Resenha | As Aventuras de Robin Hood – Alexandre Dumas
“– Sherwood e Robin Hood!, gritavam os alegres homens da floresta, perseguindo os inimigos com grandes risadas.”, pág. 295, editora Zahar.
Inspiração. O que poucos sabem é que o arquétipo do bom bandido já era comum na tradição camponesa britânica, lá pelo século XI D.C.. Muito menos que Robin Hood não foi inventado pela mente de Alexandre Dumas de forma totalmente autêntica. Inspirado em inúmeras lendas da Inglaterra, e pela perseguição implacável dos conquistadores normandos aos saxões no país, lá pelos anos de 1070 a 1200, Hood é um dos nativos ingleses rebeldes que, caçados por não se submeterem ao reino abusivo de Henrique II, sumiam do mapa nas florestas, sobrevivendo como podiam da caça, do companheirismo e da própria astúcia. Ou seja, homem do povo que, largado a própria sorte ou azar, se vira como pode, algo bem comum para brasileiros e outros humilhados pelo poder. Mas a pergunta segue a mesma: afinal, Hood é mocinho ou bandido?
Se as coisas fossem fáceis assim, Robin Hood teria uma fama maior do que já tem – quase sempre lembrado, no imaginário popular, como um “homem de bem” que tira dos sovinas, para dar aos pobres. Em um cenário de insegurança política (um novo reino europeu a conquistar e desbravar as terras da Inglaterra), Hood é ofertado bebê a uma nova família de humildes e solidários guardas florestais, mesmo tendo sangue nobre e que, talvez por uma “revolta do subconsciente”, viria a desconfiar e até enoja-la ao longo de toda a sua vida. No romance histórico de Dumas, nos é velado um único motivo que conduz o guardião do condado de Nottingham, e da sua floresta de Sherwood, ao combate das inúmeras injustiças que encontra pelo caminho, sozinho ou com seus amigos, João Pequeno e seu primo William, já que a trama repleta de aventura, romance e suspense sempre acaba estabelecendo o seu bondoso e destemido coração como a principal razão da sua flecha mirar no bumbum ou no peito dos piores fora-da-lei.
Questão de honra ao rapaz, nos tempos da honra, que mesmo tão namoradeiro, dispensava até a mais linda das princesas, no mais lindo dos castelos, para impedir o triunfo de um inimigo ao seu povo, ou o sequestro dos companheiros que jamais viriam a traí-lo. Dentre reis e barões corruptos, prestes a conquistar até o último terreno e o último vintém dos mais pobres, a publicação de capa dura da editora Zahar destaca a obra dividida em duas partes, extremamente bem traduzidas pelo mago das palavras Jorge Bastos: no primeiro, temos o volume de formação clássica do jovem “herói”, uma vez que no segundo há toda aquela carga mundialmente reconhecida (e aclamada, em um oceano multimidiático de adaptações e referências) das aventuras de Robin Hood e o seu bando de guardiões populares de Nottingham. A cada capítulo impondo-se como a última resistência saxã à perigosa dominação normanda (as leis condenavam à castração todos os rebeldes que não conseguiam se refugiar.).
Nota-se o quanto Dumas vê Hood quase como uma força da natureza, resposta ainda que inconsequente do Homem ao sofrimento cada vez mais institucionalizado e amplo. Uma boa vingança, talvez; um contra-ataque merecido. De forma quase teatral, esboçando seu jogo literário tal qual uma peça redigida em deliciosa prosa, Dumas foi o genial autor negro e francês de Os Três Mosqueteiros e O Conde de Monte Cristo, tendo então na sua trindade de clássicos uma parada obrigatória para todo(a) leitor(a), disposto(a) a mergulhar nas mais inesquecíveis das histórias. Após ganhar os traços coloridos e frenéticos da ótima animação da Disney de 1973, e ser inspiração para os heróis Arqueiro Verde, da DC, e o Gavião Arqueiro, da Marvel, a criação de Dumas virou ícone, símbolo de uma rebeldia cultuada, graças a romantização de sua ousadia que sofreu no livro, em outras mídias e no próprio folclore inglês. De tempos em tempos, sempre surge um novo Robin Hood contra os impérios. O legado de Dumas, então, vive.