O filme de David Anspaugh começa com uma viagem de carro com o protagonista Norman Dale (Gene Hackman) viajando pelas estradas interioranas dos Estados Unidos, evocando todo o caráter provinciano de Momentos Decisivos. O longa trata da trajetória do Coach Dale, homem cujo passado possuialgumas manchas e mágoas, e que retorna para sua terra como bom hoosier (o nome original do filme é Hoosiers), a fim de trabalhar como treinador de basquete do time de uma pequena escola em Indiana, em uma época que pequenas agremiações foram permitidas disputar o estadual.
A música de Jerry Goldsmith dá o tom ideal para o filme, ajudando o roteiro de Angelo Pizzo variar de forma fluida entre o temperamental comportamento de Dale e o drama vivido por ele. Hackman está em boa forma, e parece mergulhar muito bem no papel de instrutor de atletas, isso garante ao longa um caráter fidedigno. Aos poucos, a história vai ganhando mais contornos dramáticos.
O filme cai em uma jornada bastante piegas, especialmente no que diz respeito ao personagem de Dennis Hopper, o auxiliar Shooter, um bêbado local que ajuda Norman a conduzir o time. As dificuldades que ele tem em se manter sóbrio são responsáveis por momentos dignos de um sensacionalismo execrável. Ainda assim, sua performance fez Hopper concorrer ao Óscar de melhor ator coadjuvante à época.
Os momentos da partida final são muito bem registrados, com slow motion bem utilizado, embalado pelos temas de Goldsmith. Momentos Decisivos, apesar do espírito inspirador, soa bobo em muitos momentos, mas ainda assim faz um belo registro do esporte e contem ótimas atuações dos veteranos Hopper e Hackman.
Qualquer cinéfilo ou entusiasta de filmes de ação é familiarizado com o incrível Operação França (The French Connection), obra do diretor William Friedkin e estrelado por Gene Hackman e detêm a considerada melhor perseguição de carro já feita na história do cinema. Em contraste, não são muitas pessoas que viram a sua sequência, Operação França 2 (The French Connection 2), em que o detetive interpretado por Hackman vai até a França achar a tal conexão do título original. Não é um grande filme se compara a obra original. Felizmente, encontramos agora décadas depois a obra Conexão Francesa, dirigida por Cedric Jimenez, estrelando ninguém menos que Jean Dujardin(conhecido mundialmente por seu trabalho em O Artista) – agindo como a contraparte francesa do personagem de Hackman.
Na trama, o magistrado Pierre Michel (Dujardin) é transferido para Marselha, onde descobre que seu maior desafio será desmembrar uma articulada quadrilha de traficantes de heroína na cidade dominada por Gartan Zampa (Gilles Lellouche).
É interessante ver como muitas das produções tentam resgatar alguns temas e a estética setentista, não só visualmente como em decupagem, pensem em O Agente da U.N.C.L.E. ou até mesmo em Argo. Não se trata de um filme policial como Atração Perigosa ou até mesmo Os Infiltrados,o filme é dinâmico mas respeita suas duas horas de duração de maneira que até o progresso dela segue um compasso que não soa de maneira alguma como os filmes de ação/policial costumeiros dos nosso tempos.
A trilha sonora também é quase um segundo personagem da trama, é difícil lembrar em mais de oito minutos que alguma cena da produção não tenha simplesmente alguma música de época e pouquíssimo uso de trilha incidental. Junte isso a maneira que praticamente todas as cenas ressaltam sempre uma paleta quase pastel com sombras barrocas belamente enquadradas e realmente o filme se torna uma bela mescla entre o gênero policial com a estética européia e também de uma escola de cinema passada com sutis maneirismos contemporâneos.
Conexão Francesa infelizmente não é recheado de ação como um filme desses geralmente é exigido pelo público nos dias de hoje, porém contrabalanceia esse fato com uma competente execução de história sem nenhum recurso batido, como repetitivas narrações progredindo a trama ou os clássicos exageros de vilões perdendo o controle sempre que a situação não sai de acordo com o planejado. Esse filme poderia facilmente ser vendido num box com as outras duas produções que tem Hackman como protagonista.
Com a franquia já dada como morta para os Salkind – ao menos em relação aos filmes com o azulão – sobrou para Golan-Globus e seu Cannon Group produzir Superman IV: Em Busca da Paz, dirigido pelo não menos genial Sidney J. Furie, o mesmo que criou a exagerada imitação de Top Gun vista em Águia de Aço. A introdução imita as clássicas, com Alexander Courage tocando ao invés de John Williams.
