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  • Crítica | Zoolander

    Crítica | Zoolander

    Zoolander 1Paródia escrachadíssima sobre o universo fashion dos super-modelos, Zoolander é um filme dirigido, estrelado  e produzido por Ben Stiller. Os primeiros minutos apresentam um complicado cenário político baseado na paranoia típica das histórias de espionagem, escondendo os personagens poderosos sob cenários sombrios e silhuetas que discutem o futuro da humanidade, que, por sua vez, jaz na futilidade.

    A figura ideal para se infiltrar na misteriosa questão deveria ser alguém poderoso, chamativo e igualmente ignorante, é neste ponto que entra a figura de Derek Zoolander (Stiller), que faz um modelo no auge de sua carreira, que basicamente, se prepara para uma nova pose, chamada de Magnum, tão importante que é guardada a sete chaves, longe da espreita dos tabloides. A surpresa ocorre pela perda do título de maior top model, sofrendo, a partir daí, uma intensa crise de identidade, sem caminhos para traçar. A dor da substituição é tão grande que o artista aparenta não ter mais um rumo para seguir, destacando-se o grande vazio existencial que já o consumia, mas que não era perceptível graças à fama infinita que o rodeava.

    Na tentativa de se reconstruir, Derek procura seu pai, Larry (John Voight), trabalhando junto com ele como minerador, apesar de sua incrível incapacidade de carregar peso ou de realizar qualquer trabalho que demande esforço manual. O choque ocorrido com ele faz ele se enxergar como um pária em ambos os ambientes familiares que conhece, o que o torna alvo fácil para propostas indecentes, vindas da figura que mais se aproxima de um vilão nesse jocoso e debochado cenário, com o estilista Mugatau, interpretado por um Will Ferrell que varia entre o exagero extremo canastrão e afetação ponderada, em uma caricatura de uma rainha má e megera dos clássicos contos de fada de Disney. A trama em si envolve um terrível caso político, com a possibilidade de assassinato de um diplomata estrangeiro.

    Toda a graça do filme está nas palhaçadas interpretadas por Derek – que sequer sabe quantas sílabas possui seu nome e sobrenome –  e seus rivais, Hansel (Owen Wilson), seu principal antagonista no mundo fashion, igualmente encantador, ao menos de acordo com os padrões imbecis e banais estabelecidos pelo roteiro de Stiller, Drake Sahter  e John Hamburg além, claro, da figura de Mugatu e seus sidekicks. As piadas funcionam basicamente por fazer troça com um ambiente onde a idolatria é o lugar comum, levando em conta piadas que remetem a um nível de pensamento bastante baixo, desconstruindo o objeto de adulação de uma indústria que lucra bilhões de unidades monetárias, usando de gags cômicas das mais bobas para mostrar um argumento inteligente, apesar da fala simplória.

    A cena de disputa entre Zoolander e Hansel rivaliza com a lavagem cerebral que o protagonista sofre, para se tornar alvo fácil da estranha missão que lhe é incumbida. A quantidade de participações especiais é enorme, indo desde David Duchovny, como um ex-modelo de mão tão paranoico e ansioso quanto seu Fox Mulder, e David Bowie, que faz a si mesmo como juiz da disputa entre os dois astros. O papel mais significante entre as pessoas ditas normais é da repórter Matilda Jefferies (Christine Taylor), que evidentemente tem problemas com sua aparência, por ter sido uma pessoa obesa no passado e ter sofrido com bulimia.

    Zoolander consegue reunir pastiche com um estilo de vida extravagante e extremamente sexual, sem apelar para nudez ou para qualquer proximidade da dita “vulgaridade”. O filme desconstrói a superioridade normalmente atribuída aos mais belos homens do planeta, mostrando-os como bárbaros incapazes de tarefas simples, como ligar um computador desktop. Stiller consegue elevar um personagem, que não tinha ido além de dois curtas bastante tímidos, ao patamar de herói de um filme que trata com esperteza um mundo repleto de conceitos e certezas superficiais, através de uma mensagem simples e não panfletária, mesmo com toda a acidez eufemística presente no argumento.

  • Review | Arquivo X – 10ª Temporada

    Review | Arquivo X – 10ª Temporada

    Arquivo X - 10a temporada - poster

    Arquixo X foi um dos fenômenos televisivos da década de 90. A série criada por Chris Carter, em 1993, ainda é referência para muitos seriados da TV americana que encontram material suficiente para se inspirar. Durante mais de 200 episódios, a série fez de tudo. Abordou a maioria das lendas urbanas existentes no planeta, trouxe à tela serial killers, desde os que iam somente atrás de mulheres até aqueles que raptavam crianças. Revisou o místico e o fantástico, seitas, viajou pelo tempo, além de apresentar ao espectador diversos episódios especiais, seja em preto e branco, noir, recheados de humor, fazendo sátiras ou episódios escritos e dirigidos pelo elenco principal. Mas, além de tais episódios, a série trazia um conceito interessante, qual seja, uma história principal conhecida entre os fãs como mitologia e que fez a série se sustentar por 9 temporadas graças às ótimas histórias, às performances de David Duchovny e Gillian Anderson e do ótimo time de coadjuvantes que completava o time.

