Tag: Shailene Woodley

  • Crítica | Snowden: Herói ou Traidor

    Crítica | Snowden: Herói ou Traidor

    snowden2016 foi um ano particularmente trágico no mundo e uma das surpresas mais negativas surgiu com a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Por tudo que defende, o futuro comandante da nação mais poderosa do planeta representa não só a possibilidade de uma escalada ainda maior do processo de desequilíbrio econômico-social no mundo, mas sobretudo da expansão do cerceamento das liberdades individuais. E é justamente nesse contexto que Snowden: Herói ou Traidor, novo filme de Oliver Stone sobre o ex-funcionário da CIA e da NSA, se torna absolutamente relevante e terrivelmente assustador.

    Escrito pelo próprio Stone em parceira com Kieran Fitzgerald a partir dos livros Os Arquivos Snowden e Time of the Octopus (ainda sem tradução no Brasil), Snowden é um filme que resgata tudo aquilo que se espera de seu diretor. Com forte viés político, como não poderia deixar de ser, a produção constrói um thriller digno de John Le Carré para mostrar os eventos que culminaram na divulgação de documentos secretos da NSA em junho de 2013 ao mesmo tempo em que nos apresenta quem de fato é Edward Snowden, o homem responsável pelo vazamento de informações que mancharam irremediavelmente a administração de Barack Obama.

    Interpretado por um Joseph Gordon-Levitt num trabalho que impressiona pelas sutilezas com que emula o personagem título quase à perfeição (quem viu o documentário ganhador do Oscar 2015, Citizenfour, vai notar como o ator ficou realmente parecido com Snowden tanto na postura física quanto no tom de voz), o ex-CIA e NSA se revela uma figura fascinante à medida em que vemos a trajetória da transformação do homem que acreditava plenamente que a “América” é o melhor lugar do mundo e confiava em seus governantes – achando absurdo, por exemplo, quem criticava o presidente – àquele que resolveu expor o maior segredo destes para o mundo.

    O filme estrutura e divide sua narrativa basicamente entre duas coisas: os bastidores da longa entrevista que Snowden deu à documentarista Laura Poitras (Melissa Leo) e aos jornalistas Glenn Greenwald (Zachary Quinto) e Ewen MacAskill (Tom Wilkinson) em Hong Kong em junho de 2013 e os flashbacks que trazem recortes da carreira de Snowden evidenciando alguns de seus feitos em posições de destaque tanto na CIA quanto na NSA (que inclusive provam que ele não era um reles analista terceirizado como o governo americano tentou pintá-lo depois) além de sua própria vida pessoal quando mostra como seu relacionamento com a progressista Lindsay Mills (Shailene Woodley) influenciou a mudança de perspectiva que ele experimentou.

    A propósito, ainda que tenha o thriller político no seu DNA, Snowden, por vezes, ganha ares de filme de terror quando evidencia quão ameaçadoras são as ferramentas que a NSA dispunha (e provavelmente continua dispondo) para monitorar cidadãos mundo afora que sequer sabem que estão sendo vigiados das formas mais vis. É o choque de realidade que o filme provoca, aliás, que o transforma numa obra tão importante, já que expõe com todas as letras que o terrorismo foi a mera desculpa que o governo americano usou para obter vantagens em negociações econômicas com outros países através do monitoramento secreto de outros governos e empresas estrangeiras.

    Expositivo na medida certa, Snowden traz também o importante alerta sobre como é fundamental ter uma mídia imparcial genuinamente interessada em expor fatos de interesse público doa a quem doer em oposição àquela que defende interesses particulares omitindo ou manipulando informações. Nesse contexto, aliás,  há uma sequência já no terceiro ato do filme que deveria fazer muito paneleiro aqui no Brasil ficar envergonhado ou no mínimo pensando como sou trouxa por ter acreditado em tudo que os JNs da vida me disseram por meses a fio sobre o que estava acontecendo no país.

