Tag: Bruce Lee

  • Crítica | A Origem do Dragão

    Crítica | A Origem do Dragão

    Brucexploitation era o nome utilizado para a exaustiva exposição do artista marcial Bruce Lee em Hollywood. Após um sucesso estrondoso no cinema de Hong Kong, Lee ganhou as telas dos Estados Unidos, aumentando em muito sua fama, já que um dos seus objetivos sempre foi ter notoriedade em seu país de origem (Lee nasceu em São Francisco). Já haviam algumas obras que tratavam da biografia do lutador, desde Dragão – A História de Bruce Lee de Rob Cohen, em 1993, até a novela chinesa The Legend of Bruce Lee, de 2008, com cinqüenta episódios.

    As premissas de ambas se perde em meio a execução, cada uma com seus próprios problemas e apesar de todos os avisos anteriores, George Nolfi, realizador de Agentes do Destino aceitou a incumbência de dar sua versão a tal lenda. Sua escolha para o papel principal foi Philip NG, que está lá basicamente para desenvolver uma rivalidade com o mestre Jack Wong Man (Yu Xia) em uma luta histórica que ocorreu no começo dos anos sessenta. O filme se dedica tão e somente a esse evento, o que faz perguntar o motivo da alcunha original de The Birth of the Dragon, já que não se investiga a gênese da lenda por trás do Jeet Kune Do.

    Bruce é arrogante e cheio de si, os 95 minutos servem para exemplificar o quanto ele é infantil e pueril, e o seu adversário sábio e ponderado. Se a tentativa do longa era estabelecer uma gênese para o ícone este falha miseravelmente, já que a face mostrada é mais patética e enfadonha até em comparação com a péssima novela asiática.

    As lutas são anti-climáticas e há poucas cenas interessantes em A Origem do Dragão, sequer os cenários ou elementos de cena são bem construídos. Nolfi não consegue reprisar sequer os bons momentos que teve em seu filme anterior, dando à luz a um filme sem alma e espírito, um objeto que pesa a mão no fator nostálgico e não apresenta sequer uma história biográfica que cause qualquer interesse no espectador.

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  • Top 10 – Especial Dia das Crianças

    Top 10 – Especial Dia das Crianças

    Conta Comigo - destaque - top 10 - dia das crianças

    O escritor tcheco Milan Kundera afirmou, em um de seus ensaios, que o passado é equilibrado por duas forças: o esquecimento, responsável por apagar os acontecimentos; e a força da memória que os transforma. Não à toa, o passado nostálgico representa esta modificação da memória. Na infância e juventude, período de vida compartilhado por todos, o passado é visto com um olhar transformador, muitas vezes melhorado pelas memórias que o deixam mais brilhante do que o tempo vivido.

    Em homenagem ao Dia das Crianças, nossa equipe se reuniu para uma lista que retorna à nossa infância e à nostalgia, relembrando filmes que marcaram nossa infância. Sem dúvida, filmes que marcam implicitamente nossa idade e a época oitentista na qual crescemos. A lista explora vertentes diferentes dos filmes oitentistas, um registro cinematográfico diferente do atual. Considerando produções juvenis ou voltadas para a família, é perceptível uma visão simultânea entre a juventude e o mundo adulto que nem sempre se molda a favor das crianças, com bandidos, tiros, problemas, vícios e outros recursos que o cinema atual evita pela polêmica. Estranhamente transformando o universo juvenil dos filmes em um universo fictício e estéril sem nenhum conflito extremo.

    Seja pelo resgate da memória ou pelo registro de um cinema diferente do atual, nossa lista ressalta obras que estiveram em nosso imaginário precoce e, de alguma maneira, se transformaram em nós. Os leitores que quiserem colaborar com esta lista nostálgica, podem acrescentar seus filmes memorialísticos nos comentários.

    Boa leitura.

