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  • Resenha | DC: A Nova Fronteira (2)

    Resenha | DC: A Nova Fronteira (2)

    No mundo do entretenimento, a nostalgia vende e contagia, tal qual o medo e a desconfiança no teatro político. Atualmente, ninguém entende disso nas indústrias da informação melhor do que a Disney, ao promover infinitos remakes de animações que todos já amamos, e assim, garimpando mais dinheiro do que se pode contar – com exceção do live-action Mulan de 2020, mas essa é uma outra história. Nostalgia é apelativa, recorre a assuntos do coração sobre ideias que já somos apegados a gerações, e tão saudoso quanto princesas encantadas, na cultura pop, é o universo colorido e exagerado dos super-heróis, seus vilões e suas aventuras de planetas em perigo, pedras mágicas, caixas malucas e por ai vai. DC e Marvel sempre se orgulharam disso, e quase ao mesmo tempo, criaram um novo Olimpo quase sempre, não resiste a virar um playground onde deus e o diabo se enfrentam.

    Entre palhaços e monstros gigantes vindos do centro da Terra, a DC Comics (e sua eterna concorrente) alimenta há quase um século uma mitologia repleta de ícones mundialmente aclamados, figuras aladas e destemidas que nunca salvam o planeta, e sim, os Estados Unidos; a águia. E é justamente esse o motivo da minissérie A Nova Fronteira precisar existir: em 1952, todos os super-heróis foram proibidos de agir na América por serem um segundo poder não-oficial, fora de controle, e que muitas vezes só atraíam ameaças que só causavam transtorno. Tirando Superman e a Mulher-Maravilha, ninguém podia voar entre Nova York e Califórnia exceto quem se vendeu em prol da segurança nacional, e os agentes da Aeronáutica – como o famoso piloto de caças Hal Jordan, o futuro Lanterna Verde. Num país totalmente traumatizado pelo fim ainda muito recente da Segunda Guerra Mundial, minimizar perigos era uma cláusula pétrea que todos deveriam se submeter, em busca da liberdade. Mas tudo é político, e nada escapa do seu espectro.

    Com Superman e Mulher-Maravilha sendo mascotes militares do país que os acolheu (um vindo do espaço, e a outra de Themyscira), Batman é um mero marginal, e o Flash só corre para livrar sua namorada de um assalto. A Liga da Justiça ainda é um delírio distante na Parte 1, e o foco principal é em Hal Jordan, o ex-soldado de guerra e abalado com as mortes que fez, para sobreviver. Jordan é envolvido nos planos dos EUA em alcançar o espaço antes da União Soviética, sem jamais desconfiar do que o destino vindo do espaço lhe reserva – e que um marciano transmorfo já está na Terra, aprendendo escondido o comportamento do ser-humano pela TV, a mídia de massa que perpetua o american way of life desde 1954, quando ocorreu a primeira transmissão comercial pela NBC. Se só o que é americano é aceitável, o Caçador de Marte aprende isso na prática. A crítica a esse imperialismo ideológico é tão crua nas duas partes de A Nova Fronteira que impressiona, e nos faz pensar o que há por trás desses paladinos, ou seja, ferramentas de uma máquina de publicidade governamental.

    Talvez Alan Moore estava certo, e na vida real, o Dr. Manhattan iria servir a América feito um Deus azul que nasceu nesse solo. Através do entretenimento, esse patriotismo americano é polvilhado ao redor do mundo com grande facilidade (o chamado soft power, ou seja, uma conquista política que não precisa ser alcançada com armas), e nada melhor que os super-heróis para garantir a missão. Na ágil e dramática trama roteirizada e ilustrada por Darwyn Cooke e as cores de Dave Stewart, vivemos os anos embrionários para que a Liga da Justiça fique unida, afinal, enquanto mergulhamos de cabeça no que faz cada um dos seus ícones ser tão especial. Ironicamente, A Nova Fronteira é ousada o bastante para expor essas “entidades” como a grande contradição que elas são, tratando ainda de questões sociais pertinentes aos anos 50, como a paranoia do cidadão comum com medo de novas guerras, e a segregação racial no sul. Escravizados pelo governo e fadados a lutar contra monstros primitivos que os unem, na Parte 2, os heróis lutam pela liberdade como se esta fosse um conceito vazio para eles mesmos. Justo eles, os peões da nação Coca-Cola.

