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  • Crítica | O Pequeno Dicionário Amoroso 2

    Crítica | O Pequeno Dicionário Amoroso 2

    O Pequeno Dicionário Amoroso 2 A

    Dezesseis anos após o episódio original, O Pequeno Dicionário Amoroso 2 se inicia em um ambiente semelhante ao mostrado no primeiro, se valendo do pesar do luto para, mais uma vez, reviver sentimentos constrangedores e inexoráveis para os românticos. Sandra Werneck retorna à direção, somando forças com o co-realizador Mauro Lima, que reúne em si uma inspiração para contar dramas não vistos em sua filmografia desde Meu Nome Não é Johnny, sendo da parte dele uma boa parcela do mérito em retratar as tramas mais joviais.

    O roteiro de Paulo Halm, Rita Toledo e Werneck se vale novamente da química entre Gabriel (Daniel Dantas) e Luiza (Andrea Beltrão), que seguiram suas vidas, e que se encontram em pontos decadentes de suas atuais relações. A inquietude e insatisfação os fazem se reunir novamente em torno do saudosismo de uma relação que já havia se provado fracassada, mas que ainda assim é aludida graças a teimosia e a vontade de amar que ambos carregam. Ao mesmo tempo, o argumento faz troça com a modernidade, mostrando as gerações futuras lidando com seus próprios dramas, ainda que o cunho interessante esteja no casal primário.

    O desafio de Werneck era não repetir todo o formato do primeiro filme, e apesar de manter inúmeros aspectos inalterados, como as passagens de tempo que aludem as sensações e frustrações comuns ao viver, a fórmula de falar diretamente ao público é quebrada, sem grandes danos para a estrutura narrativa, já que o artifício abandonado pouco combina com a atual forma de contar uma história no cinema. A coragem dos realizadores proporciona um filme enxuto, interessante, que discute muitos temas sem deixar as pontas mais importantes soltas.

    O repaginar da temática é feito de modo delicado, com o esmero e cuidado que um artesão tem em retomar a sua obra-prima. O conjunto de eventos mostrados demonstra erros, acertos e atos comuns a todo e qualquer ser que precisa amar para se sentir completo. A complexidade do homem não precisa ser obviamente apontada como um aspecto único da espécie, já que isso já foi estabelecido antes, mas ao contrário: o texto não é condescendente com o expectador, algo bastante incomum dentro do mainstream do circuito de cinema brasileiro.

    Os planos fechados e closes ajudam a salientar a condição de hereditariedade presente no comportamento dúbio e não certeiro de Alice (Fernanda Vasconcelos), que repete as mesmas cismas de indecisão do pai. As falas somente fazem alusão ao que o visual já prevê , mas não cai no erro de ser redundante.

    O desfecho causa espanto, especialmente por não temer contorcer paradigmas e verdades ditas absolutas, tanto no gênero romance quanto nas comédias românticas. As mensagens compartilhadas pelas personagens têm sobriedade em demasia, não pecando sequer pelo excesso, mesmo quando se foge das convenções que costumam sagrar o matrimônio como a epítome do final alegre. A busca eterna pela felicidade não necessita ajustes moralistas para ocorrer, tampouco formulários de banalidade. Necessita-se somente de disposição para viver e de indisposição para reprisar os mesmos erros pretéritos, e em O Pequeno Dicionário Amoroso 2 a comunicação é praticamente perfeita entre interlocutor e receptor, sendo fluída do início ao desfecho.

  • Crítica | Tim Maia

    Crítica | Tim Maia

    De todos os tipos de produção em moda no cinema nacional atualmente, as biografias têm sido um dos mais utilizados. Em grande parte pela atração que o público brasileiro sente por grandes nomes e grandes feitos somados a narrativas novelísticas, o cinema nacional tem produzido várias obras sobre importantes figuras do cenário artístico brasileiro, resultando em produções que geralmente possuem as mesmas qualidades e defeitos.