A pérola já tem todo seu caráter explicitado logo no início, com o herói de capa voando livremente pelo espaço sideral, salvando uma expedição estrangeira ligada aos soviéticos, que seria o embrião da busca incessante pelo fim dos conflitos provenientes da Guerra Fria. É difícil escolher qual o fator mais tosco, se é a cena de voo no espaço, recortada e usada no mesmo take a todo momento; a demonstração de força e poder da rebatida na bola de baseball, que extrapola a atmosfera terrestre; ou a fuga de Lex Luthor (Gene Hackman, cada vez mais cansado) através de seu pupilo Lenny (Jon Cryer, de Two and a Half Man), em uma cena mais forçada que todo o plot pueril deste capítulo.
Nenhum dos eventos sugeridos em Superman III é levado a sério por parte do texto de Christopher Reeve, Lawrence Konner e Mark Rosenthal. A dupla que adapta a história do astro principal conseguiria, em um futuro próximo, produzir um bom filme – Jornada nas Estrelas 6: A Terra Desconhecida – e participações em seriados adultos da HBO. Mas nesse caso, não conseguem salvar da mediocridade a premissa boba de vitória da crise via desarmamento, contando com a parte que deveria ser mais séria como um evento muito infantil.
Mesmo os envolvimentos pseudo amorosos de Clark passam por um escopo extremamente irreal, sendo o pacato e matuto repórter alvo das investidas da bela e rica Lacy Warfield (Mariel Hemingway), que além de ter posse sobre o Planeta Diário, tenciona devorar seus funcionários também. O quadro se agrava quando ele passa a sofrer com os ciúmes de Lois Lane (Margot Kidder), o que contradiz todo o seu arquétipo de sujeito aparentemente desinteressante.
Quando Clark volta à sua cidade natal, descobre mais mensagens ocultas em sua nave, fator que é até justificado no primeiro filme, mas que ainda soa bobo diante da missão que lhe é cabida. Boba também é a demonstração de Kent, para Lois, trocando suas vestes para a do herói com a jornalista seguindo em sua empreitada de negar a real identidade do homem poderoso. A caminhada rumo à sede das Nações Unidas é igualmente patética, pela irrealidade e por ser o completo avesso da cartilha da Cannon, que normalmente fazia dos plots dos seus filmes folhetins pró judeus e anti-árabes, fomentando a guerra. A confissão de mea culpa dificilmente soaria mais vexatória do que neste.
A junção de todas as bombas, próximo do lado externo do planeta, impressiona pelo caráter paupérrimo tanto da cinematografia quanto a ideia de jogar todo o armamento no sol, o que certamente atrapalharia um pouco a rotina do sistema solar. Superman IV é levado tão a sério que Hackman não se deu o trabalho sequer de raspar a cabeça. Seu plano envolve lançar uma ogiva no sol para que de lá saia uma versão clonada do Super Homem, uma fera loira, avermelhada, com unhas semelhantes a garras de harpia na cor grafite. O Homem Nuclear é vivido por Mark Pillow, mas tem a voz e grunhidos de Hackman, em mais uma das barbadas jocosas da produção, novamente tencionando aludir a um vilão clássico, dessa vez tomando os elementos do Bizzaro como base.
Há muitas cenas em que se reinventa a um modo mais barato os momentos do primeiro longa, como o voo de Super e Lois, e a chamada de Lex ser escutada somente pela super audição do kriptoniano, entre outras baboseiras. O clímax da batalha mundial entre paladino e bandido envolve viagens a Itália e o uso da Estátua da Liberdade como arma, em outra tentativa fajuta de homenagear a terceira parte da saga.
Superman IV: Em Busca da Paz consegue aludir a todos os defeitos possíveis em uma produção do gênero. Consome muito tempo com a construção de um herói maniqueísta e carregado de bom mocismo, com um rival físico risível, pior até do que a versão cortada do longa, ainda mais jocosa e que combinava ainda mais com o tom de auto parodia que a saga acabou por mostrar nessa nova encarnação.
Nem é preciso falar muito quando se trata de Clint Eastwood, um dos poucos sujeitos de Hollywood que é extremamente competente em atuação e direção. Embora seu talento para atuar e dirigir seja notório, o que talvez as pessoas não percebam é que Clint sabe contar histórias. Ele conta ótimas histórias já criadas, lançadas em papel, bons romances, muitas vezes desconhecidos, mas que guardam ótimas histórias. E esse é o caso de Poder Absoluto.