    Fazendo um breve resumo da trama, o agente do FBI, Fox Mulder (Duchovny), quando criança, presenciou sua irmã sendo abduzida por alienígenas. Com a ideia de que um dia a encontraria, chegou ao bureau para trabalhar no Arquivos X, uma pequena e desacreditada divisão que investigava casos inexplicáveis. O trabalho de Mulder começou a chamar atenção e seus superiores recrutaram a novata agente e cientista Dana Scully (Anderson) para contestar o trabalho de Mulder, com a finalidade de por fim à divisão. Nesses quase 10 anos em que trabalharam juntos, a dupla se viu dentro de uma conspiração muito maior do que poderiam imaginar, envolvendo alienígenas, o próprio governo e uma possível colonização que consistia na alteração genética dos seres humanos. Mulder foi julgado militarmente por seus supostos crimes e terminou a série, em 2002, foragido ao lado de Scully.

    Com a onda de reboots e remakes que o cinema vem enfrentando, não demoraria muito para que a referida onda chegasse à televisão, reabrindo, assim, os Arquivos X. Apostando num formato bastante diferente ao qual estava acostumada, a série retornou com apenas 6 episódios, dividindo opiniões. Hoje, sem dúvida, parece que sim, foi pouco. De qualquer forma, o formato em poucos episódios foi adequado de acordo com Duchovny e Anderson, que são bem conhecidos por Californication e The Fall, respectivamente.

    Nessa temporada, a premissa da mitologia, além de envolver um Mulder enclausurado em sua casa e uma Scully que retornou ao seu ofício na medicina, apresenta Tad O’Malley (Joel McHale), um apresentador de TV que adora expor ao seu público as mais diversas conspirações. Aparentemente, O’Malley, descobriu aquela que seria a maior e mais letal das conspirações e que está em contato direto com a verdade que Mulder sempre buscou e que demonstra, na realidade, as reais intenções do governo ou de quem estaria por trás dela. Infelizmente, como dito, 6 episódios não foram suficientes para contar o que aconteceu, uma vez que essa premissa foi tratada em apenas 2 episódios, o primeiro, My Struggle, apresentando o ponto de vista de Mulder, e My Struggle II, o último episódio, mostrando o ponto de vista de Scully, que se encerra sem um ponto final (marca registrada dos finais de temporada da série), demonstrando que, de fato, a série poderá continuar.

    THE X-FILES: L-R: Mitch Pileggi, David Duchovny, Gillian Anderson and William B. Davis. The next mind-bending chapter of THE X-FILES debuts with a special two-night event beginning Sunday, Jan. 24 (10:00-11:00 PM ET/7:00-8:00 PM PT), following the NFC CHAMPIONSHIP GAME, and continuing with its time period premiere on Monday, Jan. 25 (8:00-9:00 PM ET/PT). ©2015 Fox Broadcasting Co. Cr: Frank Ockenfels/FOX

    Talvez essa 10ª temporada tenha se preocupado mais em mostrar aos fãs que a chama e o espírito da série ainda se mantêm, o que foi amplamente abordado nos outros quatro episódios. Por conta dos adventos do primeiro capítulo, não demorou para que o Diretor Assistente Skinner (novamente vivido por Mitch Pileggi) reabrisse os Arquivos X, colocando Mulder e Scully de volta à ativa. E o que vemos a partir disso é Arquivo X na sua pura essência. Embora os anos tenham se passado, Mulder tenha ganhado um pouco de peso (além de reconhecer que é um homem de meia-idade) e Scully, algumas rugas, a série parece que nunca deixou a televisão. A clássica abertura está presente, sem nenhuma alteração; os monstros da semana; as frases clássicas; as lanternas; os episódios confusos cujos desfechos não ficam muito claros; e a trilha sonora característica de Mark Snow. Tudo está lá. E, com isso, a urgência de Chris Carter em querer demonstrar nove temporadas em apenas seis episódios, tenha prejudicado um pouco o andamento dessa temporada, que aparentou ficar um pouco fora do compasso.

    Contudo, o saldo foi muito promissor, uma vez que podemos adicionar dois episódios para o hall de episódios clássicos da série, sendo um deles o terceiro episódio, Mulder & Scully Meet the Were-Monster, que remete ao lado lúdico e descarado (com uma homenagem ao falecido diretor Kim Manners) e o quarto episódio, Home Again, que mostra Scully lidando de forma emocionante com uma dura situação em sua vida pessoal. A temporada destaca mais Dana do que Mulder, uma vez que, em praticamente em todos os episódios, a agente precisa lidar com a falta de seu filho William. O arco de William, embora suspenso, esteve presente, inclusive no primeiro e segundo episódio da nova temporada, respondendo de forma sutil a uma dúvida que, por muito tempo, foi chave para as abduções e experiências genéticas envolvendo mulheres e seus bebês na série.

    Um outro ponto destacável é que a dupla não é mais um casal, fato que dividiu opiniões, deixando parte dos fãs felizes, uma vez que a base da série sempre foi os dois atuando como parceiros, demonstrando por diversas vezes um carinho e uma preocupação intensa um pelo outro, algo sabiamente mantido nessa temporada. Possivelmente, é o porquê dos dois estarem separados: assim, a carga de dramaticidade foi ligeiramente maior, acusando de forma clara que aquele sentimento que sempre tiveram um pelo outro, muito antes de ficarem juntos, ainda existe.

