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  • Crítica | Free Guy: Assumindo o Controle

    Crítica | Free Guy: Assumindo o Controle

    Free Guy: Assumindo o Controle estava programado para lançamento em julho de 2020. Adiado por duas vezes desde o início da pandemia, a película finalmente chegou aos cinemas em agosto de 2021. Os trailers já geravam uma grande expectativa, mas o timing do lançamento foi quase perfeito.

    Do início de 2020 para cá, tivemos vários escândalos envolvendo a indústria dos games: o lançamento de Cyberpunk 2077 entupido de bugs e defeitos pela CD Projekt Red, seu descaso com os consumidores, as denúncias de empregados da produtora de assédio moral, horas extras em demasia sem a mínima remuneração, o escândalo de assédio moral e sexual envolvendo a Activision Blizzard e Ubisoft que foi totalmente ignorado pelos chefões das empresas, além do racismo e sexismo por parte de grandes expoentes da comunidade gamer, para ficar somente nos mais notórios. Tudo bem que Free Guy é uma comédia feita para a família, mas o longa dirigido por Shawn Levy aborda de maneira interessante e leve esses problemas que há bastante tempo vêm assolando o mundo dos videogames.

    No filme, Ryan Reynolds vive Guy, um NPC (personagem não jogável) de um jogo de mundo aberto no estilo de GTA. Guy repete diariamente a sua rotina até que ganha consciência própria e resolve quebrar a sua programação, passando a agir por conta própria. Em um desses momentos, ele encontra uma personagem que age de maneira peculiar dentro daquele mundo. Ao conseguir estabelecer contato, a jogadora mostra para Guy que ele vive em um mundo virtual de um jogo de ação, mas que em breve esse mundo irá ser desligado. É quando o protagonista toma a decisão de ajudar a jogadora a manter esse mundo vivo, plano esse que trará serias repercussões no mundo virtual e no mundo real.

    Roteirizado por Matt Lieberman e Zak Penn se equilibra muito bem com sua narrativa dividida entre os eventos do mundo virtual e real. Enquanto no mundo virtual vemos uma inspirada paródia de jogos como Grand Theft Auto, Fortnite e outros jogos no estilo sandbox, no mundo real a narrativa traz críticas à práticas tóxicas da comunidade gamer, ao consumismo desvairado e à atuação predatória das grandes empresas de videogame. Tudo isso é feito de maneira muito bem acertada, com um deslize mínimo aqui e ali, o que não compromete em nada a narrativa. As piadas visuais são muito bem sacadas e existem diálogos espertíssimos durante todo o filme. Talvez o único ponto capaz de gerar controvérsia é a interpretação extremamente caricata de Taika Waititi. Ainda que a intenção seja mostrar alguém inescrupuloso que não aceita ser contrariado, em muitos momentos o ator/diretor infantiliza demais o personagem.

    A narrativa central em torno de Guy denota uma inspiração em O Show de Truman. Seu despertar e sua jornada de autoconhecimento vai ganhando contornos de reality show à medida que a comunidade começa a observar com atenção suas ações e seu desenvolvimento no mundo virtual. Em paralelo, a subtrama envolvendo Jodie Comer, a programadora que invadia o jogo como Molotov Girl, seu avatar em Free World que desperta o amor de Guy, é feita com bastante sensibilidade, mas sem cair no sentimentalismo barato, já que ela batalha para que sua propriedade intelectual que pode revolucionar todo o mundo dos games não se torne somente uma ferramenta para arrancar dinheiro dos usuários. Dentro disso tudo, são amarradas as críticas mencionadas no parágrafo anterior, que apesar de não serem escancaradas, são evidentes o suficiente para gerar questionamentos internos nos espectadores.

    É muito interessante observar como Ryan Reynolds rende quando tem um diretor que sabe conduzi-lo da forma correta. Nos últimos tempos, o ator vinha sempre interpretando variações de Deadpool e de seu próprio comportamento em redes sociais, o que vem o tornando extremamente repetitivo. Porém, o diretor consegue arrancar uma boa atuação de seu protagonista, com ótimas nuances de comédia e drama quando o momento se faz necessário. Jodie Comer mostra porque vem se destacando em Hollywood, a protagonista de Killing Eve entrega uma atuação comprometida e cativante tanto quando está no mundo real, como quando está no virtual. Já Waititi, como já dito, entrega uma atuação vacilante em certos momentos, mas nada que seja comprometedor. Entretanto, o grande destaque é Lil Rel Howery, o ator que já foi muitíssimo bem como o amigo de Daniel Kaluuya em Corra!, faz uma atuação sensível e divertida, roubando todas as cenas em que aparece, além de ser responsável pelos grandes momentos emocionais do filme. Os demais atores não comprometem e o longa ainda consegue espaço para diversas participações especiais.

