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  • Resenha | MSP 50 Artistas

    Resenha | MSP 50 Artistas

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    A importância de 50 anos de carreira é sempre um marco louvável que marca homenagens e edições especiais, não importando qual a vertente artística do autor. Celebrando o cinquentenário em 2009, a obra de Maurício de Sousa recebeu homenagens diversas e foi prestigiada de maneira inédita em uma edição especial reunindo 50 artistas de quadrinhos, que recriam os populares personagens com traços diferentes daqueles fundamentados pelo quadrinista.

    No prefácio que abre MSP 50 – Maurício de Sousa por 50 Artistas, o editor Sidney Gusman ressalta a especialidade desta comemoração e a fonte de inspiração da homenagem vinda de uma edição comemorativa dos 80 anos de Albert Uderzo, um dos criadores do Asterix. O sucesso da edição foi tamanho que dois outros volumes surgiram em seguida, além de uma edição dando maior liberdade aos desenhistas e roteiristas da Maurício de Sousa Produções.

    Esta edição comemorativa, lançada em capa dura pela Panini Comics, apresenta 50 autores com suas interpretações pessoais de personagens clássicas de Maurício, promovendo uma gama de leituras e estruturas quadrinescas diferenciadas, como charges, tiras e narrativas curtas. A pluralidade é o grande argumento destas visões, algo trabalhado para que cada autor desse sua visão pessoal e artística sobre tais personagens. Ainda que todas as histórias tenham diferenças entre si, a homenagem explícita se mantém em diversas histórias. Parte dos autores preferiu transformar sua trama em um parabéns agradecido ao autor, bem como poucos que possuíam personagens populares próprios realizaram um crossover entre universos.

    Em maior ou menor grau, a interpretação pessoal se destaca. Outra boa parte das narrativas causa impacto pela diferença do estilo e do equilíbrio entre homenagem e conceito próprio, caso do conhecido Ivan Reis, oriundo dos quadrinhos de heróis, que cria um vilanesco Cebolinha, ou de Fabio Yabu, que promove uma ficção científica reflexiva sobre a infância. Outros nomes desconhecidos, até então, por minhas leituras, se destacam, como Otoniel Oliveira, que realiza uma bela história com Franjinha e Marina; Samuel Casal, cuja atmosfera e ausência de cores se adequaram perfeitamente ao Penadinho; e Erica Awano e seu traço em mangá no ambiente rural de Chico Bento. Três exemplos que se sobressaem visualmente pela diferença dos traços tradicionais da turminha, com perspectivas particulares deste universo.

    Graças à popularidade de seus personagens, as histórias dessa edição são especiais pela leitura pessoal no ideário de cada um. Destaca-se a importância deste ou daquele personagem, a maneira sensível pelo qual cada artista compõe sua trama a partir do cânone, sem perder a identificação emotiva, afinal a leitura primordial da Turma da Mônica é feita na tenra idade, um batismo universal para a maioria dos leitores brasileiros de quadrinhos.

    A comemoração dos 50 anos de carreira de Maurício de Sousa é coerente com a força de seu trabalho, reconhecido mundialmente e um dos grandes destaques brasileiros nos quadrinhos. Porém, a interpretação de cada homenagem produz momentos delicados. Afinal, neste 50 anos, o criador da Mônica trabalhou ao lado de uma equipe cujos créditos nunca foram devidamente apontados. Infelizmente, muito material produzido em décadas passadas foi assinado coletivamente por uma equipe cujo líder é Maurício de Sousa, o autor e empresário simultaneamente. Dessa forma, algumas destas homenagens, ao afirmarem sobre o seu cinquentenário, dão a impressão de que sua carreira foi fundamentada de maneira solo, sem o apoio desta equipe que, somente em lançamentos atuais, ganhou o devido crédito pelo trabalho. Uma afirmativa que não retira o talento fundamentado em anos de criação, mas que deve ser pontuado para evitar qualquer centralização indevida.

    Mesmo com este problema, que ainda deve ser sanado pelos estúdios, Maurício de Sousa é um dos grandes quadrinistas brasileiros, e sua força é demonstrada nessa homenagem que espelha suas personagens e a tradição fundamentada por elas, sendo mais um marco na trajetória deste autor ímpar.

