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  • Crítica | Rei dos Reis

    Crítica | Rei dos Reis

    Obra de grande investimento da MGM, Rei dos Reis é um filme bíblico clássico conduzido por Nicholas Ray, o mesmo responsável pela direção de Juventude Transviada. Depois de uma longa abertura, pontuada pela bela música de Miklos Rosza, começa finalmente a ação, narrada pelo general romano Pompeu, vivido por Conrado San Martin, e através de seu relato percebe-se o tempo de escravidão que Israel sofria sob o domínio do Império Romano.

    A produção era cara, mas não tão pomposa quanto foi Cleópatra, lançado dois anos depois. Nos momentos iniciais, se mostra um pouco do que seria a gênese da vida do Messias, mostrando um pouco das tramas políticas que reinavam em Roma, culminando na perseguição que Herodes praticou aos primogênitos hebreus. Mostra-se também em detalhes sua queda, a briga pelo trono que seu filho travou, e obviamente, o retorno de José e Maria. Incrivelmente o filme é bastante fluido, algo não muito comum em adaptações bíblicas, aparentando uma certa modernidade no modo de contar sua história.

    O roteiro funciona mais como um resumo dos evangelhos do que como uma trama coesa e isso é uma pena, pois tanto Ray quanto Jeffrey Hunter, intérprete de Cristo estão muito bem. O ator inclusive ganharia uma fama tardia por seu papel como Christopher Pike no primeiro piloto de Jornada nas Estrelas. Ao menos nos episódios mais famosos da biografia do Filho de Deus há um belo desempenho de Hunter, mesmo que os momentos como o apedrejamento da mulher adúltera ou o destino de João o Batista primem pela artificialidade, não do ambiente, mas da situação.

    Philip Yordan conta em seu roteiro com uma valorização de Barrabás, mostrando-o como um ativista político, belicoso e forjador de armas, que não se vê seguindo um profeta pacifista, ainda mais na situação que seu povo está. Apesar de exagerada, a questão contém um pouco das características que também seriam associadas a Judas Iscariotes, o apóstolo que pensava que Jesus deveria ser mais enérgico e interferir diretamente na servidão do povo de Israel.

    Rei dos Reis ganhou fama em sua época por ser um filme que tratava da história de Jesus sem o receio de mostrar como o povo judeu foi ingrato com o profeta que lhes deu tudo, pavimentando o caminho para que Franco Zeffirelli fizesse Jesus de Nazaré e Mel Gibson realizasse A Paixão de Cristo. Ainda assim, o filme soa bem menos grandioso do que Os Dez Mandamentos, de Cecil B. Demille.

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  • 10 Grandes Filmes do Cinema LGBTQ+

    10 Grandes Filmes do Cinema LGBTQ+

    “Eles nunca terminam em final feliz.”, é o que mais se ouve dessa temática que quando atinge o interesse do grande público, como no caso de Azul é a Cor Mais Quente, não pela qualidade do filme mas pela polêmica que provocou no festival de Cannes, em 2013, é algo bem raro. Os festivais o adoram, mas o cinema mainstream tem medo dele, sempre procurando a segurança de um beijo hétero para garantir uma ampla identificação lucrativa. Mas no cinema também há espaço para a figura lésbica, gay, bissexual, transexual, queer, ontem e hoje, a favor da representação e da visibilidade de quem foge dos padrões normativos. Talvez, um dia, um blockbuster com uma super-heroína drag queen alcance um bilhão nas bilheterias, e enquanto isso não vira realidade, por isso, o Vortex Cultural separou dez títulos para (re)assistirmos e celebrar a diversidade.

    Juventude Transviada (Nicholas Ray, 1955)

    O melhor filme LGBTQ+ sem ser um filme LGBTQ+. A relação de Jim Stark (a lenda James Dean) com o garoto John, interpretado por Sal Mineo, invoca um sentido dúbio que, se não claramente romântico, é ultra sugestivo a algo a mais que uma amizade masculina. Dos olhares ás intenções no filme do mestre Nicholas Ray (“Posso ficar na sua casa hoje, Jim?”), o clássico que usa as cores e o brilho do cinemascope de forma revolucionária evita a todo custo ser o Brokeback Mountain de meio século atrás, mas para bom entendedor, meia intenção já basta.