    E se isso, por si só, não te convencer da relevância que um filme como Snowden deveria ter, o momento político atual dos Estados Unidos, aliado a uma fala de seu personagem título já na parte final da produção sobre os riscos de estarmos nos aproximando do ponto em que poderemos perder totalmente nossa liberdade e direito à privacidade em nome da pretensa segurança devem fazer o serviço.

    Texto de autoria de David Garcia, do site Ligado em Série.

  • Crítica | A Série Divergente: Convergente

    Crítica | A Série Divergente: Convergente

    Convergente

    Seguindo o comportamento adotado por 9 entre 10 franquias que conquistaram algum sucesso nas telonas, A Saga Divergente – Convergente também optou por dividir o seu final em duas partes. O curioso é que, ao contrário dos pioneiros dessa prática, o longa-metragem dirigido por Robert Schwentke consegue estabelecer um arco dramático com início, meio e fim dentro da primeira metade deste último episódio da saga, dando até mesmo a sensação de que aquele poderia ser um ponto final digno para a história. O feito alcançado pelo diretor justifica um final em duas partes com honestidade, sem primar apenas pelo retorno financeiro decorrente das bilheterias.

    A trama leva o espectador de volta a Chicago, onde forças internas e externas influenciam os protagonistas a extrapolar os muros da cidade e tentar entender do que exatamente se trata esse mundo pós-apocalíptico em que vivem. Tris, interpretada por Shailene Woodley, reúne seu ‘grupo’ e, contra a vontade da liderança local, decide explorar o mundo além do muro. O que a coloca como inimiga de sua própria cidade e, ao mesmo tempo, uma intrusa no mundo exterior.

    É interessante chamar atenção aqui para os recursos visuais muito bem utilizados pela equipe de efeitos para ambientar esse universo. A realidade ‘fim do mundo’ da saga mistura ruínas e tecnologia de uma maneira muito crível, sobretudo levando em consideração o baixo orçamento do filme. Trata-se de um misto de CGI e efeitos mais práticos que compõe com eficácia o mapa da região. Uma Chicago em ruínas circundada por um deserto vermelho e inóspito.

    O primeiro ato do filme é quase que inteiramente dedicado a relembrar o contexto herdado do episódio anterior. E aí está um problema: perde-se muito tempo nessa ambientação, que poderia ser sanada de maneira assertiva em menos de dez minutos. Mais uma vez, a escolha aqui foi partir do pessoal para o coletivo, do psicológico para o tátil. Assim, a trama inicia com Tris tentando lidar com seus dilemas e buscando algum parâmetro para a nova ética e senso de justiça empregados pelo ‘governo’ vigente. Demora bastante até entendermos quando a história se inicia de fato e isso compromete o envolvimento do espectador.

    Ainda que em decorrência da pouca presença de suas personagens no texto original, é triste ver atrizes maravilhosas como Octavia Spencer e Naomi Watts subaproveitadas. Mas as atuações do filme variam de medianas a boas, sobretudo por conta da protagonista e de Miles Teller (Whiplash – Em Busca da Perfeição). Já Theo James, que interpreta o rebelde Four, não conseguiu convencer como ator nos filmes anteriores e repete o mesmo feito nesta sequência. Os coadjuvantes entregam desempenhos honestos e conseguem sustentar o drama num bom nível.

    A ação em Convergente soa bastante rasa, quase pueril. Não são poucas as cenas, por exemplo, em que os personagens desenvolvem romances em meio a pontos clímax da história, aumentando o aspecto surreal – e isso não é um elogio – daquilo que está acontecendo na tela. Algumas tomadas parecem ser pensadas para agradar aos fãs, repetindo quase que ipsis litteris os conteúdos do livro que dá origem a trama (o famoso fan service). Justo, em se tratando de uma saga literária tão famosa, mas causa certo incômodo a partir do momento que atrapalha o andamento compassado da obra.

    A Saga Divergente – Convergente – tem inúmeros acertos em relação aos seus ‘concorrentes’, sobretudo Jogos Vorazes, que não conseguiu manter a mesma mescla de entretenimento e cunho político em seus quatro episódios. Embora a história aqui seja relativamente mais simples que a da série de filmes baseada nos livros de Suzanne Collins, os roteiristas conseguiram moldar com bastante habilidade as tramas e subtramas, criando um longa-metragem competente, ainda que lhe sobre didatismo e falte contundência.