    Arquivo X parece que voltou para ficar por mais algum tempo na TV e os fãs só têm a ganhar. A audiência tem dado essa chance à série, uma vez que os números nos EUA foram muito expressivos, sendo que, no Reino Unido, essa nova temporada foi a que mais deu audiência ao Channel 5 desde Celebrity Big Brother que foi ao ar em 2011. O primeiro passo foi dado, resta agora a série apresentar uma futura evolução.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Review | Californication – 7ª Temporada

    Review | Californication – 7ª Temporada

    californication-7-season“A eterna busca pela felicidade”. Falando de uma forma bastante simplista este pode ser o resumo da vida de muitas pessoas. No caso da trajetória de Hank Moody (David Duchovny), a história não é exatamente esta. Ainda mais se levarmos em conta a fantasia da personagem, em frente da casa de sua amada, em que se agarram de modo voluptuoso e apaixonado. Um reencontro que acontece de fato e é igualmente surpreendente para Karen (Natascha McElholme), especialmente quando seu ex encara seu novo “par de encontro”, uma situação que faz Moody destilar toda a sua escrotidão. A  essência de Californication parece ter voltado a tona nesta sétima temporada para um último vislumbre digno da trajetória do Bukowski do novo século.

    A realidade cai em cima da cabeça de Charlie (Evan Handler) e Hank. A fonte secou, não há mais trabalho, nem em televisão, musicais, meios literários ou cinematográficos. O ego gigante e a falta de tato da personagem finalmente renderam os frutos de rejeição que tanto plantou. A única oportunidade que apareceu em seu caminho seria uma adaptação de Santa Monic Cop, do mesmo filme que não foi finalizado na quinta temporada.  Um pretexto para reinserir personagens carismáticos, como Stu Beggs (Stephen Tobolowsky), para rir de si mesmo e, claro, introduzir o produtor de TV Rick Rath (Michael Imperioli). Sem interesse nas brincadeiras de Moody, o produtor aceita incluí-lo no projeto após uma longa conversa redentora e um imprevisto de criatividade da emissora. Quando tudo começa a entrar nos trilhos, uma nova questão surge e espalha merda para todo o lado – outra vez – com a esperada questão de um filho bastardo, travestido em um fã adolescente entrevistador.

    A inserção de Levon (Oliver Cooper) é mais um fator que estragaria os planos de Hank em retornar ao seu oásis – leia-se os braços de sua amada. O rapaz é o inverso de seu alegado pai: inábil com as mulheres, maniqueísta, bidimensional, incapaz de captar ironia. Isso ajuda o genitor incomodado a aumentar a sua recusa ao bastardo. O chamado a aventura ocorre sem que ele saiba que ver seu herdeiro inesperado é uma arapuca para encontrar Julia (Heather Graham), a tal ex-amante de Hank. O encontro promovido entre as “mães” é como o esperado: catastrófico.

    Após algum tempo, Hank se afeiçoa a Levon, iniciando uma relação paternal que, obviamente, reaproxima-o de Julia, O perigo segue espreitando a sua existência  mas ambos consideram a ideia ruim e deixam qualquer possibilidade de intimidade de lado. Uma das poucas semelhanças entre pai e filho é o pouco freio da língua. No caso do menino, se manifesta pela falta de tato. A volúpia é algo que une os dois “Moodys”, e o pai proporciona ao filho um momento singelo, onde ele perde sua virgindade através de uma profissional do amor, gerando muitas broncas de praticamente todas as mulheres a sua volta.

    Hank faz um pedido-quase-um-clamor para Karen. Pede que não desista da ligação que há entre eles. É sua persona que está em jogo e sua figura icônica que mantém o seriado de pé. Assim, o clamor se estende ao público, como uma desesperada intimação para que mantenha a demanda fiel e os olhos ainda em tela, apesar de todos os erros cometidos nas temporadas anteriores.

    Em meio a todo o caos de sua vida pessoal, Hank vê lembranças correrem seus olhos que, aos poucos, ficam marejados ao perceber o quanto foi responsável pela distância entre Karen e ele. O acidente que a ex-esposa sofre apressa esse processo, o fazendo lembrar os momentos antes da “primeira” separação deles, no momento em que iam para uma terapia de casal discutir os problemas.Os flashbacks são fotografados num tom azulado, remetendo a melancolia presente na música (blues), destacando as sensações agridoces presentes em suas escolhas que tornaram sua vida miserável aos seus olhos.

    A primeira tentativa de tentar consertar a história com sua alma gêmea falha miseravelmente. Hank arquiteta um jantar romântico com Karen que miseravelmente fracassa com uma sucessão de visitas ao palácio dos Runkles (onde ele residia no momento). Situações que envolvem os coadjuvantes mais carismáticos da temporada e se torna mais uma das encarnações constrangedoras das reuniões sociais perturbadas da série. O que gera mais uma discussão do protagonista com sua musa e que, mais uma vez, demonstra a ausência de um lugar para Karen dentro do caos e do mundo dionisíaco em que vive o escritor.

