Tag: Thomas Kretschmann

  • Crítica | King Kong (2005)

    Crítica | King Kong (2005)

    Peter Jackson é um diretor diferenciado, na época em que fazia filmes B na Nova Zelândia como Trash: Náusea Total ou Fome Animal ele mostrava um grande amor pelos filmes de terror de baixo investimento e frutos do exploitation, o mesmo ocorre quando adaptou os romances de J.R.R. Tolkien, demonstrando um apreço ao texto original. Quando ele decidiu lançar a sua versão de King Kong, também foi assim. As críticas em volta da sua produção foram muitas, mas é indiscutível que existe um esforço para expandir a trama e a abordagem do King Kong de 1933.

    Quando foi lançado para o cinema, o longa já era muito extenso, e ao ser lançado para o mercado caseiro ainda teve o acréscimo de 14 minutos adicionais no que foi conhecido como a Versão Estendida do diretor. O filme é uma ode ao cinema, seja na apresentação que transforma o logo da Universal no que era comum em 1933 ou nas referências que o Carl Denham de  Jack Black faz a um certo Cooper, na verdade Merian C. Cooper, produtor e diretor do primeiro filme, além disso, o nome do navio é Venture Surabaya, em atenção ao cenário do começo de King Kong de 1976, que teve uma estratégia diferente em contar sua história.

    O roteiro Jackon, Fran Walsh e Philippa Boyens expande e dá substância ao universo criado, além de tempo de tela e propósito para os personagens humanos, de um modo que as outras encarnações não deram. As tramas humanas não são meros pretextos para ludibriar o macaco ou o público, embora passem longe de serem perfeitas, pois todos eles acabam com envolvimentos sentimentais em demasia, fazendo com que o filme soe melodramático em excesso.

    Da parte do elenco, não há muito o que reclamar. Por mais artificial que alguns diálogos pareçam (especialmente os da tripulação do Venture), Black, Adrien Brody, Naomi Watts, Thomas Kretschmann, Colin Hank, Jamie Bell e Kyle Chandler tem desempenhos assertivos. O design de produção unido ao esforço dramático dos atores criam uma atmosfera única, as vezes sabotada pelos maneirismos que Jackson emprega e pela falta de lógica no comportamento de criaturas selvagens.

    O macaco é visualmente impressionante. Os pelos, textura e tamanho aliado a atuação que Andy Serkis emprega dá peso e realidade ao personagem. Se Kong deveria agir como um gorila gigante ou como um outro passo evolutivo da espécie é uma discussão válida, mas dentro da escolha narrativa que Jackson faz, Serkis entrega um desempenho excelente, esforço que reforça a ideia de que natureza intocada é algo belo e harmônico, que só se mostra destrutiva quando ocorre a ação do homem, supostamente, civilizado.

    As cicatrizes, os dentes quebrados e o caráter arredio são mostras de que Kong lutou muito para sobreviver. O cuidado em tornar uma criatura digital lidar com o mundo selvagem e urbano foi bem retribuído, e são poucas as cenas em que os efeitos digitais parecem falsos. Na parte da cidade, o filme segue com os mesmos problemas ligados a pieguice. Certamente, King Kong de Peter Jackson é repleto de boas intenções e poderia ser tão querido quanto as encarnações de John Guillermin e Cooper foram na sua época, mas acabou se tornando o primeiro de vários filmes do diretor neozelandês que foram encarados como enfadonhos, ainda que seja repleto de méritos.

  • Crítica | O Motorista de Táxi

    Crítica | O Motorista de Táxi

    O Motorista de Táxi não é só um filme pra inglês ver. Não há nada de errado se fosse, mas eu explico a expressão com todo o prazer: segundo a maioria dos historiadores, quando a Inglaterra pressionava o Brasil para interromper o lucrativo tráfico de escravos no século 19, o governo deu esse jeitinho brasileiro clássico de esconder as práticas ainda escravagistas que rolava por aqui, e que principalmente em 2018 ainda consente nos inúmeros direitos retirados de trabalhadores, e já consentia também há mais de 180 anos. Ou seja, escondeu o feio pro povo da coroa só ver o belo. E para alguns filmes, exceto esse em questão, é a mesma coisa. Para isso se dá o alcunha de feel-good movie ou blockbuster PG-13. Fiéis a sua proposta básica de entretenimento, do primeiro ao último segundo de projeção, a promessa precisa ser firmada, refirmada, e assim sendo, cumprida. E tirando os esquemas centenários do nosso (des)governo, não há nada de errado com isso, afinal desde 1965 que a Globo manipula a realidade do jeitinho que esses filmes fazem numa escala perceptivelmente maior.