    Texto de autoria Marlon Eduardo Faria.

  • Crítica | Insurgente

    Crítica | Insurgente

    Divergente - Insurgente- poster

    Segunda parte da trilogia escrita por Veronica Roth, a sequência de Divergente, lançado há apenas um ano, chega aos cinemas revelando a urgência de produções-pipoca com bilheteria garantida, mesmo que uma trama sem fôlego seja um ponto crítico.

    Como resumo dos fatos anteriores, um vídeo institucional em que a líder, Jeanine Matthews (Katie Winslet), apresenta ao povo, pontua os preceitos básicos desta série distópica na qual a sociedade é divida em facções de acordo com os dominantes psicológicos de cada um: altruísmo (abnegação), amizade (generosidade), audácia (coragem), franqueza (sinceridade) e inteligência (erudição). Entre eles, há quem não se encaixe em nenhuma destas categorias: são os Divergentes, considerados párias por não se adequarem às divisões da sociedade, e por isso são retirados do sistema.

    A trajetória de Tris segue em Insurgente com maior pressão psicológica pelos fatos sucedidos anteriormente. A personagem compreende que representa uma exceção dentro de seu universo, mas não sabe como agir de fato para modificá-lo. Difícil não equipar esta heroína com a personagem central de Jogos Vorazes, Katniss Everdeen. Afinal, narrativas contemporâneas focadas em futuros distópicos com jovens como grandes salvadores têm sido uma tendência literária e, por consequência, cinematográfica. Katniss e Tris possuem personalidades distintas, mas a composição de Tris é feita de maneira menos intensa do que a da outra franquia, resultando em uma empatia proporcional ao carisma e urgência que a atriz Shailene Woodley trabalha em seu papel.

    Tris não soa como uma ameaça urgente ao sistema de governo como Katniss, bem como seu povo parece satisfeito com o sistema de facções. Sendo assim, uma eventual mudança parece seguir mais a vontade interior da garota e do grupo de Divergentes do que um aclame geral da população. Reconhecendo que a personagem central tem pouco carisma, Roth e, consequentemente, os roteiristas Brian Duffield, Akiva Goldsman e Mark Bomback desenvolvem uma intriga sobre um artefato antigo que traria uma mensagem dos fundadores. Porém, para abri-lo é necessário a presença de um divergente. É natural que a única pessoa capaz de abrir o dispositivo seja Tris. O elemento de predestinação é mais um argumento que prova a falta de força desta história que precisa de um incentivo extra para criar conflitos entre os supostos bandidos e mocinhos.

    Mesmo este conflito com uma possível mensagem reveladora é estranho, pois a princípio a garota deseja destruir o artefato e depois desvendá-lo, mesmo que para isso quase perca a vida. Além do argumento frágil, as cenas de ação são bem simples, sem nenhum bom aproveitamento do recurso da terceira dimensão, além dos óbvios e já intoleráveis ângulos de cena que explicitam a imersão com objetos indo de encontro a tela. Mesmo com uma boa verba para produção, nenhuma cena de ação se destaca, e a bonita e potencialmente interessante cena do pôster nem mesmo está presente, sendo uma provável boa cena cortada da produção.

    De qualquer maneira, a última parte está em fase de adaptação para os cinemas e, seguindo a tendência atual, será dividida em duas partes, exibidas uma a cada ano. Difícil saber se haverá tanta história necessária para a produção de mais dois filmes, visto que nesta segunda parte há um vazio que enfraquece ainda mais a trajetória da personagem principal e seu grupo divergente.

  • Crítica | Pássaro Branco na Nevasca

    Crítica | Pássaro Branco na Nevasca

    Passaro Branco na Nevasca - Poster

    O laço umbilical compartilhado entre uma mãe e seu filho possui efeito duradouro. A mãe se torna uma representação máxima de carinho e proteção, permanecendo nesta posição mesmo em fases da vida em que a criança não precisa de um grau ativo de resguardo.