    O piloto de Santa Monica Cop é mal recebido pela audiência e o seriado é cancelado. Hank se vê novamente sem um sustento, até que Hard sugere que escreva sua própria série, sobre suas vivências, sobre suas mulheres e sobre como sobrevive as suas próprias trapalhadas. O que Moody tentou a todo custo postergar finalmente acontece e Becca (Madeleine Martin) conhece Levon. Lidar com a decepção de sua filha é algo que o faz sentir uma autocomiseração grande. Ao invés de culpa ou qualquer sentimento ligado a arrependimento. Becca chega com a novidade de que irá se casar e não deixa seu pai sequer opinar sobre assunto, desprezando as naturais irresponsabilidades do escritor. A notícia mais importante da vida da filha é ultrapassada por (mais) um fantasma do passado de seu pai.

    No series finale, Becca viaja para conhecer os pais do noivo em companhia de Karen e Hank se vê isolado em LA. Levon é preso por transar com prostitutas, o que obriga Moody a agir como pai do menino, ensinando-o a como conquistar garotas. Tal ato serve como rito de passagem, uma demonstração de que o escritor quer amadurecer e ser um homem de família respeitável, ou o mais próximo disso possível, até recusando sexo em mais de uma oportunidade.

    Hank escreve uma última carta, reconhecendo que quando abre a boca acaba estragando tudo. Karen afirma que não quer ler nada dele mas, espirituosamente, em meio a um avião repleto de gente, ele declama seus versos, logo depois de arrumar as coisas com o casal Runkle, resolver seu imbróglio com Julia e finalmente abandonar seu Porsche de farol quebrado. As portas que estavam ao seu alcance foram fechadas. Moody assume que é ruim com finais felizes, e seu desfecho é voltar em definitivo para o lugar onde tudo funcionava, onde eles eram felizes, onde o casal era um só. Após a emocionante cena, há um misto de recordatório com a trilha repetida de Rocket Man, de Elton John, semelhante ao que ocorreu na terceira temporada, quando Hank ia preso e seria impedido de mudar-se com Karen. O final da temporada condiz com o andamento da jornada, pois o que o escritor poderia querer para si no final era retornar ao simples estado alegria ou contentamento, talvez inalcançável, mas um motivo para continuar lutando.

    Abaixo, a carta do inspirado autor para a sua musa:

    – “Querida, Karen…
    Estive pensando em Nós (É com “N” maiúsculo, ele diz).
    Nossa história, como vou resumir? Tem sido perfeita? Dificilmente. Qualquer história comigo no centro nunca será nada menos que uma confusão engraçada. Mas o que tenho certeza é: nosso tempo ao sol foi absolutamente lindo. Os pesadelos, ressacas, sexo e as porradas (fucking and punch, título de um dos livros). A loucura maravilhosa da nossa cidade,onde por anos, acordava, fazia merda, dizia que sentia muito, desmaiava e fazia tudo de novo.
    Como escritor, sou péssimo para finais felizes.
    O cara fica com a garota.
    Ela o salva dele mesmo… E fim.
    Como um cara que ama uma garota, percebi que não há nada como isso.
    Não há por do sol.
    Só há o agora e nós dois, o que pode ser assustador demais às vezes. Mas, se fechar os olhos e ouvir o sussurro de seu coração, se continuar tentando e nunca desistir, não importa quantas vezes entenda errado. Até o começo e fim virarem algo chamado:
    ‘Até nos reencontrarmos’.”

    O resgate que Tom Kapinos queria para a sua série é finalmente alcançado com um desfecho digno. Hank não soube como terminar a carta ainda mais se considerarmos que a história de seu amor não acabou. É aberta, é infinita e emocional, como a sua literatura.

  • Review | Californication – 1ª a 6ª Temporadas

    Review | Californication – 1ª a 6ª Temporadas

    californicationDavid Duchovny teve muitas dificuldades em se livrar da personagem Fox Mulder em Arquivo X. Sua vontade em renegar o papel de destaque  não o eximiu da dificuldade de  livrar-se do estereótipo.  Após insucessos no cinema, o ator encontraria Tom Kapinos que tinha em mãos um roteiro curioso a respeito de um forte personagem niilista, narcisista, mulherengo e misantropo –  características defendidas como elogios notáveis.

    Hank Moody, o personagem central de Californication, é como um Charles Bukowski moderno, ainda que isto possa ser encarado como uma comparação parca. Talentosíssimo e preguiçoso, sua trajetória se inicia para o público de forma sacrílega, jogando um cigarro na bacia de água benta em uma atividade semelhante ao título de sua publicação God Hates Us All. Ao fazer uma promessa ao Cristo, ainda que não use o discurso moralista que o santo gostaria de ouvir, tem intenção de voltar ao auge criativo. A proposta da série é notada nos primeiros cinco minutos do piloto, incisiva e direta.

