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  • Review | Powers – 1ª Temporada

    Review | Powers – 1ª Temporada

    powers-posterMisturando elementos de seriados recentes como True Blood, mostrando seres fantásticos como parte do cenário social mundano e comum, e trabalhando a premissa do quadrinho anárquico The Boys, sobre o “controle” das ações de homens super-poderosos, Powers é uma série que reúne elementos dissonantes, se localizando entre a temática adulta e uma proposta jocosa do ideário dos vigilantes encapuzados e coloridos.

    A rotina mostra Christian Walker (Sharlto Copley), um ex-vigilante mascarado, e agora policial, cuidando dos mesmos arquétipos dos quais antes fazia parte, já que em algum ponto de seu passado perdeu as super-habilidades que tinha. Na sua rotina há uma clara reprimenda e autocrítica por não mais ter acesso às antigas habilidades, além de viver uma clara sensação de impotência. No entanto, essas sensações conflitantes são diluídas por uma carga humorística que não funciona perfeitamente na tradução televisiva.

    O programa é baseado na HQ homônima, de Brian Michael Bendis (roteiros) e Michael Avon Eoming (desenhos). A publicação da Marvel foi lançada pelo selo Icon – sendo esta a mesma divisão que dá vazão a histórias mais autorais como Kick Ass, de Mark Millar – e durou 78 edições, contendo alguns elementos chaves em comum com a série. A produção da Playstation Originals acaba por flertar com a comédia graças a sua fraca realização, só resultando em comicidade por fatos involuntários.

    Christian recebe a ajuda de Deena Pilgrim (Susan Heyward), uma novata agente da lei que o acompanha nas inúmeras aventuras envolvendo cenas em CGI de gore cujo amadorismo se assemelha aos filmes B dos anos 1990. As demonstrações dos poderes dos coadjuvantes assustam a moça, talvez não pela condição de civil em meio a um mundo onde seres tão poderosos convivem com humanos, mas sim pelas estranhas manifestações multicoloridas, que lembram os efeitos visuais das publicações de revistas com CD-Rom comumente vendidas nas bancas de jornais na década retrasada.

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    O mote do seriado envolve além do controle das ações públicas dos superseres,  mas também o roubo de poderes do antigo alter ego de Walker (chamado à época de Diamon), que é realocado para a divisão policial especializada de Los Angeles. A interação pessoal, que deveria garantir empatia, soa falsa, pois não é construída de modo minimamente satisfatório. A recusa do personagem em ter um novo parceiro não é original, pois já existia nos anos 1970, como em Dirty Harry, por isso não em é cabível em uma proposta séria como Powers. A outra tentativa de tornar a trama madura, com o advento da droga Sway, que aumentaria os poderes dos seres super-poderosos, é mostrada de modo muito genérico, não causando qualquer impressão maior em seu público.

    O desenrolar dos fatos ocorre a partir deste ponto, com Copley tentando dar vida a um personagem que não funciona graças à bidimensionalidade do roteiro mal adaptado e às situações grotescas que lhe ocorrem. A trama também conta com as ações fundamentais de Jonny Royalle, interpretado pelo prolífico ator Noah Taylor, que coleciona momentos vergonhosos, a começar por sua voz forçadamente rouca e bigode falso, nos poucos momentos em que a dramaturgia é exigida. A trama em modo “teoria da conspiração” parece vir a partir dele, que é um teleportador, já que é Royalle a peça chave na rede de relações com a maioria dos personagens, do futuro e do passado, incluindo a antiga alcunha de Walker e a ex-namorada do protagonista, Retro Girl (Michele Forbes). Sobra também a Royalle a intimidade com a figura de antagonismo, ainda que ele também vista a máscara de vilão em alguns pontos, diferenciando somente por sua afeição gratuita por Calista (Olesya Rulin), uma personagem basicamente inútil, que tem uma motivação tão vazia quanto suas funções dramáticas, já que está lá basicamente para acreditar que tem algum poder, mesmo sem sofrer manifestações, além de estar em apuros quase sempre.

    O ponto de cisão ocorre graças a Wolfe (Eddie Izzard), um ser que no passado servia de inspiração para Powers mais novo, e que está encarcerado graças a seus crimes de canibalismo, evidentemente sérios demais para serem simplesmente ignorados. O carisma do personagem faz acreditar que sua história será bem contada, fato que não ocorre, já que o tempo dispendido para isso é ínfimo, principalmente em comparação com os momentos em que ele consegue fugir da prisão – fato que ocorre no plural, em menos de dez episódios – e nos quais o ator veterano é posto para desfilar semi-nu, de cabelos longos e quase sempre molhados, exibindo uma forma rotunda que deveria causar medo, ainda que só motive risos. Cenas risíveis como as que está drenando humanos e Powers genéricos, com direito a muito sangue digital e gritos de horror, fazem lembrar a reação do espectador ao vê-las em tela.