    Pássaro Branco na Nevasca adapta o romance de Laura Kasischke, narrado pela adolescente Kat Connors (Shailene Woodley). O desaparecimento de sua mãe é utilizado como mola dramática. Uma circunstância que modifica a vida da personagem central. A história dá continuidade à vida após o desaparecimento da mãe e ilumina o passado.

    Como assistimos à trama pelos olhos e pela narrativa da garota, é perceptível uma carga emocional equilibrada entre ódio e remorso. Kat acredita que a mãe abandonou a família. De fato, há indícios que apontam para esta afirmação, ainda que a genitora tenha saído sem malas e deixado o carro na garagem. Ao falar a respeito da matriarca, notamos um desprezo sobre a relação da mulher com o pai, uma pessoa que sempre submeteu-se a ela. Eve Connors (Eva Green) é apresentada como uma mãe incrível somente quando se dedica ao cuidado da casa. É vista como uma mulher egoísta, que desejava ter uma filha como se quisesse um animal de estimação. As cenas que recordam a infância da garota corroboram esta afirmação.

    Após o registro de desaparecimento da polícia, a menina segue o cotidiano normal e se despede da cidade natal indo para uma faculdade. A cada verão, retorna para sua casa e, após anos do desaparecimento, recebe informações a respeito do suposto paradeiro de sua parente.

    Mesmo um tanto frívola, a representação da adolescente é coerente. Trata-se de uma garota que ainda busca sua identidade e um senso de justiça que somente a maturidade permite. Diante das modificações que um jovem sofre nesse período, é natural que, além do sentimento negativo pela perda da mãe, a garota sinta que foi agredida. Por este motivo, sente-se tão raivosa com o desaparecimento repentino. Os anos que separam o desaparecimento e a necessidade de saber o que aconteceu de fato são pequenos passos maduros que anulam parte da raiva para transparecer a saudade pela mãe. A verdade vem à tona, desejada ou não.

    (O parágrafo a seguir contém o desfecho da história. Não siga adiante se não quiser saber).

    Durante a trama, acompanhamos a visão da garota diante dos acontecimentos. A princípio, resignada por não saber ao certo o que sentir com o desaparecimento da mãe, em seguida mais emotiva com a passagem dos anos. Sendo assim, ainda que este elemento tenha sido alvo de certas críticas, parece natural a recepção de Kat ao descobrir que o pai foi, de fato, o assassino da mãe. O enfoque da história não é o caso do assassinato como um processo investigativo, mas sim como este desaparecimento, sendo por morte ou fuga, refletiu no interior da menina. Por isso, não há alteração da estrutura narrativa na solução do paradeiro materno.

    O drama termina mostrando como se sucedeu a morte da esposa. O pai era homossexual, ou ao menos estava tendo um caso homoafetivo, e poderia ser esta a explicação para a relação familiar ruim: a ausência de desejo que, por este motivo, gerava repúdio. Neste momento, ao descobrir o marido na cama com outro homem, Eve Connors ri como se soubesse que mais cedo ou mais tarde esta cena viria a acontecer. Envergonhado pelo desprezo e a falta de respeito da esposa, o companheiro a enforca em um impulso passional diante do riso frenético da mulher.

    A cena final, que revela os acontecimentos reais, tem intenção de chocar o público. Parece uma saída fácil para intensificar a obra, porém, mesmo sendo um apelo óbvio, produz a reflexão suficiente da delicadeza familiar, neste caso vista pelo olhos de uma filha que perdeu a mãe graças à violência paterna. Uma dissolução familiar completa.

  • Crítica | A Culpa é das Estrelas

    Crítica | A Culpa é das Estrelas

    Fault-in-our-stars

    Após o lançamento de A Culpa é das Estrelas, do carismático autor John Green, a adaptação para o cinema seria apenas uma questão de tempo. Com um sucesso estrondoso, o best-seller, lançado em 2012, desbancou As Crônicas de Gelo e Fogo como a obra literária mais vendida em várias partes do mundo, inclusive aqui no Brasil. O sucesso iminente do filme começou a se manifestar logo no lançamento do primeiro trailer, uma vez que foi o trailer mais curtido do Youtube, ultrapassando o detentor do recorde anterior, Homem de Ferro 3.

