Tag: Ansel Elgort

  • Crítica | Amor, Sublime Amor (2021)

    Crítica | Amor, Sublime Amor (2021)

    West Side Story é um musical da Broadway, conhecido por suas várias versões, sendo a mais famosa vista no filme de Robert Wise e Jerome Robbins lançado em 1961. Sua história atualiza o conto shakesperiano de Romeu e Julieta, ambientando na cidade de Nova York  do século XX. A expectativa em relação à nova versão de  Amor, Sublime Amor não eram pequenas, ainda mais por ser conduzida por Steven Spielberg, que vem de uma fase de adaptações bastante elogiadas.

    As escolhas visuais e temáticas do cineasta foram bem diferentes da versão dos anos sessenta. O figurino das gangues Jets e Sharks, assim como a direção de arte é bem mais realista nesta abordagem. Como na primeira montagem cinematográfica, o longa também se inicia com uma tomada aérea sobre a cidade de Nova York, dessa vez, bem mais cinza e suja, combinando com o visual maltrapilho dos grupos de foras-da-lei.

    O roteiro fica a cargo de Tony Kushner, que já trabalhou antes com o realizador em Munique e Lincoln. Aqui há um subtexto diferente da versão de Wise: o território disputado estava em fase de realocação urbana, ou seja, estavam todos se despedindo e em vias de sofrer despejo, o pedaço de terra era utilizado apenas pelos miseráveis que não tinham condições de se mudar. Os personagens possuem problemas reais, faltam-lhe condições básicas de conforto e de sobrevivência. No entanto, esses trechos poderiam ser menos didáticos.

    O elenco é comandado por Ansel Elgort (Em Ritmo de Fuga), que faz o papel do recém-reabilitado Tony, fundador dos Jets, e que se submete a um trabalho simples para tentar se regenerar nesse momento de liberdade condicional, distante dos seus antigos colegas de vadiagem. Ainda assim, ele causa em Riff (Mike Faist) a esperança de poder, enfim, sobrepujar os seus rivais, de maneira “definitiva”, mas sem os eufemismos ou artifícios retóricos que tentam esconder a vontade de matar, e até mesmo de morrer, comum a tragédia de tantos jovens.

    Tony é a exceção dentro dos Jets. Ao contrário dos outros rapazes ele tem uma ocupação. Ele é como um dos Sharks, dado que do grupo, todos trabalham, mesmo os que estudam. De maneira simples o roteiro demonstra como funciona a realidade diferenciada deles, pois mesmo sendo pobres, os brancos podem se dar ao luxo de não trabalhar, enquanto os hispânicos precisam lutar para viver.

    Tanto Riff quanto Bernardo (David Alvarez) são inspiradores se comparados aos seus capangas, mas os melhores diálogos e canções caem sobre a protagonista, Maria (Rachel Zegler), uma menina inocente e disposta a amar infinitamente. Já Anita (Ariana DeBose), é uma moça que não se permite domar nem pelo namorado violento, e nem pelas pressões comuns a um jovem latino na América. Dos arcos dramáticos, este é o mais profundo e plausível, seu intento de ser uma desenhista de moda é um bom resumo do desejo de vencer na vida.

    Os amores são mostrados quase sempre de maneira trágica e melancólica, em especial os que envolvem os personagens latinos. Tony e Maria tem química, se sentem unidos mesmo em meio ao mar de gente no momento de seu encontro. A atração pelo olhar e pela alma é pontuado de forma intensa, fato que faz essa versão contemplar bem o mito de William Shakespeare. Pode-se dizer o mesmo de Anita e Bernardo.

    Os coadjuvantes têm seu espaço, protagonizam cenas de dança grandiosas, além de números de sapateado igualmente bons. A maior parte das cenas são maiores aqui do que em comparação com a versão de Wise, além de não se depender tanto de Tony ou Riff para acontecerem os momentos musicais dos Jets. A música de Gustavo Dudamel está muito bem encaixada, e a melodia, letra e coreografia fluem muitíssimo bem. A atmosfera de musical moderno faz invejar obras recentes como La La Land: Cantandos Estações e Os Miseráveis, no sentido de popular e épico.

