é mais amena, serena e singela, não à toa a aproximação que ela tem com Mathew (vivido por Mark Ruffalo e na juventude por Sean Marquette) traz à tona sentimentos amorosos. Ao se deparar com a possível mudança do paradigma do amor não correspondido, o amigo recua, com medo de se machucar e de ser injusto com as pessoas que sempre estiveram com ele.

    As piadas físicas são ótimas, mesmo quando Jenna bebe e faz coisas típicas de adulto ela não entende ironia. Há um espírito nessa produção bem semelhante ao clássico filme estrelado por Adam Sandler, Click, embora o longa tenha uma resolução de problemas bem diferenciada, bem como é feito para outro tipo de público, tentando atingir o espectador de meia idade mais sentimental, e não as meninas adolescentes como na obra de Winick.

    As escolhas do elenco são ótimas. Além de Garner, que está muito bem, Ruffalo faz um sujeito apaixonante e super fofo. Greer consegue imprimir bem a figura de vilã que finge ser boa – e que tem até algumas camadas de traição, repetindo o ciclo de traição a Jenna, mostrando que sempre foi uma pessoa sem escrúpulos – além é claro de Andy Serkis, cujo papel é pequeno (e caricato), mas que é muito simpático e aprazível. Até o elenco infantil é bem acertado, com destaque principalmente para B. Allen que, anos mais tarde, faria a versão mais jovem de Jennifer Garner novamente em Minhas Adoráveis Ex-Namoradas.

    O caráter de Matt e da Jenna dessa realidade são diferenciados entre si. A mulher que cresceu e se emancipou se tornou mesquinha e megera, e a versão criança certamente se decepcionaria demais com esta. Enquanto o homem seguiu doce, meigo e atencioso, além de muito charmoso e bonito, ou seja, tudo o que uma mulher madura quer. Por mais moralista que seja a mensagem do roteiro Josh Goldsmith e Cathy Yuspa, ele não cai na tolice de permitir que a historia se resolva de maneira fácil, embora arme um gatilho para que o final da historia não seja o pragmático e infeliz.

    De Repente 30 é um filme que marcou tanto a geração que o assistiu no cinema ou nas reprises da TV aberta que virou sinônimo de temas de inúmeras festas de aniversários de pessoas balzaquianas. Para além das questões modais externa, mostra a jornada de Jenna como a historia de uma pessoa refém de suas referencias, incapaz de conciliar uma vida particular e profissional bem sucedida. Gerando, com isso, a reflexão do público além do divertimento.

  • Crítica | Halloween

    Crítica | Halloween

    Qualquer filme de terror quando faz sucesso se torna uma franquia muito facilmente. É raro um filme minimamente original não sofrer com continuações caça-níquéis e esdrúxulas. Halloween: A Noite do Terror não só sofreu com 9 continuações, entre sequências e remakes, mas também foi bastante copiado, como o grande referencial dos filmes slasher. A promessa sobre este Halloween era de que algo realmente assustador viria, e a responsabilidade de David Gordon Green era grande, ainda mais ao analisarmos sua filmografia formada em sua maioria por comédias e alguns poucos dramas.

    A história começa mostrando dois jornalistas Dana Haines (Rhian Rees) e Aaron Korey (Jefferson Hall), que tentam documentar a aproximação junto a Michael Myers, o assassino serial que se mantém calado há quarenta anos em Smith Groove. No material dos trailers, a jovem Allyson (Andi Matichak) diz que era boato a conversa de Myers e Laurie eram parentes, e apesar disso não ser dito no filme, fica claro que essa parte da mitologia só leva em conta o clássico de 1978, o que é justo, visto que há poucos momentos realmente bons em suas sequências.

    Laurie é uma mulher já idosa, agorafóbica, que fica longe de sua família. Os dois repórteres a procuram tentando convence-la falar alguma coisa a respeito de Myers, coisa que sequer o doutor Sartain (Haluk Bilginer ) conseguiu, mesmo seguindo os passos de Loomis. Não é nem preciso dizer que mais uma vez o assassino consegue fugir, dessa vez após o ônibus colidir a caminho de um hospital, sob circunstâncias suspeitas, o que resulta no retorno do assassino para Haddonfield, aterrorizando não só os jovens, mas também a traumatizada Laurie e seus familiares. A protagonista é uma mulher destroçada pela vida, que dedicou quarenta anos a odiar o seu algoz e se preparar para enfrenta-lo. Esse quadro é muito bem explicitado no roteiro de Green, Danny McBride e Jeff Bradley, e a abordagem é igualmente madura. O filme não tenta soar adulto somente pela violência explicita, e embora pareça um pouco arrogante em suas soluções, não é nada ofensivo.

    Continuações normalmente repetem os clichês dos clássicos, mas não é o caso desse, tal qual houve uma evolução e transição entre Exterminador do Futuro e Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final, mas nem o otimismo que Cameron colocou em sua franquia tem vez aqui, e tampouco precisou mudar o gênero de Terror para Ação afim de fortalecer a evolução desse caráter, o gênero segue inalterado. A aura de suspense é resgatada, apesar de soar um pouco sensacionalista em alguns pontos, em especial na figura do novo psiquiatra badass. A nova trilha sonora, conduzida por John Carpenter, Cody Carpenter e David E. Davies ajuda demais a pontuar a tensão, e não soa refém dos temas originais, que são empregados poucas e boas vezes aqui. Myers segue implacável, sanguinário, remodelado para ainda soar como a encarnação do mal, mas sem os exageros e tentativas didáticas de explicar tudo como foi com Halloween: O Início, de Rob Zombie. O implícito é soberano e a mitologia do personagem dá margem para o espectador ter múltiplas interpretações do modus operandi do serial killer. Ainda assim, o cineasta dá algumas mostras do quão aficionado era pela franquia, com referências visuais até sobre Halloween 3, que não conta com Myers em sua história.

