Crítica | Herança de Sangue
Filmes sobre a relação entre pais e filhos povoam Hollywood desde o início dos tempos. Ora, se formos analisar, Star Wars é uma fábula sobre a relação entre um pai e seus filhos. Porém, os filmes que tratam do tema quase sempre colocam os pais e os filhos em situações opostas de vida, fazendo com que um seja certinho e o outro desajustado. Herança de Sangue segue um viés oposto. O pai interpretado por Mel Gibson é um criminoso em reabilitação que luta pra conter sua violenta natureza, enquanto que a filha é uma moça desajustada que acabou indo longe demais em seu envolvimento com um traficante, mas que não necessariamente deseja encontrar sua redenção, apenas quer salvar sua pele.
Na trama escrita por Peter Craig e Andrea Berloff com base em um livro de autoria do próprio Craig, Mad Mel vive John Link, um ex-criminoso e alcoólatra em recuperação que vive em seu trailer e possui um humilde estúdio de tatuagem. Sua rotina é virada de cabeça pro ar quando sua filha desaparecida, vivida pela bela Erin Moriarty, subitamente reaparece. A garota atirou em seu namorado – um líder do tráfico de drogas – e agora está sendo perseguida pelos comparsas do meliante. Juntos, pai e filha iniciam uma fuga desesperada enquanto tentam finalmente se entender após longos anos de separação.
O roteiro de Peter Craig e Andrea Berloff é simples, sem grandes malabarismos, possuindo apenas um plot twist que em nenhum momento é forçado. A história segue um curso furioso, ainda que seja extremamente centrado nos personagens. As relações e diálogos entre Gibson e Moriarty possuem um tom agridoce, indo da doçura ao ressentimento mútuo em poucas frases. Interessante observar como que o protagonista vivido por Mel Gibson está sempre procurando se manter lúcido e contido durante toda a trama, ainda que sucumba à superproteção de sua prole, não percebendo que a garota é safa e também sabe lidar com o mundo sujo onde ele passou boa parte de sua vida. Porém, há um problema no desenvolvimento da história: devido à curta duração da película, 82 minutos sem contar os créditos, algumas situações acabam parecendo corridas demais, prejudicando um pouco o resultado final.
O diretor Jean-François Richet se mostra um grande condutor de tramas de ação aqui, sabendo muito bem trabalhar com a tensão de cada momento. Seu trabalho anterior, o remake de Assalto ao 13º DP (clássico dirigido por John Carpenter), já demonstrava isso. Entretanto, nesse Herança de Sangue ele consegue um resultado mais positivo, uma vez que assume um estilo bem mais cru, ao passo que é auxiliado pela fotografia árida de Robert Gantz, aspecto esse que emula Mad Max, principalmente o primeiro que foi estrelado por um jovem Mel Gibson. Isso faz com que a fita tenha um tom semelhante ao que se via no cinema de ação dos anos 80. Mais importante ainda, Richet consegue extrair atuações carismáticas e convincentes da dupla de protagonistas.
Ainda que não represente a volta de Mel Gibson aos holofotes de Hollywood, Herança de Sangue, assim como o ótimo Plano de Fuga, demonstra que o ator ainda tem muita lenha pra queimar, mesmo que o faça em produções menores que não possuem o merecido destaque na indústria cinematográfica.