    Amor, Sublime Amor é divertido, consegue variar bem entre o escapismo e a violência. Spielberg captura bem a atmosfera da delinquência juvenil que residia nos Estados Unidos no pós-Segunda Guerra. Sua forma de contar história certamente agradará o público afeito a musicais, e consegue saciar até quem não costuma consumir esse gênero, mas sua maior qualidade é a de atualizar bem os temas do clássico, com alma, emoção e energia. O único senão fica com as legendas que poderiam ter um maior cuidado com o que é dito nas músicas. Não é preciso ser especialista em língua inglesa para perceber que os textos não casam com o que é cantado e tudo é completamente modificado em sentido e espírito.

  • Crítica | Insurgente

    Crítica | Insurgente

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    Segunda parte da trilogia escrita por Veronica Roth, a sequência de Divergente, lançado há apenas um ano, chega aos cinemas revelando a urgência de produções-pipoca com bilheteria garantida, mesmo que uma trama sem fôlego seja um ponto crítico.

    Como resumo dos fatos anteriores, um vídeo institucional em que a líder, Jeanine Matthews (Katie Winslet), apresenta ao povo, pontua os preceitos básicos desta série distópica na qual a sociedade é divida em facções de acordo com os dominantes psicológicos de cada um: altruísmo (abnegação), amizade (generosidade), audácia (coragem), franqueza (sinceridade) e inteligência (erudição). Entre eles, há quem não se encaixe em nenhuma destas categorias: são os Divergentes, considerados párias por não se adequarem às divisões da sociedade, e por isso são retirados do sistema.

    A trajetória de Tris segue em Insurgente com maior pressão psicológica pelos fatos sucedidos anteriormente. A personagem compreende que representa uma exceção dentro de seu universo, mas não sabe como agir de fato para modificá-lo. Difícil não equipar esta heroína com a personagem central de Jogos Vorazes, Katniss Everdeen. Afinal, narrativas contemporâneas focadas em futuros distópicos com jovens como grandes salvadores têm sido uma tendência literária e, por consequência, cinematográfica. Katniss e Tris possuem personalidades distintas, mas a composição de Tris é feita de maneira menos intensa do que a da outra franquia, resultando em uma empatia proporcional ao carisma e urgência que a atriz Shailene Woodley trabalha em seu papel.

    Tris não soa como uma ameaça urgente ao sistema de governo como Katniss, bem como seu povo parece satisfeito com o sistema de facções. Sendo assim, uma eventual mudança parece seguir mais a vontade interior da garota e do grupo de Divergentes do que um aclame geral da população. Reconhecendo que a personagem central tem pouco carisma, Roth e, consequentemente, os roteiristas Brian Duffield, Akiva Goldsman e Mark Bomback desenvolvem uma intriga sobre um artefato antigo que traria uma mensagem dos fundadores. Porém, para abri-lo é necessário a presença de um divergente. É natural que a única pessoa capaz de abrir o dispositivo seja Tris. O elemento de predestinação é mais um argumento que prova a falta de força desta história que precisa de um incentivo extra para criar conflitos entre os supostos bandidos e mocinhos.

    Mesmo este conflito com uma possível mensagem reveladora é estranho, pois a princípio a garota deseja destruir o artefato e depois desvendá-lo, mesmo que para isso quase perca a vida. Além do argumento frágil, as cenas de ação são bem simples, sem nenhum bom aproveitamento do recurso da terceira dimensão, além dos óbvios e já intoleráveis ângulos de cena que explicitam a imersão com objetos indo de encontro a tela. Mesmo com uma boa verba para produção, nenhuma cena de ação se destaca, e a bonita e potencialmente interessante cena do pôster nem mesmo está presente, sendo uma provável boa cena cortada da produção.

    De qualquer maneira, a última parte está em fase de adaptação para os cinemas e, seguindo a tendência atual, será dividida em duas partes, exibidas uma a cada ano. Difícil saber se haverá tanta história necessária para a produção de mais dois filmes, visto que nesta segunda parte há um vazio que enfraquece ainda mais a trajetória da personagem principal e seu grupo divergente.

