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  • Review | Stargirl (Episódio Piloto)

    Review | Stargirl (Episódio Piloto)

    Com produção executiva do autor de quadrinhos Geoff Johns, Stargirl é uma serie que tenta ser um hibrido entre o que fizeram no streaming Dc Universe e no Canal CW, -inclusive passando nos dois, em streaming e em tv – reunindo características típicas de ambas adaptações, tendo mais semelhanças com Doom Patrol e Monstro do Pantano do que com o que se vê no Arrowverse.

    No Brasil, a personagem era chamada também Sideral, herdando o nome de um heroi antigo – o Starman primário – esta versão, cujo alter ego é Courtney Whitmore foi introduzida por Johns em 1999, em homenagem a sua irmã, recém falecida, e por isso, há muito carinho do autor / produtor pela jovem heroína. A interprete dela na série é Brec Bassinger, que faz a moça já mais velha, uma vez que a sua primeira aparição ela ainda é uma criança.

    Os letreiros explicativos  posicionam o epílogo em uma aventura perigosa uma década atrás, nele se percebe referencias as revistas Era de Ouro, de James Robinson (roteirista que deu as primeiras oportunidades a Geoff Johns) e Paul Smith, e os seis primeiro minutos, que não dão qualquer mostra da protagonista e personagem-título, ambientam o espectador em uma outra época, tão escapista e fantasiosa quanto as aventuras dos Minutemen em Watchmen.

    Caso fosse lançado esse epílogo, de maneira solitária, certamente faria sucesso como um belíssimo curta da DC Comics. O escapismo clássico dos heróis retrata maravilhosamente os heróis da DC do passado, com um visual estonteante e um clima fantástico único. O espectador dificilmente não será pego aqui, deixando inclusive a incógnita do nível de investimento financeiro nesse piloto, pois até as cenas em CGI são bem feitas, diferente do que é comum em produções de TV, especialmente se comparar com Flash e Arrow.

    Esse período ainda permite um bom dueto, entre Joel McHale (o Starman) e Luke Wilson, que faz Pat Dugan, seu parceiro e ajudante, incluindo ai uma breve discussão sobre o legado dos heróis, repleta de ironias típicas do humor de McHale. Esses seis minutos estonteantes, dariam o tom a ser seguido dali para frente, ao menos, é o que se espera.

    Courtney é introduzida como uma menina que cresce sem a presença do pai, ela vai se mudar, porque sua mãe se casará com Pat,  ele alias é o arquétipo do bom moço encarnado, ele tenta quebrar o gelo com sua enteada, está quase sempre clamando por carência, tentando ser um mentor ou um pai postiço, ainda de certa forma emulando a sua própria tentativa de se igualar ao Starman, sempre tentando alcançar seu status de fonte de inspiração para o heroísmo.

    A trama envolvendo Courtney não consegue liberar tanta noção do que virá nos próximos episódios, o que se espera é que tenha alguma trama adolescente no colégio, dela lidando com o heroísmo e com a vida comum, o que não é necessariamente algo ruim. A problemática na verdade mora nos detalhes, pois parte dos rapazes que a importunam, são da linhagem do vilão Onda Mental.

    O que se viu até este capítulo é um potencial tremendo, seja na evolução da relação da protagonista com seu padrasto, ou o destino inevitável dela como pretensa heroína. Bassinger é carismática, e seu elenco de apoio também, não só Wilson, mas também Amy Smart, que faz Barbara, a sua mãe, claro que se espera que esses personagens tenham mais espaço ao longo, além é claro de mais aparições de personagens clássicos dos quadrinhos, como o Faixa e a velha guarda de heróis. Stargirl começa muito bem, bastante colorido, divertido, com doses de humor bem medidas, longe do exagero típico da Marvel e com uma identidade bem própria, além de um cuidado estético grandioso demais em comparação com seriados de tv.