O livro Poder Absoluto foi escrito por David Baldacci e roteirizado por William Goldman, dono de duas estatuetas da Academia, além de outras 14 indicações e assim, ficou “fácil” para Clint dirigir o sucessor de As Pontes de Madison. Dona de uma premissa simples, porém chocante logo num primeiro momento, a fita se desenvolve num ótimo thriller policial e político de encher os olhos, com cenas inteligentes, diálogos precisos, sem esquecer, inclusive, de uma ou outra cena de ação. E claro que não podemos deixar de citar o “trio de ferro” dos atores principais aqui presentes. Além de Clint como protagonista (ou seria antagonista?), temos Gene Hackman e Ed Harris.
Luther Whitney (Clint Eastowood) é um conhecido e veterano ladrão de joias, que passou ausente boa parte da criação de sua filha, Kate (Laura Linney), tendo, portanto, uma relação conturbada com a moça, uma das promotoras de justiça da cidade. Além de ser expert em adentrar em residências super protegidas, Luther é o melhor no que faz e, assim, decide fazer um último furto para garantir de vez sua aposentadoria. Adentrando uma mansão vazia, furta todas as joias pertencentes a um casal milionário que está viajando. Porém, acontece que só o marido parece viajar, uma vez que sua esposa adentra à residência com seu amante. Luther se esconde num closet e testemunha, através de um espelho de uma face, as preliminares de um casal bêbado, que resulta num crime bárbaro.
O detetive Seth Frank (Ed Harris) tem a certeza que o crime foi cometido por Luther, por conta do modus operandi para invadir a casa e das joias furtadas e isso intervém ainda mais na relação do veterano ladrão com sua filha. Luther presenciou um crime ao qual não pode revelar assim de forma aberta, pois o amante da mulher assassinada é o homem mais poderoso dos Estados Unidos, o presidente Allen Richmond, vivido por Gene Hackman.
Assim começa o tradicional mas competente jogo de gato e rato, uma vez que Frank quer Luther preso e o presidente, assim como o marido da mulher assassinada, o querem morto. O interessante é que tal jogo não se estende somente a Luther, Frank e o presidente e é justamente onde reside a graça da trama. Há algo muito maior por trás deste “simples” crime.
O destaque do filme fica pra atuação de Clint Eastwood e Ed Harris, mais precisamente quando estes dois dividem a tela. E também é sempre interessante acompanhar Luther com sua filha, além de todas as situações em que se coloca para conseguir provar sua inocência. Mas como dito, tem momentos em que parece que o filme não trata somente da história de Luther, o que o torna obrigatório.
Poder Absoluto podenão estar na lista dos melhores filmes do diretor, mas a trama e o elenco cativam desde o começo, sendo simultaneamente inteligente e conduzindo bem os clichês, não aquele clichê que decepciona, mas aquele em que o espectador, ao assistir, proferirá algum palavrão, cuja tradução estará próxima de um sonoro “uau!”.
Richard Donner – que dirigiu o primeiro filme da franquia – foi impedido de realizar a sequência de seu Superman. Os filmes foram rodados em paralelo, e seu sucessor – Richard Lester – teve de refilmar muitas sequências, rever partes inteiras do roteiro. Em 2006 foi lançada esta versão de Superman II, se valendo até mesmo de imagens de testes de cenas.
A história começa revisitando o julgamento de Zod, Ursa e Non. Esta versão contém algumas cenas com Marlon Brando ainda – o que não ocorreu com a versão lançada nos cinemas em 1980. Os personagens parecem ter evoluído. O núcleo de Lex Luthor (Gene Hackman) continua sendo o alívio cômico. Lois Lane (Margot Kidder) consegue em minutos de cena algo que demorou décadas de quadrinhos para descobrir: deduzir que Clark Kent esconde alguma coisa, e para isso bastou somente olhá-lo.
Há algumas incongruências, como a falta de explicação de como Lex encontrou a Fortaleza da Solidão. O herói é tão onipotente que mesmo nas Cataratas do Niagara seu cabelo permanece intacto e engomado. Algumas das sequências mostram os atores com visuais completamente diferentes – o que não chega a ser um erro de continuísmo, visto as condições de algumas tomadas resgatadas. O ataque do General Zod a Casa Branca começa muito mal, mas aos poucos vai melhorando, demonstrando que resistir ao trio de bandidos é inútil. Uma ótima fala é de um sujeito espantado com os feitos dos alienígenas que diz “Oh, God”, e o general prontamente responde “ZOD”.