  • Crítica | Homens, Mulheres e Filhos

    Crítica | Homens, Mulheres e Filhos

    Homens-Mulheres-Filhos

    O acesso à internet utilizando computadores pessoais, tablets e celulares demonstra o alcance da informação nos dias de hoje. Boa parte das interações humanas é atualmente mediada pela rede – provavelmente por uma conexão sem fio – e por algum sistema eletrônico. Uma rede mundial conhecida pela população, e utilizada em demasia para busca de necessárias informações sobre como viver melhor, e pelo vício inerente a qualquer atividade humana.

    Homens, Mulheres e Filhos, sexto longa-metragem de Ivan Reitman, é adaptado do romance de Chad Kultgen, conhecido pelos romances retratando as relações – principalmente, sexuais – dos Estados Unidos. A obra traça um panorama de personagens inseridos neste moderno mundo contemporâneo onde a comunicação virtual é uma realidade paralela ao nosso cotidiano.

    A primeira cena do longa-metragem apresenta o espaço e a sonda Voyager, parte de um projeto da NASA criado em 1977 para estudar outros planetas. Em 2013, a sonda foi o primeiro objeto a sair do sistema solar. O famoso cientista Carl Sagan foi responsável pela seleção de diversas informações terrestres com o intuito de comunicar com outros seres. Estas informações são apresentadas em uma narrativa em off como base comparativa entre a vastidão do Universo e a importância da Terra, uma casca insignificante perante o infinito.

    Uma teia de personagens é apresentada diante desta era virtual. São homens, mulheres e adolescentes que mal se comunicam e utilizam o meio virtual como projeção de suas frustrações, sejam elas sexuais, como ocorre com o primeiro personagem a surgir em cena, Don Truby, um pai que acessa sites de pornografia online no computador do filho; familiares, quando Patricia Beltmeyer monitora ativamente os passos da filha, Brandy; ou utilizando-se de um meio para conquistar lucro e fama, como faz a mãe de Hannah Clint ao criar um site para a publicação de ensaios semi nus de sua filha; entre outros personagens que, em maior ou menor escala, utilizam a internet para dar vazão a seus vícios ou desvios emocionais e sexuais.

    O roteiro transforma tais elementos de maneira redutiva, fazendo cada personagem uma representação de um vício, com situações que beiram a fatalidade iminente. Relações que são alteradas pelo curso de outras vidas, demonstrando que nem pais, nem filhos têm a orientação adequada para adaptar-se a estes novos tempos. Trata-se de uma maneira extremamente dramática que enfatiza o lado negativo da relação virtual. Seria ela a base ou parte da justificativa para os duros tempos atuais.

    Sendo uma ferramenta utilizada diariamente pela grande parcela da população mundial, torna-se evidente, através de observação direta, que o mundo virtual apresenta elementos positivos e negativos. O roteiro parece calculado para ser excessivamente dramático e, dada a ênfase no lado negativo das relações e destes mundos paralelos, um tanto panfletário.

    Para fundamentar as histórias apresentadas, o bonito texto de Carl Sagan, Pálido Ponto Azul, é citado em cena e está presente no começo e no fim da trama. Um recurso para demonstrar de maneira explícita um enredo que o público já compreendeu, a saber: devemos ter consciência de como estamos lidando com as relações humanas tanto no interior familiar como no cotidiano externo.

    Em obras anteriores de Reitman, mesmo apresentando histórias contemporâneas ásperas, como a do vendedor de cigarros sem moral; da escritora de young adult que ainda vive como adolescente; do amor como uma fuga da realidade; e da gravidez na adolescência, o diretor e seus parceiros roteiristas sempre trabalharam enredos que variam tensões positivas e negativas, compondo um estilo agridoce e bem equilibrado.

    É inegável que as tramas apresentadas possuem uma base real, mas a concentração de tantos personagens exibindo seus vícios, parecendo desconhecer informações, análises, estudos e diversos elementos sobre a mudança de estruturas que a rede virtual trouxe, transforma o roteiro em um exagero calculado para provocar uma espécie de choque e de ruptura.