    Em resumo, Free Guy é um divertidíssimo filme que vale demais a pena ser assistido. Não posso esquecer de dizer que o filme é um roteiro original, ou seja, não é baseado em nenhum livro, história em quadrinhos ou outra produção. Tomara que no meio da enxurrada de adaptações, remakes e reboots continuem a aparecer ideias originais boas assim.

  • Crítica | Sete Dias Sem Fim

    Crítica | Sete Dias Sem Fim

    sete dias sem fim

    A tradição encerrada na entidade familiar comumente produz relações distantes, e o tempo se encarrega de engrossar ainda mais seus pontos diferenciais. Manter amizades já é um esforço demasiado, estreitar laços com pessoas as quais não se escolheu ter relação torna-se ainda mais difícil. É sob uma ótica de vidas cuja razão se perdeu através do desprezo humano geral que Sete Dias Sem Fim é narrado, primeiro mostrando a derrocada de Judd Altman (Jason Bateman), de dedicado marido a divorciado deprimido, para logo depois mostrar de forma agridoce o falecimento de seu pai, o que o obrigaria a sair de sua caverna pessoal para prestar condolências aos seus outros entes queridos.

    Nos momentos iniciais, apesar das gags cômicas, a sensação que predomina é a melancolia, assinalada pela trilha sonora, levada pelo piano clássico. No enterro, reencontros ocorrem, a maioria bastante atabalhoados, o primeiro deles com Wendy (Tina Fey), a irmã desbocada que cuidava do patriarca. O segundo ocorre após a chegada de Philp (Adam Driver), em seu carro de luxo, cujo som alto, tocando rap ostentativo quebra o clima de luto.

    Com poucos minutos de exibição nota-se a maioria dos problemas existentes na interação de todo o clã, o quanto cada um deles tem dificuldade em viver em comunidade e conviver consigo mesmo.  O constrangedor silêncio é finalmente quebrado pela matriarca Hillary (Jane Fonda), que clama para que a família converse entre si, especialmente para incluir as conversas disfuncionais dos presentes em seu próximo best-seller, mostrando que a exploração do grotesco vai além dos ângulos escolhidos por Shawn Levy.

    Logo as garras são expostas numa intensa briga por um dos patrimônios do pai, e no qual Paul (Corey Stoll) tem sua única fonte de renda, enquanto Philip quer fazer parte das decisões financeiras, mesmo sem ter qualquer jeito para isto. Após o embate físico, os familiares são obrigados a conversar sobre as memórias do falecido, numa tentativa de unir quem não quer ficar perto, quem não quer ter unidade. Lá, as mentiras e indiscrições ficam mais evidentes, como feridas que pedem para serem estancadas.

    Os bate-bocas e intrigas evoluem e tornam-se cada vez mais verborrágicos, exibindo uma violência reprimida por anos e que somente piorou com o acúmulo de hostilidade e guardadas em virtude do afastamento entre os entes. O roteiro se encarrega de mostrar que, apesar do claro incômodo presente na intimidade entre eles, ainda há espaço para a solidariedade e companheirismo, especialmente nos momentos de crise, quando a miséria da alma de Judd consegue se aprofundar ainda mais.

    Apesar de cada um dos personagens viver o seu pequeno inferno pessoal, o modo como a película conduz é leve, numa alegoria a um estilo de vida em que pouco se preocupa com as questões de resolução difícil e as as trata de modo amistoso, uma vez que são inevitáveis no padecimento de existir.

    Quanto mais os filhos tentam se afastar da casa matriarcal, mais e mais segredos são trazidos à luz, com fatos assustadores para a mente dos herdeiros. Encarar a realidade e a complexidade de ter de conviver com o luto e seguir em frente não são tarefas fáceis para nenhum dos personagens. O otimista “ensinamento” presente no roteiro é de que os esqueletos guardados dentro do armário podem até fazer a vida parecer pesada, mas não devem impedir o prosseguimento da existência, tampouco permitir que a tristeza tome conta do espírito, de assalto. A moral presente em Sete Dias Sem Fim mira o alto, fugindo da obviedade, tratando de modo leve as questões pesadas da vida.