A histriônica atuação de Terence Stamp é muito icônica. Seu vilão afetado, arrogante e soberbo é muito bem realizado, ainda que seja bastante caricato. Um dos problemas que Zod parece enfrentar é o tédio. A total falta de desafios em sua vida abre brecha para a atuação de Luthor, que aparece magicamente na residência presidencial. Até então o tirano sequer sabia da existência do filho de Jor-El.
Há uma explicação bem mais plausível para o retorno do herói a sua forma poderosa, após renunciar aos seus poderes. O fato ocorre após um discurso emocionado de Jor-El, pontuado com uma boa demonstração dramatúrgica de Marlon Brando e Christopher Reeve. No final Superman destruiria a Fortaleza da Solidão, e o desfecho do casal é melancólico, e outra vez o recurso de viagem no tempo seria utilizado, o que é uma pena.
Esta versão é mais como uma colcha de retalhos, está longe de ser algo comparável a Blade Runner: Versão do Diretor, por exemplo. Ao menos dá um vislumbre de como seria Superman 2: A Aventura Continua pelas mãos de seu idealizador primário.
O primeiro nome nos créditos iniciais é o de Marlon Brando e logo após vem o de Gene Hackman, acompanhado é claro pela magistral música de John Williams. A abertura é longa: entre o Prólogo e o anuncia da direção ocorrem mais de cinco minutos, milimetricamente planejados para gerar expectativa no público.
A história é de Mario Puzo – de Poderoso Chefão – e começa com o julgamento dos três super-criminosos kriptonianos, encabeçado por Jor-El. Neste momento já é possível perceber a prepotência, arrogância e imponência de Zod , que dispara bravatas contra o “juiz”.
Os efeitos especiais de RoyField eram magníficos para a época, e não fazem feio hoje, claro fazendo-se algumas concessões. Grande parte da magia em Superman é fazer o espectador acreditar que O Homem poderia voar. O roteiro de Puzo se vale das origem contada por Siegel/Shuster, a criança recém-chegada a Terra tem um força descomunal e a demonstração de suas habilidades é muito parecida com a abordagem das primeiras histórias de Action Comics dos anos 30. A criação discreta dos Kent, a forma de esconder os poderes evitando-se exibições e seu uso para benefícios próprios, tornam Clark no herói sempre preocupado com o bem estar dos menos favorecidos. Outro fator que colaborou para isso foi à instrução de Jor-El, por meio do sistema de inteligência artificial kriptoniano, ele diz que a humanidade é boa, só precisa de alguém para guiá-los.
Apesar da lentidão, as passagens de tempo são muito bem executadas, desde o prólogo em Krypton, passando pela infância e adolescência de Kal-El em Pequenópolis. O Herói só veste seu uniforme depois de passados 48 minutos de exibição. A atuação de Christopher Reeve vivendo um pacato repórter capial é muito boa, e o deixa como o completo avesso do imponente escoteiro. Mesmo com Margot Kidder fazendo uma Lois Lane cheia de caras e bocas e voz insuportável, há de se acreditar no casal, graças à química e ao enorme carisma de Reeve. Os outros personagens também possuem uma caracterização bastante peculiar, Lex Luthor em sua primeira aparição assassina um detetive que o perseguia, se auto-intitula a maior mente criminosa do universo – sua personificação varia entre o cientista louco com gênio criminoso extremamente maniqueísta, soberbo e mal por essência. Os capangas também exageram no tom humorístico, mas não é nada que atrapalhe o bom andamento do filme.
Interessante como o Super deixa um barco de algumas toneladas sobre uma avenida bem em frente a uma delegacia – de quem seria a responsabilidade de rebocar o encouraçado? Impressionante também é como o dono da prisão leva numa boa a invasão ao seu “estabelecimento”, onde o herói deixa dois criminosos no interior das dependências do cárcere.