    Isso poderia entrar numa longa discussão sobre o papel da arte (para não falar da mídia em geral) a fim de remodelar ao bel prazer dos seus agentes a nossa percepção de mundo. Mas a intenção certamente não é essa, aqui. Ficamos com a seguinte constatação: o filme do diretor Jang Hoon é uma flor que vence entre as raízes dos cedros, em meio ao asfalto duro ou da neve mais fria, na pior das temperaturas. É um manifesto ao otimismo que precisa ser reinante, mesmo que careça de uma bengala e um pouco de calor humano para resistir a tempos sociais tão difíceis como foram os protestos estudantis nas ruas da cidade de Gwangju, donde surgiu um verdadeiro massacre em 1980 contra todos que se cansaram da ditadura que viviam no país. Nisso, o filme explora o potencial e os efeitos de um raio de sol que corta o céu nublado, mesmo que este não tenha total conhecimento de parte do que representa para o todo.

    É o caso do taxista Kim. Sua luta é a de um trabalhador comum, pelo sustento de sua única filha, e alienado como o adulto que é, apenas condicionado nas suas opiniões, acha que o motivo pelo qual os mortos de Gwangju bravamente lutaram é injustificado, e prefere tudo como está – como deixa claro num tenso diálogo dentro do seu ganha-pão motorizado com um estudante visto como comunista tanto por Kim, quanto pelo autoritarismo que a Coréia do Norte ainda enfrenta hoje, em 2018. Seduzido pelo dinheiro, Kim conduz um jornalista investigativo alemão para o olho do furacão, sendo por isso mesmo levado (e levando) a ver e a se envolver na luta armada da época que antes subestimava, e no fundo desprezava. E é justamente a partir disso, da sua exata metade em diante quando combina ficção com fatos históricos que O Motorista de Táxi ganha contornos hábeis de um filme que vai além do lugar-comum por se permitir ter e portar algo a mais que outro feel-good movie qualquer, algo que apenas por ventura colaboraria com uma visão de mundo colorida e irreal. Absolutamente, não é o que temos aqui.

    Excessivo em sua duração, mas bem escalonado em seus propósitos de 1) expor com realismo e uma apuração técnica discreta os trágicos fatos sul-coreanos dos anos oitenta, e 2) manter sem digressões ou contradições a leveza do início da estória, mas expandindo os sentidos de tudo, eis um título que dificilmente consegue ofender ou aborrecer de alguma forma os seus espectadores, mas satisfazer quem procura por uma boa pedida do extraordinário Cinema da Coréia do Sul. Uma filmografia nacional digna de aplausos e que dificilmente decepciona, em qualquer gênero que se apresenta para o mundo. Além disso, é sempre um prazer assistir ao fantástico ator Kang-ho Song num papel que o deixe rir, sorrir e desenvolver na tela o seu lado mais jocoso e sensível, de modo que quase nos esquecemos daqueles outros tão paradoxais a isso que tanto nos habituamos ao longo dos anos em vê-lo encarnando, e com perfeição ímpar.

