Tag: Carlos Lamarca

  • Crítica | Zuzu Angel

    Crítica | Zuzu Angel

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    A trilha sonora de Zuzu Angel começa com a eletrizante música Dê Um Rolê dos Novos Baianos, interpretada por Pedro Luís e a Parede junto a Roberta Sá. Após uma apresentação enérgica dos créditos iniciais, o filme de Sergio Rezende já se insere no escopo novelístico típico do longa. O drama baseado na história real da personagem título mostra uma mulher da elite brasileira que vê seu filho sendo capturado pelos militares.

    A estilista de classe média goza de uma influência grande da sociedade naquela época. Os detalhes de toda a questão envolvendo ela e seu filho Stuart Angel (Daniel Oliveira) são interessantes e um bom retrato dos martírios que a ditadura causava em seus opositores, mas fora alguns poucos momentos, a abordagem do filme é sensacionalista e pasteurizada, lembrando muito com Olga, de Jayme Monjardim outro filme que fez sucesso comercial em tempos recentes.

    As ligações entre Stuart e Carlos Lamarca fizeram com que Rezende trouxesse novamente Paulo Betti para representar o guerrilheiro, como ele havia feito com o filme Lamarca de 1994. É curioso porque o escopo de realidade forçada é reprisada neste filme, ainda que seja relativizada pela modernidade com que é conduzido o cinema. Quase todas as interações são extremamente artificiais e feitas sob uma ótica com linguagem bem mais televisiva do que cinematográfica.

    Patrícia Pillar tem um bom desempenho, como é esperado, mas a irrealidade do roteiro e da condução comprometem inclusive seu trabalho. As situações em que é posta com Stuart, seja na infância ou juventude dele são quase sempre exibidas de uma maneira forçada e nada natural. O filme carece de verossimilhança ou de qualquer intervenção mais enérgica por parte de seu realizador.

    Apesar de tratar um tema complicado o modo como o filme é realizado é bastante desequilibrado, confundindo momentos leves com pesados e registrando as torturas com uma complicada estilização, quase glamourizando os momentos de sofrimento. Ao final da exibição, Zuzu Angel soa pueril e até oportunista, por explorar um tema histórico em um um roteiro engessado, que suaviza uma história forte apresentando-a como se fosse algo genérico, apesar de tentar prestar reverências e homenagens.

  • Crítica | Em Busca de Iara

    Crítica | Em Busca de Iara

    Em Busca de Iara 1

    Todo o mistério a respeito da morte da psicóloga e ativista Iara Iavelberg é analisado no documentário de Flavio Frederico. Iniciando os relatos com uma reportagem de televisão, que acompanha a tentativa da família de exumar o corpo da moça, conclui-se que o falecimento de Iara não foi por suicídio, como as autoridades anunciaram. A tentativa foi fracassada, e a partir da narração da codiretora  – e sobrinha de Iara, que teve o sobrenome mudado para não atentar aos olhos do Regime Militar – Mariana Pamplona, claramente obcecada pela história de sua familiar, a obra explora a tradição religiosa judaica da família, mostrando como a biografada começou a se interessar pelo discurso libertário.

    Unida a outros jovens, Iara começa a viver na VPR – Vanguarda Popular Revolucionária, composta por estudantes, trabalhadores e militares. Iara também integraria o Polop (Organização Revolucionária Marxista Política Operária), e depois o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), todas organizações de extrema esquerda que tinham em comum a luta contra a ditadura. A sensação de pressa acometia Iara e todos os outros integrantes destes grupos, movidos pela possibilidade de não ter um futuro garantido, uma vez que os militares estavam no auge de suas ações de poder.

    Os depoentes relembram o quão diferente tornou-se a repressão após o AI-5, recrudescendo e torturando de modo muito mais intenso e emocional, fazendo do decreto um divisor de águas na vida política e comum do Brasil, afetando diretamente os militantes. Iara transitava nesses meios e convivia com guerrilheiros na clandestinidade, usando o nome de Mariana para desviar a atenção de possíveis perseguidores, uma vez que era comum a polícia ficar de tocaia.

    Em determinado ponto, a obra se dissipa em dois caminhos servindo como uma boa análise da biografia de Carlos Lamarca, desertor do exército brasileiro que ajudou a treinar um grande número de guerrilheiros. A câmera mostra um flagrante curioso, de que os “subversivos” militantes eram vistos como agentes do caos e um perigo para o status da família normativa, enquanto Lamarca era considerado um pária, um traidor das forças armadas que se debandou para o time inimigo.

    Os detalhes da execução de Iara são explorados ao máximo, especialmente no depoimento do amigo e também militante Cesar Benjamin, que foi um dos primeiros a ver o corpo da moça, executada e com um corte que ia do queixo até a cintura, centralizado entre os seios. Além dessa imagem demonstrar um sinal de profundo desrespeito com o preso, ainda demovia a ideia de suicídio, sendo somente este um dos gritantes sinais de que a versão oficial da morte de Iara por suicídio era, na verdade, uma farsa.

    A conclusão do filme não poderia ser mais simbólica: a segunda cerimônia de sepultamento de Iara, ministrada pelo religioso Henry Sobel, no ano de 2006, encerrando a memória da guerrilheira de modo emocional, seguindo a tônica presente em todo o filme. Em Busca de Iara consegue reunir depoimentos para montar um panorama de proporções pequenas, mas que não exclui argumentos contrários. O ponto alto da obra está em seu formato, bastante pessoal e carregado de emoção, fazendo da moça que buscam um personagem tão vivo quanto qualquer um dos que estão na produção ou na plateia do filme.