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  • Crítica | O Protetor 2

    Crítica | O Protetor 2

    Imagine um bolo, preparado através de uma receita recheada de lugares comuns, com muito doce e com condimentos que normalmente fazem com que o apreciador ache o simples testar dele como algo saborosíssimo. Daí imagine que anos depois, o confeiteiro lança uma outra versão desse mesmo bolo, com os mesmos ingredientes e o mesmo esmero, e entrega esse para o mesmo apreciador do primeiro, sendo que este aprendeu a utilizar de outros sabores e tornou seu paladar com outros gostos. O Protetor 2 sofre um pouco desse mal, pois tanto Antoine Fuqua (seu diretor) quanto seu protagonista (Denzel Washington) utilizam dos mesmos elementos que fizeram O Protetor ser um filme tão elogiado, sendo este segundo recebido com mornidão por boa parte dos especialistas.

    A história começa com Robert McCall (Denzel) utilizando outro nome, em um trem na Turquia onde ataca malfeitores genéricos que raptaram uma menina. Utilizando um disfarce fajuto ao extremo, ele consegue trazer a criança à sua mãe, uma mulher comum, que trabalha numa livraria do qual ele é cliente. Depois dos acontecimentos do filme anterior ele passou a trabalhar como motorista particular de aplicativos populares, e passou a ajudar pessoas comuns com suas habilidades.

    Esse auxílio prestado demonstra alguma inteligência por parte do roteiro de Richard Wenk, aliás esse é um dos poucos pontos novos na franquia, e contém mais criatividade nesse pequeno argumento do que em todo o restante dos dois filmes que chegaram ao circuito. Como membro de uma comunidade, que tem como epicentro o prédio onde mora, ele se aproxima de um jovem artista promissor, chamado Miles (Ashton Sanders), e nesse ponto ele enxerga no rapaz uma jornada que pode resultar em algo trágico. Apesar do montante de clichês que essa situação acarreta, o  fato desse núcleo ter um pé na realidade faz com que ele soe precioso ante a trama, ainda mais por conta de todo o restante da dramaticidade.

    Como era de se esperar, McCall volta a ativa, a fim de vingar antigos amigos que sofrem emboscadas, basicamente porque ele se sente culpado por ter largado seus companheiros e forjado sua própria morte. A partir daí, atores bons são mostrados com um certo desperdício, fora Washington, mais nenhum personagem parece ter alguma tridimensionalidade, isso inclui Pedro Pascal (de Narcos), Melissa Leo e Bill Pullman.

    Para piorar, o final contém uma perseguição tática entre especialistas, onde mais uma vez se apela para alguns bordões de filmes de super agentes, com ameaças a entes queridos e pessoas próximas, mas isso não chega a incomodar tanto quanto o cenário escolhido para o embate final, sendo esse uma emulação de vídeo games mais populares onde o stealth é necessário para um boa jogabilidade, como Splinter Cell e Metal Gear Solid, mas sem o impacto ou atmosfera necessária para que a referência fosse apreciada como deveria. A utilização da poeira e neblina faz com que o filme pareça amador, mesmo com um orçamento tão graúdo.

    Ao final da apreciação de O Protetor 2, sente-se o gosto de mais do mesmo, ainda que não se justifique em momento algum a gritaria em volta do primeiro, ou mesmo as comparações com o primeiro John Wick ou outros produtos de David Leitch e Chad Stahelski. A continuação não é inferior ao primeiro filme, talvez tenha até mais diferenciais em comparação com o primeiro, o recente Sete Homens e Um Destino e demais filmes de ação comandados por Fuqua.

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  • Crítica | Snowden: Herói ou Traidor

    Crítica | Snowden: Herói ou Traidor

    snowden2016 foi um ano particularmente trágico no mundo e uma das surpresas mais negativas surgiu com a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Por tudo que defende, o futuro comandante da nação mais poderosa do planeta representa não só a possibilidade de uma escalada ainda maior do processo de desequilíbrio econômico-social no mundo, mas sobretudo da expansão do cerceamento das liberdades individuais. E é justamente nesse contexto que Snowden: Herói ou Traidor, novo filme de Oliver Stone sobre o ex-funcionário da CIA e da NSA, se torna absolutamente relevante e terrivelmente assustador.

