Tag: Britt Robertson

  • Crítica | Uma Longa Jornada

    Crítica | Uma Longa Jornada

    cartaz

    Um cowboy com flores nas mãos (filho de Clint Eastwood, dos faroestes brutos de Sérgio Leone). Mesmo no filme, todos debocham da suavidade de uma postura tão masculina devido a quebra de expectativa pelo buquê que carrega. Qual o destino do objeto, ninguém se pergunta ao longo da caminhada que, logo no início de Uma Longa Jornada resume o espírito do filme. E muito, tomando cuidado para ser tão fiel a obra quanto ao público, acostumado aos romances aguados e transgressores de um escritor mais adorado e famoso no cinema que John Green, de A Culpa é das Estrelas. Visões assexuadas, estilo Disney anos 50, e livres de quaisquer responsabilidade com a realidade que filmes como Superbad ou Juno possam carregar – ou não. Livros, filmes ou peças como Cinquenta Tons de Cinza, o suspense O Nevoeiro, ou esse, traduzido a partir do livro de Nicholas Sparks, é tudo uma questão de escolher o público e como defender esse público mostrando só o que já leram antes, esperando uma história que evoca a princesa e o príncipe em cada um.

    Todo o “mais” injetado para o livro fazer sentido no Cinema é audácia, é coragem de artista. Mas surpreendente, mesmo, é sentir quando o óbvio e o previsível conseguem ajudar ao invés de atrapalhar uma história semelhante a Romeu e Julieta, ainda que autossuficiente e bem realizada. Sparks é o tipo de escritor que gosta (ou apela a) narrativa epistolar, ou seja, uma trama costurada por cartas, de relato em relato. Aqui não é diferente, remetendo ao passado e a possibilidades do tempo presente, com reviravoltas e camadas sensíveis que não desviam nosso foco do casal principal (tipo o de Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, duas pelúcias). Só que o filme perde a chance de discutir e apenas sugere, pincelando de leve, leve até demais, os valores de um relacionamento ontem e hoje, sem reflexão a partir disso – o que tampouco me parece seguro afirmar que o livro provoque, aliás. Revisões podem valer a pena!

    David O. Russell é um bobo. O cineasta quer ser Martin Scorsese esquecendo de ser ele mesmo, todo mundo sabe, só que em O Lado Bom da Vida, também oriundo dos livros e alfarrábios, registra timidamente o que Uma Longa Jornada tenta, e quase consegue: A dificuldade de expressar os sentimentos num mundo muito ocupado pra assuntos sentimentais. Se no filme de 2012 isso se dá devido ao esforço de vencer uma competição de dança, e a intensidade da vida dos personagens, aqui é o desafio de convencer que uma relação inocente, em tempos líquidos e instáveis, de acordo com Zygmunt Bauman e outros pensadores, pode dar certo. Será? Que o filme se orgulha de ser inofensivo é evidente, e é justamente nisso, nos sorrisos iluminados pela fogueira na floresta num primeiro encontro, que a história tenta provar que vale a pena amar. Lindo, né? Que garota iria pra uma floresta a noite num primeiro encontro? É o caráter do nosso cowboy que explica o porquê. Mais lindo ainda, não? (Suspiros, por favor)

    E nada de trilha-sonora para pintar o quadro; aqui, a música é só a moldura – complemento. No fim, o filme só e orgulhosamente nos quer passar a sensação do primeiro beijo, aquele que a gente não esquece depois de mil lábios contra os nossos. Como se não bastasse, durante esse frescor, quer contar uma história da forma mais digna possível sem ofender quem já possui uma inteligência e sagacidade emocional mais refinada (Se 2 horas são necessárias pra isso, já é outra história). Uma Longa Jornada não para saber se o casal vai acabar junto, mas o que vai ocorrer antes de acabarem juntos, o que impede que nosso interesse pela história seja linear e não sofra digressões.

    Um caminho extenso para quando só nos bastava sentar na praia e imaginar um futuro lenitivo aos males do mundo, para também nos orgulharmos de fotografar o que nos conduz ao bem-estar e descrever os momentos no diário, ou postá-los no Instagram, ostentando em ambos os casos nossa capacidade de amar e sermos amados. Um dos filmes Beatles de 2015, de graça inesperada.

  • Crítica | Tomorrowland: Um Lugar Onde Nada é Impossível

    Crítica | Tomorrowland: Um Lugar Onde Nada é Impossível

    Tomorrowland - poster br

    A ficção científica como narrativa especulativa atravessa reflexões contemporâneas como base para projetar o futuro. No período da Segunda Guerra Mundial, obras distópicas como 1984, de George Orwell, e Fahrenheit 451 de Ray Bradbury focavam em um futuro totalitário e na completa ausência do indivíduo. O estudo da Cosmologia através dos tempos transformou seres de outro planeta em prováveis inimigos para estabelecer uma análise da evolução humana em várias obras, como O Jogo do Exterminador de Orson Scott Card e Contato de Carl Sagan.