    As atuações estão de fato muito competentes. Greer consegue fazer a personagem sempre em dúvida e suspeição, ao mesmo tempo que rejeita sua mãe, a acolhe quando precisa. Curtis é absurda em sua composição de personagem afetada pela mágoa, amargura e o medo. Green se mostra um diretor maduro, que além de produzir dramas competentes como Joe – que o ajudou a compor boa parte da parte emocional desta versão – também consegue trazer à luz uma história assustadora, com gore e com moderação para não deixar o excesso de violência violar o status de suspense, que pontuou os bons momentos da trajetória de Michael Myers.

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  • Crítica | 15h17: Trem Para Paris

    Crítica | 15h17: Trem Para Paris

    Depois do lançamento de O Artista do Desastre os olhares cinéfilos voltaram-se para The Room, obra máxima do ator e cineasta Tommy Wiseau. O longa-metragem é encarado de forma jocosa como uma obra prima do cinema trash, por ter atuações risíveis e dignas de pena, além de um visual único, no pior sentido do termo. A historia “heroica” de Spencer Stone, Alek Skarlatos e Anthony Sadler, três americanos que impediram um ataque terrorista num trem europeu, que se dirigia a Paris também guarda semelhanças com essa perola do trash, em especial pela artificialidade das situações propostas, mesmo que essas sejam inspiradas em fatos reais.

    15h17: Trem Para Paris varia entre a entrada no vagão da locomotiva e flashbacks, que mostram o trio de protagonistas ainda crianças, em situações onde as mães dos rapazes brancos Joyce (Judy Greer) e Heidi (Jenna Fischer) são constantemente chamadas para ir ao colégio. Os rapazes são tratados como garotos-problemas, e suas famílias se recusam a receber conselhos para encaminharem os dois rapazes (Spencer e Alek) para psicólogos, a fim de diagnosticar uma possível doença, como por exemplo, déficit de atenção. Já nesse início se nota a extrema artificialidade da história contada e o drama desenvolvido.

    Beira a tortura ter que acompanhar a trajetória de fracassos do trio, em especial Spencer, personagem que aparentemente tem mais desfalques mentais entre os três. O trio de protagonistas é representado como pessoas não aptas para o ofício de honrar a bandeira americana, falhando em praticamente tudo o que tentam, seja como civis ou no processo de seleção para obterem graduações voltadas a especializações em combates.

    A escolha de Clint Eastwood por colocar os próprios sobreviventes como intérpretes de si mesmos ajuda a quebrar qualquer ar de naturalidade que um filme que se mune da realidade precisa. O roteiro de Dorothy Blyscal não é só expositivo, como possui um conjunto de diálogos terrível, se assemelhando a um Tropa de Elite ou Cidade de Deus às avessas, pois claramente possui diálogos que soam artificiais, mecânicos e bastante patéticos. Pior, para efeito de comparação, recentemente, Projeto Flórida havia trabalhado bem com não-atores ou intérpretes iniciantes povoando o elenco, Sean Baker acertou demais na condução. Isso passa longe de acontecer no filme de Eastwood, e o início faz lembrar os filmes evangélicos recentes, como Deus Não Está Morto, sua continuação Deus Não Está Morto 2 e Quarto de Oração, em especial por sua abordagem muito baseada em um discurso evangélico completamente esvaziado de significado ou senso crítico, tais quais os três filmes sofistas citados.

    O filme de apenas 94 minutos, assusta pela morosidade da história e sua dilatação para que o evento-chave finalmente aconteça, tornando 15h17: Trem Para Paris um filme extremamente enfadonho e chato. Nenhuma conversa aparenta sair da boca de pessoas reais, ainda que sejam eles os personagens reais que vivenciaram tal situação. Todas as coincidências que ocorrem no desenvolvimento soam piegas ao extrema, assim como a tentativa de imputar um heroísmo aos personagens. Em Sully: O Herói do Rio Hudson e Sniper Americano, Clint havia representado personagens que se destacavam do ordinário, e nesse, a tentativa de mostrar pessoas comuns fazendo algo extraordinário ganha ares de comédia involuntária, com um texto pueril que beira os panfletos de auto-ajuda encontrados em consultórios de psicólogos aproveitadores, e sem qualquer personagem memorável ou digno de qualquer empatia.

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  • Crítica | Jeff e as Armações do Destino

    Crítica | Jeff e as Armações do Destino

    jeff e as armações do destino 1Jeff é um rapaz que depende de cuidados especiais, apesar da avançada idade de seu intérprete Jason Segel. Suas primeiras cenas remetem a um planejamento bastante torpe, registrado em um gravador improvisado dentro de seu banheiro. Apesar das semelhanças com uma fita de comédia, especialmente pelos escapismo a que se submete seu protagonista, fazendo uso contínuo de drogas para fugir de sua rotina depressiva, o roteiro dos irmãos Jay e Mark Duplass contempla um drama que se vale da leveza para tocar em questões difíceis sobre evolução e recusa à liberdade de pensamento.