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    A ideia de inverter paradigmas e mostrar uma versão de um mundo onde seres magnânimos existem pela ótica de quem é tradicionalmente marginalizado – a saber: viciados em drogas e contraventores – é interessante e está no cerne do gibi. O problema na adaptação da Playstation Network foi não adequar os termos para um modelo midiático tão diferente das páginas de quadrinhos, cuja textura precisa ser menos caricata.

    A ligação da origem da droga à figura de Wolfe seria interessante se todo o entorno fosse trabalhado de maneira mais contextualizada, fato que não ocorre. A descrença do espectador é a mesmo do público que assiste ao show beneficente feito pela Retro Girl e mais um personagem famoso/genérico. Vendo a morte no palco, repete, incrédulo: “é real”, como se precisasse se beliscar para descobrir se aquilo realmente ocorria ou não, de tão mal trabalhados, tanto o suspense quanto o mote heroico.

    Depois da segunda fuga de Wolfe, há finalmente um enfrentamento da criatura com seus opositores heroicos, que, como era esperado, termina de modo anticlimático, confuso e decepcionante, além de muito breve, deixando um bom pedaço do décimo e último episódio da temporada. Sobra, assim, um grande espaço para algumas inutilidades serem exploradas somente para resultar em um momento final com um fraco cliffhanger.

    Powers possui ideias iniciais até interessantes, mas é conduzida de modo bastante atrapalhado, repleto de clichês e situações constrangedoras, fruto talvez da pouca experiência de seus realizadores, e só possui bons momentos em alguns insights de Noah Taylor, mesmo que o roteiro não permita de modo recorrente. A segunda temporada estreou em maio de 2016 com esperanças esgotadas de melhora, ao menos segundo os que acompanham o drama de Walker.

  • Crítica | O Duplo

    Crítica | O Duplo

    O Duplo - nacional

    Já no início da trama, percebe-se uma mente conturbada por parte do inseguro protagonista, Simon. Em direção à sua rotina de trabalho, o homem é impedido pela estranheza que parece ter alterado seu cotidiano há pouco tempo. O caminho rumo ao seu emprego acontece em um vagão de trem, mal iluminado e insalubre, e ele prossegue, indo por uma estação subterrânea imunda e escura. Na chegada ao portão, ele é barrado, numa clara alusão à dificuldade que tem de se sentir pertencente a um lugar. A sensação que predomina é a de deslocamento da realidade.

    O aparente motivo do incômodo para Simon é a chegada de um novo funcionário, o qual lhe é grosseiro em um primeiro momento, e com mais aptidões que ele. James também é vivido por Jesse Eisenberg, e consegue representar a atuação mais moderna de seu intérprete, enquanto Simon se assemelha mais à faceta de associação comumente feita pela semelhança física com Michael Cera, emulando até a falta de dotes dramatúrgicos do ator comediante.

    A dualidade presente na interação entre Simon e James é apenas um aperitivo do universo que se desenrola ao redor das pessoas presentes na película. O universo mostrado no roteiro de Avi Korine e Richard Ayoade – que também assina a direção – guarda semelhanças visuais com muitas ficções científicas de baixo orçamento, especialmente nas referências midiáticas. As alusões textuais revelam uma realidade próxima da distopia, mostrando uma tirania movida por órgão privados, como a empresa do Coronel onde Simon trabalha. A companhia, em seus informes publicitários, deixa claro que ninguém é especial, um conceito menos autoritário que o de 1984, de George Orwell, visto que não é necessariamente proibido o contato entre humanos, já que a moral e autoestima destes não permitem qualquer relação mais íntima, graças à desmotivação geral.

    A lei não proíbe que casais se formem, mas a influência exercida pelo quarto poder – comunicação – faz com que as pessoas não se sintam aptas a tomar riscos, ao menos é essa sensação que é passada pela vivência de Simon. Quando ele resolve tentar a sorte ao sair com sua colega de trabalho, Hannah (Mia Wasikowska), a euforia tenta tomá-lo, em um dos poucos momentos em que cores vivas se permitem predominar na fotografia monocromática, mas o entusiasmo é interrompido pela inaptidão do rapaz e, claro, pelo azar enorme, que parece ser exclusividade sua, ao menos segundo a interpretação que faz dos fatos.

    É curioso como o único que se permite ter uma visão diferenciada do processo industrial e da modernidade seja exatamente o personagem cujo fracasso é mais evidente, como se o mau agouro lhe conferisse poderes. Logo, as contrapartes vão se unindo em favor de um bem maior, que é a abordagem ao belo sexo. O convívio entre ambos faz os fatos se tornarem ainda mais estranhos do que já vinham sendo.