    Super-heróis não são a extensão do homem, como eram na Grécia antiga Zeus, Atena, Hércules e Poseidon, e sim a extensão do ‘homem americano’. Fruto direto do imperialismo dos Estados Unidos, não é à toa que o Homem de Aço ainda é um símbolo supremo do gênero (por mais que Batman e Homem-Aranha sejam mais legais que ele): o cara É a América, o país acolhedor dos campos de trigo, de uma gente esforçada e que nunca teve medo de enfrentar ninguém, nem mesmo os ingleses para garantir sua independência. Superman incorpora isso com perfeição, imbatível como a América cuja kriptonita (terrorismo, crises econômicas) quando lhe atinge, sempre consegue superar. Flash, Capitão América, Aquaman e X-Men: tudo uma propaganda política e das mais espertas, vale dizer. Quando os Vingadores partiram para cima de Thanos em Vingadores: Ultimato, e quando a Mulher-Maravilha entrou no campo de batalha contra os nazistas, não estávamos aplaudindo nossos ídolos: nós estávamos aplaudindo a águia.

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  • Resenha | Gideon Falls – Volume 1: O Celeiro Negro

    Resenha | Gideon Falls – Volume 1: O Celeiro Negro

    Existem histórias em quadrinhos que são aclamadas por seu texto, existem histórias em quadrinhos que são aclamadas por sua arte. E existe Gideon Falls, que atinge a excelência tanto no aspecto verbal quanto no imagético.

    A equipe criativa, formada por Jeff Lemire, Andrea Sorrentino e Dave Stewart construiu em Gideon Falls um verdadeiro clássico moderno, um tratado estético que lida com os limites da narrativa gráfica e os subverte em prol de uma experiência sensorial única, por meio de uma trama envolvente e instigante.

    O trabalho conjunto de texto, arte e cor resulta em uma poderosa e intrigante narrativa de horror, que se utiliza da fragmentação diegetica para contar sua história, a partir dos pontos de vista do Padre Wilfred e do mentalmente instável Norton, duas pessoas absolutamente diferentes e igualmente destroçados pela vida.

    É uma verdadeira aula de narrativa, a forma como Lemire descortina os mistérios escondidos em Gideon Falls e o enigmático Celeiro Negro que assombra a cidade. Toda a dinâmica entre os personagens é muito bem desenvolvida, de forma que a história não apresenta oscilação em seu ritmo, sem deixar o andamento da trama de lado em nenhum momento. Lemire concebe o terror em Gideon Falls através das entrelinhas de cada cena, cada diálogo, deixando que a tensão sobrenatural escape em alguns momentos, mas sem deixar muitas pistas para o leitor, sobre tudo o que se esconde por trás de toda a angústia que permeia a narrativa.

    Lemire foge da abordagem intimista de seus trabalhos autorais anteriores, criando uma dinâmica de relações intrincadas e complexas entre os personagens ao longo da narrativa, sem a necessidade de um subtexto familiar para conduzir as trajetórias de seus protagonistas. Sanidade e fé são colocadas em perspectiva pela escrita do autor canadense, através dos dilemas pelos quais Wilfred e Norton passam ao longo da história.

    A diagramação que Sorrentino faz através das páginas é igualmente deslumbrante e demonstra o pleno domínio que o quadrinista exerce sobre a história que se propõe a contar. Navegar pelas disposições dos quadros em Gideon Falls se revela uma viagem quase lisérgica pelos recônditos mais assustadores da mente humana. A alternância entre os requadros padrões e as diferentes configurações de composição de página, típicas do artista, refletem o próprio estado psicológico dos personagens em cada momento capturado no espaço-tempo contido no quadro.

