Tag: Édgar Ramírez

  • Crítica | Caçadores de Emoção: Além do Limite

    Crítica | Caçadores de Emoção: Além do Limite

    caçadores-de-emoção-2-poster

    Os últimos anos têm sido marcados por refilmagens de sucessos do passado, tendo em sua maioria tentativas fracassadas de reaver hits, não conseguindo sequer atingir o objetivo de aproximar o clássico original de uma versão mais nova. Caçadores de Emoção – Além do Limite é um exemplo disso, de como mudanças na premissa podem soar falsas e frívolas. A versão de John Utah é vivida por Luke Bracey (de G.I. Joe: Retaliação e November Man), bastante diferente de Keanu Reeves no original Caçadores de Emoção, como um atleta radical arrependido de suas peripécias, aposentado graças à morte de um antigo amigo em uma das manobras suicidas que praticava ao gravar vídeos para o Youtube.

    A direção fica a cargo de Ericson Core, conhecido por assinar a fotografia de alguns recentes sucessos do filão de ação, entre eles O Troco e Velozes e Furiosos, que curiosamente possui todo o esqueleto narrativo do filme de Kathryn Bigelow. O papel de Core enquanto cineasta é apresentar belas paisagens em planos abertos e muito bem pensados. Há pelos menos três cenas de absoluta adrenalina mas que perdem força diante do terrível texto de Kurt Wimmer.

    Apesar da bela compleição de Édgar Ramirez, sua versão de Bodhi consegue ser apagada e pouco plausível. A opção por tornar o anti-herói em um terrorista da aventura soa pueril demais, igualando essa motivação ao caráter bobo do outro protagonista. Falta carisma, química e substância, não só a dupla como a todo o grupo de esportistas radicais.

    A desculpa de espiritualidade por trás dos crimes cometidos soa ofensivo em todas as manifestações, e o entorno de Bodhi é formado por um papel mais genérico do que o outro. Assistir ao grupo de aventureiros sem camisa ao menos gera no espectador a divertida competição de encontrar a tatuagem mais feia nos corpos de cada um dos surfistas, já que nada na mistura espiritual entre Capitão Planeta e Robin Hood funciona como trama pseudo-adulta.

    O esforço por transformar o enredo em algo mais solene do que o original soa patética, bem como todas as tentativas de romance e amizade indiscutível. Bracey não consegue convencer em cena nenhuma, fazendo o público discutir inclusive os métodos do FBI em confiar-lhe tanta verba para as suas missões. Mesmo o conteúdo homoerótico velado soa ofensivo, uma vez que não há mais a necessidade de mascarar qualquer mensagem de descoberta de afeto sexual ou emotivo entre homens. Para piorar, as cenas de escalada e surfe têm uma qualidade de CGI sofrível, destoando inclusive dos momentos positivos anteriores, encerrando Caçadores de Emoção – Além do Limite de um modo pífio e ofensivo para qualquer aficionado por adrenalina.

  • Crítica | Joy: O Nome do Sucesso

    Crítica | Joy: O Nome do Sucesso

    Joy 1

    Cinebiografia baseada na história da empresária e inventora Joy Mangano, a nova produção de David O. Russell em parceria com Jennifer Lawrence traz à vida a oscarizada atriz no papel-título, apresentando a si um novo desafio: encarar o papel de uma senhora empreendedora bem mais velha que seus vinte e poucos anos, no árduo caminho que fez até tornar suas marcas Miracle Mop e Huggable Hangers em sinônimo de um resultado glorioso.

    O lugar comum de Joy envolve uma conturbada relação com seu ex-marido Tony (Edgar Ramirez), que vive em seu porão, juntando a isto a chegada de seu pai Rudy (Robert DeNiro), fato que desconfigura completamente sua já atrapalhada rotina. De início, a história de Russell e Annie Mumolo (atriz e co-roteirista de Missão Madrinha de Casamento) estabelece uma conversa metalinguística com um programa televisivo, antecipando acontecimentos reais da vida da biografada, ainda que o escopo neste se assemelhe demais as novelas mexicanas vinculadas a Televisa, repletas de um dramalhão exagerado e pouco condizente com a realidade.