    A câmera dos Duplass trata de muitos closes, em tomadas quase invasivas, já que transpassa a barreira da intimidade das personagens, tratando-as como familiares, como se fossem também um membro do clã. O outro personagem especialmente retratado é Pat (Ed Helms), irmão um pouco mais responsável de Jeff, mas também atrapalhado em suas relações, principalmente com sua esposa Linda (Judy Greer), mostrando que a inabilidade nas relações humanas é uma característica recorrente na hereditariedade destes.

    Os loucos fatos que envolvem a rotina dos fraternos fazem eles se encontrar, pondo para fora toda a insegurança de Pat e a falta de tato de Jeff, que mal sabe o que fazer diante de questões básicas da vida adulta, acreditando em toda sorte de agir torpe consigo. Desconfiado, o primogênito envia o caçula para vasculhar a sua cunhada para flagrar uma possível traição. O deslocamento mútuo faz assustar o espectador, tornando ambas figuras dignas de risos.

    jeff e as armações do destino 3Nos poucos minutos exibindo os infortúnios de Jeff, há uma exacerbo de sua condição, mostrando que a falta de compreensão é o seu norte, o ponto em comum junto ao seu irmão e sua mãe Sharon (Susan Sarandon), seus únicos familiares próximos. Não ser compreendido sequer pelos seus devasta sua moral, reduzindo-o a uma miséria comum a todos os personagens, com a pequena diferença de que isso é mais explícito nele em comparação aos outros nada discretos personagens.

    No entanto, as situações mais constrangedoras ocorrem com a personagem de Ed Helms, que mesmo diante da óbvia ruína em que se encontra seu matrimônio, segue intransigente e insensível, não conseguindo ler sequer os reclames mais óbvios de sua companheira. A irresolução amorosa também acomete os serviços comuns de Sharon, fazendo os dois parecerem párias diante do ideal sentimental, tão inadequados quanto o personagem-título.

    O cuidado em conduzir uma história repleta de ternura é notado em cada detalhe minimalista  da cenografia e figurinos, valorizando a melancolia mesmo nas cores que deveriam ser vivas. Os tons em vermelhos têm intensidade baixa, sombrios como a sensação de impotência, remetendo à pequenez do ser humano diante da grandiosidade da vida e do destino, avatares universais da opressão emocional que invariavelmente incorre ao ser humano, mas que não o impede de agir com honradez e heroísmo.

    Somente após a completude da jornada do trio de personagens principais é que são liberadas as cores frescas que ecoam bo agridoce da narrativa, superando a tristeza absoluta para apresentar uma nova face de superação, comum à vida dos que tendem a evoluir. Não há necessidade de que tudo dê certo para que o desfecho seja o mais próximo de felicidade, já que Jeff consegue comprimir um sorriso, mesmo diante dos dissabores e do azedume de sua jornada, sensível em cada manifestação que o destino entrega a si.

  • Crítica | Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros

    Crítica | Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros

    Jurassic World 1

    Os acordes de John Williams são lembrados em estilo diversificado, agora com a batuta de Michael Giacchino, seguido de uma cena de ovos eclodindo, dando prosseguimento ao processo chamado vida. O diretor e roteirista Colin Trevorrow faz em Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros uma homenagem ao trilogia original e ao filme Mundo Perdido de 1925, ao mesmo tempo em que situa o público no universo estabelecido que pressupõe a abertura do dantesco parque temático Mundo Jurássico, na mesma Costa Rica onde aconteceram os eventos de Jurassic Park e de  Jurassic Park: Mundo Perdido e Jurassic Park III da franquia. O encanto do menino Gray (Ty Simpkis) relembra o quão era bela a expectativa do público, em 1993, por ver os seres pré-históricos revividos e convivendo com a humanidade.

    Nos primeiros minutos da produção, há uma clara crítica ao excessivo gasto para produzir a estrutura artificial do Parque dos Dinossauros,  aludindo aos preços de naming rights (diretos reservado de nome) da nova criatura geneticamente criada, Indominus Rex. Como um magnata entediado, que faz as vezes de John Hammond, Masrani (Irrfan Khan) é o responsável por injetar dinheiro no Parque e também por financiar as atividaded de Claire (Bryce Dallas Howard), uma executiva de sucesso que graças a sua dedicação a carreira é uma parente relapsa.

    Na introdução da personagem de Chris Pratt, Owen Grady, descobrimos seu ofício como adestrador de velociraptores. Owen é o típico herói arquetípico, belo, audaz, corajoso, tendencioso e desbravador, seu modus operandi é intervencionista, como o de um exímio caçador, parecido demais com seu Starlord de Os Guardiões da Galáxia, um perfil que se torna irresistível para a quadrada Claire que tenta em vão esconder sua rendição amorosa.

    Ao menos na esfera de expectativas, o filme entrega bem seus préstimos, mantendo um suspense que encontra no público uma boa resposta. Mantém-se uma leve excitação sobre o visual de Indominus, com a sábia decisão de não escancarar sua aparência no primeiro ataque. A primeira intervenção entre o monstro e homens é breve, mas guarda uma dose de violência grande, cuidadosamente feita para não chocar as plateias conservadoras e famílias, parte do público alvo. Enquanto esse dinossauro impacta pela violência, os velociraptores estabelecem uma forte crítica a manipulação genética e a produção de híbridos com a possibilidade de se tornarem uma arma bélica, uma análise incomum para um filme para as massas.