  • Review | Arquivo X – 10ª Temporada

    Review | Arquivo X – 10ª Temporada

    Arquivo X - 10a temporada - poster

    Arquixo X foi um dos fenômenos televisivos da década de 90. A série criada por Chris Carter, em 1993, ainda é referência para muitos seriados da TV americana que encontram material suficiente para se inspirar. Durante mais de 200 episódios, a série fez de tudo. Abordou a maioria das lendas urbanas existentes no planeta, trouxe à tela serial killers, desde os que iam somente atrás de mulheres até aqueles que raptavam crianças. Revisou o místico e o fantástico, seitas, viajou pelo tempo, além de apresentar ao espectador diversos episódios especiais, seja em preto e branco, noir, recheados de humor, fazendo sátiras ou episódios escritos e dirigidos pelo elenco principal. Mas, além de tais episódios, a série trazia um conceito interessante, qual seja, uma história principal conhecida entre os fãs como mitologia e que fez a série se sustentar por 9 temporadas graças às ótimas histórias, às performances de David Duchovny e Gillian Anderson e do ótimo time de coadjuvantes que completava o time.

    Fazendo um breve resumo da trama, o agente do FBI, Fox Mulder (Duchovny), quando criança, presenciou sua irmã sendo abduzida por alienígenas. Com a ideia de que um dia a encontraria, chegou ao bureau para trabalhar no Arquivos X, uma pequena e desacreditada divisão que investigava casos inexplicáveis. O trabalho de Mulder começou a chamar atenção e seus superiores recrutaram a novata agente e cientista Dana Scully (Anderson) para contestar o trabalho de Mulder, com a finalidade de por fim à divisão. Nesses quase 10 anos em que trabalharam juntos, a dupla se viu dentro de uma conspiração muito maior do que poderiam imaginar, envolvendo alienígenas, o próprio governo e uma possível colonização que consistia na alteração genética dos seres humanos. Mulder foi julgado militarmente por seus supostos crimes e terminou a série, em 2002, foragido ao lado de Scully.

    Com a onda de reboots e remakes que o cinema vem enfrentando, não demoraria muito para que a referida onda chegasse à televisão, reabrindo, assim, os Arquivos X. Apostando num formato bastante diferente ao qual estava acostumada, a série retornou com apenas 6 episódios, dividindo opiniões. Hoje, sem dúvida, parece que sim, foi pouco. De qualquer forma, o formato em poucos episódios foi adequado de acordo com Duchovny e Anderson, que são bem conhecidos por Californication e The Fall, respectivamente.

    Nessa temporada, a premissa da mitologia, além de envolver um Mulder enclausurado em sua casa e uma Scully que retornou ao seu ofício na medicina, apresenta Tad O’Malley (Joel McHale), um apresentador de TV que adora expor ao seu público as mais diversas conspirações. Aparentemente, O’Malley, descobriu aquela que seria a maior e mais letal das conspirações e que está em contato direto com a verdade que Mulder sempre buscou e que demonstra, na realidade, as reais intenções do governo ou de quem estaria por trás dela. Infelizmente, como dito, 6 episódios não foram suficientes para contar o que aconteceu, uma vez que essa premissa foi tratada em apenas 2 episódios, o primeiro, My Struggle, apresentando o ponto de vista de Mulder, e My Struggle II, o último episódio, mostrando o ponto de vista de Scully, que se encerra sem um ponto final (marca registrada dos finais de temporada da série), demonstrando que, de fato, a série poderá continuar.

    THE X-FILES: L-R: Mitch Pileggi, David Duchovny, Gillian Anderson and William B. Davis. The next mind-bending chapter of THE X-FILES debuts with a special two-night event beginning Sunday, Jan. 24 (10:00-11:00 PM ET/7:00-8:00 PM PT), following the NFC CHAMPIONSHIP GAME, and continuing with its time period premiere on Monday, Jan. 25 (8:00-9:00 PM ET/PT). ©2015 Fox Broadcasting Co. Cr: Frank Ockenfels/FOX

