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  • Review | Assédio

    Review | Assédio

    De Maria Camargo, Assédio é uma minissérie, de dez episódios, baseada no livro A Clínica: A Farsa e os Crimes de Roger Abdelmassih, de Vicente Vilardaga. Embora seja dito que a adaptação é livre em relação ao fatos que ocorreram com Abdelmassih. Roger Sadala é um especialista em reprodução in vitro, conhecido como Doutor Vida e que ajudou muitas pessoas a engravidar. O médico, interpretado Antônio Calloni, era na verdade um abusador que se aproveitava das fragilidades de muitas mulheres para se envolver sexualmente com elas.

    A abertura com tema natalino soa estranha, por remeter a uma música que trata de felicidade ao mesmo tempo em que a trama foca na desgraça de muitas mulheres e famílias. O primeiro caso é de 1994, com Stela (Adriana Esteves) que tem sua intimidade mostrada bem aos poucos, primeiro como uma mulher que quer engravidar e não consegue, e que depois deposita todas as suas esperanças no doutor Sadala. No primeiro episódio mostra o abuso sem focar no rosto da paciente, evitando qualquer risco de erotização da vítima. Esse cuidado que Camargo tem é muito valido e até necessário, pois independente da beleza ou não das atrizes, a última coisa que deveria acontecer é transformá-las em algo fetichista, seja pelas mulheres ou pelo ato sexual criminoso.

    Já no segundo episódio se quebra qualquer trégua da trama com seu vilão. Roger lambe a vítima, de maneira animalesca – a ideia é mostra-lo como um ser sub humano, abaixo de qualquer atitude ética ou moral. Essa primeira mulher mostrada não estava totalmente desacordada, fato que a fez lembrar em detalhes do estupro que sofreu, e gradativamente, a falta de pudor de Roger vai sendo revelada. O médico se esconde atrás de uma aura de carinho e ternura, fingindo se importar com os outros, alegando que sua família é toda assim, de abraços e afagos e que por isso pode ser confundido com alguma aproximação pseudo-amorosa ou aproveitadora.

    Há uma personagem sempre em suspeição, a jornalista Mira (Elisa Volpato) que no início é apenas uma estagiárias, mas já suspeita que a perfeição pintada em volta de Roger é estranha demais. Ela recebe ligações anônimas e passa a investigar mesmo que seu chefe a mande parar. Com o decorrer dos dez episódios, ela ganha autonomia, principalmente quando a redação é comandada por Suzana (Bete Coelho), que entende o drama que Mira conta por solidariedade feminina.

    O roteiro mostra em tom de denúncia quantas vidas foram destruídas pelas atitudes de Roger. Casamentos desfeitos, condições psicológicas severas nas mulheres vilipendiadas, entre elas Eugenia (Paula Possani), aconselhada por advogados a deixar a história de lado, afinal era a palavra dela contra a dele, um homem famoso, respeitável e amigo de gente poderosa. A ideia de onipotência de Roger é muito bem pontuada pela postura de Calloni, que convence os espectadores que não viram seus crimes quanto a sua inocência. A construção do personagem beira a perfeição.

    O seriado tem alguns núcleos diferenciados, como o da família Sadala, que vive junto a Roger e é toda bancada pelos seus milhões, entre filhos, netos, sua mãe e sua esposa, Gloria. Mariana Lima vive uma mulher obcecada, que se sente mal ao assistir a maioria das traições do marido e mergulha em um estado depressivo terrível, graças não só a infidelidade mas também ao câncer que contrai. Apesar do melodrama que a envolve, Lima consegue mostrar bem como uma pessoa que é exposta à convivência pode ser tão envenenada. Ela literalmente definha, sentimental e fisicamente.

    Calloni fala diretamente com o espectador, com a cara mais lavada do mundo. Com o tempo se percebe que isso na verdade é um depoimento que ele deu ao advogado especialista vivido por Paulo Miklos. Os casos mostrados são diversos, de pessoas pobres, que viviam no Nordeste e que fizeram muitos sacrifícios para pagar o caro procedimento, e casos onde os estupros aconteciam sem qualquer medicamento.

