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  • Resenha | Como Falar com Garotas em Festas

    Resenha | Como Falar com Garotas em Festas

    Sandman encontra Machado de Assis

    Como Falar com Garotas em Festas (Quadrinhos na Cia.), escrito por Neil Gaiman e ilustrado pelos irmãos Fábio Moon e Gabriel Bá, é o tipo de história que só poderia ter saído mesmo do pai de Sandman. A trama roteirizada por Gaiman é construída do usual ao coletivo mitológico, sempre destacando, ou relembrando, a máxima de que nada é o que parece.

    Começa com um lugar-comum: um jovem desengonçado é convidado junto com o amigo popular para uma festa em uma república feminina. O jovem desengonçado não consegue falar com as mulheres e o amigo popular tenta animar o companheiro para a aventura com as mulheres desconhecidas. Entram, um muito confiante, o outro com baixa autoestima.

    Cada rapaz segue um caminho diferente: enquanto o popular logo parte para cima da dona da festa, o desengonçado tenta conversar o melhor possível com alguma mulher sozinha. O nervosismo o atrapalha, por isso escolhe ouvir mais do que falar. Logo percebe que a maioria das mulheres dali são intercambistas. Contudo, não fica animado como o amigo popular ao saber disso, mas desconfiado com a coincidência de todas não serem dali.

    Quando o desengonçado passa a perguntar sobre a origem delas é que Gaiman desata toda sua criatividade mitológica. Aquelas adolescentes não são apenas corpos humanos, mas seres diversos que escolheram, naquele momento, habitar um invólucro de carne para aprender sobre a vida na terra. Daí ao final, o leitor surpreende-se com as origens de cada uma. Este o grande trunfo da história: a diversidade de seres que podem se esconder em carne e osso.

    Do ponto de vista gráfico, a preferência por cores quentes, sombras em degradê e formas assimétricas, transforma a atmosfera do quadrinho em algo retirado de um sonho. Os desenhos são esguios, contornos bem definidos e um trabalho magnífico de quadros construídos em aquarela. As cenas obedecem a um rigoroso controle de roteiro e imagem, de forma que, harmonicamente, são construídos momentos de tensão, suspense e desfecho.

    HQ simples, eficaz e excelente. Mas não se engane, a simplicidade é sempre conseguida com muito esforço e experiência. Não por acaso trata-se de uma parceria entre Gaiman, pai daquela que é considerada uma rara unanimidade entre as HQ’s, Sandman, e os irmãos que ganharam um Prêmio Jabuti (o maior prêmio literário nacional), pela adaptação de “O alienista”, de Machado de Assis, em quadrinhos.

    No final da história ainda encontramos esboços dos trabalhos de Fábio Moon e Gabriel Bá. HQ mais do que recomendada.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Resenha | MSP 50 Artistas

    Resenha | MSP 50 Artistas

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    A importância de 50 anos de carreira é sempre um marco louvável que marca homenagens e edições especiais, não importando qual a vertente artística do autor. Celebrando o cinquentenário em 2009, a obra de Maurício de Sousa recebeu homenagens diversas e foi prestigiada de maneira inédita em uma edição especial reunindo 50 artistas de quadrinhos, que recriam os populares personagens com traços diferentes daqueles fundamentados pelo quadrinista.

    No prefácio que abre MSP 50 – Maurício de Sousa por 50 Artistas, o editor Sidney Gusman ressalta a especialidade desta comemoração e a fonte de inspiração da homenagem vinda de uma edição comemorativa dos 80 anos de Albert Uderzo, um dos criadores do Asterix. O sucesso da edição foi tamanho que dois outros volumes surgiram em seguida, além de uma edição dando maior liberdade aos desenhistas e roteiristas da Maurício de Sousa Produções.

    Esta edição comemorativa, lançada em capa dura pela Panini Comics, apresenta 50 autores com suas interpretações pessoais de personagens clássicas de Maurício, promovendo uma gama de leituras e estruturas quadrinescas diferenciadas, como charges, tiras e narrativas curtas. A pluralidade é o grande argumento destas visões, algo trabalhado para que cada autor desse sua visão pessoal e artística sobre tais personagens. Ainda que todas as histórias tenham diferenças entre si, a homenagem explícita se mantém em diversas histórias. Parte dos autores preferiu transformar sua trama em um parabéns agradecido ao autor, bem como poucos que possuíam personagens populares próprios realizaram um crossover entre universos.