    Chá e Simpatia (Vincente Minnelli, 1956)

    Retrato do que era o bullying nos anos 50 antes de ser chamado de bullying, quando um jovem de classe média enfrenta todo tipo de dificuldade por fugir dos arquétipos padrões; por sua sexualidade cada vez mais aparente e controversa a dos seus “amigos” da escola, contando assim com o apoio de uma mulher mais velha e que acaba mudando sua vida. Apesar do absurdo final heteronormativo ao contexto mais ousado da história, Chá e Simpatia representa com perfeição, muita sutileza e um tanto além do seu tempo o quão difícil é ser diferente, ao invés de se tentar ser diferente, como ainda se julga, em uma sociedade intolerante.

    Tabu (Nagisa Oshima, 1999)

    Dois samurais, símbolos da masculinidade (seja lá o que isso quer dizer), interessados cada vez mais um pelo outro a cada cena que passa. A sabedoria do grande cineasta japonês Nagisa Oshima pode ser medida em pequenos detalhes conforme o tempo avança, como na tensão sexual metaforizada pela câmera tremida, nas reviravoltas e no suspense geral que verte dessa tensão que domina as cores, movimento e o ritmo da produção, como um todo. Um dos grandes romances da década de noventa.

    Má Educação (Pedro Almodóvar, 2004)

    No drama em torno de dois meninos separados na infância pela igreja católica, e no seu reencontro a partir de circunstâncias completamente diferentes na vida adulta, a narrativa que Pedro Almodóvar cria ao redor dos fatos verídicos e às vezes enganosos dessa história de reconciliação, e interesses dos mais variados é fantástica, fluindo um delicioso e instigante clima de imprevisibilidade, e mistério. Um filme corajoso por sua temática e inteligente na sua condução, possivelmente sendo o melhor do realizador espanhol.

    Mal dos Trópicos (Apichatpong Weerasethakul, 2004)

    O homem entregue sem limites para o desconhecido dos seus instintos. Para onde isso nos levaria num cenário propício e inconsequente para isso? Mal dos Trópicos é uma odisseia por essa possibilidade com o foco na atração passional entre dois filipinos, jovens e encarando com a maior naturalidade do mundo a sua paixão mútua, culminando na surrealista metamorfose de um deles em um animal e deixando a natureza decidir por eles o que é certo, e o que é errado. Clássico contemporâneo do impronunciável diretor asiático Apichatpong Weerasethakul. Eu falei.

    Como Diz a Bíblia (Daniel G. Karslake, 2007)

    O documentário que melhor explora no Cinema os dois lados da mesma moeda: O atacado e quem ataca, e o que melhor deixa claro o quanto esses dois valores se “enfrentam” com medo mútuo, além ou aquém do respeito pela humanidade do próximo. Surfando através de momentos e depoimentos emocionantes a respeito de igualdade, conservadorismo, liberdade, ignorância, respeito, família e aceitação, se muitos acham os filmes de Michael Moore grandes exercícios de investigação, Como Diz a Bíblia por pouco não os faz parecer amadores. Algo intensamente verdadeiro, provocador, reflexivo, chocante às vezes e sempre honesto.

    Além da Fronteira (Michael Mayer, 2012)

    Entre Romeu e Julieta havia um conflito, e entre Nimer e Roy também. Dois amantes separados por um impasse ideológico praticamente inextrincável – um é palestino, o outro israelense. Ambos tentando se enganar e viver da melhor forma possível o que sentem, à medida que a realidade que existe entre as fronteiras começa a cobrar um preço mais do que alto. O desafio era grande, e o drama é invariavelmente pesado para nos fazer sentir pelo menos 1% da dificuldade da situação. Diferente de todos os títulos dessa lista, Além da Fronteira nos lembra que não há amor sem as suas doses de dor, e sacrifício. Não neste mundo.

    Azul é a Cor Mais Quente (Abdellatif Kechiche, 2013)

    A partir de um encontro desencontrado de Adéle com Emma numa faixa de pedestres movimentada de Paris, o filme sela dois compromissos com a gente, um simples e um nada fácil: Responder a razão da cor da maioria das calças jeans no mundo merecer ser admirada (e desejada) como a mais efervescente que há, e como as paixões adolescentes podem ser adaptadas para o Cinema com toda a potência que elas nascem e porventura se mantém, e de uma forma ainda nunca vista até então, com o universo explodindo para isso em prazer, risos, lágrimas e matizes de ciano até o fim.