    Apesar de um elenco que conta com gente muito boa já citada – além de João Miguel, Paolla Oliveira, Herminia Guedes e outras participações menores – Assédio depende muito de Calloni – inspiradíssimo no papel, capaz de demonstrar muitas camadas humanas, sendo odiável, mentiroso e capaz de comover por seu carisma típico dos mitomaníacos. O fato dele ser descolado da realidade não justifica seus atos, mas faz entender os motivos que o fizeram cometer atos tão vis, ele já está alienado ao mundo tangível há muito, envolto em hipocrisia, crueldade e sangue frio para cometer atrocidades com qualquer mulher que ele meramente ache atraente. A naturalização do abuso frente à qualquer homem que aparece diante das câmeras que gravam esse drama faz  justificar não só o debruçar na história de Roger Abdelmassih, como a denúncia em forma de programa televisivo de massa. Forte, atual e certeira em seus comentários.

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  • Review | 3% – 1ª Temporada

    Review | 3% – 1ª Temporada

    Uma questão proeminente na produção brasileira é a questão de se assumir a estética da pobreza, quando, já sabendo das dificuldades de competir esteticamente com filmes de outros cantos do mundo, você assume suas dificuldades técnicas e parte deste saldo para tirar da frente este tipo de comparação. A série 3% tem justamente esta dificuldade estética, quando não consegue assumir para que lado ir. Há um problema claro de visagismo, onde “O lado de cá” não parece um local plenamente deteriorado, mas sim um local sujinho. Já “no lado de lá”, o ambiente superior segue uma estética também um tanto primária. Basicamente, se parece um um hospital.

    Com alguns problemas de ritmo e de foco, alguns MacGuffin que não prestam-se ao papel de desvirtuar nossa atenção para o grande mistério que está por vir, mas sim de fazer parecer que nada lá tem muita importância. Que tudo são pequenas pistas falsas, deixando o solo onde a história é plantada um tanto arenoso e instável.

    As atuações carecem de uma melhor coordenação de elenco, mas a responsabilidade disso é um tanto dos diálogos, que são normalmente repetitivos, dando a impressão que a série está lidando com um conceito mais abstrato do que realmente está. Então, as pessoas repetindo para si mesmas e para os outros o quanto aquilo tudo é relevante, os flashbacks sobre como a vida inteira empurrou aquelas pessoas para aquele momento único na vida e demais recursos, soam desnecessários, embora possam ser isoladamente interessantes.

    Os temas da série

    Sem surpresa alguma, uma série que tem como premissa um mundo onde apenas 3% das pessoas são escolhidas para terem uma boa vida, a partir de premissas aleatórias vindas de algum grupo de poder, fala basicamente sobre a potencial perversidade do conceito de meritocracia. “O mérito só depende de você”, é o que diz Ezequiel, interpretado pelo excelente João Miguel, que aqui demora a se encontrar no papel. A questão é que em um mundo desigual, onde pessoas recebem oportunidades diferentes desde o berço, a busca por uma chancela baseada em mérito se perde.

    Perde-se também quando os princípios morais que regem a sociedade são tão maquiavélicos. Em O Príncipe, de Maquiavel, o mérito está tá na estratégia que se escolhe guerrear suas guerras, e sendo o resultado tal qual o planejado, você escolheu uma boa estratégia. Isso claro, não entra em acordo com princípios éticos no momento em que se é pragmático quanto ao que realmente importa são os resultados. Ora, se o que importa é entrar no Maralto, os meios serão justificados pelos fins. Não a toa é possível ver a perda da ligação social que as pessoas têm entre si, e ao menos na série, esta impostura parte principalmente daquele que consideram que têm mais a perder do que os demais. Se você considera que tem muito a perder, teria a tendência de revisionar mais profundamente seus critérios éticos. Se você já não tem nada a perder, talvez acabe se submetendo à outras ordens sociais, ou revoltando-se. Em algum momento a série flerta com o conceito então da luta de classes, onde uma solução para um conflito entre classes sociais, onde há poderes assimétricos, seria uma revolta da classe dominada sobre a classe dominante.

