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  • Critica | 101 Dálmatas: O Filme

    Critica | 101 Dálmatas: O Filme

    Em 1996 chegava aos cinemas 101 Dálmatas: O Filme, versão do diretor Stephen Herek escrita por John Hughes para o clássico animado de 1961, 101 Dálmatas. A trama é bem diferente do filme dos anos sessenta, a começar pelo fato óbvio de que os animais aqui não falam, se comunicam através de latidos. A essência do filme é aproximadamente a mesma história, o cachorro macho Pongo vive com Roger Dearly, personagem de Jeff Daniels, um homem solitário, que trabalha desenvolvendo jogos de vídeo game.

    O filme não demora mais que cinco minutos para apresentar a vilã, a Cruella De Vil de Glenn Close, cuja persona é magnética e maléfica em perfeito equilíbrio. A personagem parece ter saído direto de um dos filmes do Homem Morcego, uma perfeita mistura de duas encarnações noventistas de seus vilões. Lembra um híbrido de Mulher-Gato de Batman: O Retorno com o Charada de Batman Eternamente, com uma atmosfera gélida e baseada em cores de tonalidades diferentes, o preto e o branco.

    A personagem é uma estilista e seu modo excêntrico de vida se reflete nos cenários vultuosos que ela usufrui, todos grandiosos. Em um desses cenários trabalha a designer Anita (Joely Richardson), também é apaixonada por cães. Obviamente o destino dela e do homem solitário se cruzariam, de maneira ainda mais atrapalhada que no clássico animado. Cruella é uma mulher estranha, de gostos bizarros, ama peles e não mede esforços para alcançar seus objetivos.

    As caras e bocas que Close faz lembram os antagonistas dos filmes de Tim Burton, como o Coringa de Jack Nicholson em Batman e Bettlejuice de Michael Keaton em Fantasmas se Divertem. Quando a câmera a acompanha o filme ganha força, mesmo que o casal de humanos seja bastante carismático e charmosos em tela.

    Os clássicos animados da Disney eram conhecidos por terem histórias breves, seja na construção de seus vilões, como também na reunião dos casais. Herek achou uma boa ideia emular essa velocidade de intimidade também em sua versão. O casal humano não precisa de mais de dez minutos de inteiração para decidirem, enfim, se casar.

    Fora uma ou outra ideia equivocada como uma reunião de pets do lado de fora da igreja durante a cerimônia, o tom do filme é acertado, ao unir de maneira engraçada o destino das famílias humanas e de cachorros, com várias brincadeiras de dualidade, como Anita descobrindo que será mãe com um ginecologista que esta ao lado de um veterinário. É em essência um produto feito para as crianças, embora possa ser consumida por toda a família, graças ao humor pastelão empregado no longa.

    Mesmo sem elementos fantásticos, a estrutura narrativa é de um conto de fadas. Os personagens agem de maneira suspeita, como se cordas amarrassem suas mãos e pés, fazendo deles títeres de uma marionetista insano. Além disso, os cachorros parecem estar um grau de inteligência a frente dos humanos. São bem menos caricaturais que Cruella e Roger, tem percepções melhores, julgam melhor eventos de entretenimento como narrativa em jogos, seriados de televisão, e ainda são arrojados o suficiente para abrir trancas das casas.

    Próximo do final, o tom mais sério do filme é completamente deixado de lado. A série de armadilhas que os animais produzem não incomodam só por serem completamente improváveis, mas também por que submetem os personagens vilanescos — incluindo De Vil — em sequências que mais lembram Esqueceram de Mim do que o filme original.

    Esses últimos momentos além de esticar desnecessariamente a trama, também destoam muito  do restante do filme, mais para além da continuação, 102 Dálmatas lançada em 2000 e do seriado animado 101 Dálmatas que daria continuidade a essa história. A versão de Herek presta muita reverência a animação original. Só poderiam utilizar mais os temas musicais do filme antigo, certamente daria mais personalidade a produção.

  • Crítica | Tomorrowland: Um Lugar Onde Nada é Impossível

    Crítica | Tomorrowland: Um Lugar Onde Nada é Impossível

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    A ficção científica como narrativa especulativa atravessa reflexões contemporâneas como base para projetar o futuro. No período da Segunda Guerra Mundial, obras distópicas como 1984, de George Orwell, e Fahrenheit 451 de Ray Bradbury focavam em um futuro totalitário e na completa ausência do indivíduo. O estudo da Cosmologia através dos tempos transformou seres de outro planeta em prováveis inimigos para estabelecer uma análise da evolução humana em várias obras, como O Jogo do Exterminador de Orson Scott Card e Contato de Carl Sagan.