    Em maior ou menor grau, a interpretação pessoal se destaca. Outra boa parte das narrativas causa impacto pela diferença do estilo e do equilíbrio entre homenagem e conceito próprio, caso do conhecido Ivan Reis, oriundo dos quadrinhos de heróis, que cria um vilanesco Cebolinha, ou de Fabio Yabu, que promove uma ficção científica reflexiva sobre a infância. Outros nomes desconhecidos, até então, por minhas leituras, se destacam, como Otoniel Oliveira, que realiza uma bela história com Franjinha e Marina; Samuel Casal, cuja atmosfera e ausência de cores se adequaram perfeitamente ao Penadinho; e Erica Awano e seu traço em mangá no ambiente rural de Chico Bento. Três exemplos que se sobressaem visualmente pela diferença dos traços tradicionais da turminha, com perspectivas particulares deste universo.

    Graças à popularidade de seus personagens, as histórias dessa edição são especiais pela leitura pessoal no ideário de cada um. Destaca-se a importância deste ou daquele personagem, a maneira sensível pelo qual cada artista compõe sua trama a partir do cânone, sem perder a identificação emotiva, afinal a leitura primordial da Turma da Mônica é feita na tenra idade, um batismo universal para a maioria dos leitores brasileiros de quadrinhos.

    A comemoração dos 50 anos de carreira de Maurício de Sousa é coerente com a força de seu trabalho, reconhecido mundialmente e um dos grandes destaques brasileiros nos quadrinhos. Porém, a interpretação de cada homenagem produz momentos delicados. Afinal, neste 50 anos, o criador da Mônica trabalhou ao lado de uma equipe cujos créditos nunca foram devidamente apontados. Infelizmente, muito material produzido em décadas passadas foi assinado coletivamente por uma equipe cujo líder é Maurício de Sousa, o autor e empresário simultaneamente. Dessa forma, algumas destas homenagens, ao afirmarem sobre o seu cinquentenário, dão a impressão de que sua carreira foi fundamentada de maneira solo, sem o apoio desta equipe que, somente em lançamentos atuais, ganhou o devido crédito pelo trabalho. Uma afirmativa que não retira o talento fundamentado em anos de criação, mas que deve ser pontuado para evitar qualquer centralização indevida.

    Mesmo com este problema, que ainda deve ser sanado pelos estúdios, Maurício de Sousa é um dos grandes quadrinistas brasileiros, e sua força é demonstrada nessa homenagem que espelha suas personagens e a tradição fundamentada por elas, sendo mais um marco na trajetória deste autor ímpar.

  • Resenha | Daytripper

    Resenha | Daytripper

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    Graphic novel produzida pelos brasileiros Fabio Moon e Gabriel Bá (10 Pãezinhos, O Alienista), Daytripper foi produzida para o selo Vertigo. Publicada em 10 volumes, cada um deles explora uma idade da vida de Brás de Oliva Domingos, um escritor que tem seu passado e futuro expostos nas páginas da publicação. A fim de reproduzir um pouco do caráter da obra – em um humilde esforço de análise – a resenha a seguir é dividida em capítulos, como na publicação original.

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    Brás é um escritor inseguro e nada otimista que divide seu tempo entre seus escritos e devaneios de sua mente – cada vez mais frequentes com o passar dos dias.  Sempre subjugando o exercício de criatividade que deveria exercer. Sua função no jornal em que trabalha é tratar dos obituários, o que faz com que esteja habituado a lidar com a morte todos os dias, indagando-se sobre suas motivações. Quando era jovem, tencionava viver aventuras e escrever sobre a vida, mas seu ofício faz com que seu destino se encurte – o paralelo com Shakespeare é válido mais pela tragédia do que pelo talento, existente ou não de Brás – até então.

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    A juventude é mostrada em Salvador, com Brás sendo confundido com um gringo, até que seu amigo Jorge lhe expõe o óbvio: para os nativos, o escritor era de outro planeta, o planeta dos brancos. Seu contato com Olinda – uma belíssima mulata – é por si só uma demonstração do culto a Iemanjá. Uma viagem à celebração do orixá que passa uma aura de mistério e evidencia o caráter sincrético da cidade. Além de louvar a vida,  a entidade é capaz de dar e retira-lá.