    A principal crítica negativa relativa a personificação de Lawrence é até aludida em um dos diálogos, com o xingamento de uma cliente a Joy, afirmando que ela não aparenta ser jovial. O gracejo serve basicamente de resposta bem humorada, por parte do cineasta, em prol da defesa de sua colaboradora recorrente. Tudo em Joy parece servir de degraus para mais premiações e reconhecimentos ao esforço dramatúrgico da estrela, uma vez que até os momentos fantasiosos do argumento são semelhantes aos clichês de contos de fadas, alguns mais acertados do que outros, o que demonstra certa irregularidade na exploração deste recurso.

    Joy 3

    A forma de abordagem do tema se assemelha bastante a outro momento da filmografia de Russell, como visto em O Lado Bom da Vida. A pecha de resolução positivista de empreendedorismo que se esperava dá lugar a um caminho com alguns agressivos argumentos de auto ajuda, em especial após a primeira meia hora de duração, que é quando a personagem apresenta sua ideia de esfregão super poderoso. O fato de situar a protagonista em meio a uma família disfuncional assemelha mais ainda este ao filme de 2012 sobre depressão, mas neste, mais parece uma muleta emotiva na maior parte das vezes,  soando frívolo e redundante.

    Há uma queda vertiginosa de qualidade entre um período e outro de filme. Toda a publicidade em volta do novo produto e estratégias de venda soam toscas e baratas, semelhantes aos folhetins televisivos latinos. Até a aparição de Neil Walker (Bradley Cooper) soa falsa e repentina. Outro pedaço da história que não faz sentido é a tentativa de embelezar a figura de Joy, que já está claramente bem apessoada com as feições e curvas de J-Law.

    Os méritos de Russell passam por sua direção e nos takes diretos. O uso extensivo de super closes é certeiro, a esse aspecto é somado um movimento de câmera acelerado, emulando a velocidade de um disparo de pólvora, evidentemente referenciando a questão do pioneirismo da mulher biografada.

    O desequilíbrio entre uma direção inventiva e um roteiro com alguns tropeços piegas é evidente, o que faz o saldo de Joy O Nome do Sucesso ser menos positivo do que A Trapaça e O Vencedor, ao mostrar uma trajetória demasiada adocicada sob um escopo agridoce, focando quase exclusivamente no período em que Magano era anônima, tendo em seu currículo apenas sua vontade de vencer os obstáculos que se punham a frente e claro, a luta por sobreviver em um ambiente familiar hostil e controverso, como é praxe da filmografia de Russell.

  • Crítica | Livrai-nos do Mal

    Crítica | Livrai-nos do Mal

    Baseado em uma história verídica, Livrai-nos do Mal começa focando o deserto arenoso do Iraque, com uma gravação amadora de militares americanos, que, em solo estrangeiro, tencionam levar a mesma civilização nada conciliatória que descobriram para sua terra natal. Após os créditos iniciais, é apresentada uma Nova Iorque oprimida, vítima de assassinatos a sangue frio, que tem em Ralph Sarchie (Eric Bana) o avatar de todo o seu pessimismo. O policial é cético, de relações nada íntimas e pouco fáceis, que vê somente em sua família a possibilidade de paz, mesmo que nem junto a ela consiga encontrar a serenidade.

    A partir da larga experiência do diretor Scott Derrickson em chocar, de modo amedrontador, o espectador – tomando por exemplo seus momentos anteriores, como em O Exorcismo de Emily Rose e A Entidade –, a fita segue apelando para lugares comuns no quesito fobia, em que a câmera constantemente evidencia o medo de aranhas, cobras e morcegos. Até em seus aspectos emocionais, o roteiro se baseia na melancolia, outro clichê de temor. Tudo, claro, calcado no personagem de Bana, que, ao mesmo tempo em que possui uma vida familiar bela, tem de encarar uma profissão cuja função é resgatar bebês em lixeiras. No entanto, as imagens chocantes perdem um bocado do seu impacto, por serem seguidas de momentos de humor extremo.