    Talvez essa 10ª temporada tenha se preocupado mais em mostrar aos fãs que a chama e o espírito da série ainda se mantêm, o que foi amplamente abordado nos outros quatro episódios. Por conta dos adventos do primeiro capítulo, não demorou para que o Diretor Assistente Skinner (novamente vivido por Mitch Pileggi) reabrisse os Arquivos X, colocando Mulder e Scully de volta à ativa. E o que vemos a partir disso é Arquivo X na sua pura essência. Embora os anos tenham se passado, Mulder tenha ganhado um pouco de peso (além de reconhecer que é um homem de meia-idade) e Scully, algumas rugas, a série parece que nunca deixou a televisão. A clássica abertura está presente, sem nenhuma alteração; os monstros da semana; as frases clássicas; as lanternas; os episódios confusos cujos desfechos não ficam muito claros; e a trilha sonora característica de Mark Snow. Tudo está lá. E, com isso, a urgência de Chris Carter em querer demonstrar nove temporadas em apenas seis episódios, tenha prejudicado um pouco o andamento dessa temporada, que aparentou ficar um pouco fora do compasso.

    Contudo, o saldo foi muito promissor, uma vez que podemos adicionar dois episódios para o hall de episódios clássicos da série, sendo um deles o terceiro episódio, Mulder & Scully Meet the Were-Monster, que remete ao lado lúdico e descarado (com uma homenagem ao falecido diretor Kim Manners) e o quarto episódio, Home Again, que mostra Scully lidando de forma emocionante com uma dura situação em sua vida pessoal. A temporada destaca mais Dana do que Mulder, uma vez que, em praticamente em todos os episódios, a agente precisa lidar com a falta de seu filho William. O arco de William, embora suspenso, esteve presente, inclusive no primeiro e segundo episódio da nova temporada, respondendo de forma sutil a uma dúvida que, por muito tempo, foi chave para as abduções e experiências genéticas envolvendo mulheres e seus bebês na série.

    Um outro ponto destacável é que a dupla não é mais um casal, fato que dividiu opiniões, deixando parte dos fãs felizes, uma vez que a base da série sempre foi os dois atuando como parceiros, demonstrando por diversas vezes um carinho e uma preocupação intensa um pelo outro, algo sabiamente mantido nessa temporada. Possivelmente, é o porquê dos dois estarem separados: assim, a carga de dramaticidade foi ligeiramente maior, acusando de forma clara que aquele sentimento que sempre tiveram um pelo outro, muito antes de ficarem juntos, ainda existe.

    Arquivo X parece que voltou para ficar por mais algum tempo na TV e os fãs só têm a ganhar. A audiência tem dado essa chance à série, uma vez que os números nos EUA foram muito expressivos, sendo que, no Reino Unido, essa nova temporada foi a que mais deu audiência ao Channel 5 desde Celebrity Big Brother que foi ao ar em 2011. O primeiro passo foi dado, resta agora a série apresentar uma futura evolução.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Um Último Estudo Sobre Community

    Um Último Estudo Sobre Community

    communitySituada em Greendale, em uma faculdade comunitária fictícia em um lugar fantasioso, o seriado de Dan Harmon buscava explorar os meandros e intimidade dos arquétipos que costumam habitar o campus desse tipo de instituição de ensino estadunidense. Uma das dificuldades com o público brasileiro seria traçar um paralelo com alguma instituição semelhante no país, e é para causar no público uma sensação mínima de pertencimento aquele mundo, é que é apresentado o personagem Jeff Winger (Joel McHale), um homem cuja carreira fracassada de advogado o deixou com poucas opções de sustento, em virtude da recusa de seu diploma, Jeff então retorna a universidade, e usa sua lábia para formar um grupo de estudos, tornando-se uma espécie de tutor dos estranhos alunos que se reúnem em volta de si.