    Partindo do princípio de que esta crítica está livre de comparações ao livro, existe algo de errado em A Culpa é das Estrelas e esse erro é justamente a sinopse. O filme, competentemente dirigido por Josh Boone, não trata somente do amor entre dois jovens com câncer que se conheceram num grupo de autoajuda e de como eles lidam com o sofrimento da perda. O filme, além de mostrar o que foi dito, também demonstra uma maneira divertida (e muitas vezes incômoda pelas piadas de humor negro) de se encararem os percalços da vida com câncer e como o amor pode ajudar uma pessoa doente em sua recuperação, algo que interfere não só na vida dos protagonistas como também na das pessoas que os cercam. Tudo isso dentro de uma jornada inesperada, com um desfecho interessante, o que difere dos muitos filmes do gênero, causando surpresa não pelo óbvio (que também existe e muito), mas sim porque além do câncer e da dor da perda a vida ainda prepara inúmeros dissabores.

    Hazel Grace Lancaster (Shailene Woodley) é uma jovem diagnosticada com câncer na tireoide com metástase nos pulmões, obrigando-a a respirar com um tubo de oxigênio (e também carregando-o) pelo resto de sua vida. A vida de Hazel é bastante tediosa: ela passa o dia lendo livros e assistindo a programas banais na televisão. Acreditando estar com depressão, a menina aceita os conselhos de sua mãe, Frannie (a sumida Laura Dern) e passa a frequentar um grupo de apoio da igreja juntamente com jovens na mesma situação que a dela.

    Não demora muito pra Hazel trombar literalmente num corredor com Augustus Waters (Ansel Elgort), jovem, bonito, com cara de canastrão. E a partir desse contato físico, clichê o bastante, Hazel se interessa pelo rapaz, o que faz com que ela corra ao banheiro para arrumar o cabelo, limpar alguma remela perdida no decorrer dos dias de inanição.

    Durante a reunião, Hazel descobre que “Gus” já “passou” pelo câncer, o que lhe custou uma perna e que ele estava ali acompanhando seu melhor amigo, Isaac (Nat Wolff), vítima de câncer nos olhos e que se tornaria 100% cego dentro de semanas. É também nesta reunião que Hazel e Gus têm sua primeira discussão, o que faz com que o rapaz vá atrás dela na saída, convidando-a para ir à sua casa, sendo este um dos aspectos negativos do filme, porque tudo acontece muito rápido.

    Porém, por sorte, o filme é mais do que isso.

    Como dito, Hazel adora livros e empresta seu preferido a Gus. Acontece que o livro não tem fim e “acaba” no meio de uma frase. Ademais, o autor do livro, Van Houten (brilhantemente vivido por Willem Dafoe), nunca respondeu aos e-mails de Hazel, que é louca para conhecê-lo e por querer saber qual o destino dos personagens do livro. Assim, Hazel e Gus embarcam numa viagem à Amsterdã, onde reside o mais que recluso autor, com a ajuda de uma ONG (muito parecida com a Make a Wish) e da carismática Lidewij (Lotte Verbeek), secretária de Van Houten.

    O filme funciona e você acaba não ligando para os inúmeros clichês e momentos fofos entre o casal, que somente dá seu primeiro beijo na metade da fita. Aliás, o filme é longo, tem duas horas e seis minutos de duração, mas a fluidez é tanta que nem se percebe o tempo passar.

    Ansel Elgort faz um Augustus Waters bobo, do tipo engraçadinho, mas que também te faz rir. Ele é inteligente e convicto nas suas ideias, te fazendo acreditar que realmente tudo o que ele fala tem fundamento. O destaque fica por conta de seu cigarro sempre apagado em sua boca, o que é seu porto seguro. Gus acredita que mantendo o cigarro apagado ele estaria enganando a morte. Porém, o excesso de piadas de mau gosto do personagem, inclusive para com seu amigo Isaac, chega a cansar.