    Os clichês seguem firmes e mais repetidos do que as histórias anteriores, curiosamente reprisando arquétipos dos filmes passados como a versão do CEO intervencionista, piloto de aeronaves como o presidente de Bill Pullman em Independence Day, (ainda que seu desfecho seja muito mais realista do que a vista no filme de Rolland Emerich).

    Os personagens centrais evoluem durante a história, principalmente Claire que deixa a pompa de lado, agindo de modo mais enérgico, provando que sua corrupção era fruto da falta de tempo e que a negligência não fazia parte de sua índole e caráter. Apesar de não apresentar nada que seja realmente inédito – ainda mais com trailers bastante reveladores – o roteiro mantém interessante viradas.

    A personagem de Pratt é superexposta e cada aparição o amplia como uma espécie de mito, ampliando as habilidades e capacidades sobre-humanas, seja no adestramento dos animais, como também nos atos heroicos, estilo sempre em voga em Hollywood, como também visto na persona de The Rock em Terremoto: A Falha de San Andreas, ainda que Owen Grady seja uma figura muito mais aceitável e carismática do que os heróis genéricos dos subprodutos de ação do cinema blockbuster.

    Os momentos finais aludem ao desfecho do primeiro filme, reprisando os mesmos heróis. Apesar de não apresentar uma obra prima, Trevorrow resgata parcialmente a aura do original, baseado nos livros de Michael Crichton, lembrando o espírito presente no reboot da franquia Planeta dos Macacos. Ainda assim peca ao repetir os mesmos erros de um sem número de filmes de aventura atuais, principalmente por não ousar em quase nada e reforçar a exaustão todo o conjunto de clichês de ação e aventura.

  • Um Homem Inteiro e Outras Metades: Uma Análise Final de Two and a Half Men

    Um Homem Inteiro e Outras Metades: Uma Análise Final de Two and a Half Men

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    Do início, em que se espelhava apenas na popularidade e persona de seu protagonista – se valendo até do primeiro nome deste para o espécime fictício – Two and A Half Men reúne em si dois seriados distintos, um antes e outro depois da briga entre Charlie Sheen e o criador do programa Chuck Lorre. A despeito de escândalos posteriores, como os envolvendo August T. Jones, nenhum evento dentro ou fora da ficção poderia ser mais acachapante e preponderante para a qualidade da série.

    Na primeira temporada, Charlie Harper é mostrado como um sujeito narcisista, de vida fácil, que mora em uma bela casa de praia em Malibu, colhendo os louros de sua portentosa carreira como compositor de jingles publicitários. Seu talento para música só não é maior que sua desfaçatez, que o impede de exercer seus dotes em qualquer evento que não lhe renda uma bela quantia em dinheiro. O modo bom vivant de existir faz com que ele seja um sujeito acomodado, conformado com o próprio modus operandi, só capaz de mudar após um evento tremendamente improvável de acontecer.

    Um dia, seu irmão Alan (Jon Cryer) bate à sua porta, desabrigado após um casamento fracassado. Sua personalidade é completamente diferente da de seu irmão, uma vez que este é um completo repelente para pessoas do sexo oposto. A abordagem de Alan com as mulheres envolve basicamente o sexo por pena e relações curtas; as mais longas, terminando quase sempre em um ódio mortal, já que ele suga toda a essência delas. Alan carrega consigo seu filho Jake (Jones), que durante o programa vai crescendo, passando de uma figura adorável e carismática – ao menos para sensibilizar o frio coração de seu tio – para um adolescente em via de se tornar um homem.

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    A diferença entre ambos, especialmente em relação ao sexo, muito é justificada pela presença opressora da mãe, Evelyn, vivida por Holland Taylor, uma mulher dominadora, que exerce sobre os filhos uma terrível influência, resumindo os comportamentos dos filhos aos de uma dupla de infantes. Outros personagens importantes os orbitam, como a stalker Rose (Melanie Lynskey), uma louca e irresistível ex-amante de Charlie, que sempre entra pela sacada da cobertura. Outro personagem periférico importante é Berta, vivida pela veterana Conchata Ferrell, que só não teve mais participações no seriado que Cryer e Jones.

    Entre momentos poucos e muitos inspirados, os irmãos trocam farpas, acusações e até parceiras sexuais. Especialmente Alan, que se mete em muitos apuros: após o primeiro divórcio, ele se casa de novo com Kandi (April Bowlby), uma moça mais jovem e atraente, que acaba dispensando-o. Os apuros pioram quando, em uma recaída, transa com Judith (Marin Hinkle), para logo depois engravidá-la, deixando a dúvida de que ele seria o pai.

    No decorrer da sexta temporada, um amigo de Charlie, interpretado por Emilio Estevez falece, fazendo o protagonista imaginar como seria o seu próprio funeral após uma vida repleta de bebedeira e muito sexo. Em sua elucubração imaginativa, ele vê cada uma das mulheres com quem ficou cuspindo em seu caixão, reflexo das muitas rejeições provocadas pelo personagem após noites de prazer. O desespero faz com que ele se aproxime de seus parentes, mas isso logo passa, mostrando que sua motivação tem muito a ver com o medo de morrer e perder todas as regalias que sempre teve; qualquer reflexão além disso foge de sua rotina.