    O modo como Ayoade conduz seu filme apresenta diferentes módulos de interpretação, tornando um “não mistério” a possibilidade de ser o par de iguais a mesma pessoa, porém não em uma curiosa opção, mas sim uma questão evidente. O enigma fica por conta da óbvia busca pela identidade, usando o roubo e a falsidade ideológica como sinais de uma possível insanidade, que por sua vez poderia ser fruto do constante escravagismo sentimental causado ao homem através dos constantes abusos da sociedade vigente.

    Eisenberg interpreta as duas faces do ser masculino, apresentando nuances e maneirismos distantes o suficiente para gerar no espectador a dúvida a respeito de suas reais intenções, que ganham ainda mais ambiguidade graças à nebulosa direção acompanhada de uma trilha sonora pontual. Tais elementos conseguem resgatar a essência de um suspense noir, fazendo com que as bizarrices inerentes ao espírito não sejam tão intragáveis aos olhares do público menos afeito à estética dos weird movies.

  • Crítica | No Limite do Amanhã

    Crítica | No Limite do Amanhã

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    A Terra foi invadida por alienígenas, os Mimics, que até o momento estão levando a melhor. O Tenente-coronel Bill Cage (Tom Cruise), assessor de imprensa do Exército, vê-se obrigado a juntar-se às Forças Armadas e ir para o front às vésperas de uma batalha decisiva. Sem saber o motivo, fica preso no tempo, acordando no quartel a cada vez que é morto em combate. Num de seus replays, conhece Rita Vrataski (Emily Blunt), agente das Forças Especiais famosa por sua participação decisiva na batalha anterior ao exterminar uma grande quantidade de aliens. E, a cada reboot, Cage acumula mais informações que o auxiliam a entender o que está acontecendo.

    O roteiro foi baseado no livro All you need is kill, de Hiroshi Sakurazaka, ainda sem tradução no Brasil. Apesar disso, é impossível não pensar em outras produções em que o protagonista revive o mesmo dia ou algo semelhante. Feitiço do Tempo é a lembrança mais óbvia, onde Phil (Bill Murray) acorda todos os dias no Dia da Marmota. Outra lembrança mais recente – e também mais similar em termos narrativos – é Contra o Tempo, em que Colter Stevens (Jack Gyllenhaal), acorda no corpo de um desconhecido e é obrigado a reviver os minutos que antecedem um acidente de trem causado por uma explosão, até que consiga localizar o autor do atentado.

    Enquanto em Feitiço do Tempo a repetição apenas acontece, sem qualquer preocupação em elucidar como ocorre e com uma motivação que pende para o aspecto sentimental, em Contra o Tempo a motivação é explicitada logo nos primeiros minutos, e ao final é explicado como isso ocorre. Sob esse aspecto, No Limite do Amanhã, dirigido por Doug Liman, é muito semelhante. Em outras perspectivas também, como não poderia deixar de ser, já que o fio condutor é similar. A cada restart, Cage aprende mais detalhes, consegue ir mais longe em suas incursões no campo de batalha, até que numa delas, ao contar a Rita sobre sua situação, ela lhe diz: “Venha me procurar quando acordar!”. E assim, ao encontrar Rita e Dr. Carter (Noah Taylor) pela manhã, finalmente descobre como e por que o dia reboota a cada vez que ele morre.

    Apesar da ideia já batida, o roteiro consegue segurar a onda e manter o ritmo do filme. Quando começa a ficar repetitiva e o público começa a achar que vai ser apenas mais do mesmo, um novo elemento é adicionado à trama, ou momentos de humor inevitáveis, causados pela repetição dos dias, dão aquele “respiro” merecido ao espectador. Felizmente, os roteiristas não erraram a mão e dosaram bem essas intervenções cômicas em que o principal alvo é o superior de Cage, Sargento Farell (Bill Paxton). O ritmo da narrativa se mantém, apesar de uma ou outra “barriga”, e consegue, auxiliado por uma boa montagem, manter a atenção do espectador do início ao fim.

    O elenco está ok, sem nenhuma performance extraordinária, mas todos estão bem entrosados e bem convincentes. Cruise sempre encarnando o bom-moço, desta vez possui alguns mínimos deslizes de caráter, coerentes com um militar acomodado em sua posição longe do front e capacidade nula de combate. Blunt se esforça como a agente motherfucker, já que seu porte físico é pouco condizente com sua fama – o exoesqueleto utilizado pelos soldados justifica, em parte, suas habilidades, mas não o suficiente. Os demais não se sobressaem, mas também não fazem feio.

    Boa fotografia, bons efeitos especiais, 3D dispensável. Enfim, diversão garantida, apesar do final meio Disney demais. Mas depois de aceitar o modo como o tempo estava sendo rebootado, acatar o happy end não demanda tanto esforço assim.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.