    O trabalho em conjunto de Sorrentino com o colorista Stewart confere o tom psicodélico que a obra necessita, sem deixar de se preocupar em criar uma ambientação bem característica para Gideon Falls, em seus mais distintos núcleos. A arte casa perfeitamente com o brilhante texto de Lemire, de maneira que não se encontra uma sobreposição de arte pelo texto ou de texto pela arte, mas sim uma simbiose estrutural poucas vezes vista em uma história em quadrinhos.

    Gideon Falls foi de longe a melhor série lançada nos EUA em 2018 pela Image Comics e publicada no Brasil pela Editora MINO, quase que simultaneamente ao lançamento no mercado norte-americano, sendo assim um trabalho editorial digno de todos os aplausos possíveis. O encadernado brasileiro, editado por Janaína de Luna e traduzido por Dandara Palankof, compila o material originalmente publicado em Gideon Falls #01 a #06, totalizando 160 páginas, com papel de excelente gramatura e uma belíssima capa dura.

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  • Resenha | Black Hammer: Origens Secretas – Volume 1

    Resenha | Black Hammer: Origens Secretas – Volume 1

    A capa de Black Hammer remete muito mais a um filme de terror do que a um quadrinhos. Um pouco ao momento em que Carrie liberta seus poderes na já clássica adaptação da obra de Stephen King para os cinemas, Carrie: A Estranha, pelas mãos de Brian De Palma. Fato é, que a história criada pelo roteirista Jeff Lemire e pelo ilustrador Dean Ormston tem uma narrativa tão intrigante quanto um livro de King.

    Na trama de Origens Secretas somos apresentados a Abraham Slam, Gail, Barbalien, Coronel Weird, Talky Walky e Madame Libélula. Todos possuem características e poderes bem peculiares e foram habitantes de Spiral City. Em um passado não muito distante, o grupo salvou a cidade de várias ameaças. Porém, ao enfrentarem um poderoso inimigo, acabaram sendo transportados para uma idílica fazenda em uma dimensão paralela. Os antigos campeões da cidade foram exilados e os habitantes da cidade que tantas vezes eles salvaram não fazem a menor ideia do que aconteceu, só que eles desapareceram. Já se passaram dez anos e ninguém do grupo sabe como foi parar ali, nem o motivo e nem se um dia vão conseguir dali.

    O volume lançado pela editora Intrínseca reúne os seis primeiros volumes da história. Ainda que bastante introdutórias, as histórias são bem intrigantes, com idas e vindas temporais, mostrando os heróis em seu passado glorioso e seu melancólico presente. Nesse ponto, a trama faz lembrar um pouco da série Lost, com suas idas e vindas e desenvolvimento de personagens, ainda que as histórias idealizadas por Lemire sejam mais interessantes e procuram aos poucos resolver seus mistérios. O roteirista e criador se esmera pra ir criando uma ambientação que prenda o leitor, ao passo que recheia tudo com diálogos inteligentes e influências bem vindas de outras histórias de quadrinhos e obras literárias de ficção científica. Outro ponto de destaque é o desenvolvimento dos personagens, com enfoque em seus dramas pessoais, no isolamento e nas suas emoções. Assim, o roteiro acaba dialogando com grandes obras dos quadrinhos, como Watchmen, Astro City e The Umbrella Academy. Watchmen talvez tenha sido a primeira com a qual pude estabelecer uma relação, principalmente no que tange à narrativa em linhas temporais distintas que mostram os heróis em seu auge e posteriormente já decadentes, com seus conflitos emocionais aflorando e regendo as relações interpessoais. Ormston capta bem as intenções de seu parceiro e cria um traço que prima por ter uma certa crueza, mas que evidencia o sentimento de cada personagem, favorecendo a empatia do leitor com os personagens. A colorização de Dave Stewart também é muito bem sacada, alternando tons vibrantes nos flashbacks com uma paleta mais dark nos momentos do presente.