    Um Tira no Jardim Da Infância (Ivan Reitman, 1990) – Por David Matheus Nunes

    Um Tira No Jardim da Infância

    Um Tira No Jardim de Infância é mais um dos filmes bizarros do diretor eslovaco Ivan Reitman. Responsável por pérolas como Os Caça-Fantasmas (as duas produções) e Irmãos Gêmeos, Reitman, de forma competente, coloca o brutamonte e astro Arnold Schwarzenegger – que até ali já tinha sido Conan, T-800, Dutch e Douglas Quaid – para dividir a tela com as mais variadas crianças, quando seu personagem, John Kimble, no encalço de um traficante de drogas, se infiltra como professor substituto numa escola de ensino infantil. Acontece que Kimble não tem nenhuma prática com crianças, mas se vê obrigado a deixar de ser o durão que sempre foi em prol do bem estar dos pequenos. O destaque fica para as várias situações constrangedoras que Kimble precisa passar junto das crianças, o que rende boas risadas. Apenas a título de curiosidade, a maioria das pessoas conhece o filme porque o viram pela televisão. A versão original legendada chega a ser bastante diferente no que diz respeito ao tom do filme (mais sério do que aparenta), além de ter algumas cenas de violência que foram cortadas na versão para a TV.

    Tuff Turf – O Rebelde (Fritz Kiersch, 1985) – Por Halan Everson

    Tuff Turf

    Com a pior trilha sonora que um filme dos 80s pode ter, Tuff Turf – O Rebelde mostra que pra ser valente contra os arruaceiros do seu bairro você apenas precisa de uma bike veloz, Robert Downey Jr no elenco, muita garra e ser o futuro astro de uma das produções para TV mais interessantes do ano. Estrelado por James Spader, essa bela obra do cinema acompanha um garoto novo no bairro e , assim como em qualquer bom faroeste, não é só questão de chegar, mas sim marcar território e mostrar que é o cara que vai mudar a parada para os fracos e oprimidos. Sem querer estragar para os interessados, ele usa muito bem a fórmula do “estrangeiro na cidade que vai conseguindo criar muitos problemas pra si”, algo que era mais comum em westerns, transpondo para um imaginário adolescente. Em parte, podemos pensar que pelo menos os protagonistas fazem jus a assistir à obra pela qualidade de seus trabalhos. Não são atuações geniais, mas nota-se que todos estão confortáveis com roupas berrantes, e muita trilha sonora sintetizada com teclado.
    Nota do autor: falei mal da trilha e a música-tema não desgruda mais da cabeça enquanto escrevo.

    Conta Comigo (Rob Reiner, 1986) – Por Flávio Vieira

    Conta Comigo - Stand By Me
    Baseado em um conto de Stephen King quase autobiográfico, Conta Comigo não trata apenas da amizade entre essas quatro crianças, mas a importância do meio onde elas estão inseridas, cada um em seus próprios anseios, incompreensões e rejeições, sejam elas familiares ou da própria sociedade. Rob Reiner, diretor do longa, não poupa seus espectadores, Conta Comigo, diferente de outros exemplares da época, não é leve ou abusa do sentimentalismo e da psicologia pop “breakfast club”, muito pelo contrário, o filme toca em temas delicados, e ao longo da trama amadurecemos com essas personagens, tudo isso no meio de desabafo, medo e, claro, muito companheirismo. “Nunca mais tive amigos como aqueles que tive aos 12 anos. Meu deus, quem é que tem?”

    Os Goonies (Richard Donner, 1985) – Por Karina Audi

    os goonies

    Dirigido por Richard Donner, Os Goonies é uma das grandes obras da infância que até hoje se mantém na memória de grande parte do público. O filme, que completou 30 anos em 2015, narra a história de uma turma de amigos (Mikey e seu irmão Brand; Gordo; Bocão; Dado; Andy e Stef), que, muito unidos, temem a separação do grupo com a mudança da casa dos irmãos devido a uma dívida. Ao encontrar um mapa que remete a um tesouro escondido há séculos, vão em busca das riquezas perdidas para evitar o fatídico despejo. Com roteiro de Chris Columbus, inspirado em uma história de Steven Spielberg, Os Goonies tornou-se um clássico cult devido a linguagem universal, aos elementos emblemáticos que agradam a qualquer criança (piratas, navios, caça ao tesouro, a luta entre mocinho e bandido) e ao carisma de seus intérpretes. A obra fala de descobertas, amizade, família e amor de uma forma tão cativante que é impossível relembrar a infância sem se esquecer dela.