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    Dessa vez, é mostrado Brás se separando da mesma Olinda da história anterior. A personagem mudou de forma abrupta nesses sete anos,  evidenciando que as transformações das pessoas podem ser muito drásticas, mesmo aquelas a quem o homem diz conhecer. Amenidades podem facilmente se transformar em ódio e desprezo. Moon e brincam com o vazio da vida moderna, e o quanto a gama de produtos enlatados coloridos só serve para distrair e esconder a sua típica obsolência. No entanto, o personagem (o homem) valoriza a efemeridade do momento, o breve instante pode ser mágico e gerar no futuro uma lembrança boa, de que viver valeu a pena.

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    Brás tem o seu primeiro filho no mesmo dia em que seu pai falece – mais uma vez a ideia da vida e morte é ressaltada, o Divino dá e retira a existência. Quando o pai finalmente parte, sua presença torna-se gigantesca e preenche o imaginário do filho. Não só pela figura amorosa que ele certamente era, mas também por suas imperfeições, simbolizadas por sua filha bastarda, além de fonte de inspiração e figura de mentor.

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    As multividas e multimortes de Brás são apresentadas tendo a emoção como ponto de partida.  Na edição, acompanhamos a infância do Pequeno Milagre: sua intimidade infante e um amor inocente e sem cobranças que marcou para toda a vida, mesmo que tais momentos tenham sido curtos.

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    O registro da queda do avião é belíssimo. O vermelho do fogo toma todo o quadro, mostrando que o elemento consumira tudo, com um poder praticamente infinito. O ocorrido explora o real acidente do voo da Tam, ocorrido no aeroporto de Congonhas em 2007. A possível perda de Jorge faz Brás trabalhar com muito mais afinco nestes obituários, imprimindo maior emoção que o habitual, transparecendo seus próprios sentimentos. A sensação da perda comove.

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    Brás finalmente lança seu livro, mas ainda se mantém inquieto por não saber do paradeiro de Jorge. Mesmo com as reclamações de sua esposa, parte para buscar o amigo e encontra mais um fim, dessa vez trágico, pelas mãos de quem ele amava.

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    Brás torna-se uma entidade, está em todo o lugar mesmo não estando. Sua presença está na ausência de seu ser e as poucas participações acontecem por meios digitais e eletrônicos, se tornando para sua família o que Benedito era para o filho. O leitor também compartilha a sensação de ausência.

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    “Ninguém gosta da morte, mas goste ou não, todo mundo morre um dia!” – Brás precisou encarar um emprego medíocre – aos seus olhos – para entender o sentido real da vida. A morte habita seu sonho e, mesmo arquiteto e escritor da própria história, não pode se esquivar do fim em seu mundo imaginário.

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    A iminente morte que tem no câncer seu avatar não mais assusta. Brás abraça seu destino, esperando-o ansiosamente ,e nega o tratamento que poderia ampliar seus dias para não estragar os últimos momentos. O fumo e escrita, antes interpretados como maldição hereditária, se tornam verdadeiras heranças de Seu Benedito.  Um final emocionante com as últimas palavras do pai encontradas em uma carta, escritas na época em que Brás ganhou um filho. Coincidindo – sem a menor coincidência – com o que Brás entendia ser o final de sua vida, aceitando a morte para homenagear sua deusa e entregar-se ao infinito como oferenda.

    Nada é mais belo que o mar, esperando o sacrifício do artista, o último suspiro e a última lembrança dos olhos que observaram a tão bela jornada que viveu e exerceu. Daytripper é um arroubo de emoção e uma das obras mais tocantes feitas na nona arte.

    Ouça nosso podcast sobre Daytripper.

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  • VortCast 29 | Daytripper

    VortCast 29 | Daytripper

    Bem-vindos à bordo. Nesta edição, Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Filipe Pereira e Thiago “Coração Valente” Augusto (@tdmundomente) recebem Luis Garavello (@luisgaravello), do Quadrim e Delfin (@DelReyDelfin), do Terra Zero e Ninho do Coruja, dão sua contribuição para a Iniciativa Vertigo e se reúnem para comentar a respeito do quadrinho Daytripper, de Gabriel Bá e Fábio Moon.

    Duração: 109 mins.
    Edição: Rafael Moreira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner: Rafael Moreira

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