Crítica | Cidade dos Homens
Cidade dos Homens sempre teve uma forte ligação com o cinema. A série iniciada em 2002 teve como uma espécie de piloto o curta Palace II, exibido na televisão no programa Brava Gente. Após o término da série, a O2 Filmes chamou Paulo Morelli para conduzir a história em um longa-metragem que mostraria o futuro de Laranjinha e Acerola.
A trama prossegue mostrando a vida no Morro da Sinuca no Rio de Janeiro onde moram Acerola (Douglas Silva) e Laranjinha (Darlan Cunha). Cada um deles vive seu drama pessoal, lidando com a paternidade ou a curiosidade em relação ao destino que seus pais tiveram. Em comum com o programa o longa faz sobreviver a amizade entre os meninos, incluindo até cenas de arquivo dos dois bem novos.
O início mostra Madrugadão (Jonathan Hageensen), Nefasto (Eduardo Piranha) e seu bando à caminho da praia para um banho de mar, o lazer aparentemente não era algo comum aos moradores do morro, mesmo entre os chefões que se valiam do poder paralelo do tráfico. Esse é na verdade um pretexto, um mcguffin para que os dois heróis da jornada discutam a necessidade que uma criança tem na paternidade, através de uma rivalidade entre antigos parceiros do crime, que racham o próprio território ao meio, fazendo com que os dois amigos inseparáveis, tenham que cometer uma cisão absolutamente forçada.
Na época em que foi lançado, Cidade dos Homens sofreu com as críticas que acusavam grandes diferenças dede tonalidades entre o longa e o seriado. De fato é complicado ver os personagens que causaram afeição ao público tão diferentes, alguns se enveredando por caminhos tortuosos, embora seja condizente com a realidade, e o roteiro de Morelli e Elena Soarez acerta em cheio nesse ponto. A fotografia de Adriano Goldman ajuda a fortalecer a sensação de que passado e presente se cruzam, onde os tons alaranjados fazem aquele 2007 parecer um tempo mais antigo, tal qual era na fase inicial de Cidade de Deus, além disso, o choque entre expectativa e realidade é bastante explorado e discutido na intimidade entre os personagens que veem sua parceria ser posta em risco algumas vezes.
Há boas participações de atores convidados, como Babu Santana e Rodrigo dos Santos, mas fora Cunha e Silva, é Hageensen quem se esforça mais e apresenta multíplas camadas. O traficante Madrugadão não é um sujeito mau por natureza, é humanizado, tem desejos comuns a todos, mas não deixa de ser cruel, e o texto não cai no clichê de transforma-lo em vítima da sociedade, como foi com Última Parada 174 de Bruno Barreto, inclusive colocando no passado dele, signos claros de psicopatia, como a vontade de pegar em armas e maus tratos a animais domésticos.
A história é cíclica, e nisso, o filme de Cidade dos Homens tem êxito, as questões envolvendo as coincidências de roteiro soam forçadas, mesmo que o passado em comum dos pais de Acerola e Laranjinha tivesse sido escrito antes da série estrear, ainda assim parece tudo conveniente demais, irreal e derrubador de qualquer suspensão de descrença.