    O problema é que dentre todas essas questões, a série parece fazer um resumo sobre os problemas que uma estrutura maniqueísta é capaz de proporcionar, inclusive sobre a má fé dos grupos revolucionários, que não raramente podem se dar carta branca para fazer o que quiserem, mas em nenhum momento diz exatamente a que veio. Em algum momento, lá para o final, quando algumas questões sobre aspectos da sociedade do Maralto são explicadas e surgem certos conflitos morais a coisa ganha um pouco mais de estofo, mas que é uma recompensa pouco satisfatória em vista dos 8 ou 9 capítulos que precisaram ser galgados para encontrar este final.

    3% precisa de simpatia, mas vale a pena. Não desista da série, tem coisa lá pra refletir.

    Sendo assim, é preciso certa simpatia para vencer a dificuldade que a própria série tem em se estabelecer como ficção científica. Esta simpatia, aparentemente vem sido mais frequente fora do Brasil do que dentro, pois a série conseguiu encontrar um público formador de opinião e que adquiriu muita simpatia por tudo aquilo que a série buscou representar.

    Excelência é uma questão de pura prática, e a falta de tradição do Brasil em ficção científica obviamente irá se refletir em dificuldades, principalmente por que o orçamento da série não é tão suntuoso como as demais que aparecem na própria NetFlix. Foi uma série feita com recursos escassos e dificuldades técnicas. Black Mirror, por exemplo, teve uma orçamento ao menos 10 vezes maior. O orçamento maior se reflete em mais condições de revisas seu texto, recursos para montar cenas mais imaginativas, mostrar mais do que expor e ainda pagar melhor todos profissionais envolvidos. O que se espera agora é que, com o sucesso da série, possamos vivenciar uma melhora na qualidade e maiores condições de expor as ideias que em princípio ficaram perdidas na série em sua primeira temporada e assim abrir as portas para formarmos a tradição da ficção científica em nossas terras.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | Quase Memória

    Crítica | Quase Memória

    Quase Memória 1

    Filme de proposta ensaística, Quase Memória conta a história de Carlos, um jornalista que recebe um pacote estranho, em sua casa, e passa a explorá-lo. Antes de descobrir o que há na encomenda, o personagem percebe um homem mais velho, que é na verdade, ele mesmo. As duas versões são vividas por Charles Frick e Tony Ramos, e a contraparte idosa tem um claro problema de memória, o que influi diretamente em seu ofício, e faz ambos tentarem recordar os momentos nostálgicos das gerações anteriores.

    As lembranças tencionam chegar a uma poesia, que põe em cheque todo o repertório de seu diretor Ruy Guerra, que reinventa os flashback em formatos extremamente coloridos, protagonizados pelo pai de Carlos, o senhor Ernesto (João Miguel), em uma parcela da história que faz discutir bastante política, baseado principalmente na época da ditadura militar dos anos sessenta. Mesmo com todos os recordatórios, a memória do homem velho segue falhando.

    Quase Memória 3

    Guerra adapta o texto do jornalista Ernesto Cony Filho, mas a transposição não é feita a um modo sério. A abordagem com humor teatral passa do tom na maioria das vezes, chegando ao ponto de irritar profundamente seu público sempre que João Miguel aparece diante das câmeras – fator que ocorre inúmeras vezes dentro dos noventa e cinco minutos de duração.

    O excesso de canastrice faz as situações dramáticas perderem força, falhando no papel de parecer um retrato da história, mesmo que tal recorte seja absolutamente parcial. Outro problema é a pouca exigência de seu ator principal, uma vez que Ramos quase não tem momentos onde sua dramaturgia seja realmente posta a prova, ao contrário, sobrando momentos onde qualquer artista genérico poderia realizar seu papel.