  • Crítica | A Culpa é das Estrelas

    Crítica | A Culpa é das Estrelas

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    Após o lançamento de A Culpa é das Estrelas, do carismático autor John Green, a adaptação para o cinema seria apenas uma questão de tempo. Com um sucesso estrondoso, o best-seller, lançado em 2012, desbancou As Crônicas de Gelo e Fogo como a obra literária mais vendida em várias partes do mundo, inclusive aqui no Brasil. O sucesso iminente do filme começou a se manifestar logo no lançamento do primeiro trailer, uma vez que foi o trailer mais curtido do Youtube, ultrapassando o detentor do recorde anterior, Homem de Ferro 3.

    Partindo do princípio de que esta crítica está livre de comparações ao livro, existe algo de errado em A Culpa é das Estrelas e esse erro é justamente a sinopse. O filme, competentemente dirigido por Josh Boone, não trata somente do amor entre dois jovens com câncer que se conheceram num grupo de autoajuda e de como eles lidam com o sofrimento da perda. O filme, além de mostrar o que foi dito, também demonstra uma maneira divertida (e muitas vezes incômoda pelas piadas de humor negro) de se encararem os percalços da vida com câncer e como o amor pode ajudar uma pessoa doente em sua recuperação, algo que interfere não só na vida dos protagonistas como também na das pessoas que os cercam. Tudo isso dentro de uma jornada inesperada, com um desfecho interessante, o que difere dos muitos filmes do gênero, causando surpresa não pelo óbvio (que também existe e muito), mas sim porque além do câncer e da dor da perda a vida ainda prepara inúmeros dissabores.

    Hazel Grace Lancaster (Shailene Woodley) é uma jovem diagnosticada com câncer na tireoide com metástase nos pulmões, obrigando-a a respirar com um tubo de oxigênio (e também carregando-o) pelo resto de sua vida. A vida de Hazel é bastante tediosa: ela passa o dia lendo livros e assistindo a programas banais na televisão. Acreditando estar com depressão, a menina aceita os conselhos de sua mãe, Frannie (a sumida Laura Dern) e passa a frequentar um grupo de apoio da igreja juntamente com jovens na mesma situação que a dela.

    Não demora muito pra Hazel trombar literalmente num corredor com Augustus Waters (Ansel Elgort), jovem, bonito, com cara de canastrão. E a partir desse contato físico, clichê o bastante, Hazel se interessa pelo rapaz, o que faz com que ela corra ao banheiro para arrumar o cabelo, limpar alguma remela perdida no decorrer dos dias de inanição.

    Durante a reunião, Hazel descobre que “Gus” já “passou” pelo câncer, o que lhe custou uma perna e que ele estava ali acompanhando seu melhor amigo, Isaac (Nat Wolff), vítima de câncer nos olhos e que se tornaria 100% cego dentro de semanas. É também nesta reunião que Hazel e Gus têm sua primeira discussão, o que faz com que o rapaz vá atrás dela na saída, convidando-a para ir à sua casa, sendo este um dos aspectos negativos do filme, porque tudo acontece muito rápido.

    Porém, por sorte, o filme é mais do que isso.

    Como dito, Hazel adora livros e empresta seu preferido a Gus. Acontece que o livro não tem fim e “acaba” no meio de uma frase. Ademais, o autor do livro, Van Houten (brilhantemente vivido por Willem Dafoe), nunca respondeu aos e-mails de Hazel, que é louca para conhecê-lo e por querer saber qual o destino dos personagens do livro. Assim, Hazel e Gus embarcam numa viagem à Amsterdã, onde reside o mais que recluso autor, com a ajuda de uma ONG (muito parecida com a Make a Wish) e da carismática Lidewij (Lotte Verbeek), secretária de Van Houten.

    O filme funciona e você acaba não ligando para os inúmeros clichês e momentos fofos entre o casal, que somente dá seu primeiro beijo na metade da fita. Aliás, o filme é longo, tem duas horas e seis minutos de duração, mas a fluidez é tanta que nem se percebe o tempo passar.

    Ansel Elgort faz um Augustus Waters bobo, do tipo engraçadinho, mas que também te faz rir. Ele é inteligente e convicto nas suas ideias, te fazendo acreditar que realmente tudo o que ele fala tem fundamento. O destaque fica por conta de seu cigarro sempre apagado em sua boca, o que é seu porto seguro. Gus acredita que mantendo o cigarro apagado ele estaria enganando a morte. Porém, o excesso de piadas de mau gosto do personagem, inclusive para com seu amigo Isaac, chega a cansar.