    A força de Californication vem de seu protagonista. O escritor Moody em crise é um voraz e compulsivo consumidor da carne feminina, no sentido bíblico da palavra fome. Sob a ótica da moral e bons costumes, sua família vive despedaçada. Agarrada à falsa aparência de que tudo está bem dentro da rotina do preguiçoso romancista. A depressão da personagem é alta mas ignorada pela personalidade sociopata e misantrópica. Sexista ao extremo, o chauvinismo beira o charme e faz com que se destaque da multidão, méritos que vão além do que merece. O seu cinismo diferencia-se do dos demais, além de possuir uma habilidade sedutora em relação à conquista feminina, além da sensação de ser superior ao americano médio – não à toa.

    A aflição que confunde a psiquê de Moody é a perda definitiva de Karen (Natascha McElhone), a musa, progenitora da filha Becca (Madeleine Martin) e ex-esposa, prestes a se casar com um escroque. A falta de atitude faz Hank discutir seu papel de macho alfa, mesmo que sua persona sempre esteja cercada de mulheres belas. Porém, os sentimentos presos à sua alma gêmea não o impedem de esticar os olhos na proibida menor (e filha de seu rival, futuro marido da ex-esposa), Mia Lewis (Madeline Zima), que, no papel de admiradora e aproveitadora da fama do autor, faz incorporar a óbvia Lolita.

    A arrogância de Hank afasta-o de certos tipos de mulheres, especialmente as inseguras, mas o cinismo não impede de sentir rejeição. Charlie Runkle (Evan Handler), o melhor amigo empresário e um dos melhores coadjuvantes, diz uma frase que resume o funcionamento do estilo de vida de seu agenciado: “debaixo desse narcisismo se esconde um talento para enxergar as coisas de uma nova ótica.” Após idas e vindas, infidelidades e sofrimento mútuo, Karen diz que está cansada de ser o cobertor sexual de Moody e viver com um homem capaz de destruir tudo ao seu redor. Como um toque de Midas invertido, o autor consegue ferrar com qualquer coisa com suas palavras ou levando culpa pelo estigma de mulherengo.

    O casamento de Karen e Bill (Damian Young) quase se torna uma demonstração do ego narcísico de Hank, mas após um primeiro momento de negação, aceita a partida de sua musa amada. Como prêmio de consolação, há uma declaração de orgulho sincero da sua filha, ao perceber que dessa vez o pai não estragou tudo. A rotina do escritor é tão caótica que o final feliz que fecha a primeira temporada não pode ser considerada um clichê. E, em um Porsche imundo, foge com a amada, ainda vestida de noiva, e a filha.

    Logo na segunda temporada, os acontecimentos anteriores fazem Hank questionar se os fatos são verdadeiros. Diante de seu histórico, tudo dava certo demais para sua rotina. Em virtude da boa sorte que carregava, sempre esperava graves consequências de seus atos. Mesmo em uma aposentadoria forçada pela falta de inspiração, o escritor prossegue recebendo boas propostas para retornar ao mercado, enquanto Karen decide se mudar para Nova Iorque, sua cidade natal.

    O retorno da mulher amada para cidade é um símbolo da mudança de vida. Da instituição família dos Moody como uma unidade que nunca tiveram. Hank modifica sua abordagem com as mulheres, evita os cigarros e começa a mastigar canudos de sorvete. Reencontra boa parte das senhoras com as quais dormiu na temporada anterior, em muitas delas fazendo mea culpa, e não reage com raiva de Mia, demonstrando maturidade até mesmo com o roubo de seu manuscrito. Como uma constante, as piadas escatológicas permanecem, diferenciando-o dos outros, mas colocando-se próximo demais de sua antiga persona, um fantasma que deseja se livrar a todo custo.

    Mesmo tendo desculpas, Hank se mete em problemas e o estado de calmaria cessa, resultando em um escândalo por parte de Karen. Vencido, sai de casa, rompendo com a paz que o cercava e retornando à antiga rotina. A decadência parece ser automática assim que o personagem é deixado pela mulher. Assim, Moody passa a beber, fumar e foder com tudo que anda e respira, sem exceções.

    Certos hábitos não mudam. Karen prossegue dando lições de moral em Hank mesmo após o triste rompimento, deixando-o na cadeia, graças à fiança que ela prefere não pagar. A mágica do personagem é que “não se pode ficar muito tempo com raiva dele”, nas palavras dela. A nova rotina do escritor é acompanhada por um produtor musical e seus clientes. Nesse ambiente, tudo que é preferido de Hank está presente: mulheres, drogas, bebidas. Lew Ashby, personagem de Callum Keith Rennie ganha muito destaque e torna-se um grande amigo do escritor com o passar do tempo.

    Algumas reservas morais são ditas por Moody, como a máxima de que “Não se transa com a alma gêmea de um amigo.” Tal prerrogativa é respeitada até o final da série e demonstra que o escritor é muito mais do que o poço de melancolia e maus modos que o expectador mais conservador pode achar. A morte de Lew o faz repensar tudo, não só pela falta do amigo, mas também por enxergar onde poderia parar se continuasse cometendo seus excessos. Hank entende que o amor supera tudo, e que “elas” – sejam as mulheres ou a própria família – irão te perdoar se realmente te amarem, “se a vida não for assim, não vale a pena tentar”, nas falas do finado parceiro. Tudo era por Karen e Becca. Quem garante que eles seriam felizes juntos? Era um risco demasiado para se correr. Por isso, Hank decide escrever uma carta:

    Querida Karen, se está lendo isso é porque eu tive coragem de mandar. Bom para mim. Você não me conhece muito bem, mas se deixar, tenho a frequente tendência de falar que é difícil escrever. Mas isso…É a coisa mais difícil que já tive que escrever. Não há maneira fácil de dizer, então vou falar logo. Conheci uma pessoa. Foi um acidente, eu não estava à procura. Foi uma tempestade perfeita. Ela falou algo, eu também.Quando vi, queria passar o resto da minha vida nessa conversa. Agora estou com a intuição de que ela pode ser a mulher certa. Ela é totalmente louca, de um jeito que me faz sorrir, altamente neurótica. Ela é você, Karen. Essa é a boa notícia. A má é que não sei como ficar com você nesse momento. E isso assusta pra caralho. Porque se não ficar com você agora, sinto que nos perderemos. O mundo é grande, mal, cheio de reviravoltas. As pessoas costumam piscar e perder um momento. O momento que poderia mudar tudo. Não sei o que está acontecendo entre nós, e não sei porque deveria gastar seu tempo comigo. Mas como seu cheiro é bom! Como o lar. E faz um ótimo café, isso tem que valer alguma coisa. Me liga.

    Seu infiel,
    Hank Moody.”

    O desabafo mostra o medo de entrar no processo maduro de crescer e ser adulto. Por isso prefere a auto-sabotagem. Se não o fizer, acredita que pode crescer e esquecer sua Karen. Um risco que não valeria tanto.

    Após a saída de Karen da cidade, Hank volta a sua rotina sexual, mas claramente não está tão feliz quanto deveria. A personagem começa o terceiro ano praticando seus atos ruins, incentivando o vício da bebida em Richard Bates (Jason Beghe), um outro escritor que admira. O rompimento com seus 10 anos de sobriedade arruína o futuro de Bates e abre a chance de Moody lecionar em uma universidade. Seu modus operandi é semelhante à rotina como escritor. Relapso quanto as provas dos alunos, deixa tudo a cargo de sua assistente e diz que lerá o trabalho de uma aluna, unicamente por ela ser atraente. Um ponto interessante são as ironias jocosas que faz com a saga Crepúsculo e com seus derivados.

    Enquanto leciona, destila seu costumeiro misantropismo nos aluninhos ricos e mimados da universidade, fazendo piadas que a maioria sequer imaginava existir. As melhores continuam sendo seus comentários sobre a diferença entre homens e mulheres, quando afirma que “homens são seres simples, basta um elogio ao seu trabalho para deixá-los no ponto”, ao contrário do proselitismo feminino. Óbvio que a fala é  machista, e é óbvio que a graça não se perde nem mesmo com isso.

    Hank prossegue clamando as mulheres, mas a razão evoluiu já que passa a implorar (mais) pelo amor da filha e não (tanto) das parceiras sexuais. O drama envolvendo a ida de Becca para Los Angeles faz-se abrir uma enorme discussão a respeito da paternidade, o que por si só é curioso. Os talentos dramatúrgicos de Madeleine Martin são postos à prova e ela convence dentro de suas possibilidades. Hank decide ir também para Nova Iorque e, em sua despedida de LA, é obrigado a dispensar as amantes que acumulou pela terceira temporada. Becca fica confusa ao ver a volúpia que o pai desperta nas mulheres à sua volta, entendendo, à sua maneira, que ela deve ser tratada pelos homens de um modo diferente – crescer com esse comportamento de protetor é difícil. Mas ir para NY simboliza a procura de uma felicidade que pode nunca se concretizar. Californication mostra uma realidade curiosa, onde os adultos se auto-enganam o tempo todo, enquanto crianças são sábias como filósofos.

    O final da terceira temporada parece uma repetição do season finale anterior, ou o que deveria ser o começo da terceira temporada – um grande atraso filmado e estendido. Um dos melhores momentos é a discussão da autoria de Fuckin and Puching, que Mia simplesmente roubou e que foi denunciada tão tardiamente. Hank, mesmo pensando o pior a respeito de Mia tenta protegê-la. É um cavalheiro, apesar de tudo, e sente-se como uma figura paterna. A forma com que a história termina é sensacional, inclusive o rompante silencioso na reação de Karen e o triste destino de Hank, com sua “liberdade ilusória” retirada aos olhos de sua família, a mesma que ele jurou proteger, ao som de Rocket Man, de Elton John.

    A guitarra que abre a trilha na primeira cena da quarta temporada imerge o espectador no universo caótico onde Hank se encontra. Sua vida certamente nunca esteve tão potencialmente bagunçada quanto naquele momento. Como sempre, há muitas mudanças em sua trajetória, e sua jornada volta a ser próspera com o escândalo a respeito de Mia X Moody e a adaptação para o cinema do malfadado livro. A acusação de pedofilia o faz sentir-se como um Roman Polanski ainda mais maldito, apesar de detestar tal comparação.

    A trama varia entre a produção do filme e o julgamento. O caso da promotoria enfraquece assim que Mia faz seu depoimento que, aos poucos, transforma a acusação numa simples tempestade em um copo d’água. As conversas impróprias de Moody com sua advogada Abby Rhodes (Carla Gugino) ao lado de geriatras não é interrompida, mesmo após todas as idiotices que o escritor tem a proeza de alcançar. E, como era de se esperar, consegue cooptá-la.