    A fotografia e iluminação ajudam a aumentar a aura de horror por serem mostradas quase sempre no breu, tanto nas casas quanto no zoológico – um lugar assustador quando anoitece, como um dos personagens destaca. Algo oculto move as pessoas vitimadas, um artifício que parece incorpóreo e irreal e realizado por meio de uma clara apelação para um medo comum. Sem contar o fato de mostrar pessoas repletas de cicatrizes, outro temor comumente compartilhado por todo o público.

    No decorrer das investigações, Sarchie começa a ter sua falta de fé questionada, pois os mesmos eventos vistos em sua intimidade ocorrem também na casa em que vive, onde a origem paranormal ou espiritual é deveras discutida. Ele é descrente quanto a ações de seres invisíveis, mas incrivelmente ouve uma estática nas gravações e o som de pessoas rindo, elementos exclusivamente contemplados por ele e fruto de um radar, dito por seus colegas como um talento inato.

    Após verificar uma moça que tentou matar seu filho, Sarchie encontra um padre latino de aparência bela. Padre Mendoza (Édgar Ramirez) é um religioso diferente, que tenta convencer o agente da lei sobre a “verdade”, o irremediável mal que insiste em provocar pavor nos homens, tentando-os com seus mistérios, que, em última análise, são como ritos de invocação para ação dos maus agouros. É como se todo lugar fosse o hall, a passagem para a habitação dos que estão embevecidos pelo torpor da ação daquilo que os inspira. As escrituras do Iraque são reproduzidas nas casas dos envolvidos e parecem provocar nos que as habitam uma influência hostil e maléfica, primeiro fazendo temor, depois, tomando suas ações.

    Sob a trilha de The Doors, o padre conta sua intimidade e antigos vícios em heroína que lhe fizeram mal, mas que o impediram de beber ou fumar – ou de ceder a uma olhada a belos corpos femininos. A desculpa – plausível – é de que as drogas legais o matam lentamente, e não rapidamente como as anteriores. Finalmente Archie cede, após começar a se identificar com o pároco. Aparentemente não fica apenas nisso, visto que o personagem até volta a proferir o chamado a Jesus, mesmo que sua fé tenha sido abandonada há décadas.

    Seu intenso trabalho forense invade sua casa; os mesmos sinais malignos investigados passam a habitar seu lar, e a construção do roteiro é lenta, gradual e plenamente cabível. Ele teria um dom chamado “discernimento de espírito”. O tal radar, que seus parceiros acham ser um talento policial, seria, segundo Mendoza, um dom espiritual que nem mesmo o reverendo teria a sua mão, dada a raridade desta habilidade. Aos poucos, a relação dos dois se estreita cada vez mais, emulando as duplas de agentes de raças diferentes, típicas dos filmes de tira oitentistas.

    O grito abafado pelos sons cotidianos simboliza o abandono ou o receio de que isto isto se concretize por parte de Sarchie, assemelhando-se demais à fala do sacerdote: “Um santo não é um exemplo de moral, um santo presenteia à vista.”. A premissa justificaria as falhas de ambos os protagonistas, além de unir os dois em torno do mesmo objetivo.

    Ao contrário de seus primos semelhantes, Livrai-nos do Mal tem no elenco, equilibrado e inspirado, um ponto forte. Por mais irreais que sejam seus dramas, a abordagem se aproxima muito do verossímil, um realismo fantástico bem construído e que faz poucas concessões à suspensão de descrenças, mesmo nos insistentes duelos de facas feitos por Butler (Joel McHale). A experiência de Derrickson como realizador fez valer os préstimos na toada espiritual, mas se mostrou ainda mais incomum e bem-sucedida nas sequências policiais e nos momentos de inspiração e tentativas de redenção. Toda a tragédia que toca o policial é maximizada pela ótima interpretação de Bana, na volúpia do personagem pelo perdão, que ignorou por anos, mas que não o impediu de sofrer represálias. Os pecados de Ralph até aparentam ser o motivo de todo aquele apuro que se apresentava, o que evidentemente era uma artimanha do rival de suas almas, que buscava engodá-lo.