    Escrito pelo próprio Stone em parceira com Kieran Fitzgerald a partir dos livros Os Arquivos Snowden e Time of the Octopus (ainda sem tradução no Brasil), Snowden é um filme que resgata tudo aquilo que se espera de seu diretor. Com forte viés político, como não poderia deixar de ser, a produção constrói um thriller digno de John Le Carré para mostrar os eventos que culminaram na divulgação de documentos secretos da NSA em junho de 2013 ao mesmo tempo em que nos apresenta quem de fato é Edward Snowden, o homem responsável pelo vazamento de informações que mancharam irremediavelmente a administração de Barack Obama.

    Interpretado por um Joseph Gordon-Levitt num trabalho que impressiona pelas sutilezas com que emula o personagem título quase à perfeição (quem viu o documentário ganhador do Oscar 2015, Citizenfour, vai notar como o ator ficou realmente parecido com Snowden tanto na postura física quanto no tom de voz), o ex-CIA e NSA se revela uma figura fascinante à medida em que vemos a trajetória da transformação do homem que acreditava plenamente que a “América” é o melhor lugar do mundo e confiava em seus governantes – achando absurdo, por exemplo, quem criticava o presidente – àquele que resolveu expor o maior segredo destes para o mundo.

    O filme estrutura e divide sua narrativa basicamente entre duas coisas: os bastidores da longa entrevista que Snowden deu à documentarista Laura Poitras (Melissa Leo) e aos jornalistas Glenn Greenwald (Zachary Quinto) e Ewen MacAskill (Tom Wilkinson) em Hong Kong em junho de 2013 e os flashbacks que trazem recortes da carreira de Snowden evidenciando alguns de seus feitos em posições de destaque tanto na CIA quanto na NSA (que inclusive provam que ele não era um reles analista terceirizado como o governo americano tentou pintá-lo depois) além de sua própria vida pessoal quando mostra como seu relacionamento com a progressista Lindsay Mills (Shailene Woodley) influenciou a mudança de perspectiva que ele experimentou.

    A propósito, ainda que tenha o thriller político no seu DNA, Snowden, por vezes, ganha ares de filme de terror quando evidencia quão ameaçadoras são as ferramentas que a NSA dispunha (e provavelmente continua dispondo) para monitorar cidadãos mundo afora que sequer sabem que estão sendo vigiados das formas mais vis. É o choque de realidade que o filme provoca, aliás, que o transforma numa obra tão importante, já que expõe com todas as letras que o terrorismo foi a mera desculpa que o governo americano usou para obter vantagens em negociações econômicas com outros países através do monitoramento secreto de outros governos e empresas estrangeiras.

    Expositivo na medida certa, Snowden traz também o importante alerta sobre como é fundamental ter uma mídia imparcial genuinamente interessada em expor fatos de interesse público doa a quem doer em oposição àquela que defende interesses particulares omitindo ou manipulando informações. Nesse contexto, aliás,  há uma sequência já no terceiro ato do filme que deveria fazer muito paneleiro aqui no Brasil ficar envergonhado ou no mínimo pensando como sou trouxa por ter acreditado em tudo que os JNs da vida me disseram por meses a fio sobre o que estava acontecendo no país.

    E se isso, por si só, não te convencer da relevância que um filme como Snowden deveria ter, o momento político atual dos Estados Unidos, aliado a uma fala de seu personagem título já na parte final da produção sobre os riscos de estarmos nos aproximando do ponto em que poderemos perder totalmente nossa liberdade e direito à privacidade em nome da pretensa segurança devem fazer o serviço.

    Texto de autoria de David Garcia, do site Ligado em Série.