    Desde o início, nota-se que Jeff Lemire idealizou uma obra referencial e também reverencial, pois seus personagens guardam semelhanças com alguns dos principais super heróis dos universos Marvel e DC, além de alguns outros de quadrinhos pulp. Examinando atentamente, vemos que o Devorador de Mundos é inspirado (e também presta homenagem) em Galactus e Darkseid, respectivamente grandes vilões cósmicos da Marvel e da DC; Black Hammer é inspirado em Thor e Superman, tanto pelo martelo quanto pela sua força e disposição em fazer o sacrifício supremo para proteger o mundo; Abraham Slam pode ser visto como uma mistura de Capitão América e Batman, pois é o único que não possui superpoderes e vive até certo ponto satisfeito com a sua condição atual; a Menina de Ouro é o equivalente ao Capitão Marvel e sua irmã Mary Marvel ,e possui até palavra mágica para transformação, mas sua condição impede seu envelhecimento, o que a torna uma mulher aprisionada no corpo de uma criança de nove anos; Madame Libélula tem suas influências dos quadrinhos de terror da EC Comics e Eerie Comics, com um certo quê das histórias do Monstro do Pântano e uma referência visual que evoca a Ravena dos Novos Titãs; o Coronel Weird é um misto de Adam Strange (o aventureiro cósmico da DC Comics) e do Doutor Estranho, pois é capaz de transitar entre dimensões, universos (e tem como sidekick a robô Talkie Walkie, cujo sentimentalismo lembra Marvin, de O Guia do Mochileiro das Galáxias, de Douglas Adams) e não vivencia o tempo como o restante dos seus companheiros; e o Barbalien pode ser visto como uma reimaginação do Caçador de Marte (que eu ainda insisto em chamar de Ajax).

    Enfim, Black Hammer é uma história não convencional de super heróis e seu acerto é justamente esse. Com personagens bem trabalhados, um roteiro que prende a atenção e uma arte em sintonia com tudo isso, a HQ talvez seja uma das melhores coisas surgidas nos últimos tempos e não à toa recebeu o Prêmio Eisner de melhor nova série no ano de 2017.

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  • Resenha | DC: A Nova Fronteira (1)

    Resenha | DC: A Nova Fronteira (1)

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    Escrita em 2004, DC: A Nova Fronteira tem uma estrutura narrativa cinematográfica, com uma base de três quadros largos por página e variando de acordo com a necessidade dentro dessa mesma estrutura, gerando uma leitura fluida e agradável. Qualidade essa que se destaca em conjunto com o trabalho consistente de Darwyn Cooke nos desenhos, os quais lembram, muitas vezes, um storyboard pela simplicidade do traço e a imersão que as cores de Dave Stewart trazem à revista.

    Acredito que a intenção original seja um exercício de estrutura próximo do que outro roteirista, Alan Moore, trazia na construção de seus roteiros: condensar em crescente o universo DC como um todo, contextualizando historicamente eventos reais em conjunto com o nascimento da Trindade, a origem do Lanterna Verde, Flash, Caçador de Marte, Elektron, os Homens Metálicos, entre outros.

    E não apenas isso, Nova Fronteira, certamente, é a primeira revista que une não só todos os heróis DC numa mesma origem, mas também grupos militares como os Perdedores e Blackhawks, e outros pouco conhecidos, como os Desafiadores do Desconhecido e o Esquadrão Suicida. A história preocupa em manter uma constante de datas e resumir alguns dos eventos principais como o registro dos Super-Heróis pelo governo americano com manchetes de jornal e fotos simulando o efeito de retícula em cima de algumas ilustrações (ao mesmo tempo pra justificar a ausência de alguns seres místicos como Capitão Marvel, Zatanna e Doutor Destino dos eventos em que se passa a história). Esse preciosismo com o contexto histórico é tamanho que vemos inclusive transições nos uniformes do Super-Homem e Batman.