    Shailene Woodley despertou a curiosidade de Hollywood por ter sido alvo de uma polêmica causada pelos fãs do Homem-Aranha, que praticamente obrigaram o diretor de O Espetacular Homem-Aranha: A Ameaça de Electro, Mark Webb, a cortar as participações da atriz como Mary Jane, simplesmente porque Woodley parecia não convencer pelas fotos das filmagens que vazaram. O episódio irritou a atriz, que pediu demissão, rescindindo um contrato de três filmes. Porém, em A Culpa é das Estrelas, Woodley, que já tinha estrelado outra adaptação de sucesso, Divergente, comprova que é uma atriz competente e versátil.

    Embora o filme flua, o roteiro não é bem amarrado, o que deixa algumas pontas soltas que poderiam ter sido resolvidas. Por exemplo, percebe-se claramente que o pai de Hazel, Michael (Sam Trammel), não está confortável com o relacionamento de sua filha com Gus, porém, não se sabe o momento em que Michael passa a aceitar Gus em sua família. Ele simplesmente aceita, do nada. Outro exemplo, esse um pouco mais sério, porque interfere diretamente numa das cenas mais lindas do longa, foi a motivação de Lidewij em querer mostrar ao casal a casa onde Anne Frank se refugiou antes de ser descoberta pelos nazistas. Mas, como dito, a cena é um dos pontos altos do filme, onde a trilha sonora abre espaço somente para os diálogos dos personagens e da narração do diário de Frank publicado em 1947.

    Finalmente, o saldo é bem positivo e a direção de Boone é moderna, lembrando um pouco o ritmo de 500 Dias Com Ela, com muitas doses de humor, sendo influenciado, também, por Scott Pilgrim Contra o Mundo, já que quando Hazel e Gus trocam mensagens pelo celular, as mensagens aparecem escritas na tela dentro de balões desenhados à mão. E a fotografia é bastante sutil e subliminar. Há cenas bem coloridas, e outras sem muita cor, o que demonstra o humor ou a carga emocional do filme naquele determinado momento, principalmente em Amsterdã, onde o clima é o tempo todo nublado.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Crítica | Divergente

    Crítica | Divergente

    divergente

    Que o cinema é uma arte, institucionalizada como tal, todos sabemos. Mas nenhuma falácia nos ocorre em considerá-lo uma indústria, principalmente depois da vinda de Tubarão às grandes telas, com o desenvolvimento do conceito de blockbuster e a ganância crescente de produtores e produtoras hollywoodianas que se agarram a ideias com maior possibilidade de lucro imediato e duradouro, ou seja, que gerem remessas agora e possam continuar gerando, sejam em sequências e mais sequências, remakes ou reboots. O que esse Fordismo cinematográfico tem nos trazido é uma homogeneização do que é visto em tela. E isso já aconteceu com o gênero do horror e seus grupos de jovens sendo atacados por assassinos ou forças sobrenaturais; na comédia, com a padronização das paródias e, depois, por meio dos filmes discípulos de Se Beber, Não Case!; entre tantos outros gêneros.

    Mas agora o que temos é uma pujança de abarcar todos esses “estilos” de forma pasteurizada, e de modo a atingir o público que mais vai aos cinemas na atualidade: o infanto-juvenil. O filão das adaptações de sucessos literários, dentre esses novos consumidores da sétima arte, surgiu como uma Estrela de Belém para Hollywood. Harry Potter foi o grande carro-chefe em anos, mas o público “teen”, leitores cada vez mais assíduos de obras voltadas à sua faixa etária e que exalavam seus conflitos e olhares sobre um amanhã deturpado, implorou por mais. E foi assim que Stephenie Meyer surgiu no mundo literário, preenchendo as livrarias com quatro obras (e depois mais e mais…) que seriam levadas às telas em cinco filmes, todos sucessos de público, mas nem um pouco de crítica.