    Com o andar dos fatos, o personagem, de caráter dúbio encontra a bela Britta Perry (Gillian Jacobs), e a partir daí finge ser um especialista na língua espanhola, unicamente para ter a chance de se aproximar dela. Com um comportamento que aparente boas intenções, ele já tem sua retribuição ainda no piloto, quando é encarregado de cuidar de um grupo completamente heterogêneo, que aos poucos se apresentam a ele como um bando de fracassados sem o mínimo respeito próprio.

    Greendale é na verdade um subúrbio fictício de Denver, um lugar tão fajuto quanto seu conjunto de personagens. Os que orbitam Jeff são Pierce Hawthorne (Chevy Chase), um senhor já idoso, cuja sabedoria irrelevante o faz um mentor politicamente incorreto para Jeff, o cinéfilo muçulmano Abed Nadir (Danny Pudi), a mãe divorciada Shirley Bennett (Yvette Nicole Brown), o ex-esportista  Troy Barnes (Donald Glover) e sua antiga colega de classe da  escola Annie Edison (Alison Brie). A convivência com pessoas tão diversas, que tem em comum uma auto-estima baixíssima faz Winger se mostrar ainda mais ácido em seu humor, sem preocupações maiores com a moral alheia ou com qualquer coisa que não envolva seu narcisismo latente.

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    O conjunto de personagens aumenta, ao verificar o corpo docente, formato por Señor Ben Chang (Ken Jeong), um asiático que vive papel semelhante ao que apresentaria na trilogia Se Beber Não Case, além do professor de psicologia Ian Duncan (John Oliver) e o afetado Reitor Pelton (Jim Rash). O primeiro ano serve basicamente para estabelecer a rotina e carisma entre os personagens, com tramas enlouquecidas onde a futilidade escolar predomina sobre tudo, criando universos dentro de universos, que emulam situações  que referenciam a cultura pop, especialmente nas falas de Abed e nos episódios onde a Máfia de Bons Companheiros é “refilmada”, através do tráfico de influência causado pelo ilegal comércio de frangos fritos, espalhados pelo campus. As brincadeiras alegóricas se tornariam um paradigma no seriado.

    A tradição mais comum ao seriado seria os episódios de paintball, onde o reitor permite que um campeonato ocorra, com direito a exclusão de qualquer aula ou atividade, onde todos são postos em um campo de guerra, com mais menções a filmes e seriados famosos, desde os clássicos de zumbi de George A. Romero, Warriors : Selvagens da Noite e Duro de Matar. No vigésimo terceiro episódio, inaugura-se a tradição, além de ser este o momento em que finalmente a tensão sexual entre os protagonistas é finalmente cooptada, para, claro, não resolvida em apenas uma relação.

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    As semelhanças entre Community e Arrested Development são muitas, desde a mania de se auto-referenciar, a necessidade de saber-se minimente o idioma estadunidense, graças aos muitos trocadilhos locais, até a régia feita por muitos diretores em comum, entre eles os irmãos Russo, responsáveis por realizar Capitão América 2, fato que fez abarcar alguns membros do elenco do seriado de Hurwitz. A diferença fundamental é que em Arrested, a empatia ao drama de Michael Bluth torna-se automática, pelo fato dos expectadores necessariamente terem famílias, talvez não tão psicóticas quanto os Bluth, mas com semelhanças atrozes, certamente. Já Community brinca com um nicho, de um cenário mundano, mas que é preciso ter abarcado em uma instituição de ensino ao menos semelhante ao limitado campo hipotético das universidades de baixo respeito. A verossimilhança na exploração dos estereótipos é perfeita, o que faz com que qualquer seja automática.

    A segunda temporada começa amarrando as relações malfadadas do ano anterior, claro, sem levar nenhuma delas a sério, já que todas são descartadas assim que se é permitido. A sacação de terminar cada meio de temporada com um período letivo fez com que as dois primeiros anos tivessem uma maior coesão, ainda permitindo alguns bons episódios temáticos, como a imitação de infecção zumbi vista no Halloween, que garante uma interação curiosa entre Chang e Shirley.