    A HQ passa até um pouco mais da metade encaixando muitos personagens e introduzindo novos. A impressão que você pode ter é que o ritmo dela é arrastado por isso. Em compensação, temos uma grande cena de ação no desfecho da revista, com direito a vermos quase todos os heróis agindo em conjunto. Apesar das 300 e poucas páginas, divididas em dois volumes pela Panini Comics, a leitura acaba passando mais rápido do que parece, com quadros dinâmicos e praticamente sem balões de pensamento ou narração em off, com exceção do emocionante discurso no final escrito por John Kennedy.

    Hal Jordan é com certeza o protagonista da história. É através dele que uma grande parte da narrativa é contada, deixando também espaço para o Flash e o Marciano John Johnz (que tem por sinal uma das narrativas mais contextualizadas nos anos 50, se passando por um detetive do departamento de Gotham), mas é possível ver o carinho especial dado a ele e, mais adiante, a toda a era de prata da DC. Em contraponto, só vemos a Trindade pouquíssimas vezes na história toda. Quem sabe essa seria a grande mensagem final de Cooke para os leitores, roteiristas e toda a indústria de quadrinhos? Deixar grandes medalhões no seu lugar e dar espaço a novas histórias, personagens e lugares para alcançar!?

    A ameaça final representa essa liberdade que os roteiros mais antigos possuíam de não necessitarem de grandes plots, conspirações e reviravoltas. Essa última, bem contextualizada, é utilizada em função do que “voltar pra casa” significa em Nova Fronteira: é o voltar para o real espírito de aventura que tais histórias perderam durante os anos. A edição é uma ótima introdução ao universo DC nos quadrinhos, tirando qualquer mérito das séries animadas por Bruce Tim e roteirizadas por Paul Dini e dando espaço à leitura de uma boa HQ.

    Compre aqui: DC: New Frontier (Deluxe Version)

    Texto de autoria de Halan Everson.

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  • Resenha | Batman e Filho

    Resenha | Batman e Filho

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    Em sua estreia no título mensal do Morcego, Grant Morrison optou por uma breve história em quatro partes, seguindo um recurso tradicional de suas obras: o resgate do passado por meio de releituras contemporâneas ou da reintrodução de personagens. Batman e Filho, desenhado por Andy Kubert, apresenta um novo herdeiro ao manto do morcego. Diferentemente dos parceiros e filhos adotivos de Bruce Wayne, este nasceu de noites de amor com Talia Al Ghul e, por muito tempo  desde O Filho do Demônio, de 1989 –, permaneceu fora da cronologia.

    A história de Damien está inserida logo após os eventos de Crise Infinita e o salto temporal de um ano do Universo DC. É o segundo arco de retorno da revista Batman, depois do primeiro, escrito por James Robison, no qual apresenta a volta de Harvey Dent como Duas Caras. Nesta nova fase do herói, é perceptível a tentativa de reintroduzir os vilões clássicos da personagem, tanto neste primeiro arco como nas revistas Detective Comics, cujos roteiros assinados por Paul Dini  situam histórias fechadas de 25 páginas abordando um vilão a cada edição.

    Refletindo o desfecho da Crise Infinita, em que os grandes super-heróis ficam fora de ação por um ano – espaço justificado para a megassaga 52, que tem Grant Morrison como um dos quatro roteiristas –, Batman voltou com energia total e conseguiu erradicar boa parte do crime em Gotham. Durante seu ano sabático – visto na megassaga –, o Morcego refez a trilha inicial de sua formação como herói e, entre descobertas e meditações, novamente encontrou o equilíbrio, uma força demonstrada ao combater o crime com afinco.

    A primeira página da trama apresenta um Comissário Gordon enlouquecido com um novo gás do Coringa e com um Batman falso tentando combater o vilão. Após levar um tiro deste falso Batman, o verdadeiro cavaleiro surge e deixa o Palhaço do Crime nas mãos dos policiais. Neste resgate interior de seu equilíbrio, Bruce Wayne decide dedicar um tempo como bon vivant e parte a Londres para visitar uma exposição artística, interrompida por uma horda de capanga que utiliza o soro do Morcego Humano do Dr. Robert Kirkland Langstrom. No meio da luta, é apresentado ao seu filho por Talia.