    Mais competente e complexa em sua literatura, Suzanne Collins apresenta a distopia de Jogos Vorazes ao mundo e, após o sino de “sucesso estrondoso” ecoar em todos os continentes, a obra foi também levada aos cinemas, sendo recebida com certo louvor, tanto por parte de público quanto por parte de crítica. Daí para frente, a Unilever imaginária dos estúdios adquiriu o direito de todas as obras voltadas para adolescentes e pré-jovens, e passou a saltear, trimestralmente, novas tentativas de fidelização deste público com mais marcas que, no fim, representam o mesmo elemento das anteriores, e por vezes são até de mesma origem. Dove, Seda, Palmolive? A Hospedeira, Instrumentos Mortais: Cidade dos OssosDezesseis Luas e afins? É possível até ver os diretores de todas elas fazendo download da fórmula Meyer-Collins e dando seus sutis “toques de originalidade” em busca de alcançar a mesma popularidade dos produtos padrão. Bem… Mas como nos exemplos citados, nem sempre isso é possível.

    Veronica Roth é a autora de mais uma história embasada em distopias, dando origem a Divergente. Na narrativa, uma guerra devastou o mundo que conhecemos. Em tela vemos Chicago com visual pós-apocalíptico e a tradicional fotografia acinzentada e suja que realça a degradação de várias paisagens, como prédios e antigos estabelecimentos comerciais. Alwin H. Küchler traz também as cores terrosas de seu trabalho em Hanna, contrastando com um branco intenso que emana em momentos específicos do início do filme, para a ambientação da cidade de Divergente. É nela onde vemos a sociedade dividida em cinco facções, nomeadas de acordo com virtudes e representando funções sociais diferentes: Abnegação, Amizade, Audácia, Erudição e Franqueza. Aos 16 anos, os adolescentes nascidos em cada uma dessas macro associações devem escolher continuar em suas comunidades ou migrarem para outras facções. Tris (Shailene Woodley, indicada ao Globo de Ouro por Os Descendentes), de uma das famílias mais tradicionais de Abnegação, descobre em um teste que possui as características de todas as facções, sendo assim apontada como uma Divergente, espécie rara e perseguida pelas demais. Mesmo assim, decide alistar-se a Audácia, facção responsável pela defesa da cidade. É no doloroso processo de deixar seu corpo fraco (abnegado) e desenvolver sua práxis ativa (audaciosa) para fazer parte de sua nova facção, e esconder as perigosas virtudes de ser uma divergente, que o filme se desenrola, até o último fator se tornar impossível.

    O roteiro não traz surpresas para quem já está calejado neste tipo de adaptação, ou ao menos assistiu a Jogos Vorazes. O desenvolvimento da protagonista obedece a uma gradação claramente perceptível e deveras previsível. Mas é o fato de Shailene Woodley (aliás, uma ótima e promissora atriz) ir tão bem no papel de uma adolescente que sempre quis se libertar das amarras de sua sociedade apática e viver na correria dos “malucos” da Audácia, que faz com que o filme segure a atenção de seu público até o final. A jovem parece entender que seu papel não representa apenas uma, mas milhões de adolescentes de 16 anos inconformadas com sua realidade e sedentas por aventura, ação e… um romance aparentemente impossível.

    Nossa… o romance. Saindo das flores e começando a nos ferir com os espinhos da obra, a construção do roteiro para nos conduzir à fatídica relação entre o “malhadão” Quatro (Theo James), um dos líderes da Audácia, e Tris acontece de forma boba e pueril, partindo de diálogos sofríveis do tipo “Cuidado comigo mocinha…”, sob olhares opostos ao que a ideia transmite, à completa desconstrução em minutos de um personagem anteriormente estereotipado com características sólidas de sisudez e apelo à violência. Sabe aquele ditado “para bom entendedor, meia palavra basta”? Pois bem, essa previsibilidade dos rumos do roteiro, disfarçada por diálogos forçados, ainda é completada pela insólita sensibilidade de Neil Burger (O Ilusionista e Sem limites), diretor que acerta pouco em toda obra e que recorre aos recursos fáceis de montagem para mostrar a “evolução” de sua protagonista e ainda usa-os, aliados a repetidos closes, em momentos específicos, para que os fã boys and girls não tenham medo dos rumos da história. Pois tudo simplesmente se realiza como aparenta ser, seguindo novamente a obediência à fórmula consagrada que nos faz experimentar o gosto amargo do plot já previsto, da pseudo-coragem disfarçada do roteiro em se desfazer abruptamente de alguns personagens (oi, Jogos Vorazes?) e em testemunhar superações e mais superações da protagonista e tudo mais que “um filme desses” tem a oferecer.