    Ele permanece cínico, mesmo após flagras de supostos assédios. Quando parece impossível, consegue se isolar mais ainda do mundo e dos poucos que ainda o suportam. A vontade de se auto-destruir só cresce em Hank, e nem mesmo o ator tem consciência disto. Ser superado por Karen é a pior sensação que pode poderia sentir, maior do que a apreensão pelo julgamento. Mesmo que assuma a culpa que o consome, sente a decepção nos olhos de sua alma gêmea.  A liberdade condicional dá salvo conduto para que o autor volte a ser um babaca completo. A temporada termina sem muitos ecos ou consequências marcantes, somente mais do universo de Moody. Nota-se um claro declínio nos roteiros. Até os lamentos do escritor não são mais tão fortes quanto antes, tampouco comoventes, mesmo com a intenção edificante de Hank no final.

    A Deusa da inspiração se foi, possivelmente para sempre. Encarar isso não é o estilo de Hank; seu feitio é se entregar para as mulheres e depois descartá-las. O tédio ainda o envolve, mesmo após o lançamento de um novo livro. O hiato entra a temporada quatro e cinco atravessa dois anos e meio da cronologia e Karen está casada com Richard Bates. O retiro do escritor da Califórnia acaba graças a um rapper, Samurai Apocalipse, interessado em seus préstimos. A ideia esdruxula é fazer uma série chamada Santa Monica Cop. Moody tenta declinar, mas o negro simplesmente não aceita um “não” como resposta. Enquanto isso, Hank mantém o talento de achar loucas mulheres, depravadas e sedentas por sexo. Em momento nenhum perde sua peculiaridade em cometer gafes.

    Há um flashback que mostra Hank quando se mudou para LA, ainda inseguro e modesto, com Karen muito reticente em mudar-se para lá. A cidade parece tê-los mudado, o que certamente é uma contradição quando comparados a outros momentos de rememoração dos personagens. No entanto, é interessante por mostrar o quanto a sucessão de acontecimentos mudou o modo de viver do protagonista. A vontade de crescer e evoluir na carreira despertou sua personalidade auto-destrutiva e, mais tarde, o fez se afastar de sua amada. Em uma crise no casamento, Karen tenta fazer a fuga costumeira, voltar para Hank quando a corda aperta. Mas ele permanece um perfeito cavalheiro disfarçado de um babaca incorrigível. E um amigo deveras protetor.

    Para variar, a despedida de Hank desencadeia muitas emoções antes escondidas atrás de movimentos hipócritas. A postura nas duas situações que se mostram a ele é muito diversa. No início, Moody tenta socializar com seu “genro” Tyler (Scott Michael Foster), uma versão mais nova de si, que até o substitui como roteirista, mas tudo se destrói rapidamente. Com Bates, Hank é compreensivo. Até por conta da culpa de seu passado, tenta ajudar o esposo de Karen a se reabilitar. O único inconveniente é que, como uma regra, escritor e sua amada tenham pelo menos um momento juntos por cada temporada. De um modo tresloucado, as almas tristes voltam a se cumprimentar e tudo fica bem, chegando tão perto de dar certo, mas o caos da vida do autor volta para assombrá-lo, pela quinta vez, repetindo exaustivamente o clichê.

    Californication é uma série épica, que mostra a trajetória de um escritor niilista que se mete em problemas existenciais, mas também pode ser encarada como uma ode à lei da semeadura, mostrando que independente dos bons feitos de uma pessoa, o universo (destino, deus, cosmo…) cobra a parcela da culpa das merdas (shit é uma palavra largamente usada nos roteiros) antes feitas. Isso é uma regra, e o irresistível papel de David Duchovny, Hank Moody, é a prova em carne e osso. A primeira cena da sexta temporada é uma fantasia em flashback mostrando uma variação do primeiro encontro do casal preferido de Tom Kapinos, mas com um temível fantasma.

    A culpa volta à mente do autor, que mergulha em seu conhecido vício, o álcool. Retorna também para a sua rotina em estragar a vida de todos que cruzam seu caminho. Seu novo trabalho seria com Atticus Fetch, uma Opera Rock, mas nem mesmo o motiva em um primeiro momento. Hank finalmente verbaliza que não quer mais viver.

    Talvez a vontade de morrer de Hank seja pela péssima qualidade do roteiro desse novo ano. Quase todos os momentos em que as atividades dos roqueiros são registradas, é visível um desconforto vergonhoso. Tudo é caricato e mal feito, e ao contrário das temporadas anteriores, esta pouco tem do espírito Rock ‘n’ Roll. Há poucos momentos do tradicional Hank de anos anteriores. Como se o escopo da história estivesse à procura de um público maior.

    O roteiro de Moody para a peça é recusado por ser sombrio e parecido com o livro e menos com o filme. Mesmo quem o apoia sente que falta alma em relação a um roteiro sobre um musical. Como pontos positivos, há o desenvolvimento de Becca como escritora iniciante e o legado dos Moody´s se acostumando com recusas.