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    Morrison parece mais preocupado em inserir um personagem, que pode render no futuro boas histórias, do que realizar uma adequada introdução ao universo do Morcego. Normalmente, quando um novo roteirista assina uma revista, há a natural fundamentação de parâmetros para tramas que virão; o autor utiliza este recurso com Damian e o Coringa aprisionado. Mas, com boa execução em metade da história, a outra parte falha e torna-se apressada no final, com um dos recursos mais bobos utilizados por narrativas de qualquer estilo: uma explosão em que bandidos desaparecem, resultando em um desfecho inacabado. Em linhas gerais, também nota-se a intenção de fugir levemente do realismo noturno da personagem, dando maior dimensão ao seu arsenal como super-herói: Batman e Damian viajam em um foguete e a persona de Wayne parece mais crítica e cômica nas falas.

    O encadernado lançado pela Editora Panini apresenta este primeiro arco (publicado originalmente em Batman #655 a #658 e, no Brasil, Batman nº 58 a 61) e mais três histórias posteriores, lançadas após uma história dividida em quatro partes intitulada Grotesco. Em O Palhaço à Meia-Noite, Morrison demonstra sua loucura característica ao apresentar um conto dentro da revista. Há pequenas ilustrações irregulares de John Van Fleet, mas o destaque é o conto literário sobre o Morcego e seu arqui-inimigo. É inegável a vontade do roteirista em quebrar paradigmas. Imagine o choque do público ao abrir a revista à procura de uma costumeira história em quadrinhos e se deparar com um conto que flui de maneira muito diferente da de uma obra desenhada. No conto, mesmo preso no Arkham, Coringa arquiteta um plano para matar sua cadeia de contatos. Uma narrativa muito bem delineada que depende da inventividade do leitor devido às metáforas visuais. Além disso, a trama traz um gancho que envolve o Palhaço do Crime e Arlequina.

    As três histórias seguintes compõem um mesmo enredo. Em Os Três Fantasmas de Batman, Bruce Wayne ainda está viajando quando recebe a informação de que há uma ameaça em Gotham City, e o responsável por matar policiais é visto trajando um manto híbrido composto pelos uniformes do Morcego e do vilão Bane. O título inegavelmente cita Charles Dickens e os três espíritos do Natal que visitam o personagem principal do livro Um Conto de Natal. Os fantasmas de Bruce Wayne são elementos traumáticos de sua vida. O primeiro deles apresenta-se na primeira parte de Batman e Filho e é retomado nesta aventura: um Batman que utiliza armas de fogo para matar, símbolo que não só representa a morte de seus pais, mas também a mudança da filosofia da personagem, a de nunca utilizar armas fatais. Em seguida, o policial truculento com o uniforme meio Batman meio Bane dialoga com A Queda do Morcego. A primeira parte termina com uma cena semelhante, com Batman agonizando no chão após levar um chute nas costas. Em Casos Inexplicáveis, um Wayne alucinado e acamado vive um pesadelo e menciona os casos não solucionados durante sua carreira. Trata-se de outra retomada do roteirista a uma série de histórias antigas do Batman que não se encaixam mais em sua cronologia por serem diferentes demais do habitual. Tais narrativas foram a base para compor A Luva Negra. Mais um mistério que Morrison deixa para os fãs (um compilado com os casos citados também foram lançados pela editora).

    Por fim, Belém é uma história sobre um futuro apocalíptico. Na edição original, foi publicada no número 666 de Batman e apresenta Damian assumindo o manto do pai, modificando a filosofia de Batman ao tornar-se um herói que mata os vilões, elemento que evidencia o terceiro temor do Morcego, o de um futuro em que estará morto e seus sucessores não seguirão a base moral rígida de sua carreira. Este argumento será utilizado em referências futuras, demonstrando que, como sempre, a composição de uma história de Grant Morrison nunca possui o objetivo de ser uma mera leitura, mas também de um jogo de pistas e inferências que somente o bom leitor poderá elucidá-las por completo.