  • Crítica | O Protetor

    Crítica | O Protetor

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    Em 2001, o diretor Antoine FuquaDenzel Washington fizeram uma parceria que incendiou as telas de cinema. Juntamente com Ethan Hawke e o roteirista David Ayer, a dupla lançou o incensado Dia de Treinamento, excelente filme policial que rendeu o Oscar de Melhor Ator para Denzel por seu controverso personagem Alonzo Harris. Agora, em 2014, Fuqua e Washington retomam a parceira, mas com um resultado aquém do esperado

    Neste O Protetor, Denzel encarna Robert McCall, um cidadão aparentemente comum, com uma estranha mania de cronometrar seus atos mais mundanos. Conhecido por sua camaradagem com seus colegas de trabalho, McCall sofre de insônia e sempre passa suas noites em uma lanchonete próxima à sua casa. Lá, acaba criando amizade com uma prostituta adolescente vivida por Chloë Grace Moretz (em aparição fugaz). Quando a garota é surrada por seus cafetões, Robert resolve tomar a justiça com suas próprias mãos. Entretanto, seus atos acabam levando-o a uma guerra com o crime organizado, guerra essa que vai exigir que McCall desperte algumas habilidades especiais há muito adormecidas.

    O roteiro escrito por Richard Wenk não se aprofunda muito nos personagens. McCall, o personagem de Denzel, é retratado como um homem pacato e metódico. Logo adiante, fica claro que ele possui um transtorno obsessivo-compulsivo. Isso é interessante, mas fica uma sensação de vazio, pois não se apresenta um motivo claro para aquele comportamento e nem como ou quando aquilo se iniciou na vida do personagem. A maneira como esse distúrbio é apresentado nas cenas de ação toma uma clara inspiração em filmes de super-herói, pois o transtorno é filmado quase como um superpoder. Uma saída interessante do diretor Fuqua, mas pouco explorada. Seu passado também é pouco trabalhado, sendo apenas mencionado superficialmente quase ao final do filme. Os personagens secundários são pouco desenvolvidos, provocando uma centralização excessiva do filme na figura do seu protagonista e na prostituta vivida por Chloë Moretz, que, ainda que peça central para o ponto de ignição da trama, pouco aparece. A personagem faz um pouco de falta, mas pelo menos foge-se da figura da donzela em perigo.

    O ritmo do filme é um pouco arrastado em certos momentos, mas pelo menos o diretor Antoine Fuqua está mais contido e não tenta emular o chinês John Woo, seu colaborador em Assassinos Substitutos. Fuqua filma algumas sequências sensacionais, principalmente o primeiro embate de Denzel com os exploradores sexuais. Também se esmera ao filmar algumas sequências mais violentas, tornando-as quase poéticas. Tomem como exemplo a cena do saca-rolha e a da pistola de pregos. Porém, o ritmo um pouco arrastado e alguns exageros da trama acabam por diluir o impacto da obra. A fotografia é estilosa e se aproveita muito bem de algumas paisagens urbanas da cidade de Boston. Entretanto, uma sequência mais carregada de efeitos digitais torna-se superficial e desnecessária em meio ao desenvolvimento do filme.

    Denzel Washington, aqui, atua quase como se estivesse no piloto automático, uma vez que seu personagem não exige muito de seus talentos dramáticos. Mas, mesmo que sua interpretação esteja em modo autômato, ainda está bem acima da média dos atores da atualidade, e seu Robert McCall é um personagem carismático. Merece destaque Marton Csokas, que vive o bizarro vilão incumbido de matar McCall. O restante do elenco apenas desfila pela tela, e nem as participações de Melissa Leo e Bill Pullman acrescentam muita coisa.

    Ainda que possua muita falhas, O Protetor é uma diversão escapista que merece uma espiada. Principalmente porque fica claro que esse filme poderá representar o início de uma nova franquia cinematográfica. Vamos torcer para que o próximo seja mais caprichado que esse filme.

  • Crítica | Os Suspeitos

    Crítica | Os Suspeitos

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    Novo filme do cultuado diretor canadense Dennis Villeneuve, Os Suspeitos é um bom suspense de grande tensão: a procura de um pai por uma filha desaparecida, gerando grande conflito e envolvimento emocional em diferentes escalas dentro de um grupo de pessoas próximas.