    Tais cenários são utilizados frequentemente em narrativas como o futuro totalitário presente nos juvenis Jogos Vorazes ou na saga Divergente. São tendências que surgem como reflexo de cada tempo, conforme o contexto dos autores.

    Com este argumento em voga, é perceptível um crescimento de conceitos que questionam o futuro da Terra e suas transformações climáticas devido a ação humana. No cinema-catástrofe, o hiperbólico Roland Emmerich explorou o assunto em 2012 e, mais próximo do cenário de ficção científica, Danny Boyle dirigiu o eficiente Sunshine – Alerta Solar. Bem como Interstellar de Christopher Nolan também discutiu a sobrevivência da espécie à procura de outros habitats. A destruição futura do planeta também é tema de Tomorrowland – Um Lugar Onde Nada é Impossível, produção dirigida por Brad Bird em sua segunda incursão fora da animação, e obra cuja bilheteria tem sido aquém da esperada pela Walt Disney Pictures. Estrelado por George Clooney, o projeto de Bird, que também assina o roteiro ao lado de Damon Lindelof e Jeff Jensen, era aguardado com expectativa e, diante de uma história simples, e a esperança de uma grande obra de ficção científica foi deixada de lado.

    Grande parte da ficção científica trabalha com duas histórias dentro de sua narrativa, projetando um futuro provável para analisar o próprio ser humano. Muitas tramas são metáforas simbólicas para reflexões profundas e metafísicas de nossa própria evolução. A necessidade de produzir um filme familiar gerou um desafio natural para os roteiristas que precisavam equilibrar uma boa trama sem perder o escopo reflexivo. A solução foi transformar a história em uma aventura semelhante às da década de oitenta, evocando personagens juvenis como centro e lhes dando o poder para transformar sua trajetória, mantendo a fantasia dentro do enredo.

    Na década de 60, o pequeno Frank Walker é um inventor prodígio que participa de uma feira de invenções com um protótipo de um propulsor a jato. Mesmo o aparelho não empolgando Nix, um dos jurados do local, sua filha Athena confia na inteligência do garoto e convida-o para embarcar em uma aventura em uma cidade situada no mesmo espaço que a Terra, mas em outra dimensão. Habitado por cientistas, professores e intelectuais em geral, Tomorrowland é composto somente por mentes pensantes que desejam um futuro melhor sem os vícios do planeta Terra.

    A origem do garoto é apenas um preâmbulo para equiparar a história de Case Newton, uma adolescente que, como também o jovem Walker, acreditava ser capaz de modificar o mundo ao seu redor com a potência da imaginação e criação inventiva. Convocadas pela mesma Athena, as personagens devem salvar o planeta de uma iminente catástrofe.

    A aventura de fantasia é definida em um logo primeiro ato com uma hora de duração, firmando a parceria entre Casey e um velho Walker, interpretado pelo sempre galã George Clooney. O longo ato inicial evidencia a intenção de evocar a narrativa de outras décadas, tanto pela condução mais lenta como também na evocação de um universo inocente, conduzido por uma pureza juvenil. Ao contrário de obras como Os Goonies e E. T. – O Extraterestre a presença deste elemento puro não parece natural, mas inserida no contexto para ampliar o público e a bilheteria.

    Nestes dois exemplos de produções oitentistas, entre outras que poderiam ser citadas, os dramas envolvidos em cena eram densos, apesar da história simples. Principalmente, devido a uma época em que não havia amenidades nos conflitos em histórias infantis. Personagens lidavam com a morte e a perda como adultos também lidam com tais situações. Compondo sua base apenas com cores vibrantes, Tomorrowland evita, por consequência, um conflito, nem que seja o tradicional embate de mocinhos e vilões.