    Os momentos finais são os mais emocionantes, mas nada que justifique todo o entorno pitoresco e risível de Quase Memória. As emoções vividas pelo protagonista, somente nos minutos finais ajudam a relembrar o quão desperdiçado foi o seu talento durante o restante da fita, e o quão frívolo soou o resultado final do exercício de Guerra, que tenciona muito mas entrega pouco.

  • Review | Felizes Para Sempre?

    Review | Felizes Para Sempre?

    felizes-para-sempre-posterA minissérie de Euclydes Marinho reúne um núcleo familiar diversificado, contando o envolvimento dos filhos dos Drummond, com seus dramas de meia-idade que envolvem a batida questão velhice da relação e a comum quebra da fidelidade. As primeiras cenas mostram uma noite em um motel, exibindo o sexo entre amantes, para logo depois exibir a a comemoração do aniversário de 46 anos dos patriarcas. Em meio à homenagens aos idosos, há um sem número de questões óbvias e congratulações, até o rompimento com o lugar comum.

    Após alguns impropérios ditos na mesa de jantar, o filho adotado Joel (João Baldasserini) decide chamar a atenção dos presentes anunciando com pompa que ele e a esposa decidiram se divorciar, para manter o amor entre eles. Por trás da contraditória ideia, é exibida a questão fundamental da refilmagem da oitentista Quem Não Ama Não Mata, também escrito por Euclydes.

    É após o discurso de Joel que se geram algumas situações nos outros casais da família, ecos entre os pares que têm uma rotina sexual combalida, sintetizada no traumatizado relacionamento entre Marília e Claudio (Maria Fernanda Cândido e Enrique Diaz). O que resta do casamento, após o choque da perda de um filho, é uma mulher inconsolável, implorando por qualquer demonstração sexual do marido, que, diante de provas cabais da traição que ele comete, nada faz, dada a prostração em que se encontra e a necessidade carnal que possui.

    felizes-para-sempre-poster-cinefilmesonline.net-globo 11O pensamento cafajeste do marido, normativo e machista, é contrastado com o moderno cenário internos dos prédios de Brasília. Os Drummond têm sua base de operação na capital brasileira, com negócios que envolvem ilegalidades, numa apelação ao cenário de mar de lama. A miscelânea de pecados da corrupção flerta com a necessidade física e com a questão maior do seriado, mostrada no final de casa episódio. Ainda no primeiro capítulo, há uma tentativa da parte da esposa em tentar salvar o casamento, contratando uma prostituta de luxo, Danny Bond, vivida por Paolla Oliveira no auge da forma física, que estaria ali para cumprir a fantasia sexual de Claudio em fazer um ménage a troix, claro, para apimentar de novo o casamento dos dois.

    As cenas dirigidas por Fernando Meirelles são de extremo bom gosto, revelando a sensualidade dos corpos femininos de modo gradativo, repelindo qualquer possível comentário recriminatório sobre vulgaridade. O apuro visual exercido no folhetim se diferencia da fotografia das novelas recentes, com signos imagéticos que remetem à podridão da alma, associando o defeito moral da corrupção a figuras animalescas, como se Brasília fosse a savana moderna, um ambiente hostil que mal respeita as amarras familiares.

    O furor causado pela semi-nudez de Paolla Oliveira é plenamente justificável, não só pela beleza inegável da intérprete, que usa a profissão mais antiga do mundo para demonstrar o quão frágeis sãs as relações conservadoras e normativas, mas também pelo entorno e arcabouço levantados em volta dela. O luxo, a erudição de gosto e pensamento, tudo colabora para que Danny Bond seja uma figura perfeita, obviamente pontuada pelas curvas esculturais da jovem atriz.

    A futilidade habita a psiquê de Claudio, que ao conversar com seu pai, Dionisio (Perfeito Fortuna), se preocupa em aconselhar seu progenitor para que pratique sexo fora do casamento, aparentemente para ver o idoso bem, achando alternativas fora do matrimônio. Tudo para esconder o receio de ter na impotência hereditária a garantia de seu futuro. As relações entre os irmãos também não são fáceis, especialmente nos detalhes trabalhistas que envolvem Claudio e o alcoólatra Hugo (João Miguel), com troca de agressões e acusações seríssimas. Em comum, os irmãos têm a atribulação no casamento. Hugo é casado com Tânia (Adriana Esteves), uma cirurgiã plástica que se envolve em um caso de infidelidade, chamando outro abismo, ainda mais culposo e de consequências magnânimas, de morte e destino.