    Situado na fria e chuvosa cidade de Boston, Keller Dover (Hugh Jackman) leva uma vida feliz ao lado da esposa Grace (Maria Bello) e os filhos Ralph (Dylan Minnette) e Anna (Erin Gerasimovich). Em visita a casa dos amigos e vizinhos Franklin (Terrence Howard) e Nancy Birch (Viola Davis), sua filha, a pequena Anna (Kyla Drew Simmons), desaparece. As famílias logo procuram a polícia e o caso cai nas mãos do detetive Loki (Jake Gyllenhaal) que prende um suspeito, Alex (Paul Dano), que logo é solto devido à ausência de provas. Alex é um adulto problemático e com sintomas de deficiência cognitiva, mas que parece ser o culpado para Dover, que irá ultrapassar os limites de tudo o que acredita para encontrar sua filha.

    Começando já na escolha do tema (desaparecimento de crianças) o diretor acerta no objetivo de mobilizar uma plateia da mesma forma que qualquer um desses casos mobiliza a opinião pública. O infalível aspecto de pureza e inocência de uma criança torna qualquer ato contra ela abominável e irá aglutinar na comoção e condenação desse ato e seus realizadores grande parcela da sociedade, da mesma forma que acontece com o público do filme, que embarca na história e se pergunta a toda hora se faria algo diferente do que lhe é mostrado.

    Emocionalmente falando, o filme então consegue compreender a dimensão devastadora de um caso como este, que não é incomum em nenhum lugar no mundo, e que mostra como toda a dimensão da tecnologia não é capaz de nos proteger dos terrores da própria humanidade. A sensação de impotência dos protagonistas é destacada a todo instante, assim como as brigas internas dos adultos, evidenciando em todo instante a frustração de não conseguir fazer nada. Também neste aspecto somos apresentados ao detetive Loki, que é deixado claro ser um policial típico de filmes de investigação: solitário, sem vida, obcecado pelo trabalho e empático com as injustiças sofridas pelas vítimas dos crimes que investiga. Loki e Dover são personagens interessantes, que por vezes se antagonizam, mas ambos buscam o mesmo objetivo, um dentro e outro a margem da lei, simbolizando o eterno conflito de “civilização x selva” que sempre vem à tona quando o assunto é a violência humana.

    Também é interessante a construção de Alex, um personagem que é a todo instante tratado como culpado, e que parece culpado realmente. Em todo o calor gerado por comoções públicas, faltou ao diretor movimentar a história mais nesse sentido, e tornar a vingança egoísta e personalista de Dover como também parte da opinião pública, e não só pessoal. No entanto, faltou ao filme um trabalho melhor no que tratou da parte policial e investigativa. Ao contrário de outros clássicos do gênero, como “O Silêncio dos inocentes”, Os Suspeitos em alguns momentos falha em manter a expectativa da resolução do crime, e as pistas oferecidas dão ao espectador a chance de desvendar pedaços da história antes de Loki, enfraquecendo seu personagem, como na cena onde é utilizado o velho clichê da mesa destruída pela frustração e ali uma pista crucial é desvendada, quando um espectador mais atento teria reconhecido aquela pista vários momentos antes.

    O mesmo se repete na cena final, quando detalhes importantes são ignorados a fim de se encerrar a história em um clímax instigante e que deixa no ar o que poderia ter acontecido, mas não a ponto de não responder exatamente isso ao “acostumado às respostas” público americano. Caso não se focasse na investigação policial em si, detalhes como estes poderiam ser relevados (Dover vai a casa da tia de Alex com mala, ferramentas e deixa várias pistas, que são ignoradas pela história quando a casa é invadida e revirada por policiais, e nenhuma resposta a essas pistas é dada), mas nesse caso, enfraquece a narrativa investigativa sob a perspectiva policial.

    Apesar de uma fotografia muito bem construída, e também atuações dignas de grandes atores (talvez a melhor de Jackman), Os Suspeitos se alonga por muito tempo em redemoinhos narrativos (como a tortura de Alex por Dover) e que desgastam o choque inicial, travando o desenvolvimento da história. Quando o filme acaba, sobra uma sensação de “ainda bem” misturada a outra de satisfação com uma história que traz à tona discussões interessantes sobre paternidade, violência e sociedade, mas que poderiam ter sido levadas por um caminho mais ousado, questionando mais o valor da mídia e das decisões pessoais nesses casos, como faz magistralmente o longa dirigido por Ben Affleck, “Medo da Verdade” (Gone Baby Gone).