    Shailene Woodley despertou a curiosidade de Hollywood por ter sido alvo de uma polêmica causada pelos fãs do Homem-Aranha, que praticamente obrigaram o diretor de O Espetacular Homem-Aranha: A Ameaça de Electro, Mark Webb, a cortar as participações da atriz como Mary Jane, simplesmente porque Woodley parecia não convencer pelas fotos das filmagens que vazaram. O episódio irritou a atriz, que pediu demissão, rescindindo um contrato de três filmes. Porém, em A Culpa é das Estrelas, Woodley, que já tinha estrelado outra adaptação de sucesso, Divergente, comprova que é uma atriz competente e versátil.

    Embora o filme flua, o roteiro não é bem amarrado, o que deixa algumas pontas soltas que poderiam ter sido resolvidas. Por exemplo, percebe-se claramente que o pai de Hazel, Michael (Sam Trammel), não está confortável com o relacionamento de sua filha com Gus, porém, não se sabe o momento em que Michael passa a aceitar Gus em sua família. Ele simplesmente aceita, do nada. Outro exemplo, esse um pouco mais sério, porque interfere diretamente numa das cenas mais lindas do longa, foi a motivação de Lidewij em querer mostrar ao casal a casa onde Anne Frank se refugiou antes de ser descoberta pelos nazistas. Mas, como dito, a cena é um dos pontos altos do filme, onde a trilha sonora abre espaço somente para os diálogos dos personagens e da narração do diário de Frank publicado em 1947.

    Finalmente, o saldo é bem positivo e a direção de Boone é moderna, lembrando um pouco o ritmo de 500 Dias Com Ela, com muitas doses de humor, sendo influenciado, também, por Scott Pilgrim Contra o Mundo, já que quando Hazel e Gus trocam mensagens pelo celular, as mensagens aparecem escritas na tela dentro de balões desenhados à mão. E a fotografia é bastante sutil e subliminar. Há cenas bem coloridas, e outras sem muita cor, o que demonstra o humor ou a carga emocional do filme naquele determinado momento, principalmente em Amsterdã, onde o clima é o tempo todo nublado.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Crítica | Divergente

    Crítica | Divergente

    divergente

    Que o cinema é uma arte, institucionalizada como tal, todos sabemos. Mas nenhuma falácia nos ocorre em considerá-lo uma indústria, principalmente depois da vinda de Tubarão às grandes telas, com o desenvolvimento do conceito de blockbuster e a ganância crescente de produtores e produtoras hollywoodianas que se agarram a ideias com maior possibilidade de lucro imediato e duradouro, ou seja, que gerem remessas agora e possam continuar gerando, sejam em sequências e mais sequências, remakes ou reboots. O que esse Fordismo cinematográfico tem nos trazido é uma homogeneização do que é visto em tela. E isso já aconteceu com o gênero do horror e seus grupos de jovens sendo atacados por assassinos ou forças sobrenaturais; na comédia, com a padronização das paródias e, depois, por meio dos filmes discípulos de Se Beber, Não Case!; entre tantos outros gêneros.

    Mas agora o que temos é uma pujança de abarcar todos esses “estilos” de forma pasteurizada, e de modo a atingir o público que mais vai aos cinemas na atualidade: o infanto-juvenil. O filão das adaptações de sucessos literários, dentre esses novos consumidores da sétima arte, surgiu como uma Estrela de Belém para Hollywood. Harry Potter foi o grande carro-chefe em anos, mas o público “teen”, leitores cada vez mais assíduos de obras voltadas à sua faixa etária e que exalavam seus conflitos e olhares sobre um amanhã deturpado, implorou por mais. E foi assim que Stephenie Meyer surgiu no mundo literário, preenchendo as livrarias com quatro obras (e depois mais e mais…) que seriam levadas às telas em cinco filmes, todos sucessos de público, mas nem um pouco de crítica.