    Tais cenários são utilizados frequentemente em narrativas como o futuro totalitário presente nos juvenis Jogos Vorazes ou na saga Divergente. São tendências que surgem como reflexo de cada tempo, conforme o contexto dos autores.

    Com este argumento em voga, é perceptível um crescimento de conceitos que questionam o futuro da Terra e suas transformações climáticas devido a ação humana. No cinema-catástrofe, o hiperbólico Roland Emmerich explorou o assunto em 2012 e, mais próximo do cenário de ficção científica, Danny Boyle dirigiu o eficiente Sunshine – Alerta Solar. Bem como Interstellar de Christopher Nolan também discutiu a sobrevivência da espécie à procura de outros habitats. A destruição futura do planeta também é tema de Tomorrowland – Um Lugar Onde Nada é Impossível, produção dirigida por Brad Bird em sua segunda incursão fora da animação, e obra cuja bilheteria tem sido aquém da esperada pela Walt Disney Pictures. Estrelado por George Clooney, o projeto de Bird, que também assina o roteiro ao lado de Damon Lindelof e Jeff Jensen, era aguardado com expectativa e, diante de uma história simples, e a esperança de uma grande obra de ficção científica foi deixada de lado.

    Grande parte da ficção científica trabalha com duas histórias dentro de sua narrativa, projetando um futuro provável para analisar o próprio ser humano. Muitas tramas são metáforas simbólicas para reflexões profundas e metafísicas de nossa própria evolução. A necessidade de produzir um filme familiar gerou um desafio natural para os roteiristas que precisavam equilibrar uma boa trama sem perder o escopo reflexivo. A solução foi transformar a história em uma aventura semelhante às da década de oitenta, evocando personagens juvenis como centro e lhes dando o poder para transformar sua trajetória, mantendo a fantasia dentro do enredo.

    Na década de 60, o pequeno Frank Walker é um inventor prodígio que participa de uma feira de invenções com um protótipo de um propulsor a jato. Mesmo o aparelho não empolgando Nix, um dos jurados do local, sua filha Athena confia na inteligência do garoto e convida-o para embarcar em uma aventura em uma cidade situada no mesmo espaço que a Terra, mas em outra dimensão. Habitado por cientistas, professores e intelectuais em geral, Tomorrowland é composto somente por mentes pensantes que desejam um futuro melhor sem os vícios do planeta Terra.

    A origem do garoto é apenas um preâmbulo para equiparar a história de Case Newton, uma adolescente que, como também o jovem Walker, acreditava ser capaz de modificar o mundo ao seu redor com a potência da imaginação e criação inventiva. Convocadas pela mesma Athena, as personagens devem salvar o planeta de uma iminente catástrofe.

    A aventura de fantasia é definida em um logo primeiro ato com uma hora de duração, firmando a parceria entre Casey e um velho Walker, interpretado pelo sempre galã George Clooney. O longo ato inicial evidencia a intenção de evocar a narrativa de outras décadas, tanto pela condução mais lenta como também na evocação de um universo inocente, conduzido por uma pureza juvenil. Ao contrário de obras como Os Goonies e E. T. – O Extraterestre a presença deste elemento puro não parece natural, mas inserida no contexto para ampliar o público e a bilheteria.

    Nestes dois exemplos de produções oitentistas, entre outras que poderiam ser citadas, os dramas envolvidos em cena eram densos, apesar da história simples. Principalmente, devido a uma época em que não havia amenidades nos conflitos em histórias infantis. Personagens lidavam com a morte e a perda como adultos também lidam com tais situações. Compondo sua base apenas com cores vibrantes, Tomorrowland evita, por consequência, um conflito, nem que seja o tradicional embate de mocinhos e vilões.

    A Disney vem tentando modificar o paradigma de suas histórias mas ainda não encontra uma maneira adequada de acrescentar novas camadas a sua outrora simplicidade bem equilibrada. Vê-se uma tendência em trabalhar argumentos em pares, utilizando em tramas diferentes as mesmas soluções narrativas. Assim como Frozen – Uma Aventura Congelante e Malévola compartilhavam o mesmo efeito moralizante do amor fraternal, essa produção se assemelha com o futuro colorido de Operação Big Hero: um local evoluído tecnologicamente em uma Terra desgastada em que personagens se destacam pelo caráter e a inocência – bem como a criatividade – e são inspiração para mudanças. Além da impressão de um reconhecimento prévio de um conflito visto em um recente filme do estúdio, a trajetória das personagens não parece urgente nem mesmo conflituosa como deveria, retirando qualquer potencial destrutivo do vilão interpretado por Hugh Laurie. Mesmo seu discurso megalomaníaco não parece ameaçador.

    Esteticamente a obra tem muita beleza, principalmente nos claros cenários do futuro e nos enquadramentos que demonstram um início de estilo na câmera de Bird. Porém, a falta de densidade retira a potência base de uma ficção científica projetada antecipadamente durante a divulgação do filme. Mesmo sendo apenas uma obra familiar entre aventura e fantasia, a intenção de ampliar o público impede que a história atinja com eficiência um desses gêneros e, diante disso, falta-lhe fôlego em qualquer uma de suas vertentes.