    Mas talvez uma das coisas que mais irritam em Divergente é sua longuíssima duração. Nada justifica os 140 MINUTOS DE PROJEÇÃO, nem mesmo o doce de coco da Shailene Woodley faz com que alcancemos rapidamente os esperados créditos finais da obra. São exatas duas horas e vinte minutos de uma produção que se estende muito em momentos que não adicionam nada à narrativa, como nas várias comemorações e alegrias da protagonista por suas evoluções ou vitórias. Me remeteu ao insuflado Bling Ring: A Gangue de Hollywood de Sofia Coppola. Cenas como a da personagem sobrevoando por dentre os prédios da cidade de Chicago, sentindo-se finalmente livre de seus antigos grilhões, funcionam muito mais por suas metáforas “sonrisal” altamente didáticas (a felicidade, a superação, o soerguimento) unicamente do que pelo que mostram em seus cansativos minutos de computação gráfica e fotografia de noite azulada.

    Voltando às lentes de Küchler, porém, vemos que na medida em que os 140 minutos de Divergente transcorrem, o que emanava da cor branca (da inocência e abnegação) vai se tornando prata, ganhando densidade, corpo, assim como a crescente (e, aliás, belíssima) trilha sonora de Junkie XL, supervisionada por Hans Zimmer, que, ainda que usada em excesso várias vezes, em outras consegue trazer, de forma simples e suave, sentimentos como melancolia, decepção e medo, complementando a construção imagética Shailene/direção de arte.

    A composição do abrigo de Audácia é interessante. Vezes parecendo um extenso ringue de UFC, vezes um colégio interno “barra pesada”, contando com os tradicionais grupinhos estereotipados (os brigões, o piadista do bullying, o nerd, a tímida e etc), o lugar incorpora bem o momento de ruptura ao qual os adolescentes estão sendo expostos. Em relação às cenas de ação, com ressalvas às lutas que acontecem durante o treinamento (e que novamente remetem a Jogos Vorazes até em seu grau de ousadia contida), Neil aposta mais em cenas sem violência, ou que se deem de forma “limpa”, sem culpas (em simulações de embate ou em sonhos, por exemplo), do que nas que envolvem o conflito em si, o qual tem por base um plano encabeçado por Jeanine (Kate Winslet, é… ela tá no filme), a líder da Erudição que, tal a insipidez na narrativa, mais parece uma mistura do Presidente Snow com a Jessica Delacourt de Elysium. A sub-trama (que depois de revelada se torna trama principal do filme e surge como mote para mais minutos de projeção), apesar de surgir de forma megalomaníaca, fazendo vários movimentos de personagens, trazendo alguns de volta, executando outros, aprofundando o romance, apelando para dramas familiares, prometendo mudar a estrutura de tudo o que vimos até então, faz realmente apenas isso: promete. Algum motor liga, mas o avião de Divergente não decola e voltamos a dormir pois o filme parece não acabar. E o pior? Segundo o E = MC² das adaptações de obras infanto-juvenis, era basicamente isso que esperávamos desde o início.

    Shailene. O mergulho na psiquê de sua personagem, Tris, é o que há de melhor em Divergente. Seu Corra, Lola, Corra onírico é algo que, quando surge, traz esperança. Melhor explorado, mais paciente e frequente, certamente essa particularidade conduziria a obra a um patamar, se não superior, mas singular em relação às outras adaptações. A distopia high school, infantil e genérica da obra, no entanto, faz com que A Hospedeira venha à cabeça. Mesmo que os dois produtos tenham enredos completamente distintos, surgem, porém, da mesma fonte: a Unilever cinematográfica.

    Texto de autoria de Rodrigo Rigaud, do Zona Crítica.