    Mais competente e complexa em sua literatura, Suzanne Collins apresenta a distopia de Jogos Vorazes ao mundo e, após o sino de “sucesso estrondoso” ecoar em todos os continentes, a obra foi também levada aos cinemas, sendo recebida com certo louvor, tanto por parte de público quanto por parte de crítica. Daí para frente, a Unilever imaginária dos estúdios adquiriu o direito de todas as obras voltadas para adolescentes e pré-jovens, e passou a saltear, trimestralmente, novas tentativas de fidelização deste público com mais marcas que, no fim, representam o mesmo elemento das anteriores, e por vezes são até de mesma origem. Dove, Seda, Palmolive? A Hospedeira, Instrumentos Mortais: Cidade dos OssosDezesseis Luas e afins? É possível até ver os diretores de todas elas fazendo download da fórmula Meyer-Collins e dando seus sutis “toques de originalidade” em busca de alcançar a mesma popularidade dos produtos padrão. Bem… Mas como nos exemplos citados, nem sempre isso é possível.

    Veronica Roth é a autora de mais uma história embasada em distopias, dando origem a Divergente. Na narrativa, uma guerra devastou o mundo que conhecemos. Em tela vemos Chicago com visual pós-apocalíptico e a tradicional fotografia acinzentada e suja que realça a degradação de várias paisagens, como prédios e antigos estabelecimentos comerciais. Alwin H. Küchler traz também as cores terrosas de seu trabalho em Hanna, contrastando com um branco intenso que emana em momentos específicos do início do filme, para a ambientação da cidade de Divergente. É nela onde vemos a sociedade dividida em cinco facções, nomeadas de acordo com virtudes e representando funções sociais diferentes: Abnegação, Amizade, Audácia, Erudição e Franqueza. Aos 16 anos, os adolescentes nascidos em cada uma dessas macro associações devem escolher continuar em suas comunidades ou migrarem para outras facções. Tris (Shailene Woodley, indicada ao Globo de Ouro por Os Descendentes), de uma das famílias mais tradicionais de Abnegação, descobre em um teste que possui as características de todas as facções, sendo assim apontada como uma Divergente, espécie rara e perseguida pelas demais. Mesmo assim, decide alistar-se a Audácia, facção responsável pela defesa da cidade. É no doloroso processo de deixar seu corpo fraco (abnegado) e desenvolver sua práxis ativa (audaciosa) para fazer parte de sua nova facção, e esconder as perigosas virtudes de ser uma divergente, que o filme se desenrola, até o último fator se tornar impossível.

    O roteiro não traz surpresas para quem já está calejado neste tipo de adaptação, ou ao menos assistiu a Jogos Vorazes. O desenvolvimento da protagonista obedece a uma gradação claramente perceptível e deveras previsível. Mas é o fato de Shailene Woodley (aliás, uma ótima e promissora atriz) ir tão bem no papel de uma adolescente que sempre quis se libertar das amarras de sua sociedade apática e viver na correria dos “malucos” da Audácia, que faz com que o filme segure a atenção de seu público até o final. A jovem parece entender que seu papel não representa apenas uma, mas milhões de adolescentes de 16 anos inconformadas com sua realidade e sedentas por aventura, ação e… um romance aparentemente impossível.

    Nossa… o romance. Saindo das flores e começando a nos ferir com os espinhos da obra, a construção do roteiro para nos conduzir à fatídica relação entre o “malhadão” Quatro (Theo James), um dos líderes da Audácia, e Tris acontece de forma boba e pueril, partindo de diálogos sofríveis do tipo “Cuidado comigo mocinha…”, sob olhares opostos ao que a ideia transmite, à completa desconstrução em minutos de um personagem anteriormente estereotipado com características sólidas de sisudez e apelo à violência. Sabe aquele ditado “para bom entendedor, meia palavra basta”? Pois bem, essa previsibilidade dos rumos do roteiro, disfarçada por diálogos forçados, ainda é completada pela insólita sensibilidade de Neil Burger (O Ilusionista e Sem limites), diretor que acerta pouco em toda obra e que recorre aos recursos fáceis de montagem para mostrar a “evolução” de sua protagonista e ainda usa-os, aliados a repetidos closes, em momentos específicos, para que os fã boys and girls não tenham medo dos rumos da história. Pois tudo simplesmente se realiza como aparenta ser, seguindo novamente a obediência à fórmula consagrada que nos faz experimentar o gosto amargo do plot já previsto, da pseudo-coragem disfarçada do roteiro em se desfazer abruptamente de alguns personagens (oi, Jogos Vorazes?) e em testemunhar superações e mais superações da protagonista e tudo mais que “um filme desses” tem a oferecer.