    Eis uma gratificante surpresa aos amantes das boas narrativas. O próprio roteiro de O Motorista de Táxi é portanto uma analogia ao acaso, aos rumos inesperados de uma guerra ou de uma emocionante perseguição cinematográfica de carros, e talvez até a elementos do destino para seguir entrando em contato gradual com o aspecto mais e mais político da estória, pois a realidade sempre consegue adentrar. Choca-se, ou melhor, integra-se deliciosamente bem com outros tons, diferentes dos do seu início pacífico e timbrado somente por tons amigáveis e ensolarados. Nisso, é curioso perceber como o Cinema consegue, agindo como irmão da realidade que é, transformar um dia comum em montanha-russa que muda os eventos do agora para toda a posteridade, a seguir. E Kim achava que sua vida nunca cairia longe da mediocridade de seu táxi amarelo, sempre acostumado com aquela realidade política confortável e sob controle, vivendo em paralelo com uma guerra separada de sua casa por aquelas mesmas ruas de sempre, e claro, aquela mesma rotina que um dia teve a certeza em julgá-la interminável.

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  • Crítica | Hitman: Agente 47

    Crítica | Hitman: Agente 47

    Hitman- Agente 47

    Segunda versão cinematográfica baseada no jogo lançado pela IO Interactive em 2000, Hitman: Assassino 47 é uma nova tentativa da 20th Century Fox, mesma produtora do primeiro longa, de investir em uma franquia de sucesso nos consoles e PC. Uma fonte que sempre resultou em adaptações difíceis, sendo Resident Evil – Hóspede Maldito uma das versões mais conhecidas.

    O grande desafio de adaptar um jogo para os cinemas se deve à fidelidade necessária à história e à construção de uma narrativa que mantenha o mesmo conceito conhecido por seus jogadores e tenha um alcance universal para o público em geral. Muitos jogos se baseiam em um argumento base e se desenvolvem em missões, transitando por temas semelhantes, um estilo que pode abarcar o cinema mas nem sempre representá-lo com qualidade.

    Os preceitos fundamentais do game, sobre um assassino profissional clonado e modificado geneticamente, são estabelecidos nos minutos iniciais da produção, em uma narrativa em off. À semelhança da origem do herói Capitão América e o soro do Super Soldado (criado por uma equipe que morre logo após a experiência com Steve Rogers), o único homem capaz de reproduzir a experiência do Agente 47 está desaparecido e começa a ser caçado por uma agência para repetir a experiência e compor um exército.

    Com o diretor estreante Aleksander Bach e uma trama escrita pelo mesmo roteirista do primeiro longa-metragem, é evidente que a série não é tratada como um produto de primeira linha com possibilidade de alta rentabilidade. Mas sim uma narrativa voltada para um alcance médio de público, capaz de pagar seus gastos e obter algum lucro. Inicialmente, a personagem inicial  provavelmente seria de Paul Walker. Um provável desafio para o ator sorridente incorporar um papel fechado e normalmente inexpressivo, além de garantir um atrativo ao público. Infelizmente, Walker saiu de cena antes do início da produção e o britânico Rupert Friend assumiu o papel.

    Com uma figura naturalmente apática devido a sua programação para se tornar um assassino de aluguel, a identificação com a personagem é difícil. A trama é claramente voltada para a ação com uma miscelânea de estilos diversos vistos em outras produções na última década: lutas corporais com golpes brutais, cenas bem ensaiadas como balé, exageros que desafiam a lei da gravidade, câmeras que acompanham a movimentação das personagens e imagens cujo impacto visual, com uso de reflexos e cores quentes, em contraste com a fotografia azulada, se destacam.

    Objetivo ao extremo em sua narrativa, as cenas de ação ao menos se sustentam e seus personagens transitam de uma cena a outra sem muita evolução. Talvez se houvesse maior dedicação e elaboração no projeto, o produto seria melhor além de um filme de ação que peca pela falta de estilo próprio, mesmo que seu argumento base seja suficiente para ser bem trabalhado nas mãos de bons roteiristas. Como um encadeamento de cenas de ação, Hitman: Assassino 47 pode satisfazer e – de fato – sua bilheteria comprova que a produção foi capaz de pagar seu orçamento e ainda obter lucro. Porém, falta muito para que seja um filme minimamente considerável e, como a produção anterior, com Timothy Olyphant, será esquecido em breve, engolido por bons lançamentos do ano e, futuramente, adaptado por uma terceira vez ou sumariamente renegado aos bons jogos lançados até então.