    Um dos factoides que mais gerou eventos foi o gradativo afastamento de Pierce do grupo, Primeiro, entregando o segredo bastardo de Shirley, agravado após estragar uma peça anti-drogas, ao fazer crianças agirem em apologia ao uso de maconha, culminando no extremo bullying com um personagem acessório, em um jogo de RPG. Se a primeira temporada serviu para mostrar o grupo se descobrindo como comunidade, apoiando-se mutuamente, a segunda serviu para discutir isto o tempo todo, usando o mais errático e politicamente execrável para exibir o quão frágil é a unidade dos estudantes, assim como é fraca a mente do ancião, que sofre graves problemas de auto-rejeição, o que influi diretamente na sensação de ser sempre rejeitado por todos, mesmo quando não o é.

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    A falta de docilidade do espírito humano, além da propensão ao auto ódio e a tragédia fazem de Community uma série única, e a mostra mais chamativa disto é exibido no terceiro ano, com um paralelo feito com o Reitor Pelton, que ao ter de realizar um novo comercial para a universidade, começa a ter sonhos de grandeza, exibindo todos os seus sonhos orgulhosos, embaralhados com toda a sua dificuldade de lidar consigo e com outros humanos. Dean Pelton faz ás vezes de Kubrick, preso 12 horas em uma mesma cena, além de usar de modo óbvio as cores e fantasias de Apocalipse Now, além de fazer do documentário afora da propagando se assemelhar a Heart of Darkness.

    O caráter de inclusão dentro da faculdade Greendale é tão grande que garante versões diferenciadas de discurso, pondo um crossdresser em um lugar de prestígio e autoridade, na cadeira de reitor, ao mesmo tempo que exibe um personagem grosseiro e preconceituoso, garantindo voz a ambos, mostrando que o mundo particular, encerrado nos corredores do campus é semelhante ao mundo externo, ainda que neste, o casos instaurado seja puramente metafórico em Community, além de não excluir estereótipos.

    A terceira temporada acaba bem, contando episódios memoráveis, especialmente os que envolvem o Dreamatory e as passagens do ofício de psicologia de Britta. A quantidade exorbitante de mudanças, como a ascensão de Señor Chang ao vilão principal da série, o aumento de comentários metalinguísticos e a possibilidade de finalmente alguém do elenco fixo sair, através do anúncio da ida de Troy para a faculdade de trabalhadores do ar-condicionado. A atenção do público estava tão bem postada nas palavras de Dan Harmon que quase não se notou que o especial de paintball não ocorreu, talvez tenha sido um protesto do showrunner, que acabava de saber que seria dispensado de sua função. O roteirista tratou de fechar a maioria das pontas soltas, arrumando um final para o programa, mesmo com a renovação para mais uma temporada.

    O quarto ano começava sem o criador da série, parodiando a questão que agitava os bastidores de Community, apresentando a Abed TV, onde uma sitcom com claquetes de risos era executada, ao modo e estilo do cinéfilo árabe, mostrando até um Pierce Hawthorne alternativo, já que Chevy Chase se envolveu em brigas com os produtores, especialmente Harmon, tornando através do twitter a questão pública. No entanto, o que se percebe e é um grave problema com os roteiros, sem a supervisão do autor primordial. O medo das mudanças foi inserido como plot, ainda que de uma forma bastante confusa e trabalhada de forma porca.

    O receio de cancelamento aumentou, sendo esta a primeira temporada com apenas 13 episódios finalizados. Apesar de conter alguns momentos, como a exploração do passado entrelaçado dos sete estudantes, o quarto ano é quase todo dispensável, sem inspiração e fraco em essência, com momentos bobos como a Changnésia, que fazia Ben Chang fingir que tinha perdido a memória, unicamente para unir ele com seus algozes, em uma brega confraternização. Jeffrey concluiria seu curso, e em meio das festividades, seria dado um “novo fim” a série, que teria mais uma chance dentro da NBC.