    Do sexto para o sétimo ano, uma relação se fortifica, com a entrada da personagem Chelsea (Jennifer Taylor) à série, e naturalmente a moça transita da posição de transa casual para namorada e até noiva do eterno solteirão. O relacionamento dura um bom período, somente interrompido após uma briga, que incrivelmente não inclui nenhuma infidelidade do bêbedo compositor. Charlie se insere na completa fossa após o rompimento, sentimento que perdura por todo o fim do sétimo ano.

    A comédia de constrangimento de Alan segue viva, piorando de quadro na sétima temporada, com a inserção de mais um de seus pares fixos, Lyndsey Mackelroy (Courtney Thorne-Smith). Seu destino se inverte com o de seu irmão mais velho, no último ano, com a presença de Cheen no elenco. Charlie se torna um deprimido, que não consegue mais se relacionar com mulher alguma, a não ser profissionais do sexo, numa alusão clara à desilusão amorosa causada pelo último rompimento. Após algumas tentativas frustradas de se comprometer com outras mulheres, Charlie percebe a contrapartida do que sente por Rose, atentando para a razão de nunca ter cortado relações com a stalker. Após um casamento fake, feito para enganar o protagonista, o musicista começa a perseguir sua amada.

    O último capítulo do seriado termina com Charlie convidando Rose a ir a Paris, onde a surpreenderia com um pedido de casamento, sem sequer notar que estava sendo enganado. Aquele seria seu último momento como protagonista do show de TV, que retornaria em sua primeira cena do ano seguinte em um funeral, que conta com a presença de muitos dos seus conhecidos, inclusive de algumas mulheres com quem dormiu, a maioria aliviada por não ter mais a fonte de suas DSTs presente em vida.

    Após a chegada da urna que continha as cinzas do primogênito Harper, o novo astro do show aparece, ensopado, na varanda da casa de Malibu. Walden Schmidt, um depressivo bilionário, que acabou de romper um relacionamento, tentava suicidar-se de modo atrapalhado. Logo, Walden vence seus instintos de autoflagelo, transando com duas mulheres na primeira noite que passa no cenário predominante de Two And A Half Men. Walden decide comprar a casa. A proximidade entre os dois, que acabaram de se conhecer, aumenta a ponto de Alan ir viver com o recém-dono da casa, algo comum, dada a infantilidade latente do novo hospedeiro.

    A falta de criatividade acomete os roteiristas, que reprisam muitos dos dramas de Charlie, como o fato do protagonista ser preso a uma mulher do passado e ser fruto de inveja por parte de todos os personagens masculinos mostrados em tela. A mudança na arquitetura e a falta de desprezo de Walden por Alan parecem ser algumas das poucas diferenças entre os dois. Bridget (Judy Greer) chega a ponto de perseguir seu antigo amado, como Rose fazia antes, para depois voltar à configuração original.

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    No décimo ano, Walden ainda se recupera de um namoro fracassado, se inserindo em relação malfadada atrás da outra, tendo que lidar com a temível condição de ser um bilionário e de ter belas mulheres o cercando sempre. O pobre homem rico chega a se fingir de pobre para namorar uma moça simples. Toda essa problemática supera e muito os dramas de Jake – que se alista ao exército, e quase não aparece mais, graças a um ataque relativo a uma conversão religiosa de seu intérprete –, e, claro, a vida medíocre e parasitária de Alan, que a duras penas consegue manter seu namoro vivo, apesar de todo o seu derrotismo.

    A pergunta que persiste desde o nono ano não é respondida: o motivo pelo qual Alan continua na casa de Walden é discutido por cada mulher que habita a cama do gênio da internet. A insistência neste estado de dependência de um estranho do mesmo sexo ao outro faz reacender muitas perguntas, especialmente ligadas a um romance homoafetivo de cunho grotesco, visto a disparidade estética entre os “amigos”.

    Após o season finale número 10, Jake anuncia sua transferência para o Japão. O décimo primeiro ano já não teria sua presença no elenco, com uma estranha substituição logo no primeiro episódio: Jenny (Amber Tamblyn), a filha beberrona e lésbica de Charlie. Perdida entre romances tórridos do passado, ela é convenientemente trazida à tona após a queda de mais um dos tripés da série, o segundo em menos de três anos. O começo da temporada reaviva o fantasma de Charlie Harper, vivido por Kathy Bates, tornando-o mais uma vez o motivo de depressão e lamento, jogando Walden (mais uma vez) para o papel de coadjuvante.

    Após o anúncio de que o décimo segundo ano seria o último do seriado, Chuck Lorre decidiu que seria aprazível aumentar a família presente na casa e a tensão sexual entre os participantes. Depois de quase morrer devido a um infarto, Walden repensa seus objetivos de vida, e para dar fim à sua solidão, escolhe tentar adotar uma criança, o que, para efeitos práticos, tem dificuldade em fazê-lo estando solteiro. A profecia se cumpre, com Alan sendo a nova noiva do bilionário, para ficarem, como casal, mais fortes na possibilidade de adoção.