    A produção de 2014 do diretor Mauro Lima, sobre a vida do cantor brasileiro Tim Maia e baseada no livro de Nelson Motta, reflete bem essa dualidade do cinema nacional. Tim Maia é interpretado enquanto jovem por Robson Nunes e adulto por Babu Santana. Ambas as interpretações são boas e convincentes no papel do polêmico cantor, com destaque para Babu Santana e sua semelhança física com Maia. Também estão no longa vários outros atores globais conhecidos do grande público brasileiro, como Alline Moraes no papel de Janete, esposa de Maia, e Cauã Reymond no papel do amigo Fábio, dentre outros.

    O tom do filme segue uma narrativa clássica de biografia, começando pela infância pobre de Sebastião Rodrigues Maia na Tijuca, entregando marmita para sua mãe e sofrendo os efeitos do racismo da sociedade brasileira por ter menos oportunidades que seus amigos brancos. Ao crescer, o jovem Maia, vendo toda essa desigualdade, acumula uma raiva, que, somada a seu gênio forte, irá causar várias das situações complicadas com as quais lidará em sua vida pessoal e profissional.

    A narração do filme, feita por Reymond, é um dos elementos que mais se destaca negativamente, não só pela narração em si, mas pelo tom quase de leitura de folheto de missa que o ator faz, sem acrescentar emoções ou informações relevantes à história. Por várias vezes, a narração simplesmente descreve o que estamos vendo em tela.

    Porém, se antes sofríamos com a baixa qualidade técnica das produções, atualmente esse não é mais um problema. Em vários dos filmes nacionais lançados recentemente, a qualidade de imagem, captação de som, enquadramento, figurino, maquiagem, dentre outros, cada vez mais se torna um nível de excelência, o que deveria favorecer o surgimento de novas produções de qualidade, já que essa tecnologia está cada vez mais acessível. Mas, infelizmente, as grandes produções ainda estão submetidas ao padrão Globo, e as produções alternativas ainda se encontram fora dos circuitos e do acesso da maioria da população.

    O filme também utiliza-se de um vício muito comum no cinema nacional, que é o apelo ao humor fácil usando situações engraçadas, muitas vezes com um tom artificial, e o abuso de palavrões para arrancar risos do espectador. Porém, nem mesmo esse artifício resiste à enrolada trama. Se o primeiro ato possui passagens muito bem filmadas, como a da briga, filmada em preto e branco e em câmera lenta, de Maia com um integrante da banda, nos outros dois o filme se perde em meio a tantos personagens e idas e vindas na vida do artista. O que parece é que a vida de Maia é tão complexa que nem mesmo o diretor conseguiu acompanhá-la nas filmagens.

    O padrão Globo também é uma das razões pelas quais a narrativa se torna tão conservadora e fechada, tornando a experiência de acompanhá-la um tanto quanto enfadonha, como usar muito tempo de tela para aprofundar relações que são secundárias, como a de Maia com Roberto Carlos (George Sauma). A duração do filme é um de seus principais problemas. Os 140 minutos se tornam totalmente desnecessários não para contar a história da vida do artista, grande e complexa, mas para mostrar a visão que Mauro Lima quis. Várias polêmicas a respeito da fidelidade do filme sobre a trajetória de Tim Maia foram levantadas por seus amigos e parentes, mas, como obra de ficção e adaptação, a questão a ser levantada não é essa, mas sim como uma história de 140 minutos poderia ser facilmente condensada em 90 ou 100 minutos.

    Ao retratar a vida adulta do cantor, mergulhado no consumo autodestrutivo de drogas e álcool, cujo problema, somado a sua personalidade problemática, acaba por afastar amigos e família, o filme dá um salto na história tentando compensar o tempo desperdiçado anteriormente. Se perdemos vários minutos acompanhando o cantor seguindo Roberto Carlos por São Paulo, subitamente sua vida pula vários anos: de um fundo do poço da carreira a uma mal explicada volta por cima, e de repente, morte.

    Em resumo, como figura história, polêmica e importante no cenário musical brasileiro, Tim Maia merecia ter sido retratado de forma mais objetiva. As escolhas de Mauro Lima tentam mostrar o lado problemático do cantor, mas acabam se perdendo em meio à complexidade do personagem, resultando na confusão da linha de condução da história, o que o diretor parece perceber e tentar consertar, sem sucesso, em seu final. Falta ao cinema nacional aprender a sair desse emaranhado de limitações artísticas e começar a se movimentar no sentido de produzir boas obras biográficas.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

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