    Usar a dicotomia presente entre os sentimentos de ciúme e posse de outro ser como base é uma tática tão velha como o mundo. O que diferencia Felizes Para Sempre? de tantas outras minisséries da Globo é a sensibilidade com que ela é levada, além do gabarito de seus realizadores, que conseguem realizar algo mais transcendental e tocante do que foram as recentes produções Dupla Identidade, Amores Roubados, O Rebu e tantas outras. A linguagem visual de Fernando, Rodrigo Meirelles, Paulo Morelli e Luciano Moura transgride as regras básicas da televisão, sem o temor de perder a unicidade visual, expressando as sensações humanas em elementos mortos do cenário, que servem como notas, lembretes da mensagem de depressão e declínio ético dos Drummond e agregados.

    felizes-para-sempre-poster-cinefilmesonline.net-globo 8Alguns dos elementos narrativos são claramente retirados de produtos recentes, como a tela que se abre após chamadas telefônicas, contatos do Messenger e SMS, semelhante ao que foi visto no filme mais recente de Jason Reitman. Aviltante é perceber a ruína geral que ocorre com o clã: Dionísio infartando; Joel em divórcio litigioso; Hugo saindo de casa, também com o casamento falido; e Claudio sendo investigado.

    As atuações do folhetim são quase todas equilibradas, especialmente de João Miguel, fazendo o papel do homem magoado que tenta reagir apesar de seus vícios; Adriana Esteves, como a mulher que tenta resgatar seu casamento, mas é impedida pela família; e, claro, de Maria Fernanda Cândido, a qual representa uma senhora que não tem a atenção do marido, compondo um triângulo amoroso assustadoramente cruel. Mas é Enrique Diaz que concentra os maiores talentos, exibindo um cinismo ímpar de quem só se importa com os próprios problemas, não tendo piedade sequer de seus parentes.

    Os contornos finais do seriado exibem traços trágicos para os personagens principais e reprisam as mesmas características de dramas familiares recentes, como Álbum de Família, com texto de Tracy Letts, e o iraniano A Separação, em que qualquer personagem analisado pelo público exibe enormes falhas do ethos, tornando todos incapazes de gerar uma empatia pura e simples. As semelhanças com Fogueira de Vaidades, de Brian de Palma, também saltam aos olhos, relacionando-se à intrincada rede de influências e desvios de caráter.

    O desfecho guarda ainda mais reviravoltas e atrocidades, dando a alguns dos personagens a moeda que valem, diferentemente do que costuma acontecer nos finais de novela. A tragédia finalmente abraça os Drummond, ao som dos acordes de A Voz do Brasil, o informe que detalha os acontecimentos e meandros do planalto e que em Felizes Para Sempre? anuncia a dor e o rancor liberados por quem usou a desgraça alheia como calço e base de sua existência.  Chega a ser curioso que o tiroteio do episódio cabal tenha tantos elementos típicos do western americano, com detalhes nas cruzes do cemitério e closes nos rostos dos pretensos assassinos, os quais carregam revólveres, o duro aço que prenuncia a morte. O flerte dos personagens com a mortandade finalmente tem seu fim, referenciando as tragédias gregas familiares alinhadas a elementos típicos dos contos rodriguianos.

    Uma Brasília fétida, cujo infortúnio maior da obra é a visão estereotipada e maniqueísta do Planalto, pregada aos setes ventos por Fernando Meirelles nas poucas aparições públicas que teve em 2014. Apesar de apelar para algumas estratégias triviais, a minissérie consegue contar uma história rica, com personagens reais, fidedignos à realidade televisiva brasileira, e que transgride a linguagem audiovisual, apesar do formato episódico e da lição de moral envolvendo a fidelidade matrimonial.