    O disparate começa pelo fato de que são dois héteros fingindo ser gays, e que deveriam demonstrar uma afinidade grande o suficiente para convencer os responsáveis pela adoção de que não são uma fraude. A intenção de abranger o público LGBT é singela, mas executada de modo ofensivo para essa parcela da população, já que o pressuposto é de que se passar por gay é uma tarefa fácil.

    Após muitas trocas de casais e situações constrangedoras, Walden consegue enfim adotar Louis (Edan Alexander), e o esperado fim da estranha relação dos Harpers com os Schmidt tem um fim anunciado. O décimo quarto episódio serve, entre outras coisas, para fechar as pontas abertas dos últimos quatro anos, unicamente para dedicar o series finale ao pensamento abstrato e ao mal concebido final, que uniria as duas principais fases do seriado, praticamente ignorando o último protagonista, referenciando a persona que Chuck Lorre considerava ingrata. A postura, apesar de contraditória, guarda uma certa lógica, dada a carência e arrogância do personagem principal feito por Ashton Kutcher, que não se via bem sem a presença parasitária do divorciado Alan.

    Os convites dados a Charlie Sheen soaram estranhos, segundo os boatos, com propostas esdrúxulas que claramente mudariam todo o rumo do programa de aproximadamente uma hora de duração, contando intervalos comerciais. A ausência do astro o elevou a um patamar de fama ainda maior do que possuía, fazendo do seu atual programa – Anger Management – um show bastante visto para as pretensões de seus empregadores, que exibiram 90 episódios ininterruptamente, por dois anos, talvez por medo de também perder seu protagonista. Mesmo não estando presente, a aura de Charlie venceu qualquer concorrência com Kutcher e, especialmente, com Chuck Lorre, que quis se aproveitar do hype e ainda alfinetar seu desafeto.

    Charlie Harper em animação, uma piada super original de Lorre.Charlie Harper em animação, uma piada super original de Lorre

    As primeiras cenas remetem ao primeiro episódio da era Walden, com o recordatório do suposto funeral sem corpo de Charlie, para logo depois mostrar Rose indo até seu porão para alimentar um prisioneiro em um poço. O pretexto para a fuga finalmente ocorre, e elementos da sua sobrevivência são enviados aos seus familiares. A partir daí, tudo em volta começa a parecer ainda mais deslocado, incluindo as interações de Walden, que deixa de ser o pegador com pênis gigantesco para se tornar um sujeito que precisa de ajuda de uma revista feminina para fazer uma mulher gozar. Daí, mil piadas com o fim do seriado são lançadas, entre elas a participação de Arnold Schwarzenegger como relator do caso das ameaças de Charlie, sendo somente um pretexto para tratar dos detalhes da trama. Algumas cartas para ex-namoradas também são enviadas, além de lembrar (finalmente) a ausência de Charlie enquanto pai de Jennifer. August T. Jones também retorna para reavivar seu personagem e ser ovacionado pela louca plateia, com uma sequência que mal dura dois minutos.

    A vingança de Charlie Harper quase se realiza, e é interrompida por um remendo de roteiro dos mais vergonhosos já vistos na história da TV americana, com a última quebra da quarta parede. Surge um soberbo Chuck Lorre, que assassina seu xará e desafeto, para logo depois ser esmagado por um piano, usando um artifício típico de um desenho animado como alegoria de sua própria mentalidade infantil, fechando melancolicamente o seriado que deveria ter ao menos metade da duração que realmente teve. Em brigas de ego, é difícil ter qualquer possibilidade de boas saídas, mas certamente nem nos piores pesadelos dos fãs de Charlie Sheen, Two and a Half Men e até de Chuck Lorre, imaginava-se algo tão baixo e fraco quanto o que foi exibido. Charlie, Alan, Jake, Berta, Evelyn, seus respectivos pares, e até Walden Schmidt, mereciam um desfecho mais bem elaborado, sem suas relevâncias banalizadas e sem um fim tão abrupto, vazio e sem razão de ser, de um programa que jamais foi um primor no quesito roteiro, mas que tinha no carisma de seus personagens uma boa alternativa de despiste.

    Nem mesmo isso sobrou. As aventuras na casa de Malibu com bebidas, strippers e afins não serão tão inspiradas e lotadas de mulheres, álcool e boêmia quanto eram antes.

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  • Crítica | Homens, Mulheres e Filhos

    Crítica | Homens, Mulheres e Filhos

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    O acesso à internet utilizando computadores pessoais, tablets e celulares demonstra o alcance da informação nos dias de hoje. Boa parte das interações humanas é atualmente mediada pela rede – provavelmente por uma conexão sem fio – e por algum sistema eletrônico. Uma rede mundial conhecida pela população, e utilizada em demasia para busca de necessárias informações sobre como viver melhor, e pelo vício inerente a qualquer atividade humana.

    Homens, Mulheres e Filhos, sexto longa-metragem de Ivan Reitman, é adaptado do romance de Chad Kultgen, conhecido pelos romances retratando as relações – principalmente, sexuais – dos Estados Unidos. A obra traça um panorama de personagens inseridos neste moderno mundo contemporâneo onde a comunicação virtual é uma realidade paralela ao nosso cotidiano.

