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  • Crítica | Sem Remorso

    Crítica | Sem Remorso

    Criado por Tom Clancy, o Ryanverse já foi adaptado para diversas mídias. Tudo começou com A Caçada ao Outubro Vermelho, filme que adaptou o livro homônimo que tinha o analista da CIA, Jack Ryan, como protagonista. Desde então, várias outras adaptações de livros para o audiovisual tem o personagem como central em suas histórias — recentemente um seriado do personagem chegou ao Amazon Prime Video.

    Ocorre que, nos livros, o escritor criou um universo muito rico com vários personagens interessantes que ganharam suas histórias próprias, tais como o esquadrão Rainbow Six (adaptado para uma longeva e bem sucedida série de games) e agora John Kelly, personagem de apoio de vários livros com Jack Ryan.

    Não é exagero dizer que Kelly é uma espécie de super soldado, pois nos livros ele é sempre mostrado como alguém extremamente competente e habilidoso. Isso o torna um dos personagens mais importantes que habitam o Ryanverse, presença recorrente nas obras literárias, tendo desenvolvido uma grande amizade com Jack Ryan à medida que vão trabalhando juntos. Devido a isso, Clancy detalhou sua origem no livro homônimo a esta adaptação, além de colocá-lo como personagem central em vários outros da linha principal do seu universo compartilhado, além de spinoffs, tais como Rainbow Six e os livros protagonizados por Jack Ryan Jr. Nos cinemas, antes de Michael B. Jordan encarnar o personagem, Kelly foi interpretado por Willem Dafoe em Perigo Real e Imediato, último filme da trilogia iniciada em A Caçada ao Outubro Vermelho e por Liev Schreiber no fracassado reboot do ano de 2001, A Soma de Todos os Medos.

    Na trama, após voltar de uma missão de resgate que quase terminou em desastre, Kelly tem sua casa invadida por um grupo de assassinos que mata a sua esposa e o deixa seriamente ferido. Acusado pela morte dela e envolvido em uma conspiração que vai aos altos escalões governamentais, Kelly parte em uma jornada violenta para descobrir quem matou sua esposa e expor toda a trama conspiratória.

    Roteirizado por Taylor Sheridan (A Qualquer Custo e Terra Selvagem) e Will Staples, e dirigido por Stefano Sollima (Sicario: Dia do Soldado), Sem Remorso difere dos filmes protagonizados por Jack Ryan na abordagem. Aqui o tom é muito mais pessoal, com todos os eventos gravitando em torno do protagonista. Mesmo em Jogos Patrióticos, filme estrelado por Harrison Ford em que Ryan se torna alvo da vingança de um terrorista irlandês, os eventos que se desenrolam dependem de outros aspectos da trama, desde a burocracia da CIA ao comportamento dos seus chefes. Aqui, a dinâmica é inversa: Kelly é a força motriz do filme e o seu entorno reage ao seu comportamento, tomando as ações a partir do que ele faz, fazendo a narrativa ser bem mais direta.

    Jordan demonstra mais uma vez ser um dos grandes atores da atualidade. Sua atuação confere profundidade emocional ao protagonista, evitando que ele seja somente uma máquina perfeita de matar. O ator é plenamente capaz de segurar um filme sozinho, pois une competência e carisma. Some-se isso à boa direção de Sollima, que consegue criar bons momentos de ação e tensão, tais como a fuga do prédio cercado, a sequência inicial de infiltração e o interrogatório onde Kelly incendeia um carro para conseguir informações. Além disso, nas sequências mais “burocráticas” que mostram os núcleos políticos e corporativos do filme, o diretor encadeia bem os eventos, deixando claro para o espectador o que está ocorrendo.

    Ainda que não seja um filme memorável, Sem Remorso é um eficiente thriller de ação com um bom roteiro de  Sheridan, direção segura de Sollima e uma ótima atuação de Jordan. Boa diversão e um bom ponto de partida para uma nova franquia.

  • Crítica | Sicário: Dia do Soldado

    Crítica | Sicário: Dia do Soldado

    Sequências normalmente costumar ser filmes que tentam se valer da fórmula de seu antecessor exagerando ainda mais nos quesitos que antes deram certo. Sicário: Dia do Soldado tem um pouco disso, ainda que tenha uma coragem maior que Sicário: Terra de Ninguém, ao se assumir como um filme de ação sem grandes pretensões, de certa forma reprisando o exercício que já tinha ocorrido com Círculo de Fogo: A Revolta e Jurassic World: Reino Ameaçado, ainda que ambos tenham tido resultados diferentes em níveis de qualidade.

    Na direção, Dennis Villeneuve dá lugar ao italiano Stefano Sollima, mais conhecido por ser filho de Sergio Sollima, antigo diretor de filmes de western spaghetti, como O Dia da Desforra. Sua carreira passou a chamar mais atenção após a direção de alguns shows de televisão, cuja abordagem tem como ponto importante a violência – é o caso de Gomorra e Suburra. Enquanto o primeiro roteiro de Taylor Sheridan dirigido por Villeneuve tinha uma certa sutileza e discrição em muitos pontos, Dia do Soldado é violentíssimo.