    Retroceder Nunca, Render-se Jamais (Corey Yuen, 1986) – Por Thiago Augusto Corrêa

    Retrocer Nunca, Rende-se Jamais

    Explorando de maneira familiar um dos desejos presentes do imaginário infantil, de se tornar um grande lutador, Retroceder Nunca, Render-se Jamais é um tradicional filme juvenil com uma mensagem simples como fio condutor. Fã de Bruce Lee, o jovem Jason Stillwell treina arte marciais e deseja uma revanche contra um grupo que agrediu seu pai. Com a ajuda do espírito de Lee, o jovem treina e anseia por uma vingança contra Ivan Krushensky, o temido Russo. Antes de ser alcunhado como Mestre, Jean-Claude Van Damme estreou nos cinemas como este vilão caricato sem muita expressão mas com forte habilidade de luta. O tradicional maniqueísmo oitentista com vilões temíveis e heróis sempre carismáticos provocam um dualismo divertido nesta produção. Além do uso do conceito fantástico para fazer de Bruce Lee um mentor espiritual, pontuando esta história no imaginário de todo jovem que admirava o lutador e sonhava em se tornar um ninja no estilo filme americano. E, claro, imperdível por ser a estreia do grande Mestre nas telas com seu famoso espacate.

    Os Mestres do Universo (Gary Goddard, 1987) – Por David Matheus Nunes

    Mestres do Universo

    Aproveitando o sucesso do desenho do He-Man na metade dos anos 80, o único filme do diretor Gary Goddard foi um prato cheio para as crianças da época, que puderam ver uma das primeiras adaptações para o cinema de uma animação de sucesso. E coube a Dolph Lundgren o fardo de viver o príncipe de Eternia. Fardo porque, analisando e comparando-o com a animação, podemos perceber que apenas alguns personagens foram aproveitados e só. Pouco da mitologia do He-Man foi usado. O protagonista está lá apenas como He-Man. Em nenhum momento vemos o príncipe Adam, muito menos o Pacato/Gato Guerreiro. O simpático Gorpo foi substituído por um irritante goblin e o que sobrou, é justamente o destaque. Lundgren está bem caracterizado como He-Man e o momento em que profere a clássica frase “eu tenho a força”, empunhando sua espada, ainda é emocionante. O sábio Mentor e a Teela estão lá, mas quem rouba a cena é o time de vilões, composto pelos horríveis Homem-Fera, Saurod (uma versão do Lagartauro), Blade, Karg, a bela Maligna e, claro, o Esqueleto, cuja caracterização é sensacional; além de imponente, o cajado é representado pela cabeça de um bode. A versão dublada do filme é recomendada, uma vez que todos os dubladores do desenho estão lá.

    Gotcha! Uma Arma do Barulho (Jeff Kanew, 1985) – Por Halan Everson

    gotcha

    Com um elenco de desconhecidos, pelo que me recorre à mente, Gotcha! Uma Arma do Barulho acompanha a vida de um jovem azarado com as mulheres vivido por Jonathan, interpretado por Anthony Edwards (A Vingança dos Nerds) que resolve visitar Paris com seu melhor amigo para recuperar os ânimos – por que não? O que pode dar errado?. O que acontece é uma trama de espionagem internacional, com níveis de perigo à la James Bond. Fugas, perseguições, cenas de tiroteio e romance, tudo isso acontecendo com um adolescente que só queria se dar bem com as mulheres, passando a impressão que é para ser engraçado. Algumas cenas e uso de trilha sonora passam esse clima divertido e descontraído, mas não é muito difícil parar de levar a sério, principalmente no dubladão. Assim como em Tuff Turf nesse filme também temos uma péssima trilha sonora sintetizada com teclados e uma música tema que consegue ser menos grudenta que a de Tuff Turf. Um detalhe muito curioso é que Jonathan em uma determinada parte do filme sempre fala o “Gotcha” na versão dublada, e sempre pensei que era uma gafe da dublagem, mas não é… É ruim assim mesmo.