    A primeira cena do longa-metragem apresenta o espaço e a sonda Voyager, parte de um projeto da NASA criado em 1977 para estudar outros planetas. Em 2013, a sonda foi o primeiro objeto a sair do sistema solar. O famoso cientista Carl Sagan foi responsável pela seleção de diversas informações terrestres com o intuito de comunicar com outros seres. Estas informações são apresentadas em uma narrativa em off como base comparativa entre a vastidão do Universo e a importância da Terra, uma casca insignificante perante o infinito.

    Uma teia de personagens é apresentada diante desta era virtual. São homens, mulheres e adolescentes que mal se comunicam e utilizam o meio virtual como projeção de suas frustrações, sejam elas sexuais, como ocorre com o primeiro personagem a surgir em cena, Don Truby, um pai que acessa sites de pornografia online no computador do filho; familiares, quando Patricia Beltmeyer monitora ativamente os passos da filha, Brandy; ou utilizando-se de um meio para conquistar lucro e fama, como faz a mãe de Hannah Clint ao criar um site para a publicação de ensaios semi nus de sua filha; entre outros personagens que, em maior ou menor escala, utilizam a internet para dar vazão a seus vícios ou desvios emocionais e sexuais.

    O roteiro transforma tais elementos de maneira redutiva, fazendo cada personagem uma representação de um vício, com situações que beiram a fatalidade iminente. Relações que são alteradas pelo curso de outras vidas, demonstrando que nem pais, nem filhos têm a orientação adequada para adaptar-se a estes novos tempos. Trata-se de uma maneira extremamente dramática que enfatiza o lado negativo da relação virtual. Seria ela a base ou parte da justificativa para os duros tempos atuais.

    Sendo uma ferramenta utilizada diariamente pela grande parcela da população mundial, torna-se evidente, através de observação direta, que o mundo virtual apresenta elementos positivos e negativos. O roteiro parece calculado para ser excessivamente dramático e, dada a ênfase no lado negativo das relações e destes mundos paralelos, um tanto panfletário.

    Para fundamentar as histórias apresentadas, o bonito texto de Carl Sagan, Pálido Ponto Azul, é citado em cena e está presente no começo e no fim da trama. Um recurso para demonstrar de maneira explícita um enredo que o público já compreendeu, a saber: devemos ter consciência de como estamos lidando com as relações humanas tanto no interior familiar como no cotidiano externo.

    Em obras anteriores de Reitman, mesmo apresentando histórias contemporâneas ásperas, como a do vendedor de cigarros sem moral; da escritora de young adult que ainda vive como adolescente; do amor como uma fuga da realidade; e da gravidez na adolescência, o diretor e seus parceiros roteiristas sempre trabalharam enredos que variam tensões positivas e negativas, compondo um estilo agridoce e bem equilibrado.

    É inegável que as tramas apresentadas possuem uma base real, mas a concentração de tantos personagens exibindo seus vícios, parecendo desconhecer informações, análises, estudos e diversos elementos sobre a mudança de estruturas que a rede virtual trouxe, transforma o roteiro em um exagero calculado para provocar uma espécie de choque e de ruptura.

  • Crítica | Três Reis

    Crítica | Três Reis

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    Três Reis começa como um sinal de mudança de tempos, anunciando a metamorfose da era belicista americana, retratando a Guerra do Golfo sob uma ótica singular e engraçada. A maneira jocosa, totalmente diversa de como era retratada o conflito pela imprensa (a época) e mais diferenciada ainda da cobertura que fora realizada na guerra americana anterior: Vietnã – foi uma boa maneira de David O. Russell mostrar que os tempos eram outros, esta era a Guerra da Mídia, em Nam a opinião pública derrubou os EUA, e este erro teria de ser evitado a todo custo.

    A aventura com premissa escapista joga o trio de protagonistas numa curiosa caça ao tesouro, repaginando os filmes de pirata, atualizando-o não só na linguagem textual, mas também nos cenários, saindo os sete mares para explorar o desértico cenário do Oriente Médio e tirando os estereótipos de piratas desregrados e maltrapilhos, pondo militares porra loucas no lugar.

    A obstinação da repórter Adriana Cruz (Nora Dunn) em busca do furo é digna de nota, especialmente se comparada as atitudes de sua rival (Cathy Deitch, feita pela já maravilhosa Judy Greer), dois lados da investigação jornalística são mostradas e suas procuras pelo sucesso ajudam a compor o quadro louco da trama proposta pelo roteiro.

    A edição do filme privilegia o tema da comédia, mostrando a caça pelo ouro e a tentação dos soldados em embolsar os valores, mas a história transita entre isso e demonstrações de maus tratos aos cidadãos iraquianos. O propósito dessas transições é mostrar humoristicamente o quão ambígua é a relação entre o povo e seu ditador, revelando o pouco apoio da plebe a imposta e autodeclarada autoridade local. Mesmo os “bravos” yankees não são unânimes quanto ao nível de interferência que deveriam empregar na situação. Em muitos momentos a comédia é posta de lado, fazendo do filme um filhote de Dr. Fantástico de Stanley Kubrick, abusando do humor negro para provar seu ponto. As cenas violentas são registradas numa velocidade diferente, truncada, quase como se Russell estivesse registrando-as a contragosto – a guerra é impessoal, é devastadora com quem está envolvido nela.