    O longa começa mostrando o cotidiano do personagem Matt Graver, um agente do governo vivido por Josh Brolin que nesse início ostenta uma barba parecida com a que Jeff Bridges geralmente usa. Logo ele tira a pelugem do rosto, pois deveria conversar com os membros do governo americano, liderados por James Riley, feito por Mathew Modine em uma das suas mais caricatas interpretações nos últimos anos. A conversa, mega-expositiva, mostra que Graver é um dos sujeitos que suja as mãos pelo governo dos EUA, e isso seria uma boa denúncia, caso não tivesse uma abordagem extremamente maniqueísta, evidentemente.

    Mas, esse maniqueísmo não é exatamente um defeito, pois Sollima faz questão de mostrar que em seu entendimento, a fábula que Sheridan criou é somente um produto de ação, como os longas estrelados no passado por Sylvester Stallone e Arnold Schwarzenegger, por exemplo, mas com um trabalho estético e técnico mais apurado. A fotografia do polonês Dariusz Wolski (Perdido em Marte, Prometheus, Sweeney Todd) não tenta imitar Roger Deakins, e mesmo sendo bem diferente tem seus momentos de inspiração. Enquanto isso, a música de Hildur Guðnadóttir ajuda a estabelecer a aura de suspense, embora muitas vezes soe intrusiva.

    O subtítulo Dia de Soldado é justificado, uma vez que o personagem principal é Alejandro, vivido por Benicio Del Toro, dessa vez sem ter que lidar com um personagem vazio e desnecessário como foi Emily Blunt no primeiro. Sua persona segue misteriosa – apesar de citar um pouco de seu passado – e seu código moral inabalável. Mesmo com poucas palavras, se nota seus limites éticos, fato que o faz parecer até um pouco mais heroico.

    A forma como a missão envolvendo o rapto do filho de um inimigo do governo serve para mostrar de maneira didática o quão predatória pode ser a tática comum dos que servem o governo norte-americano, que consideram inimigos como terroristas, ainda que seus métodos sejam muito parecidos. Sollima não consegue trazer à tona grandes discussões ideológicas e morais, mas compensa isso com cenas de ação viscerais e sufocantes, fazendo de Sicário: Dia do Soldado um objeto mais honesto que seu antecessor.

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  • Crítica | Terra Selvagem

    Crítica | Terra Selvagem

    Taylor Sheridan teve uma carreira de pouco expressão como ator. Talvez ele seja lembrado por seu xerife David Hale na série Sons of Anarchy. Entretanto, como roteirista, Sheridan vem tendo uma carreira de grande sucesso. Terra Selvagem é seu segundo filme a estrear no circuito nacional no ano de 2017 – o primeiro foi o sensacional A Qualquer Custo que lhe uma indicação ao 02 de melhor roteiro – e o seu primeiro filme como diretor. Mais uma vez, Sheridan desempenha um grande trabalho como roteirista e mostra que é capaz de ser um grande diretor.

    Na trama, uma jovem agente do FBI é designada para investigar a misteriosa morte de uma jovem dentro da reserva indígena Wind River, localizada no Wyoming. A vítima possui sinais de violência sexual, mas nenhum outro que possa indicar a sua causa mortis. Devido à natureza hostil do lugar, a agente solicita a ajuda de um rastreador radicado no local, uma vez que o local é extremamente frio e isolado. Entretanto, ao passo que a investigação se aprofunda, a dupla começa a perceber que as implicações desse assassinato são muito maiores do que imaginavam.

    O agora também diretor Taylor Sheridan bebe muito da fonte de David Mackenzie e Denis Villeneuve, diretores de A Qualquer Custo e Sicario (filmes baseados em roteiros seus), o que significa longos planos que delineam as gélidas e desoladoras paisagens da reserva Wind River.  Ao passo que tudo se desenrola, novos elementos são introduzidos à trama. O que poderia vir a fazer o filme perder o rumo, vai o tornando cada vez mais intrigante, muito graças à mão firme do diretor e ao seu roteiro conciso. Interessante observar que os longos discursos explanativos, sempre presentes no cinema hollywoodiano, não tem lugar aqui. A história vai sendo contada sem que o espectador seja subestimado, com um desenvolvimento bem ágil, entremeado por algumas sequências tensas e eletrizantes.