    As piadas dentro da rehab são completamente fora do tom, quase tudo que envolve o personagem de Atticus é caricato e toscamente construído. A comédia é fraca. Apoiar a temporada inteira num dos maiores defeitos da série se prova um equívoco ainda maior. Quase todos os registros de músicos, bandas e cenário musical foram péssimos, e a cereja indigesta é  a cena envolvendo o roqueiro britânico poser de estilo indefinido – nem metal, nem hard rock, nem nada.

    A Showtime e Tom Kapinos chegaram à conclusão de que a saga de Hank Moody deveria ter seu fim. A sétima temporada será a última do seriado, que, apesar da decadência das duas temporadas anteriores, garantiu momentos épicos, especialmente nos dois primeiros anos, mostrando o modo de viver de um párea, de um sujeito diferente de outros de seu tempo. Um escritor à moda antiga, genial, mas arredio e pouco afeito à fama que incomodamente o agride, e que, mesmo com toda essa agitação, com uma paixão persistente que prossegue em seu coração, o faz sempre ter a vontade suprema de estar junto à sua musa.

  • Review | Arquivo X – 1ª Temporada

    Review | Arquivo X – 1ª Temporada

    X-Files-Season-1

    Lançada em setembro de 1993, Arquivo X foi testemunha ocular de uma década em que muitas séries televisivas foram consumidas pelo tempo enquanto poucas se tornaram fundamentais para uma nova era na década seguinte.

    Até mesmo os fãs mais agressivos da série são capazes de admitir a queda da qualidade nas últimas temporadas e o desfecho mediano. Porém, é inegável a competência do início do seriado que, em pleno horário nobre, apresentou uma estrutura ousada cuja temática envolvia uma trama central de conspiração entre governo americano e extraterrestres. Além de explorar tudo o que parecia inexplicável, apoiava-se no estranho e no bizarro através de roteiros bem conduzidos.

    Criado por Chris Carter – que nunca repetiu o mesmo sucesso – os arquivos do título são uma divisão do FBI alimentada pela crença de um único agente federal, Fox Mulder que, na infância, presenciou a abdução de sua irmã mais nova. Fato que modificou sua maneira de agir, transformando-o em um homem obsessivo em descobrir a verdade por trás de fenômenos inexplicáveis.

    Arquivo X surgiu em época analógica e, mesmo assim, produziu uma gama de fãs que consumiam revistas especializadas, escreviam suas próprias histórias dos agentes federais e participavam de fóruns virtuais sobre a série. No Brasil, a revista Sci-Fi News foi uma de suas  maiores fontes, ainda que o país sempre tenha assistido à série com atraso em relação aos Estados Unidos, com episódios dublados na Fox ou na Record. De qualquer maneira, não havia quem ficasse impassível diante dos casos semanais.

    A trama tem início quando a agente Dana Scully é convocada para acompanhar Mulder nas investigações do Arquivo X. Uma tentativa dos superiores de reprimir os impulsos do agente, tentando introduzir uma agente federal que possuísse fundamentos científicos e que fosse além das teorias pouco ortodoxas do parceiro. A discrepância entre a dupla produziu um dos grandes casais icônicos da televisão, com uma impressionante química entre uma personagem irreparavelmente crente no impossível e outra cuja base é a ciência.

    A primeira temporada introduz os elementos que consagraram a série. Os 24 episódios desta temporada equilibram-se na trama mitológica – que transforma o governo americano em uma máquina de produzir mentiras – e em investigações que, supostamente, não possuem solução. Episódios conduzidos com boas doses de mistério e investigação policial.

    Vinte anos após seu lançamento, alguns argumentos, demasiadamente apoiados em temas da década de 90, perderam a força e sentido aparente. Tais situações não caem no completo ridículo devido à química do casal e aos bons diálogos. Por outro lado, tramas ainda funcionais no presente e roteiros bem fundamentados resultam em episódios primorosos que ainda hoje mantêm um frescor assustador.

    A série se tornou tão grandiosa que, ainda hoje, mantém-se no ar com reprises em diversos canais pelo mundo. Tal é a sua importância que, das mãos de J. J. Abrams, originou-se Fringe, uma herdeira que bebe da fonte destas investigações e, a partir da segunda temporada, escancara suas homenagens ao original.

    No país, a Fox foi responsável pelo lançamento das nove temporadas da série. Na época, a chegada de uma temporada completa era novidade para o mercado brasileiro. Infelizmente, algumas legendas eram recheadas de erros – concordância, digitação –, além de traduções que se modificavam no decorrer dos episódios e omissões nos textos que não situavam o local em que ocorriam as ações. Problema que impossibilita a compreensão total do público que não é fluente em inglês.

    Apesar de tais erros, a primeira versão do box, que ilustra este texto, se tornou um belo lançamento de uma época em que não havia contenção de gastos, o que facilitava que boas edições especiais surgissem no país. O digipack com luva metálica cobrindo a embalagem não se compara com a edição atual, econômica, sem o disco de extras. Um incômodo para aqueles que, além do material, prezam também pelo conteúdo gráfico.

    Boatos dizem que a série está nos futuros planos do estúdio para um lançamento em alta definição. Um merecido box para uma série cultuada.