    Dan Harmon voltaria a assinar a produção executiva, retirando o personagem de Pierce, já que Chevy Chase havia tido uma briga pública com ele. O começo do quinto e possivelmente – novamente – último ano começaria  melancólico, com fotografia soturna e iluminação bastante nula. Jeff fracassou ao tentar trabalhar como advogado. Ávido por reencontrar seus amigos, ele retorna ao campus, para perceber que seus ex-colegas também tem problemas enormes para seguir suas vidas. O azar que acometeu os alunos, flagrou também a escola, que faliu, mesmo com os esforços do reitor. Os remanescentes do elenco principal tentam resgatar a dignidade da universidade, fazendo uma analogia com o esforço dos fãs em manter Community no ar, e os estereótipos se invertem, com Jeff tornando-se professor de direito.

    O retorno de Harmon trouxe de volta também a multiplicidade de episódios temáticos, que parodiam programas de tv e filmes, com destaque para o pujante momento em que faz-se alegoria para os filmes de crime de David Fincher, investigando-se um temível vilão que lança moedas sobre os cofrinhos alheios e que jamais teve sua identidade revelada, como em Zodíaco. Plots esquecido no terceiro ano, como o retorno a vida de Costeleta, além da saída em definitivo de Troy, que parte em viagem após o anúncio da morte de Pierce, que sepulta de uma vez a participação de Chevy Chase no show televisivo. O retorno de Duncan também é um ponto indicado pelo showrunner, que ainda introduziu o veterano professor Hickey (Jonathan Banks), um idoso ranzinza que serve como substituto para a vaga de Hawthorne, ainda que seus disparates tenham mais a ver com o fato de ser incompreendido enquanto artista do que puramente politicamente incorreto. Estes, junto a Chang – que passa a dar aulas de matemática, assumindo seu papel de estereotipo racial – formam o comitê que visa salvar Greendale do fechamento.

    Após mais um episódio alucinatório, em que Jeff tem ilusões com um desenho do GIJOE, em uma clara fuga para a infância, a universidade corre o risco de fechar, o que gera a abertura de velhas feridas. O fato de o Subway – novamente patrocinador – comprar o espaço da faculdade faz com que o grupo de salvação se divida. Com medo, Jeff retornar ao seu romance malfadado com Britta, relembrando seu primeiro objetivo e pedindo finalmente sua mão em casamento, para que algum vínculo daqueles cinco anos perdure.

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    A Yahoo salvou – outra vez – a série do cancelamento, municiando Dan Harmon de condições de mais uma vez usar a metalinguagem para abrilhantar seu roteiro, agora com a saída de Yvette Nicole Brown e sua Shirley, que foi cuidar de seu pai doente, e que tem uma ótima despedida. Para o seu lugar, foi encarregada uma nova responsável pelo grupo de resgate a Greendale, Francesca “Frankie” Dart (Paget Brewster), que a no princípio entra em conflitos imbecis com os protagonistas, mas aos poucos consegue conciliar sua rotina apolínea à loucura dos remanescentes.

    É curioso como mesmo a saída dos personagens centrais é bem encaixada na trama, já que é um aspecto comum a vida de universitário, onde amizades intimas são construídas e descontinuadas em virtude das rotinas completamente diferentes. Os sub-plots e tramas prosseguem finitos em si, com pouca influência pragmática com o andamento do seriado, exceto talvez pela ação que envolve o “assumir” da homossexualidade do Reitor, que torna material um fato que antes era oficialmente especulado, mas que era evidente mesmo para o menos atento observador, ainda que o viés seja de uma perversão atroz, já que segundo o próprio personagem, o termo gay mal começa a defini-lo, unido ainda pelo paralelo da libertação de um pássaro de seu cativeiro, tendo de abrir mão de algo importante para poder voar – no caso do pássaro, seus filhotes que viviam em uma caixa de controle elétrico, e no caso do Reitor, a “saída” do Armário.