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  • Resenha | Batman & The Spirit

    Resenha | Batman & The Spirit

    Batman - Spirit

    Criado pelo revolucionário Will Eisner, o herói The Spirit surgiu na década de 40 em um supletivo dominical dedicado aos quadrinhos. Desde então, tornou-se uma das criações icônicas do mestre e ainda lembrada pelo público contemporâneo, que, mesmo sem ser uma testemunha ocular do sucesso da personagem, reconhece a criação mascarada que traja sobretudo e uma gravata, uma referência noir e adulta, inédita para a época.

    Em 2007, a DC Comics adquiriu os direitos da personagem e coube ao roteirista Jeph Loeb apresentá-la a um novo público leitor. Desenhado por Darwyn Cooke, responsável integralmente por doze edições seguintes do herói, este crossover utiliza um dos medalhões do estúdio como destaque para apresentar um novo antigo personagem que possui semelhanças com o Homem-Morcego. Ambos são detetives que utilizam o mistério e a teatralidade como estilo para esconder a origem e o alterego, atuam em uma cidade específica e têm como amigo um comissário da polícia.

    A trama de Convenção do Crime apresenta a amizade entre Gordon e Dolan, relembrando a primeira vez em que Spirit e Batman se encontraram para evitar um ataque de um grande grupo de vilões. O argumento narrativo é básico e cria paralelos entre as personagens de cada universo como modo de interação. Dessa maneira, Gordon e Dolan são convidados para uma convenção policial em comum e, ao mesmo tempo, seduzidos por mulheres fatais, P’Gell, no caso de Gordon, e Pamela Islay formando um par com Dolan. Os heróis são atraídos pelo grupo vilanesco ao mesmo local para serem exterminados. Após um desconforto inicial, e a descrença por parte de Spirit da real existência do Homem-Morcego, a dupla forma uma equipe.

    A história não se desenvolve além de uma aventura de apresentação. O roteiro de Loeb não se situa nem em sua fase elogiada, nem em sua derrocada posterior. Permanece equilibrada e agrada ao demonstrar as diferenças operacionais entre as personagens. Por outro lado, o traço de Cooke, voltado a um estilo mais cartunesco e, assim, fora dos padrões mais realistas de muitos desenhistas atuais, é um primoroso acerto. Completa com estilo a personagem de Spirit e, longe do realismo do Morcego, demonstra-se funcional pela aventura e as doses de humor que ainda evidenciam traços de um estilo noir.

    Torna-se visível que utilizar Batman como uma figura de destaque – a trama tem também uma aparição-relâmpago  de Superman – funciona para situar o herói de Eisner e mostrar ao público que  as personagens habitam um mesmo universo. Como ponto de partida e uma carta de apresentação, a história é funcional. Porém, a fase seguinte apresentada por Cooke é composta com um apuro tão preciso que transforma este crossover entre grandes personagens em uma sombra quase insignificante.

  • VortCast 29 | Daytripper

    VortCast 29 | Daytripper

    Bem-vindos à bordo. Nesta edição, Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Filipe Pereira e Thiago “Coração Valente” Augusto (@tdmundomente) recebem Luis Garavello (@luisgaravello), do Quadrim e Delfin (@DelReyDelfin), do Terra Zero e Ninho do Coruja, dão sua contribuição para a Iniciativa Vertigo e se reúnem para comentar a respeito do quadrinho Daytripper, de Gabriel Bá e Fábio Moon.