A maneira como o Super-Homem cai na armadilha de Luthor é estúpida, imprudente, óbvia e inaceitável. Nesses momentos os elementos da história parecem inspirados nas versões mais pueris do Super-Homem, como as mostradas no desenho Superamigos. Em contrapartida as façanhas e sacrifícios que ele faz pela população, mesmo com os exageros tornam o caráter cinematográfico ainda mais épico. Suas promessas são cumpridas, o dever com os inocentes é maior que as suas necessidades pessoais. Um ponto fraco no roteiro é o artifício utilizado no final – a viagem no tempo – em que liga-se uma variação de Deus Ex-Machina completamente desnecessária, sem falar no fato disso ser uma desobediência direta a ordem de seu pai de “não interferência na história humana”. Isso mostra que o kriptoniano é suscetível a tentações.
Super-Homem o Filme é um clássico incontestável, mesmo que não seja perfeito. Certamente é o melhor filme de super-herói realizado até o presente momento, além é claro de ter servido de inspiração para as outras adaptações que viriam depois. Uma grande realização de Richard Donner – talvez a mais notável de toda a sua carreira.
Clint Eastwood é, por si só, uma instituição do cinema americano: seus personagens e sua pessoa se misturam e como diretor ele é responsável por grandes clássicos. Em 1992, Eastwood retorna ao Western, gênero que o deixou famoso, mas que vinha esquecido há um tempo considerável.
Os Imperdoáveis gira em torno de William Munny, um antigo assassino que adota uma vida reclusa com seus filhos e vive assombrado por seu passado violento e pela morte da mulher. Munny é encontrado por Kid, um jovem interessado em ganhar uma recompensa de 1000 dólares oferecida por um grupo de prostitutas que buscam vingança. Interessado no dinheiro para os filhos, Munny encontra seu antigo parceiro Ned Logan e segue para a missão.
O oeste, nos filmes clássicos do gênero, sempre representou a ameaça da natureza sobre o homem e o herói é aquele capaz de colocá-la sob controle. O cowboy americano é o homem capaz de, por sua própria força (física e mental), civilizar forças perigosas e desconhecidas. Munny não é esse homem.
O personagem é apresentado pela primeira vez já com algum tempo de filme. Vemos então um Clint Eastwood de cabelos brancos, enrugado, e é impossível não contrastar essa imagem com sua imponência nos filmes de Sergio Leone. O envelhecimento e a passagem do tempo rondam os personagens principais: eles já não atiram ou montam da mesma forma, dormir ao relento os deixa doentes. No final a passagem do tempo, o envelhecimento, a natureza enfim, parece estar ganhando deles.
Em diversos momentos, Munny é jogado no chão por animais: ele não consegue controlar seus porcos ou seu cavalo. O personagem também não pode controlar a si mesmo. A vida regrada, o afastamento das mulheres e do álcool são a tentativa desesperada de encontrar do lado de fora aquilo que ele parece saber que está dentro. Munny teme que a crueldade esteja em sua própria natureza, teme que a crueldade anterior não seja mais do que parte dele mesmo.
O código moral em uma terra sem lei é mais um elemento onipresente nos Westerns e é outro ponto que Eastwood coloca em discussão nesse filme. Em um dos diálogos finais, Beauchamp afirma que não merece morrer daquela forma; Munny lhe responde que merecer tem pouco a ver com aquilo. O personagem de Eastwood, ainda que atormentado, sai ileso enquanto Ned, o “melhor” dos dois, incapaz de matar a sangue frio, morre espancado. A moral e a virtude de um atirador são objeto da longa sequência em que Little Bill e Beauchamp conversam na prisão e o motivo pelo qual o biógrafo se desencanta com English Bob.
Ao contrário de um faroeste clássico, aqui o destino dos personagens tem pouco a ver com seu comprometimento moral e a morte raramente vem acompanhada de nobreza. O universo de Os Imperdoáveis não tem lei, nem aquela certeza de sentido que acompanha boa parte do cinema americano.
O filme é construído em grandes planos abertos, como esperado do gênero, mas aqui eles não servem para mostrar a terra a ser conquistada, e sim aquela que destrói e endurece os personagens. As cenas internas são sempre escuras, os planos fechados, cada personagem limitado por si mesmo e a moça mais bonita do filme tem seu rosto marcado por cicatrizes.
Eastwood não chega exatamente a desconstruir o gênero, mas o elemento de tragédia e o pessimismo que insere em seus filmes subvertem os clichês. É um esforço notável e prova de sua excelência como diretor que os elementos mais fortes em Os Imperdoáveis não sejam os pertencentes ao faroeste, mas as características marcantes do cinema de Eastwood.