    Carol (Todd Haynes, 2015)

    Eleito o melhor filme LGBTQ+ pelo Instituto Britânico de Cinema, em 2015, Carol é uma grande homenagem aos grandes romances do passado, atemporais, revitalizados aqui por duas divas da Hollywood atual, Cate Blanchett e Rooney Mara, e pela visão magnifica do diretor Todd Haynes, sempre esnobado pelo Oscar. Defendendo a ideia de que arte é amor, e que amor é arte, e um não existe sem o outro, Haynes conjurou um filme-poesia numa das mais respeitosas obras cinematográficas desse século.

    Moonlight: Sob a Luz do Luar (Barry Jenkins, 2016)

    A jornada de Chiron, negro, pobre e gay pelas fases da sua vida dura é um triunfo semi obtido de tornar Cinema, por simples gestos minimalistas ou olhares de sensibilidade abismal, inúmeras noções e verdades inconvenientes ironicamente minoritárias dentro do que a sociedade já inferioriza, ou ignora. Moonlight é silencioso e todo contido em si, não poderia deixar de ser, e carrega consigo um gosto muito bom de ineditismo e de sucesso representativo oriundos de um autor tão novato, quanto Barry Jenkins.

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  • Crítica | Juventude Transviada

    Crítica | Juventude Transviada

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    Nicholas Ray é um nome tão importante no cinema moderno que Jean-Luc Godard disse uma vez que “o cinema é Nicholas Ray” e Wim Wenders acompanhou seus últimos dias e transformou-os no excelente Um Filme Para Nick. Não é a toa que seu filme mais famoso revolucionou o cinema americano e transformou James Dean em um ícone.

    Juventude Transviada começa com Dean deitado no chão, bêbado, brincando com um macaquinho de dar corda. Ele em seguida deita o boneco, o cobre com um pedaço de papel, como se o pusesse para dormir, e deita ao seu lado. A cena é estranha, incômoda e diferente de tudo que o cinema americano tinha feito até então. Essa sequência inicial, uma espécie de prólogo antes do início real do filme, também marca o que será o personagem de Dean: um misto de fragilidade, insolência e estranheza.

    A trama apresenta uma série de adolescentes de subúrbio, todos eles com casa, família e uma situação confortável. No entanto, há uma sensação de desconforto que passa pelos personagens do filme e mostra de forma sutil a parcela de trágico e dolorido que existe na juventude média americana.

    Esses adolescentes buscam um lugar, uma espécie de entendimento e conforto que não encontram em casa: Jim se divide entre uma mãe histérica e um pai extremamente passivo; Judy entre uma mãe apática e um pai que a repele porque já é “muito crescida”; e os pais de Plato, milionários, estão sempre viajando. Ray coloca seus personagens em um lugar delicado: já são grandes o suficiente para terem consciência das fraquezas de seus pais (e no caso de Judy para despertar um tipo de desejo que deve ser afastado), mas incapazes ainda de romper com a estrutura familiar.

    Nicholas Ray é o primeiro cineasta a olhar de perto a adolescência e, mais que isso, a leva-la a sério suficiente para lhe dar ares de tragédia. Desde o início, quando ouvimos na delegacia que Plato atirou em cachorrinhos, sabemos que há algo de incontrolável e violento nele. Buzz, o namorado “popular” de Judy, morre tentando provar que é mais corajoso que Jim: provar algum valor, ser aceito, é algo tão importante que vidas são postas em risco. Ao mesmo tempo a morte de Buzz serve para acentuar o rompimento dos adolescentes com seus pais: eles habitam em um mundo perigoso, onde tragédias ocorrem, mas seus pais mal sabem, eles estão definitivamente sozinhos.

    Juventude Transviada toma o adolescente como símbolo daquele que não encontra lugar na sociedade, que não está em nenhuma das caixas delimitadas e explora com sensibilidade a tensão entre querer permanecer à margem e querer se encontrar. Esse olhar para personagens desajustados ou incompreendidos é parte do que torna o filme tão inovador e um elemento que acompanha todo o cinema independente americano e o cinema francês da década de 60.

    Com esse filme Nicholas Ray criou um ícone e mudou o cinema, ao mesmo tempo que fez um clássico que, embora com alguns elementos datados, ainda diz respeito a uma certa experiência universal.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.