    Mas talvez uma das coisas que mais irritam em Divergente é sua longuíssima duração. Nada justifica os 140 MINUTOS DE PROJEÇÃO, nem mesmo o doce de coco da Shailene Woodley faz com que alcancemos rapidamente os esperados créditos finais da obra. São exatas duas horas e vinte minutos de uma produção que se estende muito em momentos que não adicionam nada à narrativa, como nas várias comemorações e alegrias da protagonista por suas evoluções ou vitórias. Me remeteu ao insuflado Bling Ring: A Gangue de Hollywood de Sofia Coppola. Cenas como a da personagem sobrevoando por dentre os prédios da cidade de Chicago, sentindo-se finalmente livre de seus antigos grilhões, funcionam muito mais por suas metáforas “sonrisal” altamente didáticas (a felicidade, a superação, o soerguimento) unicamente do que pelo que mostram em seus cansativos minutos de computação gráfica e fotografia de noite azulada.

    Voltando às lentes de Küchler, porém, vemos que na medida em que os 140 minutos de Divergente transcorrem, o que emanava da cor branca (da inocência e abnegação) vai se tornando prata, ganhando densidade, corpo, assim como a crescente (e, aliás, belíssima) trilha sonora de Junkie XL, supervisionada por Hans Zimmer, que, ainda que usada em excesso várias vezes, em outras consegue trazer, de forma simples e suave, sentimentos como melancolia, decepção e medo, complementando a construção imagética Shailene/direção de arte.

    A composição do abrigo de Audácia é interessante. Vezes parecendo um extenso ringue de UFC, vezes um colégio interno “barra pesada”, contando com os tradicionais grupinhos estereotipados (os brigões, o piadista do bullying, o nerd, a tímida e etc), o lugar incorpora bem o momento de ruptura ao qual os adolescentes estão sendo expostos. Em relação às cenas de ação, com ressalvas às lutas que acontecem durante o treinamento (e que novamente remetem a Jogos Vorazes até em seu grau de ousadia contida), Neil aposta mais em cenas sem violência, ou que se deem de forma “limpa”, sem culpas (em simulações de embate ou em sonhos, por exemplo), do que nas que envolvem o conflito em si, o qual tem por base um plano encabeçado por Jeanine (Kate Winslet, é… ela tá no filme), a líder da Erudição que, tal a insipidez na narrativa, mais parece uma mistura do Presidente Snow com a Jessica Delacourt de Elysium. A sub-trama (que depois de revelada se torna trama principal do filme e surge como mote para mais minutos de projeção), apesar de surgir de forma megalomaníaca, fazendo vários movimentos de personagens, trazendo alguns de volta, executando outros, aprofundando o romance, apelando para dramas familiares, prometendo mudar a estrutura de tudo o que vimos até então, faz realmente apenas isso: promete. Algum motor liga, mas o avião de Divergente não decola e voltamos a dormir pois o filme parece não acabar. E o pior? Segundo o E = MC² das adaptações de obras infanto-juvenis, era basicamente isso que esperávamos desde o início.

    Shailene. O mergulho na psiquê de sua personagem, Tris, é o que há de melhor em Divergente. Seu Corra, Lola, Corra onírico é algo que, quando surge, traz esperança. Melhor explorado, mais paciente e frequente, certamente essa particularidade conduziria a obra a um patamar, se não superior, mas singular em relação às outras adaptações. A distopia high school, infantil e genérica da obra, no entanto, faz com que A Hospedeira venha à cabeça. Mesmo que os dois produtos tenham enredos completamente distintos, surgem, porém, da mesma fonte: a Unilever cinematográfica.

    Texto de autoria de Rodrigo Rigaud, do Zona Crítica.