    Os Suspeitos é capaz de entreter e tem uma crueza e aspereza condizentes com o tema retratado, mas que falha em desenvolver objetivamente seu ritmo e conduzir os protagonistas em um desenvolvimento que justifique o tempo de tela, assim como em produzir pistas e recompensas que causem mais do que um certo “eu já suspeitava” ao seu final, enquanto prometia algo além. É um bom filme, mas que não acrescenta muita coisa ao gênero, recheado de clássicos mais completos.

    * Detalhe para a horrível tradução do título em português. Prisioneiros traduziria perfeitamente o que o filme quer passar, quando pais são prisioneiros dos captores de seus filhos. Os Suspeitos além de genérico e vazio, entrega que já há mais de um suspeito do crime.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | Invasão à Casa Branca

    Crítica | Invasão à Casa Branca

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    Filmes com temas quase idênticos sendo lançados na mesma época. Uma tendência que Hollywood sempre repete, e o mais recente exemplo é a dobradinha que mostra a Casa Branca sendo invadida. Olympus Has Fallen, batizado por aqui como, hã, Invasão à Casa Branca, foi esperto e se antecipou a White House Down (O Ataque), que tem estreia prevista pra setembro. Neste longa dirigido por Antoine Fuqua, acompanhamos Mike Banning, agente do serviço secreto que chefia a equipe de proteção do presidente. Afastado do cargo quando falha em salvar a vida da primeira-dama, ele tem a chance de redenção meses depois: terroristas norte-coreanos (sempre eles, hoje em dia) conseguem dominar a residência oficial do líder norte-americano, tomando ele e boa parte de seu gabinete como reféns. Mike, o cara certo no lugar errado, é o único capaz de, literalmente, salvar a pátria.

    Com essa premissa, não precisa ser nenhum gênio pra perceber que teremos altas doses do velho patriotismo exacerbado, tipicamente estadunidense. Com direito inclusive a simbolismos nada discretos, por exemplo, câmera lenta e música dramática quando os vilões retiram do mastro a bandeira dos EUA e a jogam fora. Ainda mais sendo um filme de ação, Invasão à Casa Branca entrega esse e outros clichês (central de comando que serve só pra explicar a trama pro espectador, garotinho espertoetc.), perfeitamente esperados. Então não cabem reclamações comunistinhas de faculdade style quanto a isso. O que na verdade prejudica o filme é seu roteiro indeciso entre se levar a sério, como um thriller político, ou se assumir como diversão descerebrada.

    A tensão entre as Coreias do Sul e do Norte é usada como pano de fundo e estopim para a ação dos terroristas, mas nada além disso. Não são feitas críticas políticas a ninguém, muito menos ao papel dos Estados Unidos. Até aí, passável. Mas a indefinição de tom afeta também o protagonista. Inicialmente inseguro, duvidando de si mesmo, basta entrar em ação para ele imediatamente virar o herói clássico, infalível. Problema que vem se repetindo em várias produções do gênero: tenta-se humanizar o personagem, mas falta o senso de dificuldade naquilo por que ele está passando. Um direcionamento diferente, mais descompromissado, ajudaria inclusive o ator. Gerard Butler se mostra bem mais à vontade proferindo frases de efeito e posando de fodão.

    Apesar desses problemas, com boa vontade dá pra embarcar na história e curtir as boas cenas de ação (o ataque inicial, em plena luz do dia, é sensacional) e a tensão bem construída ao longo do filme. O plano dos invasores é razoavelmente aceitável, e as interações entre eles e os reféns mostram uma crueza muito bem vinda nestes tempos em que o PG-13 suaviza quase tudo. Há que se lamentar, porém, que o presidente vivido por Aaron Eckhart não tenha um grande momento, limitando-se a fazer cara de mau enquanto espera o resgate. E também que o embate entre o herói e o ameaçador vilão-chefe fique aquém do que poderia ter sido. De resto, diversos atores conhecidos (Morgan Freeman, Dylan McDermott, Angela Bassett, Melissa Leo, Radha Mitchell, Robert Foster e até Ashley Judd, direto do túnel do tempo) servindo apenas como acessórios pra movimentar a trama.