    As tramas episódicas seguem a linha de questionar a metalinguagem dos seriados americanos, se preocupando em aprofundar pouco a relação entre as personagens, fugindo talvez de qualquer mensagem nostálgica pelo fim iminente.  Até o retorno ao paradigma do paintball é feito sob uma nova ótica, com Jeff tentando ser proibitivo ao ato já que neste momento é um professor e quer impressionar Frankie, promovendo uma limpeza étnica, a base de um serviço secreto de guerra, cujo desfecho é bastante trágico, ainda que repleto de referências a estupidez clássica do grupo de aventureiros.

    Após treze episódios neste novo formato, o semestre e o seriado como era conhecido era finito, como era previsto desde os primórdios dos roteiros de Dan Harmon. O serie finale também abusa de metalinguagem, imaginando como seria uma sétima temporada da série, com alguns dos participantes da mesa do comitê contando sua versão de como seria a vida a partir dali. Todo o estratagema é basicamente uma desculpa para reafirmar que a tv não se baseia em senso comum ou inteligência, mas sim em lucros e projeções de audiência, e Community nunca se enquadrou em nenhum desses arquétipos. O episódio fake, pré créditos finais alude ao narcisismo de produtores bem remunerados da tv estadunidense, e fecha  de maneira legítima a comédia, fechando Community como esta começou, como uma potente paródia do que ocorre na televisão dos EUA, com o mesmo fim de sua prima gêmea 30 Rock, ainda que sua sobrevida tenha sido ligeiramente maior. O aguardo para as últimas desventuras dos loucos ex-alunos está a cargo de seu criador.

    O apagar das luzes da sala de estudos não poderia ser mais melancólico, mesmo diante do aceno com a possível feitoria do tão sonhado filme, não garantido pelo showrunner, apesar da hashtag #anadamovie ao final do episódio.

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  • Crítica | Livrai-nos do Mal

    Crítica | Livrai-nos do Mal

    Baseado em uma história verídica, Livrai-nos do Mal começa focando o deserto arenoso do Iraque, com uma gravação amadora de militares americanos, que, em solo estrangeiro, tencionam levar a mesma civilização nada conciliatória que descobriram para sua terra natal. Após os créditos iniciais, é apresentada uma Nova Iorque oprimida, vítima de assassinatos a sangue frio, que tem em Ralph Sarchie (Eric Bana) o avatar de todo o seu pessimismo. O policial é cético, de relações nada íntimas e pouco fáceis, que vê somente em sua família a possibilidade de paz, mesmo que nem junto a ela consiga encontrar a serenidade.

    A partir da larga experiência do diretor Scott Derrickson em chocar, de modo amedrontador, o espectador – tomando por exemplo seus momentos anteriores, como em O Exorcismo de Emily Rose e A Entidade –, a fita segue apelando para lugares comuns no quesito fobia, em que a câmera constantemente evidencia o medo de aranhas, cobras e morcegos. Até em seus aspectos emocionais, o roteiro se baseia na melancolia, outro clichê de temor. Tudo, claro, calcado no personagem de Bana, que, ao mesmo tempo em que possui uma vida familiar bela, tem de encarar uma profissão cuja função é resgatar bebês em lixeiras. No entanto, as imagens chocantes perdem um bocado do seu impacto, por serem seguidas de momentos de humor extremo.

    A fotografia e iluminação ajudam a aumentar a aura de horror por serem mostradas quase sempre no breu, tanto nas casas quanto no zoológico – um lugar assustador quando anoitece, como um dos personagens destaca. Algo oculto move as pessoas vitimadas, um artifício que parece incorpóreo e irreal e realizado por meio de uma clara apelação para um medo comum. Sem contar o fato de mostrar pessoas repletas de cicatrizes, outro temor comumente compartilhado por todo o público.

    No decorrer das investigações, Sarchie começa a ter sua falta de fé questionada, pois os mesmos eventos vistos em sua intimidade ocorrem também na casa em que vive, onde a origem paranormal ou espiritual é deveras discutida. Ele é descrente quanto a ações de seres invisíveis, mas incrivelmente ouve uma estática nas gravações e o som de pessoas rindo, elementos exclusivamente contemplados por ele e fruto de um radar, dito por seus colegas como um talento inato.