    A Disney vem tentando modificar o paradigma de suas histórias mas ainda não encontra uma maneira adequada de acrescentar novas camadas a sua outrora simplicidade bem equilibrada. Vê-se uma tendência em trabalhar argumentos em pares, utilizando em tramas diferentes as mesmas soluções narrativas. Assim como Frozen – Uma Aventura Congelante e Malévola compartilhavam o mesmo efeito moralizante do amor fraternal, essa produção se assemelha com o futuro colorido de Operação Big Hero: um local evoluído tecnologicamente em uma Terra desgastada em que personagens se destacam pelo caráter e a inocência – bem como a criatividade – e são inspiração para mudanças. Além da impressão de um reconhecimento prévio de um conflito visto em um recente filme do estúdio, a trajetória das personagens não parece urgente nem mesmo conflituosa como deveria, retirando qualquer potencial destrutivo do vilão interpretado por Hugh Laurie. Mesmo seu discurso megalomaníaco não parece ameaçador.

    Esteticamente a obra tem muita beleza, principalmente nos claros cenários do futuro e nos enquadramentos que demonstram um início de estilo na câmera de Bird. Porém, a falta de densidade retira a potência base de uma ficção científica projetada antecipadamente durante a divulgação do filme. Mesmo sendo apenas uma obra familiar entre aventura e fantasia, a intenção de ampliar o público impede que a história atinja com eficiência um desses gêneros e, diante disso, falta-lhe fôlego em qualquer uma de suas vertentes.

  • Crítica | A Filha do Meu Melhor Amigo

    Crítica | A Filha do Meu Melhor Amigo

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    Julian Farino é um diretor londrino acostumado a encabeçar episódios de séries como Byron, The Office-US, Sex And City, Roma entre outras muitas. Em seu primeiro longa-metragem, faz uma comédia dramática que emula alguns dos elementos de filmes indie – a saber a temática, fotografia e disposição de cores – bastante populares e com público cativo, vide Juno, 500 Dias com Ela, Ruby Sparks etc.

    O roteiro de Ian Helfer e Jay Reiss, também estreantes no cinema mainstream, foca em duas famílias vizinhas em Nova Jersey, e que tem na rotina a segurança de suas vidas – mesmo que todos ali passem longe do contentamento com a condição em que existem. A história é narrada por Vanessa (Alia Shawkat), uma menina frustrada profissionalmente, que aparenta ter bastante ambições, mas que faz pouco esforço para alcançar seus objetivos. Apesar disso, a base do guião não é nela, e sim na geração anterior – pelo menos nesse primeiro momento – especialmente no casamento malfadado entre Paige  e David – pais da relatora, e na vida privada dos seus melhores amigos Terry e Carol.

    A vida de todos é imutável, e eles são incapazes de quebrar qualquer paradigma, até que a filha do casal Ostroff retorna para casa, após ter seus planos de casamento frustrados. Nina (Leighton Messter) volta desiludida e pouco preocupada com qualquer coisa que não seja os seus próprios desejos, e se mete em uma relação que rompe a amizade entre as duas famílias. O subúrbio é utilizado como o avatar da rotina e do medo da variação, o argumento toca em temas como crise de meia-idade, término de casamento, ótica adolescente sobre divórcio dos pais etc. Outro ponto de interessante discussão é até que ponto é valido apelar para a tradição e para os laços familiares quando estas coisas se interpõem a felicidade própria.

    As atuações são razoáveis, Hugh Laurie que ainda possui muito do Doutor Casa em sua caracterização, mas dá uma personalidade diferente ao seu personagem passivo de meia-idade. Messter não compromete, mas faz pouco acreditar em seus dramas. Entretanto o destaque certamente é Catherine Keener, até por ter em mãos o personagem mais rico da película, e que apresenta maior evolução deixando de ser a esposa dedicada, simulada e ilusória para se tornar uma mulher cheia de ideais e que dedica sua vida a atingi-los – além é claro de ter protagonizado a cena mais cômica e agridoce do filme, onde destrói parte da decoração de natal da fachada de sua antiga casa para logo depois agir de forma calma e serena no interior da festa natalina.

    O caso de Nina foi o catalisador da mudança, o evento que modificou o status quo e fez todos perceberem o quanto os personagens estavam insatisfeitos com as próprias vidas, o que inclui a própria Nina, Paige, David, Carol, Terry e mesmo Vanessa, além é claro de trazer clareza de o quanto eles precisavam se transformar.

    Sair da zona de conforto é difícil, mas é necessário em alguns pontos da vida. David percebe tarde demais que certos caminhos não têm volta. The Oranges é uma comédia de incômodos e constrangimentos, um pouco pretensiosa, mas ainda assim de divertimento fácil.