    Em essência um meio-termo entre Duro de Matar e 24 Horas, Invasão à Casa Branca poderia ter sido melhor caso escolhesse um desses lados. Mas, em tempos sem Jack Bauer e com John McClane decepcionando, Mike Banning é o que tem pra hoje.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Crítica | Corações Perdidos

    Crítica | Corações Perdidos

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    Após um longo atraso, finalmente chega ao Brasil Corações Perdidos (Welcome to the Rileys), um drama estrelado por James Gandolfini, Melissa Leo e Kristen Stewart, que interpretam três personagens que se unem em busca de uma razão para viver, e não apenas uma existência sem motivação alguma.

    Na trama, conhecemos Doug Riley (Gandolfini) e Lois (Leo), um casal que vê sua vida completamente estagnada e repleta de uma tristeza absoluta após uma tragédia que envolvendo a única filha do casal. Com isso, ambos se isolam de sua maneira, Lois passa a se fechar dentro de cada, ficando completamente isolada do mundo exterior, enquanto Doug externa seus sentimentos em casos extraconjugais, casos esses consentidos tácitamente por sua esposa.

    Não que não exista mais amor, mas é perceptível como pouco-a-pouco ele se esvai, e isso fica claro nos diálogos mecânico entre eles, como algo que deixou de ser natural e passa a ser estritamente necessário para a manutenção de um relacionamento a dois. E Neste isolamento dos dois protagonistas é necessário que o algo aconteça em suas vidas e demonstre que a vida continua, por mais difícil que isso seja. E esse fator externo é expresso na figura da personagem de Stewart, a stripper Mallory.

    Após a súbita morte de sua amante, Doug faz uma viagem de negócios para Nova Orleans onde conhece Mallory. Doug vê na figura da garota uma chance de redenção por ter sido um pai ausente, e a garota vê nele um pai que nunca teve. É óbvio que existe um choque de gerações e de culturas, enquanto Doug é um empresário de classe média e pai de família respeitado, Mallory ganha a vida como stripper em um bairro pobre de Nova Orleans. Enquanto isso temos Lois tentando se reencontrar. O desenvolvimento desses personagens é o ponto alto do longa.

    As atuações de Gandolfini esbanjam carisma e parece encaixar com perfeição e naturalidade para o personagem que vemos em tela, uma figura protetora e paternal, que demonstra em seus olhares e trejeitos esperança e doçura, mas que ao mesmo tempo externa um profundo trauma. Melissa Leo está contida, mas levando sua personagem ao ápice ao interpretar toda sua insegurança e sensibilidade. O ponto mais fraco fica por conta de Kristen Stewart, porém, tem seus méritos ao construir uma personagem ingênua e imatura, longe de ser pejorativa a crítica de sua atuação.

    O roteiro de Ken Hixon não passa de um drama de superação onde temos personagens que decidem superar suas perdas e buscar um novo significado em suas vidas. Alguns clichês incomodam como a figura do marido frio, da esposa sentimental e de algumas escolhas para o desenvolvimento da trama, mas o filme em nenhum momento utiliza sentimentalismo barato e maniqueísmos como muitos longas do gênero.

    A trilha sonora encaixa com maestria, talvez pela experiência do diretor, Jake Scott, em dirigir videoclipes. Seu trabalho de direção é simples, no entanto competente, privilegiando as atuações e o roteiro. Um filme redondo e sem grandes surpresas, mas que irá surpreender muita gente.

  • Crítica | O Vencedor

    Crítica | O Vencedor

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    David O. Russel transporta para as telas a história do peso-leve Micky Ward, boxeador conhecido pela sua resistência nos ringues onde com frequência costumava suportar vários rounds de castigo até seu adversário apresentar cansaço e ele dar a volta por cima, bastante parecido com o nosso lutador de Jiu-Jitsu e MMA, Antonio Rodrigo Nogueira, o “Minotauro”.