    Após verificar uma moça que tentou matar seu filho, Sarchie encontra um padre latino de aparência bela. Padre Mendoza (Édgar Ramirez) é um religioso diferente, que tenta convencer o agente da lei sobre a “verdade”, o irremediável mal que insiste em provocar pavor nos homens, tentando-os com seus mistérios, que, em última análise, são como ritos de invocação para ação dos maus agouros. É como se todo lugar fosse o hall, a passagem para a habitação dos que estão embevecidos pelo torpor da ação daquilo que os inspira. As escrituras do Iraque são reproduzidas nas casas dos envolvidos e parecem provocar nos que as habitam uma influência hostil e maléfica, primeiro fazendo temor, depois, tomando suas ações.

    Sob a trilha de The Doors, o padre conta sua intimidade e antigos vícios em heroína que lhe fizeram mal, mas que o impediram de beber ou fumar – ou de ceder a uma olhada a belos corpos femininos. A desculpa – plausível – é de que as drogas legais o matam lentamente, e não rapidamente como as anteriores. Finalmente Archie cede, após começar a se identificar com o pároco. Aparentemente não fica apenas nisso, visto que o personagem até volta a proferir o chamado a Jesus, mesmo que sua fé tenha sido abandonada há décadas.

    Seu intenso trabalho forense invade sua casa; os mesmos sinais malignos investigados passam a habitar seu lar, e a construção do roteiro é lenta, gradual e plenamente cabível. Ele teria um dom chamado “discernimento de espírito”. O tal radar, que seus parceiros acham ser um talento policial, seria, segundo Mendoza, um dom espiritual que nem mesmo o reverendo teria a sua mão, dada a raridade desta habilidade. Aos poucos, a relação dos dois se estreita cada vez mais, emulando as duplas de agentes de raças diferentes, típicas dos filmes de tira oitentistas.

    O grito abafado pelos sons cotidianos simboliza o abandono ou o receio de que isto isto se concretize por parte de Sarchie, assemelhando-se demais à fala do sacerdote: “Um santo não é um exemplo de moral, um santo presenteia à vista.”. A premissa justificaria as falhas de ambos os protagonistas, além de unir os dois em torno do mesmo objetivo.

    Ao contrário de seus primos semelhantes, Livrai-nos do Mal tem no elenco, equilibrado e inspirado, um ponto forte. Por mais irreais que sejam seus dramas, a abordagem se aproxima muito do verossímil, um realismo fantástico bem construído e que faz poucas concessões à suspensão de descrenças, mesmo nos insistentes duelos de facas feitos por Butler (Joel McHale). A experiência de Derrickson como realizador fez valer os préstimos na toada espiritual, mas se mostrou ainda mais incomum e bem-sucedida nas sequências policiais e nos momentos de inspiração e tentativas de redenção. Toda a tragédia que toca o policial é maximizada pela ótima interpretação de Bana, na volúpia do personagem pelo perdão, que ignorou por anos, mas que não o impediu de sofrer represálias. Os pecados de Ralph até aparentam ser o motivo de todo aquele apuro que se apresentava, o que evidentemente era uma artimanha do rival de suas almas, que buscava engodá-lo.

    Após as fortes cenas onde é feito um ritual e onde todos os pecados pretéritos da dupla são escrutinados e usados contra si, enfim ocorre a bonança, com a libertação da alma de Santino (Sean Harris, irreconhecível quase), que logo traz à luz a paz de volta à vida de Sarchie, sobrevivendo até mesmo à mudança de gênero. Sua segunda metade, apesar de ser bem mais didática do que o todo, é reveladora, tendo sua credibilidade posta em cheque por abandonar um pouco o suspense, mas conseguindo apresentar uma boa ambientação policial. Os últimos momentos têm uma notável queda de qualidade, por ter um cunho demasiado piegas, mas que, à luz de toda a extensão do filme, não se caracterizam como um elemento necessariamente ruim.