    O roteiro trabalha com esmero as questões polêmicas e pertinentes a respeito da falta de estatística sobre mortes em reservas indígenas e, principalmente, da morte de mulheres indígenas. Tanto que a película é baseada em eventos reais. Porém, existe uma questão que é trabalhada de uma forma muito comovente e com uma sutileza difícil de ser encontrada: o luto. O personagem de Jeremy Renner é apresentado como um homem que sofreu algumas grandes perdas pessoais. Ao ser integrado à investigação, seu personagem funciona como fio condutor de vários eventos que decorrem a partir daí. Entretanto, ele é o elemento principal que ajuda na empatia do espectador com o que é apresentado em tela. Sua interação com o pai da moça morta, vivido pelo excelente Gil Birmingham (que trabalhou em A Qualquer Custo) rende os grandes momentos do filme, pois retratam dois homens enlutados cada qual à sua maneira, destruídos pela vida tentando se apoiar da maneira que for possível no momento. Outro ponto bem interessante são os diálogos breves sobre a perda dos valores culturais dos indígenas. Ainda no concernente às atuações, Elisabeth Olsen entrega um grande trabalho como a agente novata e idealista do FBI destacada para a investigação e o veteraníssimo Graham Greene entrega a habitual competência como o xerife cético que deixou suas raízes indígenas, mas que ainda possui grande consideração pelos seus pares.

    Em suma, Terra Selvagem é mais um espetacular trabalho do talentoso roteirista Taylor Sheridan e que também demonstra seu  potencial para consolidar uma bela carreira como um grande diretor.

    https://www.youtube.com/watch?v=CVElCdD4rtw

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  • Crítica | Sicário: Terra de Ninguém

    Crítica | Sicário: Terra de Ninguém

    sicario

    O talentoso diretor canadense Denis Villeneuve retorna ao circuito estadunidense após executar seu belo O Homem Duplicado em sua terra, para executar o badalado Sicario: Terra de Ninguém, que explora um drama policial que tem seu protagonista dividido entre uma mulher e um homem latino, o que deveria ser o ponto de partida para uma trama equilibrada em relação às minorias, fato que não ocorre.

    O roteiro do iniciante Taylor Sheridan (um ator de series televisivas, como Sons of Anarchy, Veronica Mars e dois spin offs de CSI) explora a história de Kate Macer (Emily Blunt), uma agente do FBI que já no início se vê em uma situação de calamidade, ao encontrar os espólios de um cartel latino violentíssimo, que se escondia nos compartimentos de uma casa entre corpos putrefatos de seus inimigos.

    A trilha sonora, apesar de interessante, acaba por cortar a maior dose dos suspenses que se postam diante de Kate. Gradativamente, novos chamados à aventura são feitos a agente, que deixa sua confortável posição de chefia para acompanhar Alejandro (Benicio Del Toro) e Matt Graver (Josh Brolin). Os dois personagens masculinos exercem uma opressão emocional sobre ela, fazendo ficar ainda mais evidentes os descuidos da moça com a sua aparência, aspecto que serve de signo para o estado depressivo em que ela se encontra.

    No entanto, a postura debochada de Graver é completamente diferente do comportamento misterioso de Alejandro, que se enquadra no mesmo estereótipo dos heróis de western spaghetti: homem duro, cujo passado misterioso o credencia para ser o superior em qualquer aventura. Não fosse a entrega de Del Toro, tal repetição de bordão dramatúrgico seria um erro, mas não o é, especialmente se comparado a todo o resto. As motivações das personagens são mal construídas, tão rasas que não possuem credibilidade em qualquer de suas atitudes por serem somente reflexos de um péssimo clichê.

    A construção de ideário do que seria Juárez, uma província mexicana onde a violência explícita é a palavra definitiva, esbarra em mais uma retratação xenófoba por parte do script tipicamente hollywoodiano. Até as boas cenas de ação e a bela fotografia de Roger Deakins (que já havia trabalhado com Villeneuve em Os Suspeitos) são diluídas graças à desimportância que ocorre após tantas frases de efeito e repetições de padrões visuais toscos, como gângsteres tatuados, que têm na crueldade seu norte, conceito idêntico ao dos piores seriados policiais dos anos 1990.

    Nem mesmo a mudança tática entre o esquadrão do começo do filme e o novo modo de combate apresentado pelos agentes especiais serve de alento. A tentativa de gerar signos visuais que acarretem em situações de real discussão de ambiguidade esbarra nas péssimas construções de relacionamento, que primam pela insipidez, exceto no caso de Alejandro – exatamente por não se revelar quase nada de seu repertório.

    Apesar de tentar mostrar um universo enbrutecido, Sicario peca por não saber escolher entre a vontade de Kate em alcançar a onisciência e o cinismo caricato de Graver e seus homens, ao abordar um mundo sem esperanças. O final assume de vez a má construção do texto, entregando o protagonismo ao único personagem que não está mal justificado em tela, aludindo curiosamente a uma curiosa semelhança deste desfecho com o videogame que dá continuidade aos fatos ocorridos no jogo Scarface: The World is Yours, que punha Tony Montana de novo em ação, ainda que Del Toro seja muito menos histriônico que o traficante cubano. Curioso que um desfecho semelhante ao realizado em outra mídia seja um dos melhores momentos de um filme cujo potencial era imenso, mas que se perde em meio a um argumento descabido e desequilibrado, que torna banais até temas graves.