    O foco, depois da captura de Troy Barlow (Mark Wahlberg) muda, a câmera na mão prevalece em detrimento das cenas em terceira pessoa, a intenção é imergir o público na incomoda sensação da captura e na transformação, de um caçador de um baú lotado de opulência para o estado miserável de um simples refém. Nesse estágio, o roteiro permanece repleto de situações engraçadas, mas as piadas são não mais os percalços da procura pela riqueza e sim as promessas infundadas de que o governo de Bush Primeiro auxiliaria a castigada escuma iraquiana.

    As cenas que mostram os órgãos internos sendo alvejados pode ser encarado como uma alegoria as feridas dos militares retratados, que superficialmente parecem bem e motivados, mas que por dentro estão apodrecendo, graças a situações que se meteram graças a sua cobiça desmedida. A motivação de Elgin (Cube), Gates (Clooney) e Barlow muda e a frustração por não conseguir prosseguir com a sua missão é maior que sua fome pelo ouro. A nobreza dita no título se manifestaria nas atitudes do trio, que após a odisseia mudaram sua postura a fim de se diferenciar dos seus superiores engravatados, o desfecho pode ser encarado como piegas, especialmente graças a mensagem edificante, mas também pode ser visto como uma evolução na jornada dos personagens, e neste ponto, o trabalho de David O. Russell é competentíssimo.

    Ouça nosso podcast sobre a filmografia de David O. Russel.

  • Crítica | Carrie: A Estranha (2013)

    Crítica | Carrie: A Estranha (2013)

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    Quarenta anos após o lançamento de seu primeiro romance, Stephen King é considerado um dos melhores escritores de suspense. Influência que transpassa a maioria dos literatos que encontraram no autor uma espécie de precursor contemporâneo do medo.

    Lançado em 1974, marcando sua estreia, Carrie – A Estranha apresenta a inventividade do autor ao narrar a história de uma garota colegial que descobre poderes telecinéticos. O arroubo narrativo, que King considera cru, produz uma história entrecortada com documentos ficcionais, trechos de outros livros, citações de especialistas, promovendo uma falsa veracidade dos fatos.

    Dois anos após o lançamento do romance, Brian de Palma trouxe a história para as telas. O roteiro de Lawrence D. Cohen concretiza uma adaptação eficiente e que, reconhecendo a estrutura narrativa de King (a qual é impossível de ser transportada para as telas sem parecer um falso documentário) escolhe um outro foco sobre a mesma história.

    A primeira cena da produção de 1976 apresenta um grupo de garotas no vestiário. A câmera passeia com naturalidade pela nudez feminina até encontrar a estranha Carrie no final de um corredor. A cena não sexualiza os corpos nus, deixando-os como parte de um cotidiano natural.

    A personagem interpretada por Sissy Spacek se tornou icônica, principalmente quando banhada em sangue em sua formatura. Como filme, Carrie foi bem sucedido tanto como produção de terror quanto destaque da carreira da equipe envolvida. Quase 40 anos após a eficiente versão de De Palma, uma nova produção cinematográfica foi lançada, dirigida por Kimberly Peirce (Meninos Não Choram), e com Chloë Grace Moretz e Julianne Moore no elenco.

    Adaptar uma obra com versões lançadas anteriormente garante uma base de retorno financeiro maior do que um produto inédito, ao mesmo tempo em que nasce a sombra da comparação. Os produtores ficam em um impasse entre reconhecer as adaptações anteriores ou negá-las, afirmando que a obra literária foi a única fonte fiel. Mesmo que se tente esconder, é clara a reprodução do filme anterior na nova produção.

    As mesmas modificações de roteiro e composições cênicas construídas por Cohen e De Palma estão presentes neste Carrie – A Estranha. A cena inicial do chuveiro se repete. Mas, transformada através dos anos, tem a mão da vigília dos bons costumes e esconde a naturalidade da nudez. O que resulta em uma Carrie desesperada a, em boa parte desta cena, manter-se com as mãos retesadas ao corpo, segurando a toalha para esconder a sensualidade e ganhar uma faixa indicativa menor.

    Alem da proximidade exagerada com a versão anterior, a seleção de elenco falha ao colocar Moretz como personagem central. Escolheu-se uma garota bonita demais para um personagem cuja estranheza é uma de suas características. Sem a capacidade cênica de Spacek, a atriz demonstra sua disparidade em relação aos outros alunos com olhares assustados, uma cruz no pescoço e um cabelo mal penteado. Não há o medo de uma garota que se sente deslocada na escola. Sem o reconhecimento do drama, não há ação que se sustente.

    Até mesmo a exímia Julianne Moore não consegue entregar uma interpretação além do comum. Novamente o visual exagera na caracterização de uma cristã fervorosa, parecendo esconder qualquer vontade da atriz em dar credibilidade a uma mãe que vê o mundo como a panela do diabo e as mudanças hormonais da filha como primeiro contato com este mundo pecaminoso.

    Mãe e filha não estabelecem tensão necessária para que a história se sustente, destruindo uma das bases da história. Ainda que os efeitos especiais sejam bem compostos, não deixam de ser um decalque da versão anterior, em que planos cênicos parecem copiados em demasia. Não há espaço para originalidade.

    Sem a credibilidade dramática, sem o suspense aterrorizante, o remake resulta em uma obra sem razão, falha em seus princípios. Ainda que a afirmação caia em uma nostalgia que observa o passado com maior brilhantismo, a produção de De Palma continua tão forte quanto a obra de King, um mestre do gênero até hoje e poucas vezes bem adaptado a outras mídias.