    Duração: 109 mins.
    Edição: Rafael Moreira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner: Rafael Moreira

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  • Resenha | Lex Luthor: Homem de Aço

    Resenha | Lex Luthor: Homem de Aço

    lee-bermejo-lex-luthor-1Lançado em 2004, em formato de mini-série, Lex Luthor: Homem de Aço mostra a situação de Metropolis sobre os olhos do magnata careca. A arte de Lee Bermejo é bastante peculiar, aliada às cores de Dave Stewart, que por sua vez dão um tom de pintura às páginas. Os personagens tem seus rostos marcados – até os bebês tem rugas – e a face do kriptoniano é feita de forma escura, demonstrando graficamente o quanto ele é “ruim” aos olhos do seu inimigo.

    A intenção de Bryan Azzarello é legitimar os argumentos de Lex contra o Escoteiro, tentando mostrar que nem todas as suas convicções são baseadas na paranoia. O “vilão” olha para ele como um obstáculo ao homem comum, enxerga suas ações como freio a capacidade humana. Luthor é um personagem pouco maniqueísta e que não se prende a valores morais baratos, seus crimes são validados com o velho argumento de que os fins justificam os meios.

    Ventila-se a possibilidade de que o roteiro de David Goyer em Man of Steel 2 seja influenciado por esta HQ, em especial o conluio entre ele e Bruce Wayne, onde o foco seria na cobrança as consequências dos atos do último filho de Krypton. O fato pode ser emulado e encaixaria bem no roteiro se a sutileza e a reticência do vigilante de Gotham for reproduzida como em sua essência, mas qualquer coisa além disso é pura especulação.

    O hostil milionário põe em seu discurso inúmeras referências aos grandes feitos do homem, validando a ação do sujeito sem poderes em detrimento dos feitos super-heroicos. Ele fala tudo isso para logo depois apresentar Hope, um protótipo feminino quase onipotente, que viria para preencher o ideal do ser humano com habilidades perto do Divino, mas idealizado por alguém de “dentro”. Curioso como ele se isola e se torna cínico, mesmo para atributos tão quentes aos olhos humanos como a sedução e o desejo carnal, a não ser quando tais tentações partem do objeto feito por seu próprio imaginário.

    Hope é de Metropolis, nascida e criada e só tem olhos para a cidade. Ganha notoriedade e fama instantaneamente, o que incomoda o jornalista Clark Kent, e o leva a fazer duras críticas a sua conduta. Seu código ético é inspirado no de Lex Luthor, e sua punição ao mal feitor que assassinou dezenas de policiais de forma impensada – um demente Homem dos Brinquedos – é prova disso, pois ela o larga esperando seu fim derradeiro e o vilão é salvo pelo Alienígena de capa. No fim das contas, Hope é fantasticamente intangível, e por isso irreal, é como uma máquina que põe para fora os desejos e forma de pensar de Lex, mas que ainda assim é mecânica, e distante da realidade e pensamento humano, assim como o kryptoniano que o protagonista tanto odeia.

    A fala final de Lex escancara em forma de desabafo – mas sem perder a classe – tudo o que o seu Nêmesis representa para ele e para a humanidade, claro, sob sua ótica distorcida. O homem comum assume que sozinho é impotente diante de tal poder, mas se apega a esperança de que com seus semelhantes ele conseguirá a vitória. A esperança é algo impresso no caráter do Homem, e enquanto ele viver, ela viverá também. Azzarello consegue resgatar grande parte da grandiosidade do personagem mesmo sem ignorar suas facetas pouco fáceis de lidar, como a do cientista louco, ao contrário, o autor dá um novo sentido para isso, tornando-o crível e até empático.

  • Resenha | Conan: A Filha do Gigante de Gelo e À Mercê dos Hiperbóreos

    Resenha | Conan: A Filha do Gigante de Gelo e À Mercê dos Hiperbóreos

    conan-a-filha-do-gigante-de-gelo

    A Mythos Editora já há algum tempo vem publicando materiais recentes envolvendo o Gigante de Bronze, o mais atual deles é o encadernado que reúne os arcos A Filha do Gigante de Gelo e À Mercê dos Hiperbóreos, com roteiro de Kurt Busiek, arte de Cary Nord e Thomas Yeates, além do premiado trabalho de cores de Dave Stewart. (mais…)