    Com sete indicações ao Oscar, sendo ganhador de dois deles com Christian Bale e Melissa Leo como atores coadjuvantes, O Vencedor traz um relato sincero de Micky Ward (Mark Wahlberg). Na trama sabemos um pouco do passado do seu irmão, Dicky Eklund (Bale), através de entrevistas para um documentário da HBO. Dicky ficou conhecido por ser o pugilista que derrubou Sugar Ray Leonard durante os anos 70, mas que acabou sendo derrotado, de acordo com ele, injustamente.

    Micky sempre coloca sua família em primeiro plano, mesmo que isso signifique estragar sua carreira como pugilista, já que Dicky e sua mãe só  o colocam em lutas que acabam denigrindo sua imagem e promovendo seus adversários. Sua carreira de boxeador é um fracasso e o tempo está passando para ele, seu irmão e exemplo, Dicky, está completamente afundado no crack. Micky passa sua vida sem perspectivas de um futuro de sucesso, mas tudo isso muda quando ele se envolve com um garota local e decide fazer uma mudança brusca em sua vida.

    Com uma trama que teria tudo para se tornar uma convenção de estereótipos e clichês, O Vencedor consegue ir muito além de um filme de boxe e superação como a grande maioria. Seja pelas excelentes atuações mostrando o quão reais e complexos são os personagens apresentados em tela, seja pelo roteiro convencional, mas que acrescenta verossimilhança a história ou mesmo pela direção com caráter bastante documental em todo o longa.

    E por falar em atuações, Bale rouba a cena com seu personagem, que apesar de todos os seus problemas e defeitos é impossível não se cativar, seja pela sua esperança em retornar aos ringues ou com sua relação com seu irmão, demonstrando o carinho que tem com o irmão mais novo e a experiência nos ringues ao dar dicas fundamentais para vitória do Micky.  Alice, mãe de Micky, Dicky e mais sete filhas é interpretada por Melissa Leo, uma mulher que se mostra motivada por interesses financeiros e deixa visível sua preferência por Dicky, invés do irmão mais novo. É difícil não odiá-la por suas decisões.

    Não menos importantes que os supra-citados acima, temos Amy Adams interpretando a namorada de Micky, uma jovem forte e decidida, com um passado difícil que vê uma oportunidade de redenção ao ajudar Micky e ela própria. E por falar em Micky, Mark Wahlberg se mostra humilde, pois apesar de ser o produtor e protagonista do filme, em nenhum momento ele tenta se tornar maior que o restante do elenco. Seu personagem por exemplo, apesar de discreto é notável toda a angústia guardada dentro dele. Micky mostra que apesar de ser um lutador é uma pessoa extremamente pacífica e demonstra seu desconforto até mesmo ao confrontar seus familiares. O relacionamento de Micky e Dick é o ponto alto do longa, pois mesmo com os maiores problemas e mágoas entre os dois, ambos se mostram unidos.

    Russel se mostra extremamente competente em levar o filme de forma documental, utilizando até mesmo as câmeras da HBO nas filmagens. A fotografia dá o tom decadente, deprimente e realista ao retratar seus personagens e a cidade de Lowell, o mesmo vale para a escolha do elenco, onde todos se mostram em perfeita sintonia. Impossível não se sensibilizar com a cena onde Dicky canta os versos de “I Started a Joke” dos Bee Gees para sua mãe, o dilema de Micky em aceitar seu irmão novamente como treinador ou mesmo quando é exibido o documentário sobre o crack, mostrando os efeitos devastadores sobre Dicky, uma realidade nua e crua do crack onde vemos um homem completamente devastado e o choque de sua família ao ver onde ele chegou.

    O Vencedor não é um filme sobre boxe e sim sobre adversidades e família. Seus personagens são repletos de dúvidas e problemas. Assim como a vida.

    Ouça nosso podcast sobre a filmografia de David O. Russel.