  • Resenha | As Barbas do Imperador

    Resenha | As Barbas do Imperador

    As Barbas do Imperador - capa

    A parceria entre a escritora Lilia Moritz Schwarcz e o ilustrador Spacca já rendeu bons frutos anteriormente no primeiro trabalho da dupla, D. João Carioca – A Corte portuguesa no Brasil, publicado em 2008 pelo selo Quadrinhos na Cia., da editora Companhia das Letras, que abordava a chegada da família imperial ao Brasil e um pouco do Primeiro Império.

    Quase seis anos depois, a dupla se uniu novamente para dar continuidade a essa história, mas dessa vez para narrar a história do Segundo Império, desde o nascimento de Pedro de Alcântara; sua infância; a partida de seu pai, D. Pedro I; a sua preparação para assumir a coroa; todos os liames pelos quais passou o Brasil durante o reinado e culminando, por fim, em sua morte.

    Importante ressaltar que As Barbas do Imperador é um livro da própria Lilia e vencedor do prêmio Jabuti em 1999, marcando um passo importante na construção historiográfica do Segundo Império, já que trouxe uma revisão sobre o período régio no Brasil, a sociedade brasileira da época e a importância da iconografia para fundamentar o poder monárquico de D. Pedro II.

    Nesta adaptação, Lilia se reúne com Spacca novamente para dar cores ao próprio trabalho, conseguindo se adaptar à linguagem da arte sequencial para mostrar como funcionavam os símbolos e a construção de uma sociedade para D. Pedro II. Era de suma importância para ele criar um retrato de nação romântica, concebendo uma memória para consolidar a monarquia, financiando pintores para enaltecer a nacionalidade, escritores que simbolizassem o que houvesse de melhor no Império e historiadores voltados à construção dessa memória, sempre buscando inspiração nas raízes nacionais, principalmente voltadas à figura do índio e do exótico, criando os alicerces do país.

    Não à toa, este projeto “indianista” de D. Pedro II se reflete em dezenas de esculturas, quadros, romances, e até mesmo em símbolos da monarquia, como a moeda e xilogravuras envolvendo o monarca, se integrando cada vez mais à iconografia política do Brasil. Com o tempo, percebemos que esses símbolos se tornam motivo de sátira para alguns impressos da época.

    Além disso, entendemos um pouco como a monarquia utilizava as festas como instrumentos estratégicos para a consolidação da realeza e a aproximação com um império tipicamente europeu, com suas cores exóticas, é claro. Sempre buscando uma afirmação de poder, reforçando uma ideia mítica de monarquia. Essa visão vai se degradando nos anos finais do Segundo Império.

    A obra dá espaço para os acontecimentos históricos da época, desde as rebeliões no período de regência, como os movimentos abolicionistas, a Guerra do Paraguai, e tantos outros. Além de demonstrar que, desde os períodos de Segundo Império até hoje, quem detém o poder sempre soube fazer alianças entre partidos com ideais opostos daqueles que acreditava, já que D. Pedro II sempre se revezou entre os representantes dos partidos liberais e conservadores, ora buscando alianças de um lado, ora de outro. Nada muito diferente do que vemos hoje.

    O texto narrativo é um pouco truncado para uma HQ, funcionando muito mais como um texto analítico, misto de ensaio e biografia de Dom Pedro II. Contudo, o objetivo é este mesmo: adaptar a obra de forma mais palatável para todas as idades e não propriamente um roteiro de quadrinhos que estamos habituados a ler. Spacca surge justamente para dar vida à história e transpor essa linguagem ao universo das HQs, e, verdade seja dita, faz muitíssimo bem. Seu traço caricatural é vivo e recria cada momento de forma interessantíssima, desde o modelo da época, como a construção de retratos, documentos, pinturas e outros símbolos iconográficos, sempre de forma dinâmica. O álbum conta ainda com uma seção de extras com textos sobre a Guerra do Paraguai, a escravidão e a importância que a fotografia teve no império de D. Pedro II, além de uma galeria de construção dos personagens e cronologia da época.

    As Barbas do Imperador é um belo lançamento para compreendermos um pouco sobre nosso passado e entendermos nosso presente.

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