    Após as fortes cenas onde é feito um ritual e onde todos os pecados pretéritos da dupla são escrutinados e usados contra si, enfim ocorre a bonança, com a libertação da alma de Santino (Sean Harris, irreconhecível quase), que logo traz à luz a paz de volta à vida de Sarchie, sobrevivendo até mesmo à mudança de gênero. Sua segunda metade, apesar de ser bem mais didática do que o todo, é reveladora, tendo sua credibilidade posta em cheque por abandonar um pouco o suspense, mas conseguindo apresentar uma boa ambientação policial. Os últimos momentos têm uma notável queda de qualidade, por ter um cunho demasiado piegas, mas que, à luz de toda a extensão do filme, não se caracterizam como um elemento necessariamente ruim.

  • Crítica | O Conselheiro Do Crime

    Crítica | O Conselheiro Do Crime

    o conselheiro do crime - poster brasileiro

    O britânico Ridley Scott está no panteão de grandes diretores vivos. Porém, as melhores produções de sua carreira estão situadas em décadas passadas: sua estréia, Os Duelistas, adaptação de uma história de Joseph Conrad, ganhou o prêmio de Melhor Primeira Obra em Cannes. E suas duas seguintes produções, Alien – O Oitavo Passageiro e Blade Runner – O Caçador de Andróides são obras máximas da ficção científica. Três filmes que sustentam com muita solidez o sucesso do diretor.

    Scott ainda vive pela potência do passado, projetando na própria carreira a sombra de seu início. Até mesmo quando intentou um retorno às suas origens com outra ficção científica, Prometheus, teve uma recepção dividida entre público e crítica.

    Diante desta filmografia oscilante, o grande atrativo de O Conselheiro do Crime era o roteiro assinado por Corman McCarthy, considerado um dos maiores escritores americanos contemporâneos, e o elenco talentoso formado por Michael Fassbender, Javier Bardem, Brad Pitt e Penélope Cruz.

    A história entregue pelo escritor situa-se longe de sua prosa premiada. Mesmo que uma narrativa e um roteiro cinematográfico se aproximem em certas instâncias, há diferenças estruturais entre eles. Tem-se a ilusão de que um bom escritor é capaz de dominar todas as vertentes narrativas, mas poucos foram capazes de se destacar em todos os gêneros. No Brasil, Rubem Fonseca, em entrevistas, autodeclara-se um cineasta frustrado e seu roteiro de O Homem do Ano, baseado na obra de Patrícia Melo (diretamente influenciada pela obra de Fonseca), não se compara com o talento de prosador que possui. Exemplos que demonstram a disparidade entre estilos de texto distintos.

    O suspense é focado no conselheiro do título que investe no tráfico de drogas à procura de dinheiro fácil. Dentro deste ambiente hostil e desconhecido, o conselheiro se torna alvo fácil quando o comboio com narcóticos não chega ao local estabelecido.

    Sem evidenciar as intenções dos personagens, como se tentasse abordá-los com nuances elípticas, a história é disfuncional. Conduz o público de vazio a vazio, sem intriga, drama, suspense, sem elementos que se destaquem. A história reproduz eventuais componentes vistos em histórias do gênero: a droga produzida em ambientes pobres, o contraste luxuoso dos poderosos que retêm o dinheiro, e as iscas fáceis que decidem adentrar no perigoso negócio. Personagens tipificados e interpretados sem muita exigência pelo elenco.

    A falta de clareza narrativa produz uma frieza não-intencional. Ampliando a sensação de que nem mesmo o roteirista e, por consequência, os atores sabem das motivações dos personagens. E o que parecia ser uma história de erros se anula pela condução mal realizada.