    Deu a Louca nos Monstros (Fred Dekker, 1987) – Por Flávio Vieira

    Deu a Louca Nos Monstros

    Fred Dekker, mais conhecido até então pelo seu trabalho de direção à frente do competente A Noite dos Arrepios, se reuniu com o então estreante Shane Black (Beijos e Tiros, Homem de Ferro 3) para escrever Deu A Louca nos Monstros, de 1987. O filme é um belo exemplar dos anos 80, com toda a temática aventuresca juvenil típica dos filmes dessa década. Além disso o longa-metragem é uma grande homenagem aos filmes de monstros clássicos da Universal. Repleto de efeitos práticos e um roteiro no mínimo curioso que usava uma desculpa qualquer para realizar um crossover de diversos monstros clássicos (Drácula, Frankenstein, Monstro do Pântano, Lobisomem e uma Múmia), Deu a Louca nos Monstros ainda passa longe do politicamente correto dos dias de hoje, já que é bastante comum acompanharmos crianças fumando, discutindo sobre virgindade, praticando magia negra ou mesmo utilizando armas. Uma bela homenagem ao universo de horror clássico e que ainda arruma tempo para aplicar pequenas camadas ao que em tese seria apenas um filme infantil despretensioso.

    Esqueceram de Mim (Chris Columbus, 1990) – Por Karina Audi

    Esqueceram de Mim - Home Alone

    Segundo filme de Chris Columbus, hoje praticamente ignorado pela crítica, Esqueceram de Mim foi um grande sucesso no início da década de 1990 que alavancou o sucesso de Macaulay Culkin, o qual interpreta Kevin, o garoto esquecido em casa pela família quando em viagem para a Europa no Natal. O filme foi escolhido para integrar esta lista não pelas qualidades técnicas, que fogem, por exemplo, da criatividade do diretor Columbus vista em outras produções anteriores como roteirista (Gremlins, O Enigma da Pirâmide e Os Goonies); mas sim porque é uma produção popular que simpatizou os espectadores e traduziu uma época do cinema familiar oitentista. O filme trabalha bem com o imaginário infantil de uma criança que se vê sozinha e precisa agir com maturidade sem os pais, algo que Kevin só descobre no final, quando acredita que o seu desejo, de nunca mais ver seus parentes, era apenas uma vontade infantil. Ao longo de sua jornada, Kevin luta com bandidos, supera o preconceito contra seu vizinho Marley e percebe-se um menino bom, seguindo a proposta de finais felizes dos filmes familiares natalinos. Sob uma trilha sonora do sempre genial John Williams, Esqueceram de Mim marcou época de muitos jovens, que hoje já não se veem sozinhos em casa tomando sorvete escondidos e preparando armadilhas para possíveis malfeitores.

    E.T. – O Extraterrestre (Steven Spielberg, 1982) – Por Thiago Augusto Corrêa

    Et - Extraterrestre

    Após a primeira aventura de Indiana Jones, Steven Spielberg dirigiu esta produção direcionada para o âmago familiar. Dando voz às crianças como personagens principais com direito a filmá-las em ângulos proporcionais, mais baixos do que os tradicionais, destacando-as nas cenas, E. T. – O Extraterrestre explora outra vertente juvenil focada na amizade e no mistério de seres de outros planetas. A fantasia é equilibrada tanto no encantamento da relação entre Elliott e o extraterrestre como no choque de realidade adulta quando o visitante é aprisionado pelo governo e tratado como experiência. Transitando nestes temas, a obra é sensível e evoca sentimento primordiais como a construção da amizade e da lealdade, a compreensão das diferenças e, ao mesmo tempo, demonstra a selvageria do mundo adulto em paralelo com a pureza infantil, um tema sempre presente nas obras do diretor.