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  • Crítica | Uma Noite no Museu 3: O Segredo da Tumba

    Crítica | Uma Noite no Museu 3: O Segredo da Tumba

    Uma Noite no Museu 3 - O Segredo da Tumba

    Poucas trilogias mantêm a qualidade e sucesso nas três partes de suas histórias. Mesmo grandes produções, como O Poderoso Chefão e De Volta Para o Futuro, apresentaram oscilações. Normalmente, ao nos referirmos a trilogias, o último ato sempre é o mais difícil de ser bem executado. À exceção, talvez, de O Retorno do Rei, na trilogia O Senhor dos Anéis, o melhor dos três e grande desfecho da saga. Realizar três histórias diferentes com a mesma qualidade é um processo difícil, ainda mais quando as três produções são desenvolvidas de maneira separada, sem nenhum plano inicial de conduzir continuações, mas que, devido ao sucesso de público, ganham mais uma história nas telas.

    Nestes casos, observamos um padrão entre cada parte de uma trilogia. Normalmente, o segundo filme reconta a história do primeiro de maneira levemente diferenciada e maior, muitas vezes cometendo excessos para entregar algo a mais ao público. Por consequência, se a continuação recebeu críticas negativas, sua terceira parte tenta equilibrar-se nos acertos anteriores, evitar erros e tornar competente o desfecho.

    Esta proposição pode ser vista na trilogia Uma Noite no Museu, a franquia mais familiar do comediante Ben Stiller. Após o primeiro filme, que trabalhava com simplicidade uma história lúdica e mágica, sua sequência apresentou excesso de novos personagens e cenários que desequilibraram a narrativa, resultando em um filme inferior. Eis que Uma Noite no Museu 3: O Segredo da Tumba evita o excesso de novas personagens, mantendo os conhecidos e cativantes integrantes do Museu em uma nova aventura que decidirá o destino de cada um deles.

    Shawn Levy assume novamente a direção nesta produção que enfoca o trabalho do vigia noturno Larry Dayle em um museu de história natural. Um local onde, durante a noite, as personagens históricas ganham vida graças à magia da Pedra de Ahkmenrah. Devido a uma corrosão que surge na peça, Larry viaja até Londres para pedir ajuda ao Faraó Merenkahre, o criador do artefato.

    A produção começa com um pequeno prólogo em uma escavação do Egito, quando um garoto acidentalmente encontra a tumba onde está a pedra. Durante muito tempo, este mesmo garoto seria o guardião noturno do museu, um dos antigos vigias que retorna à história quando Larry procura-o para pedir informações sobre o artefato. Enquanto lida com este problema do museu, Dayle tem problemas com o filho, decidido em não seguir nenhuma carreira acadêmica. Um conflito paternal explorado além da aventura.

    Como na história anterior, as personagens necessitam explorar um novo museu e se deparam com novos objetos que ganham vida devido à Pedra de Ahkmenrah. Ao contrário do excesso de personalidades de Uma Noite no Museu 2, somente um novo personagem acompanha a jornada dos heróis: o famoso cavaleiro Lancelot. A adesão da figura nobre à trama promove humor e ajuda a intensificar as cenas de aventura e ação. O museu britânico é limitado a poucas áreas, o que se evita o surgimento de outros personagens, mas ainda apresentando novos monumentos em cenas pontuais, principalmente porque há salas específicas para diversos países e regiões. Sem deixar de lado o acervo grandioso do museu, a história destaca a litografia Relativity, de M. C. Escher, e ainda inova uma cena de batalha encenada dentro do quadro com suas diversas visões de perspectiva e tridimensionalidade (um dos pôsteres de divulgação utilizou o quadro em cena).

    A trama dosa a aventura e o lado familiar, afinal trata-se de um filme feito para um público amplo, de crianças a adultos. As cenas de humor são simples, com um tipo de riso que é provocado sem agressividade. Um estilo de produção que não busca nenhuma invenção, mas segue uma cartilha própria, consagrada nas histórias anteriores e com personagens queridos do público.

    A produção marcou a despedida de Robin Williams, sendo esse o último filme estrelado pelo comediante. Alguns críticos apontaram que sua morte modificou levemente a estrutura desta obra, que adquire um tom mais maduro e sensível em seu ato final. As últimas falas do Presidente Teddy Roosevelt dialogam sobre o fim e o início de novos caminhos, a sensação de desconhecimento sobre o futuro que seria benéfica devido às suas muitas possibilidades. Uma realidade que gera outra carga a essas palavras. O público anula momentaneamente a diferença entre personagem e ator para, com emoção, se despedir do próprio Williams na figura do presidente. O adeus a um ator que sai de cena da mesma maneira que entrou nos palcos: em um papel cômico, demonstrando que conduziu sua vida até o fim na esperança de trazer o riso aos outros.

    Neste misto de comédia, história familiar e leve drama dentro e fora das telas, Uma Noite no Museu 3 realiza um desfecho com qualidade a uma história simples, sem muitas pretensões, mas que cativou o público principalmente pelo jogo cênico de personagens históricas, dialogando entre si, e o humor acessível de Ben Stiller.