  • Crítica | Carrie: A Estranha (2013)

    Crítica | Carrie: A Estranha (2013)

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    Quarenta anos após o lançamento de seu primeiro romance, Stephen King é considerado um dos melhores escritores de suspense. Influência que transpassa a maioria dos literatos que encontraram no autor uma espécie de precursor contemporâneo do medo.

    Lançado em 1974, marcando sua estreia, Carrie – A Estranha apresenta a inventividade do autor ao narrar a história de uma garota colegial que descobre poderes telecinéticos. O arroubo narrativo, que King considera cru, produz uma história entrecortada com documentos ficcionais, trechos de outros livros, citações de especialistas, promovendo uma falsa veracidade dos fatos.

    Dois anos após o lançamento do romance, Brian de Palma trouxe a história para as telas. O roteiro de Lawrence D. Cohen concretiza uma adaptação eficiente e que, reconhecendo a estrutura narrativa de King (a qual é impossível de ser transportada para as telas sem parecer um falso documentário) escolhe um outro foco sobre a mesma história.

    A primeira cena da produção de 1976 apresenta um grupo de garotas no vestiário. A câmera passeia com naturalidade pela nudez feminina até encontrar a estranha Carrie no final de um corredor. A cena não sexualiza os corpos nus, deixando-os como parte de um cotidiano natural.

    A personagem interpretada por Sissy Spacek se tornou icônica, principalmente quando banhada em sangue em sua formatura. Como filme, Carrie foi bem sucedido tanto como produção de terror quanto destaque da carreira da equipe envolvida. Quase 40 anos após a eficiente versão de De Palma, uma nova produção cinematográfica foi lançada, dirigida por Kimberly Peirce (Meninos Não Choram), e com Chloë Grace Moretz e Julianne Moore no elenco.

    Adaptar uma obra com versões lançadas anteriormente garante uma base de retorno financeiro maior do que um produto inédito, ao mesmo tempo em que nasce a sombra da comparação. Os produtores ficam em um impasse entre reconhecer as adaptações anteriores ou negá-las, afirmando que a obra literária foi a única fonte fiel. Mesmo que se tente esconder, é clara a reprodução do filme anterior na nova produção.

    As mesmas modificações de roteiro e composições cênicas construídas por Cohen e De Palma estão presentes neste Carrie – A Estranha. A cena inicial do chuveiro se repete. Mas, transformada através dos anos, tem a mão da vigília dos bons costumes e esconde a naturalidade da nudez. O que resulta em uma Carrie desesperada a, em boa parte desta cena, manter-se com as mãos retesadas ao corpo, segurando a toalha para esconder a sensualidade e ganhar uma faixa indicativa menor.

    Alem da proximidade exagerada com a versão anterior, a seleção de elenco falha ao colocar Moretz como personagem central. Escolheu-se uma garota bonita demais para um personagem cuja estranheza é uma de suas características. Sem a capacidade cênica de Spacek, a atriz demonstra sua disparidade em relação aos outros alunos com olhares assustados, uma cruz no pescoço e um cabelo mal penteado. Não há o medo de uma garota que se sente deslocada na escola. Sem o reconhecimento do drama, não há ação que se sustente.

    Até mesmo a exímia Julianne Moore não consegue entregar uma interpretação além do comum. Novamente o visual exagera na caracterização de uma cristã fervorosa, parecendo esconder qualquer vontade da atriz em dar credibilidade a uma mãe que vê o mundo como a panela do diabo e as mudanças hormonais da filha como primeiro contato com este mundo pecaminoso.

    Mãe e filha não estabelecem tensão necessária para que a história se sustente, destruindo uma das bases da história. Ainda que os efeitos especiais sejam bem compostos, não deixam de ser um decalque da versão anterior, em que planos cênicos parecem copiados em demasia. Não há espaço para originalidade.

    Sem a credibilidade dramática, sem o suspense aterrorizante, o remake resulta em uma obra sem razão, falha em seus princípios. Ainda que a afirmação caia em uma nostalgia que observa o passado com maior brilhantismo, a produção de De Palma continua tão forte quanto a obra de King, um mestre do gênero até hoje e poucas vezes bem adaptado a outras mídias.