  • Crítica | O Grande Mestre

    Crítica | O Grande Mestre

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    Filmes de luta são bacanas. Para muitos, irresistíveis, à beira da inspiração de se matricular na escolinha de caratê perto de casa para quebrar o cotovelo no primeiro golpe decente ou queda latente. Não é fácil ser Bruce Lee; mais árdua ainda é a tarefa  de seu próprio tutor. Um universo atraente, cujas habilidades podem ser a maior maldição imposta a um ser em constante luta— literalmente ou não  para se manter humano, rumo à sobrevivência impossível de se alcançar, uma plenitude linear de uma existência tão imprevisível. O Grande Mestre, mistura de O Tigre e o Dragão e Kill Bill junto a um charmoso clima noir, não debate, mas escancara as portas da trajetória de um fantasma social — verdadeiro nômade que precisa provar seu valor a quem não ousa duvidar dele e, mesmo assim, busca o desequilíbrio do próximo para alcançar a tal plenitude pessoal. Focando esta analogia urbana, visto que nas cidades é essencial ser 100% competente o tempo todo, fica fácil — até demais — captar as intenções por trás do escopo da projeção, certeiro feito os socos e pontapés coreografados em belas danças regidas pela lendária coreógrafa de lutas Yuen Woo-ping. Odes à brutalidade humana, revestida aqui da mais bela poesia irônica entre dor e antídoto, os quais são mascarados por ritmo, planos cênicos sobrenaturais de absoluta beleza, além de sonoplastia magnífica.

    Mas a piscina é rasa, e quem quer dar um mergulho fica com metade da cabeça sem se molhar. Isso se deve à nova tendência dos filmes de ação que não justificam todo o seu apreço publicitário, que é, hoje em dia, apostar num drama no estilo “novelão mexicano”, reduzido ainda mais ao que se deve expandir, e que efeito especial algum substitui. Não que um ótimo cuidado na dramaturgia não combine com o oposto, afinal ambos se atraem, seja na arte, seja na vida. Contudo, O Grande Mestre e seu diretor Wong Kar-wai são frutos imediatos deste novo galho experimental, que ainda tem muito a se ramificar, mas que já dá sinais de que não deve ir muito longe.

    Caso o espectador já tenha dado uma espiada prévia nos grandes filmes de ação de Seijun Suzuki e Akira Kurosawa, duas lendas do cinema asiático, sabe que há razões para duvidar deste falso épico que transborda efeitos de câmera lenta, filtros de captura de imagem e diegética exagerada mesmo para espetáculos faraônicos deste calibre. Saber contar uma história em meio à ação é um dom muito respeitável. Vários são os elementos bem coordenados por Wong para orquestrar a produção, porém são emissores e derivados de um audiovisual oco e de um gosto de “quero mais” desagradável, que pode ser saciado pelo recente 13 Assassinos, de Takashi Miike, um Épico japonês da gema, com o devido É maiúsculo junto a tudo de bom que a tecnologia oferece atualmente.

    É curioso e muito mais do que isso: triste constatar a conduta dos cineastas não americanos em aceitar a “americanização”. Um palavrão feio e de consequências horríveis, como é o caso do filme de Wong, uma controvérsia nada acidental de um produto oriental que teima ser ocidental, e que perde sua identidade ao tentar se adaptar a outro DNA. Tal influência não remete ou faz bem à essência do material, que vende a alma, na vontade de reconhecimento, através da identificação com a forma frenética de se fazer o cinema típico dos Estados Unidos e do Reino Unido. Então, sem comparações e por efeito de causa, apenas: será possível imaginar um filme de Mizoguchi com uma edição ao estilo de Hitchcock? Depois de três conhaques e uma sessão dupla de O Grande Mestre, eu não duvido. É melhor nem tentar…

    Pois por tentar fazer o Yojimbo do século XXI, restou a vontade; ao tentar refilmar O Tigre e o Dragão, sobrou a ambição; de captar a genialidade de obras como A Vida de um Tatuado, ficou o ímpeto de uma criança perdida num tatame de caratê pela primeira vez, sem saber direito o que socar nem o porquê, pois cresceu vendo, por meio da televisão, filmes de luta, querendo brincar da mesma maneira. É preocupante que a crença sobre um visual arrebatador se torne motivo suficiente para um filme arrebatador, e que esta preocupação não seja mais uma exclusividade restrita à cegueira cultural promovida à exaustão por Hollywood: ela começa a se propagar, oficialmente, com O Grande Mestre, do outro lado do hemisfério. O fim está próximo ou o solstício de certas práticas centenárias apenas avança ao epitáfio em prol da soberania dos cadetes da tecnologia?